quinta-feira, 12 de janeiro de 2023

Pitaco de Ano Novo: Gerência nova e problemas antigos e mais violentos

 


Link: https://youtu.be/zMKEhkLafws


Poucas vezes a expressão irônica – a sua ausência preencheu uma grande lacuna – foi tão feliz para expressar a alegria que me invadiu no dia 1 de janeiro deste ano, dia da festa cívica de posse de Luís Inácio.

A ponto de, aliviado,  ter comemorado a dispensável presença do antecessor, em decorrência de sua prenunciada fuga, expressão de seu caráter antidemocrático, covarde e fujão.

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É forçoso reconhecer que a viagem às pressas criou uma janela de oportunidade de que se valeram os organizadores do evento -  Cerimonial da posse e a primeira mulher e companheira Janja – para, de imediato, tornarem clara a diferença entre o campo democrático que entra e o que sai.

Distinção representada pelo simbolismo do gesto de passagem de faixa ao novo presidente, pelos mais legítimos representantes do sofrido, invisível e excluído povo brasileiro.

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Mas, se a festa e seu caráter apoteótico me transmitiram a sensação de estar de alma lavada, reconheço que, aos poucos, aquela sensação de alegria vai se apagando de minha memória, substituída pela imagem de  uma fotografia desbotada.

Fenômeno que não pode ser tomado como sinal de Alzheimer, mas reflexo da sociedade injusta, iníqua e  profundamente desigual que caracteriza nosso país.

Realidade que estala de forma eloquente em minha consciência, e revela que uma festa dedicada a pôr em relevo o povo marginalizado do país seria fugaz, não duradoura.

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Com toda sua simbologia, se na subida da rampa do Planalto Lula estivesse cercado de empresários, banqueiros, financistas e investidores do mercado financeiro, jornalistas e analistas políticos e econômicos das grandes detentoras dos meios de comunicação, talvez tivesse infundido um respeito maior ao ato cívico.

Talvez os discursos repletos de propósitos, promessas, afirmações e conteúdos necessários e que mereciam ser escancarados por verdadeiros fossem escutados, analisados e interpretados de forma mais isenta, dando lugar a críticas menos apressadas e reducionistas,  menos ácidas, menos manipuladoras.

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Enfim, com jornalistas e analistas mais altivos e menos propensos à subserviência às elites e poderes econômicos, como se viu prosperar nas páginas dos jornais.

Os discursos e mensagens de Lula talvez tivessem sido menos distorcidos propositadamente, em tentativa canhestra de destacar aquilo que não foi dito, com a intenção de reavivar um clima de “nós contra eles”, como salientou em sua coluna na cada vez mais conservadora Folha de São Paulo, o irrepreensível professor Conrado Hubner Mendes.

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O professor viu nos textos o compromisso com a implantação -  sem deixar nenhum brasileiro de fora (ou seus legítimos representantes eleitos, independente do partido a que pertencessem) - de um país que não fosse democrático apenas na forma, mas principalmente no seu conteúdo.

Substancialmente inclusivo, justo, solidário, capaz de produzir e disponibilizar maiores oportunidades de acesso a alimentos, moradias, bens de consumo e culturais (“a gente não quer só comida, a gente quer comida, diversão e arte”), emprego e renda.

Renda menos desigualmente distribuída, em busca de  uma sociedade com distribuição dos frutos do trabalho mais equânime e equitativa.

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A ausência de empresários – depredadores, grileiros, aproveitadores, agrotrogloditas alguns, apenas excessivamente egocêntricos outros -, objetivando apenas a manutenção de sua bolha de riqueza incrustrada em meio a uma realidade paralela, ajuda a entender não apenas a vassalagem dos meios de comunicação de massa.

A ausência de acenos de submissão aos mercados financeiros e seus agentes a soldos polpudos – eufemisticamente confundidos com mercado em geral, formado por empresários respeitáveis, produtivos, e inclusive pequenos e médios empresários cuja luta pela sobrevivência não pode jamais ser ignorada – serviu como sinal.

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Pela negligência às elites, por não ter dado a elas o destaque de que se julgam merecedoras,  fazendo delas suas companheiras na chegada ao Planalto, no domingo seguinte as forças subordinadas a parte dessa  elite, ou que a procuram mimetizá-las se impuseram de forma violenta, caótica e criminosa.

De sua pequenez moral, da indigência de princípios éticos e democráticos da grande maioria dos invasores - vários apenas buchas de canhão, massas úteis de manobras vis – pouco há o que se esperar. Exceto o rigor na aplicação da lei e das punições ali previstas, em conformidade com o devido processo legal, por elas tão agredido.

Aos militares, irresponsáveis da segurança, a ansiedade da dúvida, a expectativa das investigações e a certeza de que o ostracismo não é  penalidade tão pesada quanto o remorso e a consciência de terem contribuído para remeter as Forças ao descrédito público e ao papel subordinado de que sempre tentaram se desvencilhar.

Aos financiadores do golpe frustrado, covardes de toda a espécie, as pesadas punições previstas na legislação antiterrorista, tanto na esfera penal quanto na cível.

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Para concluir, gostaria de destacar a reação passiva ou reticente dos mercados financeiros e seus lacaios, incapazes de qualquer manifesto de desapreço ou divulgação de nota de repúdio aos ataques ao Estado de Direito.

Para não fugir ao padrão de sua reação, em meio à apuração de responsabilidades e de prejuízos ao patrimônio e danos físicos, morais, sociais e políticos causados pela ação terrorista,  a maior preocupação que foram capazes de manifestar frente à imediata e unânime reação das autoridades constituídas do país foi a de como Lula sai fortalecido de todo o episódio.

O que encaram como um pesadelo, que torço para que se concretize.