segunda-feira, 26 de janeiro de 2015

Aqui, ortodoxia; lá fora, keynesianismo tardio. Enquanto isso, a Grécia assusta a Europa

Sinceramente, há coisas que são muito difíceis de entender. Especialmente em se tratando de economia.
Senão vejamos: enquanto no Fórum Econômico Mundial realizado em Davos, Joaquim Levy era alçado à condição de queridinho da reunião e da mídia internacional, justamente por estar adotando as medidas de cortes de gastos e elevação de impostos consideradas necessárias para recuperar a responsabilidade fiscal deixada de lado no primeiro mandato da presidenta Dilma, a Grécia realizava eleições no dia de ontem.
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Amplamente prevista, embora não com a margem obtida nas urnas, a população grega deu vitória ao Syrisa, partido dito dominado pelos radicais de esquerda, que teve como uma de suas mais importantes  bandeira, a rejeição aos cortes de gastos e selvagens elevações de impostos, que conduziram o país à penúria.
Segundo comentário do portal UOL, nessa segunda feira, a vitória ressalta como 5 anos de ortodoxia fiscal levou a Grécia ao caos, estimulando os dissidentes antimainstream e criando um precedente antiausteridade significativo. Com o risco de tal reação à política conservadora de inspiração alemã fazer surgir seguidores, como a Espanha, mergulhada em crise semelhante à grega, por força de adoção de medidas impostas de caráter semelhante.
A Espanha realiza eleições esse ano e o Syrisa, Tsipras e o povo grego podem se tornar uma referência importante, a amedrontar os principais líderes europeus.
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Independente disso, e dos elogios à ortodoxia de Levy e de sua preocupação em promover um ajuste fiscal severo e restritivo, também a política monetária adotada no Brasil, de cunho restritivo remete a economia a um futuro preocupante.
Destinado a resgatar a confiança dos mercados no sistema de metas de inflação, e conduzir a inflação para o centro da meta até o final de 2016, o presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, também presente a Davos, tem dado demonstrações de que, para conter a inflação desse início de 2015, identificada como resultado da correção de preços administrados no país, fará uso intensivo da elevação da taxa Selic, se necessário.
Em outras palavras, a elevação da Selic representa uma menor quantidade de moeda em circulação, no momento em que o Banco Central Europeu anuncia a adoção de uma  política monetária fortemente expansionista.
Segundo o BC Europeu, 60 bilhões de euros serão utilizados mensalmente para permitir compra de títulos junto aos governos dos países da zona do euro. A política de "quantitative ease" ou afrouxamento monetário segue o modelo daquela adotada com sucesso pelos Estados Unidos,  e prevê a injeção de mais de 1 trilhão de euros, em pouco mais de um ano.
Sua justificativa é a recessão que atinge praticamente a todas as economias da eurozona.
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Tudo bem que enquanto a Europa enfrenta um recessão sem previsão para chegar a seu termo, os Estados Unidos começaram a reagir, apresentando sinais de recuperação e crescimento econômico a tal ponto que as autoridades econômicas já deram início à adoção de medidas no sentido contrário, ou seja, de contenção monetária.
Mas, uma política de afrouxamento monetário em economias praticando taxas de juros muito baixas, até próximas a zero, fazem surgir a dúvida quanto a sua eficácia, ao menos em retirar a demanda agregada do patamar insuficiente em que se encontra.
Isso porque pode se repetir naqueles países, o mesmo fenômeno de armadilha da liquidez que ocorreu na economia americana em certo instante, com os portadores de dinheiro optando por ir aplicar seus recursos em mercados financeiros de países emergentes, como o Brasil.
Nesse sentido, a prática de politicas ortodoxas que constituem as preferidas pelos donos de capital financeiro  por parte do governo brasileiro pode servir de estímulo para atrair para cá, os recursos necessários para financiar de forma mais tranquila, nosso cada vez maior déficit nas transações correntes, que alcançaram o valor de 91 bilhões de dólares, em 2014.
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Lembremos que tal capital não vem ao nosso país, senão para obter sua valorização financeira, nos circuitos especulativos, sem  muita expectativa de gerar a expansão de investimentos produtivos.
Ao contrário, um grande influxo de moedas externas, valorizando o real, tende a trazer mais problemas para nossa já combalida indústria. E agravar ainda mais nossa dependência desses recursos.
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Mas o que faz a economia brasileira ter de adotar medidas na contramão daquelas adotadas pelos países que cobram uma maior responsabilidade de nossa parte?
Ao contrário dos países europeus, mesmo a Grécia ou Espanha, ou Rússia, que enfrentam crise e deflação, o Brasil atravessa um período de estagflação. Ou seja, embora já tenha sinais de recessão, há uma inflação que apresenta sinais de resistência. Seja pela correção de preços, seja pela questão que se prenuncia, devido à  seca, de escassez de água, energia, alimentos.
Parece-me pois, que a ideia é de primeiro debelar a inflação, se necessário aprofundando nossa recessão e desemprego. Para então, com o atraso que nos é peculiar, adotar as medidas destinadas a afrouxar a política econômica.
Claro, se até lá, sobrar ainda um setor industrial a ser estimulado.
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Interessante, também verificar a mudança de postura e comportamento de Martin Wolf, colunista do Financial Times, que prevê uma nova crise internacional em seu livro The Shifts and the Shocks: What We’ve Learned—and Have Still to Learn—from the Financial Crisis.
Para o influente analista econômico, é necessário se retomar os ensinamentos de Lorde Keynes, abandonando as políticas de liberalização que ele apoiou, quando adotadas por Thatcher e Reagan, e que apenas proporcionaram condições para crises financeiras como a dos anos 2007-2008.
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Mas, ao optar pelo Chicago Boy, Levy, Dilma resolveu adotar os preceitos ditados pelos mercados. Tomara que, acreditando ficar bem com sua biografia, não passe à história como a presidenta que levou a economia brasileira à depressão. Sem inflação, como o governo com superávits primários invejáveis, e um desemprego brutal, como chegou a ocorrer na Espanha e Grécia.

quinta-feira, 22 de janeiro de 2015

O reinício do Galo. Quem sabe o fim da inflação, pela condenação da economia brasileira ao estado vegetativo?

Enfim, aconteceu alguma coisa de boa nesse início de ano, ao menos para os atleticanos: a retomada do futebol, a volta do Galão ao Independência, e a manutenção da mística de que caiu no Horto, tá morto.
Melhor ainda, poder ver renovado o apoio da Massa, que mais uma vez se fez presente, hipotecando toda confiança ao time de Levir Culpi. Claro que havia a saudade do time; havia a apresentação de Lucas Pratto; havia a curiosidade de ver como o time se comportaria sem Tardelli; havia ingressos a preços reduzidos, muito mais de acordo com o bolso e o orçamento de quem inicia o ano com despesas que aparecem de todos os lados, sempre em maior volume que os rendimentos do trabalhador. 
Por tudo isso, mais de 20 mil torcedores compareceram e viram uma exibição de muita doação de todo o time, de muita disposição, muita garra, toques rápidos, jogadas em velocidade no primeiro tempo do jogo.
Era como se o time não tivesse interrompido suas atividades, tendo voltado a exibir o mesmo futebol empolgante que o levou a ser o campeão da Copa do Brasil no final do ano.
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Talvez em função do calor, que obrigou o juiz a paralisar o jogo utilizando-se do recurso do tempo técnico, talvez pelo fato de o time ucraniano não conseguiu vencer a barreira representada pela postura da defesa do Galo, ou porque o placar já estava em 3 a zero, o futebol caiu muito no segundo tempo, quando várias substituições foram realizadas. 
No Shakhtar, por exemplo, saiu o goleiro Pyatov, protagonista de um dos lances mais bizarros do jogo, com bola rolando. Saiu também Bernard, que a rigor não jogou nada, emocionado quem sabe, pelas homenagens que a torcida do Galo lhe rendeu.
No Atlético, as mudanças efetuadas por Levir só tiveram algum efeito nos minutos iniciais do segundo tempo, muito em  função da entrada de Dodô que logo de cara deixou sua marca, com uma arrancada espetacular do meio campo, em passe de Josué, e um belíssimo gol em chute indefensável. 
Já a entrada de Pedro Botelho serviu para demonstrar que Douglas Santos é, indiscutivelmente, o dono da posição. Já Maicosuel entrou pela esquerda, no lugar de Lucas Pratto e, apesar de mais adaptado ao time, ao elenco, ao estádio, à torcida, não conseguiu  manter o nível que o bom avante argentino demonstrou. 
Dessa forma, enquanto Pratto foi o responsável pela abertura da goleada, com um gol de cabeça encobrindo o goleiro do time ucraniano, em jogada mais uma vez originada d cobrança letal de lateral por Marcos Rocha, Maicosuel ficou mais alheio à partida, tendo uma única vez tentado e conseguido dar uma arrancada, em diagonal, entrando como quis, com perigo na defesa adversária.
E foi só.
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Donizete muito fraco no desarme e abusando de jogadas mais duras e até faltosas, foi substituído por Dodô, que começou com muita disposição e acabou tomado pela letargia que se abateu sobre a equipe, depois do quarto gol. 
Tudo bem, era jogo amistoso, de um time ainda em pré-temporada, o que serve para explicar a queda do ímpeto do time.
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Carlos como sempre correndo muito, pelas laterais do campo deu uma sorte indescritível quando, mais  uma vez sendo fominha, tentou um chute fraco para o gol do Shakhtar. Por incrível que possa ser, a bola passou por entre as pernas do goleiro adversário, em um peru que deve fazer parte da galeria de gols mais ridículos do Horto.
Curiosamente, logo a seguir, o goleirão que não se abateu, redimiu-se completamente ao espalmar uma bola que tinha endereço certo da gaveta do gol do Shakhtar. 
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Marcos Rocha, às vezes arriscando-se em jogadas de efeito que costumam levar perigo, foi importante no apoio, mais que na defesa; Leonardo Silva e Jemerson impecáveis no miolo, não deixaram espaço para o rápido time da Ucrânia. 
Sobre Jemerson, apenas o comentário, quanto à expulsão justa, por ter ficado sem pernas no final do jogo, não conseguindo acompanhar a velocidade dos atacantes adversários. A bola da falta que resultou em sua expulsão, em minha opinião, era dele, não fosse a falta de pernas. 
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Pierre que entrou no final, entrou muito mal, fora de ritmo e errando muitos passes. E Cesinha, que entrou no lugar de Luan, correu muito, mas foi vítima da queda de qualidade de futebol de todo o time. 
Por conta dessa queda de qualidade, uma partida que estava fácil acabou se complicando em termos, com o time visitante marcando dois tentos.
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No entanto, no dia de aniversário de Victor, ou São Victor, mais uma vez o goleirão do Galo mostrou que é, de fato, um dos melhores goleiros do Brasil, senão o melhor. 
Valeu por matar a saudade. E por ter deixado a torcida com confiança e uma boa expectativa para o ano de 2015.
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E prossegue o arrocho conservador

Como todo o mercado já antecipava, a taxa de juros básica da economia, a Selic, sofreu nova majoração de 0,5%, por decisão unânime da Direção colegiada do Banco Central, com assento no COPOM.
Com isso, a taxa agora se encontra em 12,25%, muito elevada sob qualquer parâmetro de análise.
Não à toa, em pronunciamento feito em Davos, no Fórum Mundial, Levy admitiu que a economia brasileira irá atravessar um período de recessão que ele estima ser de "apenas" um trimestre. 
Uma recessãozinha de nada, não fosse afetar negativamente a vida de tantos trabalhadores, sujeitos a perderem seus empregos. 
Mas, como o pensamento dominante é o de que, com inflação elevada a solução ou receita é "taca-lhe juros", o BC alia-se à Fazenda e colocam em curso um arrocho fiscal e monetário que vai jogar a demanda agregada ao chão, arrastando consigo o interesse e as decisões dos empresários de produzir. O que dirá, investir.
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Claro, sem produção, com desemprego que já se prenuncia no horizonte, com queda nas vendas, os preços deverão se estabilizar, e até podem cair alguns, caso os empresários necessitados de fazerem caixa para honrar seus compromissos, se disponham a reduzir e até zerar suas margens.
O que significa que a inflação será domada. E que os economistas do governo e do mercado irão saudar o acerto das políticas do governo, por terem conseguido estancar a infecção que dominava o organismo da economia. Isso, independente de o doente chegar a óbito.
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Pena de morte

Mais uma vez, volto ao tema da pena de morte, que aplicada na Indonésia, levou à execução de um professor de ultra-leve brasileiro, traficante internacional de fama reconhecida, Marcos Archer.
Dessa vez, para lembrar dos esforços que continuam sendo feitos pelo governo brasileiro, para evitar a execução de um segundo nacional, flagrado traficando drogas, em quantidade bem inferior, escondidas em suas pranchas de surfe.
Traficantes ou não, dizia eu, em postagem nessa semana, ainda não consigo conceber como a pena de morte encontra defesa em qualquer circunstância, salvo a do calor do momento. 
Mas, em minha postagem, falava de penas de morte não amparadas pelo sistema  judiciário e legal, que acabam sendo adotadas como aqui no nosso país. 
Falo das execuções nas periferias das grandes cidades, como Belo Horizonte, que essa semana assistiu a uma série de homicídios, de toda espécie.
Assassinatos feitos por milicianos, por justiceiros, por gente despreparada para exercer o papel de proteger a sociedade, por quem se arvora em juiz dos atos dos outros, dos traficantes e dos cornos ou mal-amados de toda espécie; dos homens que acham e se sentem donos de suas mulheres.
Que nos colocam na honrosa posição de país com um dos maiores índices de mortes violentas, que superam mais de 50 mil, no período de dez anos, conforme levantamento do Mapa da Violência.
E que nos envergonha, quando lembrado corretamente e com muita emoção por Kelly Slater, na mensagem que ele postou em homenagem a seu amigo, morto por discussão fútil, em Santa Catarina.
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A morte de Ricardinho, apenas vem confirmar a bestialidade com que estamos convivendo em nossa sociedade e que, de tão comum, está já nos entorpecendo. Não reagimos mais.
Ricardinho foi executado, tanto quanto o traficante Archer, com a diferença de não ter motivo para tal.
Tanto que o criminoso, policial que alegava legítima defesa, ter usado de meio muito mais violento e agressivo para se defender que aquele alegado por ele, usado na agressão por Ricardinho. 
Sendo ambos rapazes com perfil de atletas, opor um revólver para se defender de agressão sofrida com uma faca mostra mesmo porque não há como aceitar o argumento de auto-defesa, o que justifica que o assassino tenha se evadido.
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Mas, se Ricardinho a quem homenageamos,  foi vítima da pena de morte não justificada, o que dizer da menina de 4 anos,  vítima de bala perdida no fim de semana,  e agora, do menino de menos de 10 anos, com morte cerebral diagnosticada, pelo mesmo motivo?
Força às famílias de ambos, é o mínimo que podemos desejar. 
O que é muito pouco.

quarta-feira, 21 de janeiro de 2015

Estelionato eleitoral de Dilma é diferente do praticado por Aécio?

Na idade em que me encontro, era de se esperar que eu já fosse detentor de alguma experiência de vida, o que deveria impedir-me de ser surpreendido com tanta frequência.
Entretanto, sou obrigado a admitir que estou longe dessa condição. Sempre e cada vez mais, acabo sendo surpreendido por comportamentos, ações, declarações, atos e fatos, e por várias situações que a política brasileira e os políticos, seus agentes, nos proporcionam.
Ainda agora, sou novamente obrigado a reconhecer meu espanto, ao tomar conhecimento de declarações proferidas pelo senador mineiro, e candidato derrotado a presidência da República pelo PSDB, Aécio Neves. 
Em suas declarações, o senador, que acumula o cargo de presidente nacional de seu partido, criticou violentamente as medidas do pacote fiscal anunciada pela equipe econômica do governo, as quais classificou de "estelionato" eleitoral.
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Na nossa postagem de ontem, nesse espaço, já havia comentado o pacote, preocupado principalmente com o fato de que as medidas adotadas até agora têm um impacto muito maior sobre as camadas sociais com nível mais reduzido de renda.
Por não ter sido anunciada no pacotinho, não tratei da questão que o ministro Levy já havia anunciado estar em estudo, a saber, o aumento da tributação sobre as PJs. Mas, também essa medida, embora correta em princípio, acaba sendo, como já suficientemente demonstrado por vários comentaristas, um aumento da tributação sobre os ombros do trabalhador. Ou seja, mais uma vez, o aumento do peso da carga tributária se dá sobre o trabalho. Não sobre o capital.
A propósito, bem ao contrário do que está  em curso nos Estados Unidos, onde preocupado em elevar a arrecadação do governo,  Obama está inclinado a encaminhar ao Congresso, projeto de elevação de impostos, especialmente sobre as grandes fortunas. 
Mas, o Brasil tropicalizado é diferente. E enquanto os ricos não são molestados, os pobres e os cidadãos que integram as várias camadas sociais que compõem a classe média, são cada vez mais escorchados. 
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Aqueles que tiveram a paciência de acompanhar o meu pitaco de ontem sabem, contudo, que não considero que o arrocho fiscal posto em prática por Levy e Dilma represente um estelionato. Representa muito mais uma capitulação, feita na direção desejada, recomendada e exigida pelo mercado, e por seus porta-vozes e gurus.
Alguém poderia argumentar que estou discutindo questões meramente semânticas, e que o fato de Dilma ter feito um discurso em campanha, que previa o respeito e a manutenção, senão ampliação dos direitos conquistados pelos trabalhadores e classes menos favorecidas, contrário às ações e decisões que vem adotando, constitui exatamente a essência do conceito que a Ciência Política formulou e que denominou de estelionato eleitoral. 
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Justiça seja feita, um conceito que, por não estar tipificado em lei,  não representa crime, embora tentativas de deputados de incluir tal prática nos tipos dos crimes eleitoral. 
Então, reconheçamos, até para atender ao meu aluno e amigo Júlio César, que está em curso um estelionato, e que, como líder da oposição, o senador mineiro demonstra toda a sua insatisfação e revolta com as medidas de Dilma.
Segundo Aécio, em publicação que a gente nunca pode ter certeza se é correta, já que postada no fraquíssimo Estado de Minas, ´' É inaceitável que medidas dessa magnitude, que afetarão a vida de milhões de famílias, sejam tomadas sem nenhum debate com a sociedade."
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No trecho transcrito da declaração, importa observar que o senador não criticou a medida em si. Ou sua necessidade ou correção. 
Preferiu, como convém aos políticos da velha cepa, de perfil mais tradicional, ou politiqueiros, criticar a forma de adoção autoritária e sem debate, das medidas. 
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Em razão disso, ele, que em todo seu discurso de campanha tergiversou sobre as medidas que iria adotar para corrigir os rumos da economia brasileira,  que acusava de estar descarrilhada se arvora, agora, de defensor dos interesses dos trabalhadores, para os quais seu discurso representou sempre uma ameaça.
Afinal, foi seu companheiro  Armínio Fraga, ministro da Fazenda "ex-ante", que declarou que a legislação que assegurava aumentos reais de salários deveria ser alterada, atribuindo a ela parte da responsabilidade pela inflação. 
Também foi o "ministro ex-ante" que deixou clara a necessidade de se adotar um programa destinado a recuperar a responsabilidade fiscal, que deveria embutir medidas de aumento da carga tributária como também cortes de gastos. 
Enfim, um conjunto de medidas que, se não declaradas, eram bastante alinhadas com o pensamento e propostas de Aécio. Que tinha como um de seus principais objetivos, dar racionalidade à economia e criar um ambiente estável e favorável às decisões empresariais de investimento. 
Ou seja, o mesmo discurso de Joaquim Levy, ministro "ex-post" ou verdadeiro ministro da candidatura eleita, o que não surpreende a ninguém, uma vez a amizade que os une, levou a que Armínio trocasse várias ideias e se aconselhasse com Levy.
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Se antes, como candidato, Aécio concordava com a necessidade dos ajustes provocados pelas medidas de Dilma, pelo bem da economia brasileira e de nosso país, agora, do lado de lá da mesa, o senador dá a entender que "integrantes da oposição irão se mobilizar para impedir no Congresso Nacional a aprovação de propostas que possam penalizar os trabalhadores."
Ou seja, às favas as necessidades de ajuste da economia brasileira, de racionalização das contas públicas, de ajustes necessários para coibir abusos de programas sociais. 
Derrotado, sem compromisso com o país real e seu povo que lhe virou as costas, Aécio promete tentar impedir a aprovação das medidas que ele mesmo deixava antever considerar corretas.
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Ai me pergunto: não estaria também Aécio praticando estelionato eleitoral, embora seja necessário repetir, em nenhum momento ele teve a coragem ou hombridade de abrir o jogo e dizer claramente, mesmo quando cobrado pelos entrevistadores, que remédios amargos ele adotaria, caso eleito?
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Meu caro Júlio, é por esse motivo que não dá para ficar desapontado com Dilma e sua "traição". Porque senão eu estaria usando "dois pesos para julgar uma mesma medida". 
Estaria condenando Dilma pelo estelionato, e admitindo que Aécio praticasse o mesmo comportamento. 
A verdade é que me surpreendo, não por acreditar que Aécio fosse político capaz de pensar em algo mais que seus interesses e vaidades pessoais, em detrimento dos interesses maiores do país. 
Mas porque a imprensa não aponta o dedo acusador, como o faz com Dilma, para mostrar que Aécio apenas adota a mesma postura. 
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E repito o que disse ontem: acostumado a sempre ser vítima de estelionatários eleitorais, é que a população brasileira já calejada, prefere votar no que representa uma ameaça menor. Mesmo sabendo que, em geral, no final ela é que irá pagar os ajustes necessários ou não, que sempre poupam os mais favorecidos.
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Não concordo com Dilma, mesmo reconhecendo que algumas medidas são corretivas. 
Por exemplo, na questão do PJ, que sabemos ser uma exigência das empresas, que terceirizam seus custos e não contratam principalmente os trabalhadores mais qualificados de acordo com o que deveria ser a prática. 
A verdade é que, para desempenhar a mesma atividade que deveria executar caso fosse um trabalhador contratado com carteira assinada, o PJ acaba se beneficiando, ao menos do ponto de vista da incidência do Imposto de Renda, e APENAS NESSE CASO.
Como PJ, a alíquota não ultrapassa os 5%, contra uma alíquota provável de 27,5% pela tabela da Receita Federal, para empregados.
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Se se beneficia por esse ângulo, a questão é que o trabalhador perde todos os demais direitos assegurados por lei, como o recolhimento à Previdência Social, ou férias, ou o pagamento de 13º, ou o recolhimento do FGTS.
Então, há que se discutir melhor a adoção da medida, que comporta vários ângulos de abordagem.
Mas, os verdadeiros culpados dessa perda de arrecadação do IR, as empresas, e a causa real dessa perda, as manobras que as empresas colocam em prática para se evadirem de suas obrigações com seus trabalhadores, essa questão o governo não aborda. Faz vista grossa. Ignora. 
Mais fácil é partir para cima do mais fraco, o trabalhador.

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Vexame do Galinho

Não comentei o jogo em que o Galinho se classificou para a fase de quartas-de-final da Taça São Paulo de Juniores. E não o fiz por não ter achado o time do Atlético merecedor do resultado. Pelo menos não mais que o Flamengo, que jogou melhor, levou mais perigo e perdeu as melhores oportunidades durante todo o jogo. 
Entretanto, o goleiro Rodolfo estava inspirado e nos salvou, inclusive conseguindo pegar o único e derradeiro penalte batido pelo Flamengo, depois de 9 cobranças. 
Deu Galinho, com um show de cobrança de penalidades.
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Mas, ontem, contra o São Paulo, não havia adversário para o tricolor paulista. A defesa, nervosa, e completamente aberta, bateu cabeça o tempo inteiro, além de ter deixado espaços vagos durante os 90 minutos, por onde um João Paulo endemoniado penetrava sem qualquer problema. 
O técnico do Galinho, a tudo assistiu, incapaz de mexer no time e no esquema que não funcionou em nenhum momento. 
Pensando bem, com um técnico tão passivo, 4 a zero foi até pouco. 
E se o Galinho deu vexame e nos decepcionou, o gol olímpico que deu os números finais ao jogo, foi uma pintura. 

terça-feira, 20 de janeiro de 2015

Aberto o saco de maldades mostra que Dilma curvou-se aos poderesos

No dia 31 de dezembro, antes da posse da presidenta para seu segundo mandato, o Ministério da Fazenda, já dentro do espírito do ajuste proposto pela nova equipe econômica para resgatar o equilíbrio fiscal do governo, editou a PORTARIA Nº 523, DE 31 DE DEZEMBRO DE 2014, publicada no Diário Oficial da União - DOU, no primeiro dia útil de janeiro.
A finalidade não exclusiva da Portaria foi promover um aumento dos valores pagos pelo governo às instituições financeiras, pelos serviços de arrecadação de receitas federais, como da Previdência Social.
Antes, os bancos recebiam R$ 0,40 por documento de arrecadação, independente da forma de acolhimento. Pelos novos valores, o documento poderá custar de R$ 1,30 se quitado no guichê de caixa, ou R$ 1,10, por documento com código de barras também pago no caixa, ao mínimo, se pago por débito em conta via processo automatizado de cobrança.
Apenas por curiosidade, o valor de R$ 1,10 representa um reajuste de 175%.
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O reajuste aprovado pelo Congresso para a correção da tabela do IR neste ano, de 6,5% para uma  inflação de 6,41% foi vetado pela presidenta, já que representaria uma "renúncia" fiscal de R$ 7 bilhões, embora do ponto de vista da arrecadação real, não há o que se falar em  renúncia.
É bom nos lembrarmos de que, em todo o mandato da presidenta, embora mantida dentro do intervalo de tolerância do sistema de metas, de 4,5% mais 2 pontos percentuais, a inflação superou sistematicamente a taxa alvo. Entretanto a correção da tabela do IR foi da taxa alvo de 4,5%.
Ou seja, é prática comum no governo reajustar por baixo, para que aumente o número de contribuintes, já que a maior parte dos trabalhadores têm assegurado ao menos a reposição da inflação, excetuados os servidores públicos do Executivo.
Dessa forma, eleva-se o número de pessoas que saem da faixa de isenção e passam a ter de pagar o imposto de renda.
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Os juros bancários,  por si só elevados, e até comentamos ontem nesse blog as razões apontadas por economista do INSPER para tal fato, agora deverão sofrer uma elevação, em função do aumento de IOF de 1,5% para 3% ao ano, contido no pacote de maldades com que o ministro brindou a sociedade  no dia de ontem.
Com isso, a que se soma a manutenção da alíquota de 0,38% de IOF para abertura de crédito fica mais caro a obtenção de empréstimos na rede bancária. Além disso, compras parceladas no cartão passam a ter custo mais elevado, e compras em cartão de crédito ficam restringidas.
Claro que isso dificultará imensamente a demanda de consumo, especialmente de bens de consumo durável por parte das famílias.
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A correção da alíquota de IPI paga pelos atacadistas de cosméticos, visando homogeneizar a cadeia de produção, que tem sido apresentada como não constituir um aumento de alíquota terá um impacto, mesmo que pequeno, na geração  de receitas. No caso, de 381 milhões de reais, dentro de um pacote que estima gerar 20 bilhões de reais.
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Acrescente a isso, o retorno da CIDE sobre combustíveis, que inclui gasolina, cujo aumento estimado é de R$ 0,22 e diesel, R$ 0,15 por litro, além de impactar também o preço do gás de cozinha.
Esse retorno, previsto para gerar 12 bilhões de receitas extras.
No que tem deixado o ex-ministro Mantega com uma baita inveja, já que agora sim, ele está aprendendo o que significa e como se faz a tal Contabilidade Criativa.
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Antes desse pacote, as tarifas de energia já tinham subido, com previsão de subirem mais, para que nós consumidores possamos pagar 9 bilhões que o Secretário do Tesouro já declarou que não irá pagar às distribuidoras.
Para comemorar o aumento, o país teve ontem um apagão, muito menos por problemas de geração e transmissão e muito mais justificado a título de se fazer exercícios de treinamentos preventivos para o caso de São Pedro se rebelar e querer punir o povo que acredita que Deus é brasileiro.
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Mas a verdade é que Deus só será  mesmo brasileiro, desses que devem ser levados em consideração, se for membro proeminente das classes de maior renda do país. Tipo os banqueiros, os empresários da comunicação ou do agronegócio.
Ou pertencer ao grupo de grandes e produtivos donos de capital  que inteligentemente, colocam seu capital para trabalhar em seu lugar.
Justo o pessoal que aplica recursos em títulos públicos  e que o ministro Levy está preocupado em agradar, tentando criar um superávit primário que doa a  quem doer.
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No corte de gastos determinado pelo Ministro, como se fosse um contingenciamento, a Educação perdeu 7 bilhões, para que o governo faça a economia necessária para pagar os juros dos muito, muito ricos. Esses que preocupam tanto e atraem tanto a atenção do Levy.
Muito bem, não fosse o slogan do mandato Dilma 2, a Pátria Educadora.
Talvez por esse motivo, a preocupação  do MEC em melhorar a qualidade do ensino, não por melhorar a remuneração de professores, nem por rediscutir currículos ou propor uma reforma, mas por reduzir os gastos do Fies, o programa do financiamento estudantil, agora de acesso mais restrito, já que só podem se credenciar ao financiamento, alunos que tenham obtido uma nota mínima no Enem.
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Lógica de restrição que é semelhante à que levou ao pacote de endurecimento das condições de acesso a direitos trabalhistas, alguns dos quais, cortes mais que qualquer outra coisa, necessários.
Mas ainda assim, cortes. E mexendo em regras do campeonato não com o jogo já iniciado, mas a poucos dias do início do campeonato.
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A conclusão: Dilma se curvou aos interesses do mercado. Talvez até para, no caso de a política de arrocho não conseguir seu intento, poder se eximir de responsabilidades, o que é uma equívoco da parte dela já que sempre a midia e os interesses dominantes irão responsabilizar os graves problemas gerados por ela nos primeiros quatro anos.
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Não há traição. Há talvez, quando muito, covardia. E submissão aos interesses do capital financeiro, já que dificilmente a produção brasileira irá retomar a trilha do crescimento ou os empresários produtivos irão desejar retirar da gaveta projetos de investimento.
Embora a escola de pensamento econômico a que o ministro se filia acredita que o governo não pode gastar, para não ter de utilizar a poupança interna para financiar seus gastos, o que permitiria aos empresários terem dinheiro suficiente para investimentos, a verdade é que, com a economia arrochada e níveis demanda declinantes, mesmo que o governo não gaste (e até por esse motivo também!) e mesmo com inflação na meta, dado o câmbio distorcido levando à ruína nossa indústria, não haverá empresário disposto a trocar a remuneração do mercado financeiro por uma previsão de lucros que não irão se realizar, por falta de vendas.
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Nesse meio tempo, o COPOM reúne-se essa semana e é esperada nova elevação da Selic, completando o arrocho fiscal com o arrocho monetário.
A inflação cai, no final do ano. Isso é uma certeza. Tanto quanto a de que a febre pode ser debelada, caso a prescrição seja de algum tipo de veneno que faça o paciente deixar de sofrer nessa dimensão.
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E lá se vão as contas do governo Dilma entrar no eixo e nós ganharmos o respeito da comunidade financeira internacional,  por termos criado juízo, feito o para casa, e nos atrelado ao grupo de países que têm, como as estatísticas têm mostrado, 1% da população mais rica proprietária de mais da metade de toda a riqueza mundial gerada.
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Saudemos o capitalismo e suas virtudes, como as virtudes do livre mercado!
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Alguns irão dizer que Dilma ludibriou o povo, seu eleitor, ignorante.
Ignorante não. Crédulos, talvez.
Capazes de votarem em Collor e acreditarem que sua vida ia melhorar, para serem surpreendidos por medidas como o confisco da poupança e até da conta corrente, que atingiu a todos. Medida que, no debate famoso do segundo turno, o vencedor acusou Lula de desejar promover.
 Capazes de votarem em FHC, na esperança de que sua vida ia continuar melhorando, depois do êxito do Plano Real. Para logo em seguida verem a explosão da crise cambial, a elevação do dólar, o apagão, até chegar ao seu término, com inflação de mais de dois dígitos.
 Capazes de votarem em Lula e verem Palocci adotar as medidas que Lula criticava como neoliberais.
Capazes de votarem agora em Dilma.

Enganam-se os que acham que o povo não aprende e erra por ignorância.
No caso de um povo com tantas experiências desagradáveis, já está mais que na hora de se respeitar a sabedoria do povo, e perceber que sua escolha não se dá por não saber ou intuir o que virá.
Ao contrário, sabendo que será o bode expiatório, sobre quem a conta irá  recair, o povo apenas escolhe o que acha que vai fazê-lo sofrer menos. Ou o candidato cujo perfil deve promover menores sacrifícios.
Por isso, Dilma. A menos pior. Não a ideal.


A execução na Indonésia

O primeiro brasileiro condenado à pena de morte, e fuzilado na Indonésia, preso por tráfico de drogas poderia ser o maior criminoso, dado que o traficante não mata a sangue frio, cara a cara com sua vítima, mas acaba conduzindo seu freguês à morte lenta depois de uma agonia equivalente a uma tortura cruel.
Marco Archer Cardoso Moreira não merecia morrer pelo crime que cometeu, como ninguém merece ser apenado com a perda da vida, sem a mínima oportunidade de poder refletir sobre seu erro, e tentar reparar os males que provocou.
Crítica que vale para a Indonésia, para os Estados Unidos, para outros países que condenam à mortes, seja em julgamentos formais (como na Indonésia) seja por juízos decididos em gabinetes, a título de combates ao terrorismo ou postura equivalente, que sempre incluem invasões, bombardeios, ataques aéreos com a morte de civis sem vínculo com a causa alegada parar os ataques.
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E esse raciocínio deve valer para nossas milícias e justiceiros, nas vilas, favelas, regiões de periferia das grandes metrópoles, e também para o criminoso capaz de cometer crimes bárbaros.
Porque sempre deve valer a reflexão de que não há diferença entre Marco Archer e qualquer outro traficante no morro, ou qualquer assassino sanguinário e bestial.
Punir pesadamente SIM.
Pena de morte, nunca. Ou nunca mais!!!

segunda-feira, 19 de janeiro de 2015

A venda de Tardelli, o que o Galo precisa e os juros altos no Brasil

Sejam 5,5 milhões de euros, ou pouco mais, a verdade é que o Galo perde um jogador referência e, por isso mesmo, importante para a disputa dos torneios que temos pela frente esse ano. A começar pela Libertadores, torneio para o qual a primeira fase do Mineiro é sempre um bom preparativo; a etapa de finais do Mineiro, desde que o time assegure a classificação e, principalmente, se o Cruzeiro também se classificar, caso em que torna-se uma obrigação a conquista do título; o Campeonato Brasileiro, a Copa do Brasil, campeonatos que exigem um plantel maior e mais qualificado.
Entenda-se: qualificação não em termos de capacidade técnica apenas, mas também de experiência, malícia, catimba, especialmente para avançar na Libertadores.
Mas, além da grana que ajuda a tirar o Galo do sufoco, permitindo acertar a situação de pagamentos atrasados dos jogadores, não há como criticar a conclusão das negociações: afinal, Tardelli já tinha dado sinais evidentes de seu interesse em sair do Atlético.
E não há como criticar esse desejo, que representa a confirmação da independência financeira para o atleta que, como qualquer trabalhador, tem todo o direito de buscar melhorar sua remuneração.
E, atleta insatisfeito, como qualquer outro profissional, acaba vendo reduzida sua produtividade, principalmente quando a atividade exercida envolve doses elevadas de criatividade, inventividade, entrega física e emocional.
E é bom deixar claro que não se trata de uma reação de pirraça, de fazer corpo mole por ter sido contrariado em sua vontade, embora alguns jogadores possam até enfrentar esse dilema. Mas, por não se sentir devidamente valorizado o que, mesmo que inconscientemente, suga sua energia e afeta sua confiança e sua disposição.
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Com Tardelli, atleticano confesso, não seria diferente. Ainda mais quando sua esposa, que segundo comentários manifestava  vontade de voltar a morar no exterior, começasse a dar demonstrações de insatisfação, o que é capaz de minar a tranquilidade de qualquer pessoa normal.
Assim, que Tardelli encontre lá fora o sucesso de que é merecedor, e possa conquistar seus sonhos.
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Por outro lado, virada a página de mais essa passagem vitoriosa de Tardelli, cabe agora a Levir fazer um verdadeiro trabalho de análise dos recursos com que conta, para poder enfrentar os desafios grandes que terá pela frente.
Levir está consciente de que a Libertadores depende não apenas da vontade, da garra, da disposição, da juventude e entrega, da qualidade técnica que certamente existe no elenco. Ele sabe que dadas as circunstâncias que cercam jogos, as condições de campos, os locais e a presença até ameaçadora das torcidas, e principalmente as arbitragens é fundamental contar também com jogadores experientes, capazes de peitarem o juiz, se necessário. Capazes de fazerem catimba e levar o adversário à irritação. Um jogador capaz de dar bronca nos seus companheiros e, se necessário, até pegar a bola debaixo do braço, e de cabeça erguida mostrar que não está derrotado e ser capaz de levantar o moral do grupo. Um jogador malandro, capaz de cadenciar o jogo, e fazer a bola rolar de pé em pé, ou então dar o chutão candidato a ganhar o prêmio do "leitão" do jogo. quando necessário.
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Pode ser que tal jogador já esteja no clube, e já faça parte do elenco do Galo, podendo tanto ser o Guilherme, ou Maicosuel, ou mesmo Pratto. Mas, a par da grande qualidade de futebol de todos eles, não consigo imaginar esse papel de liderança sendo exercido por qualquer um deles.
E esse é o meu temor. Acho que falta alguém para chamar a responsabilidade e fazer virar o jogo.



Porque os juros do crédito bancário são tão elevados?

Já há algumas semanas a Folha de São Paulo tem publicado, aos domingos, no caderno Mercado, uma série denominada "Questões Brasileiras" contemplando artigos, voltados a discutir temas econômicos, cuja solução passa por um debate mais amplo por parte de toda a sociedade. Temas como os motivos de o desemprego não estar se elevando, mesmo com a economia estando estagnada; ou a discussão da necessidade de uma reforma de nosso sistema de Previdência, que aborda a espinhosa questão da diferença de critérios de aposentadoria, em razão da diferença de gêneros, dentre outros.
No artigo publicado no dia de ontem, o professor do Insper, Marco Bonomo, abordou a questão das elevadas taxas de juros cobradas pelos bancos em suas linhas de crédito, tomando a cautela de diferenciar o segmento livre, em que as taxas são as de mercado, em contraposição ao segmento de crédito direcionado, que obedece às taxas estabelecidas pelo governo.
Conforme dados apresentados, a taxa média de um empréstimo á pessoa física ao final de 2014, era de 44% ao ano, o que revela uma taxa superior à inflação de 35% ao ano.
Para estabelecer as razões de taxas tão exorbitantes, o professor propõe que se divida a taxa em dois elementos: a taxa de juros básica, a Selic, que fixa o nível da taxa de captação ou o custo de financiamento dos bancos, e que é uma da mais elevadas do mundo. E, um segundo elemento, que é o "spread" bancário, ou a diferença entre o que o banco cobra e o que ele paga a título de "funding".
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O economista inicia mostrando que, pela moderna teoria monetária, o nível da taxa básica deveria flutuar em torno da taxa neutra, que é a que faz a demanda agregada igualar-se ao produto potencial da economia, considerada uma taxa natural de desemprego.
Para o professor, nossa taxa neutra é muito elevada, o que obriga à elevação da Selic, para que uma situação de agravamento da inflação seja evitada.
E, como razão para a manutenção em patamares tão elevados da taxa neutra, o professor propõe "a impaciência dos nossos consumidores, o que se traduz numa baixa propensão a poupar".
E porque o consumidor brasileiro não poupa?
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Bonomo regressa no tempo, ao período da experiência inflacionária do país, para alegar um "risco na atividade de poupar", seja pela experiência de retornos incapazes de superar a inflação, antes da existência do instituto da correção monetária, seja por que os índices de correção eram manipulados, seja ainda por consequências do confisco da era Collor.
A essa percepção o articulista agrega outra: o paternalismo do Estado e sua criação de mecanismos de poupança forçada e benefícios pré-estipulados, que levou a uma acomodação por parte da população.
Por fim, é aventada a contribuição do baixo nível de educação financeira da população, o que não é de se estranhar para uma população carente até mesmo da educação básica.
Como não poderia deixar de cutucar, de passagem, o economista acrescenta dois fatores conjunturais: a deterioração da política fiscal e a queda de reputação do Banco Central.
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Engraçado. Em meu raciocínio limitado, se comparado ao do professor, e lembrando-me das aulas de macroeconomia keynesianas mais básicas, sempre aprendi que a poupança é o resíduo. O que sobra da renda, depois de feitos os gastos de consumo da pessoa ou de sua família. Conforme a definição mais aceita, poupança é o não consumo.
Para alguns, não é o ato ou decisão autônoma do agente. Mas o que lhe resta da renda depois de assegurada sua sobrevivência.
Para Keynes, a poupança seria determinada pelo nível de renda. E esse seria o principal fator, inquestionavelmente o fator mais importante de quantos forem apresentados.
Ora, em um país em que o número de pessoas vivendo em estado de miséria absoluta era um assombro e merecedor de críticas de organizações tão consideradas como o Banco Mundial, ao menos até o início da gestão de Lula e seus programas de assistencialismo e bolsas, é difícil ver como o risco da poupança pode se fazer presente. Risco muito maior é o de se alimentar, já que para quem não tem nem o quanto necessário para poder fazer uma refeição decente, comer pode ser uma agressão ao estômago atrofiado.
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E, depois dos programas assistencialistas a que o professor deve, em parte, atribuir ao menos parcialmente alguma culpa pelo fator conjuntural da deterioração da política fiscal do governo, pessoas que nunca tiveram acesso a bens tão triviais para nós outros, passaram a consumir mais, não por serem perdulários, mas por carência de anos e anos em que nada tinham e, por isso, mal acostumados com a poupança forçada que o governo lhes impunha.
Faça-me o favor. Culpar mais de 45 milhões de brasileiros, quase uma França, que finalmente e a duras penas conseguiram uma inserção no mercado de consumo, por estarem gastando em excesso, por falta de educação financeira seria  cômico, não fosse a discussão de até que nível o humor pode chegar. Para não se transformar em tragédia.
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No tocante ao "spread" os argumentos do economista são todos corretos, talvez com mais peso para alguns que outros, algumas ponderações de relevância distinta da que o professor parece atribuir, considerando-se a posição do fator no texto.
A elevada concentração do sistema, uma das maiores razões, o professor expõe em último lugar, embora seja forçado a considerar a necessidade de políticas que incentivem a competição. Mas, aqui, apenas sugere a utilização do cadastro positivo, e à medidas de portabilidade, criticando a utilização dos bancos públicos e sua força concorrencial para quebrar o poder de mercado dos grandes bancos privados.
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Aborda a questão da inadimplência, que faz os bons pagadores pagarem pelos maus; trata do compulsório elevado, sem remuneração;  menciona o imposto indireto IOF; e critica as operações do segmento do crédito direcionado, que atendem a atividades como financiamento agrícola, ou da habitação. Ou seja, ao ajudar as populações com menor capacidade de suportar os riscos de seu negócio, como o rural, os bancos compensam ou desforram as taxas menores que são forçados a cobrar nos créditos do segmento livre.
Ao que parece, o autor do artigo, concorda com esse comportamento dos bancos.
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Fica muito clara a ideia por trás e quais os agentes econômicos que são o alvo de preocupação do autor do texto.
E não é ao povo inculto e bárbaro certamente que suas atenções se voltam.
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Melhor o texto do professor Belluzzo, no Valor da semana passada, comentando em entrevista que Dilma capitulou ao mercado.
Não houve nem traição nem estelionato, Apenas e tão somente, capitulação.
Desse texto podemos tratar amanhã ou outro dia, mas já pinço duas citações, que reproduzo:

"Valor: O sr. e um grupo de economistas de perfil heterodoxo assinaram manifesto em apoio à Dilma, que dizia que a população desaprovava políticas que afetavam os trabalhadores.
Diante da política econômica atual, o sr. se sente traído?
 Luiz Gonzaga Belluzzo: Não considero uma traição e sim, submissão.

Ela capitulou diante das pressões do mercado, assim como os líderes europeus e uma parte do PT."

E: 

"Valor: E o que fazer? 
Belluzzo: Com certeza, dá para dizer o que não fazer: um ajuste fiscal dessa magnitude. Porque querer reequilibrar a economia com um superávit fiscal quando ela está em recessão parece um desatino.
Isso para não falar dos problemas da Petrobras e das empreiteiras."

OU ainda:

"O que está na cabeça "deles" é tentar reequilibrar a economia com o aumento da poupança do governo. Acho que vai ser a maior prova de que essas teorias da poupança não funcionam: não é possível poupar com renda em queda. Mas eles precisam justificar o fato de que é a poupança que financia o investimento, o que é uma brutalidade. Todo mundo sabe que numa economia moderna quem financia o investimento é quem adianta os recursos líquidos.
E eles vêm com essa história da poupança. É um misto de estupidez com picaretagem. Para eles, o cara enriquece porque poupou.
Não, o cara enriquece porque investiu, produziu para enriquecimento dele e da sociedade. Quem poupa subtrai da renda e reserva isso como riqueza privada. O Keynes tinha horror a esse negócio."

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quarta-feira, 14 de janeiro de 2015

Pitacos esportivos e outros sem esportividade

Desde o último dia 7 encerraram-se as férias dos jogadores de futebol dos dois maiores clubes de Minas: Atlético e Cruzeiro. 
Em ambos os times a semana tem sido marcada pela bateria de exames clínicos e físicos que dá origem ao chamado período de pré-temporada. 
Em geral, poucas mudanças nos elencos, apenas inchados, em alguns casos, pelo retorno dos vários jogadores emprestados a outros clubes, e na expectativa de serem incorporados ao elenco ou de uma nova negociação.
O Cruzeiro retorna apresentando mais novidades, tanto em contratações quanto em saída de jogadores. De longe, entretanto, a mudança mais marcante nesse início de ano é a venda de Ricardo Goulart para a China, pela extraordinária quantia de quase 44 milhões de reais. 
Para um jogador que custou 2 milhões ao Cruzeiro e sai por uma quantia líquida de 20 e poucos milhões, é um negócio da China, com o perdão do trocadilho.
***
Em minha opinião, de um ferrenho e convicto não cruzeirense, o time de azul perde sua maior estrela, maior mesmo que Ewerton Ribeiro, embora a crônica esportiva tenha escolhido este último duas vezes como melhor do time e craque do campeonato Brasileiro.
Se bem me lembro, houve um período no meio do ano, em que Ricardo Goulart estava jogando mal, sem qualquer inspiração. Mas, deve ser dito também que o mesmo aconteceu com Ewerton, e Ricardo Goulart, quando se recuperou mostrou ser um jogador útil a qualquer time do país. A ponto de ver seu futebol reconhecido por Dunga, o técnico da seleção brasileira, o que resultou em algumas convocações para os amistosos da seleção.
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Antes de Ricardo, o time bicampeão do Brasileiro (consecutivamente) já havia visto a saída de Marcelo Moreno, seguida da de Borges, e até mesmo a de Dagoberto.
Confesso que, como atleticano, a quem Dagoberto sempre teve a capacidade de irritar menos por seu futebol e mais por seu comportamento e declarações, vê-lo sem lugar no time pelo qual cantou o hino, bradou os cânticos da torcida é muito bom. 
Nesse caso, devo admitir, por se tratar de uma Vingança. Exatamente aquela que é prato que a gente come frio. 
Agora o jogador-torcedor enervante, para não baixar o calão, sofre a humilhação de ter de procurar um time para jogar, caso contrário, pelo que sai na imprensa, deverá retornar para ver se pode ser aproveitado no plantel. 
Humilhante... Mas ótimo. E me faz ter frouxos de risos.
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Enquanto isso, no GALO

Mas já tratei muito do outro time e, definitivamente, sou torcedor do Galo e não torcedor anti-qualquer coisa. 
E se pouco falei do Galo é porque as novidades são poucas. E ainda assim, na maior parte das vezes, difíceis de entender, ou mesmo aceitar.
Vá lá. Houve a contratação do muito bom atacante, o argentino Lucas Pratto. E, já que a piada é inevitável, também houve a contratação que marca o retorno de Danilo Pires ao time que o lançou para o futebol. 
Para não deixar o Pires na mão, o Galo resolveu servir a mesa. 
Pratto é bom jogador e mostrou isso na última Taça Libertadores, onde se destacou jogando pelo Vélez. 
Que tenha aqui no Galo condições de mostrar todo o futebol de que é detentor.
Mas, Pires... Nada contra o ex-jogador do Santa Cruz, que marcou sete gols no último campeonato, e mostrou ser como ele mesmo se definiu, um volante moderno. Claro que meu desejo é vê-lo brilhando com a camisa alvinegra do Atlético, ajudando na campanha e tomara que conquista de mais uma Libertadores.
O problema aqui é outro. E tem nome e sobrenome: Fillipe Soutto. Afinal, porque esse prata da casa não tem qualquer oportunidade no nosso time, independente do técnico que esteja lá trabalhando?
Não dá para entender como manteve e deu tantas chances ao péssimo Serginho, com seu futebol violento. Testou Eduardo, também egresso da base e a quem considero muito presunçoso. Deu chances a tantos, exceto Fillipe Soutto.
Sinceramente, difícil de encontrar explicações.
***
Outro que sai é Réver, o capitão da jornada vitoriosa da Libertadores, que foi figura apagada em 2014. Muito em função de contusões que o perseguiram e o afastaram de campo na maior parte do ano, a ponto de dar chance ao surgimento de Jemerson.
Há mais tempo, cometi a heresia de comentar que achei que Emerson dava mais segurança à defesa que Réver. Fui crucificado e confesso que, embora não tivesse mudado minha opinião, para minha alegria vi Réver se tornar o maior zagueiro artilheiro da história do Atlético. Superando a Luizinho.
Também apenas para não deixar passar em branco, Emérson pouco jogou no ano passado, também afastado por contusão.
Agora ouvi dizer que Levir está disposto a dar nova chance a Emérson, e está liberando Réver.
A única observação a respeito é a de que a liberação de Réver cria a mesma situação para o time, de quando ele se contundiu. O time fica sem opções de banco para uma eventualidade. 
E as opções que restam, exceto Emérson, não têm a mesma experiência de Réver. 
Mas, entende-se o desejo do jogador de sair, tentando poder mostrar futebol para retornar à seleção brasileira.
E, caso o negócio seja bom para todos os lados, não há muito o que criticar. Jemérson, embora novo já mostrou que dá conta do recado. Com sobras.
E ainda tem Tiago para a zaga.
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Guilherme continua sendo uma novela. Tanto agora na renovação de seu vínculo com o clube, quanto em meio às temporadas, em que seu futebol inteligente e que se provou muito útil pouco sempre enfrenta o problema de contusões. 
E, afastado por longos períodos dos gramados, é sempre uma incógnita como será o retorno do jogador. Se pesado, sem condições físicas de correr e dar o gás que a torcida cobra dos jogadores que envergam o manto atleticano, ou se o Guilherme oportunista e com muita visão de jogo.
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Também em banho-maria a situação de Tardelli, que já deu inúmeras demonstrações de que não deseja continuar no Galo, independente de seu contrato com o clube.
Esse, caso seja mesmo vendido, representará perda grande para o time, se não representar uma perda semelhante, caso esteja jogando desmotivado.
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Jô, André e Emerson Conceição, afastados do plantel, não são objeto sequer de interesse de outros clubes. No caso de Jô, por culpa exclusiva do próprio jogador e de suas seguidas indisciplinas. Porque se indisciplina não deve ser tolerada em qualquer circunstância para não quebrar o espírito de corpo e o moral do grupo, menos ainda de um jogador que passou grande parte do ano passado sendo apenas uma promessa. E uma grande frustração, inclusive na seleção.
Jogando mal, sem marcar durante quase toda a temporada, Jô realmente terá dificuldade para achar clube interessado em seu - fraco - futebol, em seu despreparo para a fama (Fred, que também foi uma frustração na Copa do Mundo, recuperou seu futebol e foi um dos artilheiros da competição).
Quanto a André, o Bebezão é outro que vai custar a achar quem aposte ainda em sua capacidade de se dedicar ao futebol, com exclusividade. 
O outro melhor nem falar.
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A saída de Alex Silva talvez represente para o jogador o mesmo que a saída de Marcos Rocha fez por seu futebol, há alguns anos atrás. Tomara que o jogador possa explodir e mostrar todo seu potencial.
No mais, o Galo vai para a Libertadores com um elenco bom, forte, mas completamente inexperiente para o tipo de competição que todos sabem ser a Libertadores.
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Sem competência, Grêmio apela para o mata-mata

Há anos sem conseguir chegar entre os mais bem colocados da competição, especialmente sem almejar o título, situação que também se repete nos mata-matas de que participa, o Grêmio sai com essa asneira, típica de quem não tem mais nada a fazer.
O pior é que como dona Globo gosta mais desse formato americanizado de play-offs, a ideia estapafúrdia pode ganhar alento. E adeptos.
Nesse caso, em que o Grêmio apenas mostra não ter capacidade para manter um time, uma base, um técnico, um elenco por falta de estrutura, planejamento e logística, sinto-me no dever de fazer um elogio ao Fluminense.
Afinal, reconhecendo suas debilidades, o time fez já há algum tempo, a opção por ganhar as competições no tapetão.
Menos mal. Pelo menos não engana a nenhum torcedor. Nem aos seus. 

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Inflação na meta e energia extrapolando

Conforme comentei durante todo o ano passado, o resultado final da inflação para o ano acabou ficando em 6,41%, dentro dos limites do intervalo do sistema de metas. Para mostrar que a inflação não saiu de controle, como o ministro tão ridicularizado Mantega, sempre afirmou. 
Vá lá que não houve qualquer crescimento do PIB, o que apenas mostra que Mantega não é pitonisa. Nem tem vocação para Mãe Dinah, estando mais para o charlatanismo, ao menos no que se refere a suas previsões. 
Mas, como também afirmamos em várias ocasiões, o problema ou descontrole maior deveu-se à questão da seca que o país vem enfrentando, e contra qual nenhum ministro pode lutar. 
Dessa forma, e para corroborar nossas afirmações, o item alimentação foi o que mais pesou no final da alteração dos preços.
Por um lado, devido à seca. Por outro, devido à - positiva - elevação de exportação de carnes para mercados antes fechados. Por fim, em função de o dólar ter se valorizado no ano, o que se é bom para a indústria nacional, que pode tentar se recuperar, é péssimo para o consumidor de carnes. Afinal, é melhor vender ao exterior, em dólares valorizados. Ou então, cobrar internamente preço equivalente ao da receita vinda de fora. 
Pior deve ser o quadro nesse início de 2015, quando a inflação deverá estourar o limite superior do sistema de metas, o que é pouco significativo, já que o que conta é o índice para o ano corrido. Afinal, como o ministro já anunciou, haverá uma inflação corretiva, alinhando preços de combustíveis, de energia, etc, sem que o calor e a seca percam força.
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Quanto à energia, que toda a imprensa e a midia usam para agredir o governo e as políticas do primeiro mandato, o que está para acontecer é que a energia cada vez mais cara que já consumimos e ainda estamos consumindo, e que deixamos de pagar anteriormente, terá de ser paga agora. 
Ou seja, o que houve ou o que ganhamos a população brasileira foi apenas um tempo. Deixamos de pagar antes. Vamos pagar agora. 
Curioso é que, se questionado, qualquer analista dirá que é melhor pagar depois ou ter de devolver qualquer valor recebido antecipado. Afinal, nesse intervalo de tempo, esse valor  poderá ser aplicado, gerando um rendimento para o beneficiário. 
O governo tentou estimular a economia, sem êxito, concedendo esse subsídio na energia. Não há como afirmar que o motivo da medida fosse meramente para represar preços e manipular a inflação. 
Agora, com a seca e problemas na geração de energia hidrelétrica, o que obriga o uso das usinas termelétricas, de maior custo, não há como evitar os reajustes. 
Não gostaria de ver o  que diria o ministro se a seca permanecesse e, o uso da energia mais cara fosse a opção única, para justificar cada vez maiores elevações de preços, nada corretivas, até com impacto na inflação.
Embora este fosse um cenário trágico, ao menos a ortodoxia poderia nos brindar com alguns argumentos interessantes. E novos. 
A energia pode aumentar até 30% . Resta-nos reaprender a poupar, energia e água.  Ou aprender a fazer a dança da chuva. 

terça-feira, 13 de janeiro de 2015

O câmbio e a desindustrialização

A preocupação com o câmbio e suas consequências nefastas para nossa economia, nossa indústria em especial, à frente, foi o tema principal da entrevista que o professor Bresser Pereira concedeu a Luís Nassif, no Canal 3, TV do Brasil.
Na conversa, se interpreto corretamente o pensamento do Professor Emérito da FGV, ele expôs sua tese de que, como país emergente e de grande dimensão e grande dotação de riquezas naturais que o caracterizam como grande exportador de commodities, o Brasil convive necessariamente e de forma duradoura com um tipo de problema cujas consequências são, em média, exatamente as mesmas da doença holandesa.
Mas, qual o significado dessa doença holandesa? Qual a ideia que o ex-ministro expõe com tanta preocupação?
Por doença holandesa entende-se o fenômeno vivido pela Holanda a partir do instante em que foram descobertas significativas reservas de gás natural em seu mar territorial. Com a demanda mundial do  produto em alta, e também seu preço, a Holanda tornou-se grande exportadora dessa commodity, gerando um volume elevado de influxo de divisas. Tamanha prosperidade provocou a desvalorização do dólar e a valorização do florim, barateando produtos industrializados importados e encarecendo a produção interna holandesa.
Como consequência, sem condições de competir com produtos industrializados do exterior, a Holanda deu início a um processo de desindustrialização  de consequências desagradáveis.
No caso do Brasil, rico na produção de commodities e um dos mais importantes países no comércio mundial de produtos do agronegócio e de produção mineral, segundo o professor, não haveria um único desses produtos, exceto esporadicamente que tivesse seu preço muito elevado. Mas, em média, os preços desses produtos seriam responsáveis pela entrada de uma quantidade de recursos que teria um efeito análogo ao da doença holandesa.
Com muita entrada de dólares pelas exportações de commodities, nossa moeda fica valorizada e nossa indústria acabaria sendo afetada pela perda de competitividade derivada do câmbio desfavorável. Bresser Pereira estima que por volta de 15 a 20 ou até 25% do valor de nosso câmbio seriam justificados por tal fenômeno, típico de países emergentes que, como o Brasil tem tais condições de produção natural. Em consequência, nossa indústria não teria como alcançar os níveis de produtividade que lhe permitissem concorrer tanto nos mercados externos com exportações,  quanto com vários tipos de produtos importados  em nosso próprio mercado interno. Resultado do fenômeno: o sucateamento de nossa indústria, a perda da importância relativa que já teve em nosso país, e que tanto nos encheu de orgulho.
Daí sua defesa da adoção de medidas protetivas de nossa indústria, em especial, a adoção de uma política tarifária, que permitisse a elevação de nossa alíquota média em algo em torno de 20/25%.
Além dessa medida, se entendi corretamente a tese e a proposta do professor, Bresser abordou outras questões importantes, provenientes do câmbio desequilibrado.
Uma dessas questões, que achei importante, é relativa a um pensamento keynesiano meio capenga  ou, como ele definiu, vulgar. Trata-se de que para muitos economistas, não haveria motivação capaz de levar o empresário a investir se não houvesse uma demanda agregada sustentada. Daí a razão de programas de apoio à manutenção do consumo da sociedade, através dos programas sociais de transferência de renda, os programas de bolsa, tão benéficos em termos de geração de poder aquisitivo e elevação dos níveis de consumo da população, com os efeitos decorrentes sobre a produção e a geração de emprego.
Nessa mesma direção foi dada muita importância à criação e à melhoria das condições de ao crédito para estimular a nossa demanda agregada.
Mas, como o professor lembrou, não basta ter as condições de estímulo à demanda. Há também que se preocupar em dar acesso aos nossos empresários a essa demanda gerada. Ou para simplificar: não basta dar recursos para que as famílias aumentem seus gastos, especialmente se tais gastos poderão alimentar um processo de aquisição de bens – mais baratos – no exterior.
Isso provocaria apenas uma deterioração de nossa conta de transações correntes, e a condenação de nossa indústria a uma perda gradativa de importância econômica, em caminho sem retorno.
***
É verdade. O câmbio pode, se muito valorizada nossa moeda, nos condenar à perda de mercados clientes e de receitas de exportações importantes, além de poder também direcionar para o exterior, nossos fluxos de demanda, de produção e até de empregos.
Por isso concordo com a crítica feita pelo professor á ideia de utilizar para financiamento de nosso processo de crescimento, a poupança externa, entendida como um resultado negativo em nossa conta de transações externas.
Tecnicamente, e por definição, a poupança externa nada mais é do que estarmos comprando, no exterior, bens e serviços em maior proporção do que vendemos. Em termos de rendas, representa também que estamos remetendo mais para fora do país do que recebendo de nossas empresas que operam em outras regiões do mundo.
Ou seja, financiamos o excedente do que compramos lá fora, em relação ao que vendemos e, para cobrir essa diferença, temos de tomar financiamentos. Ou contar com o interesse em que proprietários de capitais queiram vir investir em nosso país.
De um jeito ou de outro, a atração e a entrada desses valores financeiros –representa nas contas de movimento de capitais do Balanço de Pagamentos – exige para o seu proprietário algum tipo de ganho. Afinal, só se houver perspectiva de ganhos, sob a forma de lucros ou de juros, o capital terá interesse em se dirigir a aplicações em nosso país.
Tendo em vista nossas fragilidades em infraestrutura e logística, é natural que os prêmios pedidos pelos donos dos capitai, para se dirigirem à nossa economia, sejam elevados. Ou seja, taxas de juros elevadas, benesses em termos de política fiscal para aqui se instalarem.
É verdade que nós crescemos, ou instalamos novas empresas, mas grande parte do dinheiro vem atraída pelos juros elevados.  E repete-se o ciclo: juros altos, entrada de montantes vultosos de capitais, nova desvalorização do câmbio, novas dificuldades de exportar e aumento das importações, nova conta negativa de transações correntes, nova necessidade de atrair capitais externos.
***
Com isso, ao final do processo, as medidas do governo  saem como um tiro pela culatra: mais nos desindustrializamos. Mais frágil nossa economia se torna.
E aí é que fico me perguntando? Ao elevar juros, para atrair capital externo que seja, o que irá levar o industrial nacional a desejar modernizar sua empresa, expandir, crescer, se sabe das dificuldades de vender e realizar sua produção internamente e principalmente externamente?
Caso seja um bem não comercializável, ainda vá lá. Mas no caso dos bens que sofrem e enfrentam concorrência internacional, não é muito mais negócio utilizar os recursos financeiros de que dispõem ou a que têm acesso, para aplicar tais recursos no mercado financeiro, com remuneração assegurada e elevada?
***
Ao final, a verdade é que, mesmo não concordando com todo o raciocínio de Bresser Pereira, é de se destacar sua preocupação com o câmbio. Esse sim, que mata, como dizia Simonsen. Esse sim, que é o instrumento de política mais estratégico com que devemos nos preocupar, em um mundo globalizado como o que vivemos. 

segunda-feira, 12 de janeiro de 2015

A responsabilidade fiscal é condição necessária e suficiente para o crescimento?

Começo relembrando algumas das identidades trabalhadas nos modelos macroeconômicos, baseadas nas Contas Nacionais. Uma dessas identidades, em especial, merece destaque nesse momento.
Trata-se da equação I + G = S + T, em que I representa a decisão de gastos em investimentos por parte dos empresários, G os gastos de governo incluídos os investimentos públicos, S a poupança familiar ou poupança feita pelo setor privado da economia e T os tributos arrecadados pelo governo.
A forma de derivar essa equação é simples, já que o produto ou a renda, idênticos em valor, para haver equilíbrio deve atender justamente às decisões de gastos ou despesas dos agentes econômicos.
Em uma sociedade fechada, sem qualquer relação com o exterior, ou em  que o resultado das contas externas fosse igual a zero, o total produzido, cujo símbolo é Y seria idêntico a C + I + G, onde C representaria o consumo das famílias.
Logo: Y = C + I + G.
Por outro lado, a renda é, por definição, o pagamento feito a todos que produziram, sob a forma de salários, lucros, juros ou aluguéis. Mas, para nossa equação, interessa aqui verificar a destinação, ou o uso que as pessoas fazem da soma de dinheiro que recebem. Ou seja, como gastam o seu dinheiro.
E sabemos que as pessoas têm de pagar impostos T, consumirem para sobreviverem C e poupam o restante.
Isso nos indica que pela ótica da destinação da renda, Y = C + T + S.
Como, por trabalhar com identidades, sabemos que as duas equações têm que dar o mesmo valor, podemos fazer C + I + G = Y = C + T + S.
E, como temos C de ambos os lados, podemos eliminar esse valor, chegando finalmente à fórmula do início:
I + G = S + T.
Vale observar que a simplificação que fizemos de tratar de uma economia fechada, não sofre qualquer alteração se a economia for aberta. Apenas que o valor de I e de S se expandem e passam a significar a soma de investimento externo (caso tenhamos exportados bens e serviços e recebido rendas em quantidade maior que os mesmos valores importados ou as rendas enviadas para fora do país), ou a soma de toda a poupança, incluída a chamada poupança externa.
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Mas, qual a importância da equação de equilíbrio mostrada acima?
É que um grupo de autores com base na equação costuma desenvolver o seguinte argumento: se tudo está em ordem, o governo gasta o que arrecadou em tributos. Ou seja, está com orçamento equilibrado. Assim sendo, os empresários vão decidir investir e o país, em consequência irá crescer, na medida em que a sociedade estará disposta a poupar.
É um raciocínio que indica que, se a sociedade quiser melhorar seu padrão de vida e consumo, no futuro, terá de fazer sacrifícios no presente, tal como a formiga da fábula com a cigarra.
Se a sociedade quiser crescer mais ou de forma rápida, deverá poupar mais. Com mais dinheiro poupado, mais os empresários terão como financiar seus projetos de investimento.
O problema é quando o governo não está equilibrado. Pior: quando está gastando mais que sua arrecadação. Ou seja, na existência de um déficit nominal do governo.
Nesse caso, para financiar seus gastos, com pagamentos dos compromissos de juros caso estivesse endividado, ou para financiar os seus gastos de custeio se a máquina pública inchada e perdulária gastasse acima do que estivesse a sua disposição, caso estivesse com déficit primário, o governo teria o recurso de ir tomar empréstimos no mercado.
Com isso, estaria utilizando da poupança que a sociedade gerou, deixando menos recursos para o empresariado financiar seus projetos de investimento.
Haveria o que se chama de processo de deslocamento, dos agentes privados e produtivos, pelo governo. Em inglês, o fenômeno com nome sofisticado de "crowding-out".
Como emprestar ao governo é sempre um risco infinitamente menor que emprestar para empresários cujos negócios são sempre sujeitos a oscilações (já que o governo pode, em último caso, ou aumentar a quantidade que extrai a título de impostos da sociedade ou então criar dinheiro e pagar a todos os credores), os bancos preferem usar os recursos poupados de que são depositários para comprar os títulos públicos.
A consequência é que a poupança se reduz, os juros sobem e os empresários não investem. O país não cresce ou tem que depender de investimentos ou financiamentos ou capitais de fora. Ou seja, financiar o nosso processo de crescimento, e desenvolvimento, com poupança externa. Capital externo.
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Alguma semelhança entre o que tratei até aqui e o nosso país ou nossa economia, "arrasada pelo governo Dilma 1 e por esse Mantega que de nada entende"?
Vejamos: o governo tem e sempre teve dívida bruta elevada, o que o obriga a pagar o serviço dessa dívida. Para isso, tem que fazer superávits primários em volume elevado. Ou seja, gastar menos que o que arrecadou.
Mas, no governo Dilma, o superávit primário veio se reduzindo e até deve chegar a valor negativo esse ano de 2014. Ou seja, teremos um déficit.
Com isso, temos de tomar empréstimos não apenas para pagar parcela dos juros absurdos - o que todos os governos vêm fazendo desde há muitos anos, seja o governo Itamar, FHC, Lula ou Dilma.
O problema é que com um déficit, não teremos que financiar parcela dos juros. Mas os juros integralmente e também o valor do déficit gerado.
Isso expande a razão Divida Pública Bruta em relação ao PIB, que é um importante indicador da solvência de nosso país e, como tal, acompanhada de perto pelos credores, internos e internacionais.
No limite, se a dívida estiver crescendo em termos de sua participação no PIB, os credores irão exigir maiores juros ou prazos cada vez mais encurtados para financiar ou refinanciar a dívida. E a economia se degrada como aconteceu no governo Sarney, em seu final.
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Não escapa à ninguém que a taxa básica de juros está muito elevada em nosso país. E que com taxas altas nenhum empresário irá tomar recursos para investir, o que fará nosso crescimento minguar. O que nos leva a Pibinhos.
E nem adianta dizer que havia empréstimos com juros subsidiados em nosso país durante todo o tempo do primeiro mandato de Dilma. Nem adianta lembrar que o BNDES emprestou muito dinheiro, a juros muito baixos, já que baseados na TJLP.
Porque o BNDES financiou empresas de setores específicos, especiais, e mesmo nesses setores, as chamadas empresas campeãs nacionais.
Ou seja, emprestou a privilegiados e causou revolta, natural, em grande parte de empresários que, por pequenos, ou por não estarem nos setores eleitos nem serem considerados campeões, não foram beneficiados.
Diga-se que a própria política fiscal de redução de alíquotas para estimular o consumo da população, pautou-se sempre por setores específicos. Não foram medidas de cunho geral, amplo.
Isso explica porque o empresariado ficou contra o governo e não quis investir, mesmo tendo condições para tal.
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O círculo vicioso de aumento da dívida, aumento do pagamento de juros, elevação da necessidade de geração de superávit primário, aumento da dívida, etc. fica mais grave se o resultado primário foi deficitário.
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Seria essa a preocupação de nosso novo ministro Levy?
Seria para romper esse círculo vicioso que o ministro enfatiza todo o tempo a necessidade do corte de gastos públicos, e até, se necessário, uma elevação de impostos?
Mas, se todo mundo concorda com a necessidade de se voltar a gerar resultados positivos no orçamento, isso só seria o suficiente e necessário para que o país voltasse a crescer?
De acordo com nossa equação: bastaria fazer o máximo possível para que o governo limitasse seus gastos e pudesse manter sua dívida em relação ao PIB estável, que sobraria necessariamente recursos para que os empresários pudessem voltar a investir e o país crescer?
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Parece-me que essa é a ideia que sustenta o argumento ou raciocínio de nosso ministro. O que valeu até uma crítica de professores de economia, tanto da FEA-USP, quanto da Unicamp, no programa Entre Aspas da Globonews, na semana passada. Programa que citei ligeiramente aqui, em postagem anterior.
E o que os professores falaram? Falaram que parece que o ministro acredita que, apenas por ter as contas públicas em ordem, o país retomará o seu crescimento.
O que não é automático, como a análise da equação poderia indicar.
Pela fórmula, basta que o governo não tivesse que vir concorrer com os empresários pela poupança acumulada, estaria dada a solução.
Mas, porque os empresários iriam investir? Apenas por terem recursos disponíveis? Ou seja, o motivo do empresário investir ou deixar de investir é somente a disponibilidade de recursos e a consequência natural dessa disponibilidade, os juros baixos?
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Só para lembrar, já foi objeto de estudo, e já se constatou que os investimentos empresariais, em geral, realizam-se na maior parte das vezes, a reboque de investimentos públicos em nosso país.
Se essa hipótese se mantém, e se o investimento privado depende primeiro da realização de investimentos em infraestrutura feitos pelo governo, como os empresários costumam argumentar, então o raciocínio do Ministro Levy, está fadado ao fracasso.
Teremos  cortes de gastos, inclusive cortes de investimentos públicos, sacrifícios grandes e restrições cada vez maiores a gastos do governo que têm impactos multiplicadores enormes, como os gastos das transferências previdenciárias e dos programas assistencialistas, que sustentam grande parte da vida econômica de pequenos municípios.
Com a queda da demanda do governo, teremos queda de demanda agregada geral, e possivelmente desemprego.
Com medo de perda de emprego, as pessoas não irão consumir, exceto o mínimo necessário. E, com isso, o consumo tende a encolher ou manter-se estável.
Ora, ninguém irá em sã consciência, expandir capacidade produtiva, para um consumo que não se expandiu. Pior para uma demanda agregada em queda.
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Então, os empresários não investiriam apenas pela disponibilidade ou o custo barato do dinheiro. Estaria faltando o principal: motivo para expandir a produção. Sem tal motivo, para que tomar dinheiro, mesmo que barato?
Para exportar para um mundo que está comprando cada vez menos, ainda sob os efeitos da crise? Para exportar para a economia americana, que está crescendo com algum vigor, mas cujos interesses comerciais estratégicos não colocam o Brasil em posição de destaque?
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E o que dizer da possibilidade de atração de capital externo para financiar nosso crescimento? O que dizer da estratégia de crescer com utilização e atração de poupanças externas, como o professor e ex-ministro Bresser Pereira salientou ser tradicional em nosso país, em entrevista dada ao Luis Nassif, no programa brasilianas.org, apresentado na TV Brasil, o canal 3 da Net.
Afinal, para atrair o influxo de capitais forâneos, um requisito  seria  a prática de juros elevados, na contra-mão do desejo do ministro de juros civilizados. E caso a entrada de capitais fosse em volume elevado, isso interferiria no câmbio, tornando o real valorizado.
Dessa forma, nosso empresariado não investiria por não conseguir competir nem no mercado internacional, onde os preços seriam mais baratos, nem no mercado interno. O que apenas reproduziria o que temos visto acontecer cada vez mais, desde a entrada em ação do plano Real:  o sucateamento de nossa indústria, outrora orgulho de todos nós.
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Se Dilma 1 não teve êxito e a economia fracassou, com medidas de caráter menos ortodoxo, a verdade é que, Dilma 2, por maior que seja a ortodoxia a ser implantada, também promete ser um fracasso semelhantes, ao menos em termos de crescimento.
Mas, se teremos ainda e novamente mais pibinhos, é certo que teremos sacrifícios muito mais agudos.

sexta-feira, 9 de janeiro de 2015

Por uma sociedade mais justa: o discurso de posse de Patrus Ananias

Comentei ontem, sobre o excelente discurso deste que é, em minha opinião, um dos Políticos de maior estatura que tem em nossa Minas Gerais, e também no Brasil, Patrus Ananias.
Refiro-me ao discurso que fez por ocasião de sua posse no Ministério de Desenvolvimento Agrário - MDA, em que tocou questões fundamentais para a criação de uma sociedade mais justa, mais humana, mais fraterna e que respeite mais e procure, sempre mais, valorizar a vida. Com VIDA grafada em letras garrafais, gigantes, já que vida na acepção maior, que supera, em muito o simples direito de respirar e se alimentar.
Gostaria de dizer, nesse pitaco, que em relação ao Ministério de Dilma, em seu segundo mandato, embora por humildade irá dizer que longe disso, Patrus ocupa uma posição e a ele corresponde um papel que é, no futebol, equivalente ao que já foi de Pelé na seleção brasileira um dia. Da mesma importância de um Neymar, para o time de Dunga hoje, ou de Messi para o Barcelona ou Cristiano Ronaldo para o Real Madri.
Claro, nenhuma estrela joga sozinha e, se podem aparecer bem e se destacarem, muito se deve ao restante do grupo. Grupo que Patrus, como todo grande craque faz questão de exaltar, sabendo que do comportamento de cada um deles, individualmente, é que sairá a tranquilidade que lhe permitirá confiança para se tornar artista. E, a partir daí, ser inovador e poder criar o momento mágico de um espetáculo já em curso.
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Votei em Patrus para deputado federal, muito embora para outras posições, fechei o voto no PSOL. Esse meu voto não significa que eu seja de opinião que o melhor voto é na pessoa e não no partido. Acredito, justamente, no contrário. As pessoas é que constroem os partidos. Se um partido é considerado bom, sério, firme, é porque seus membros também o são, necessariamente.
Claro, maçãs podres sempre podem existir. E até mesmo nas fruteiras mais bem cuidadas, a ação do tempo, do calor, da umidade, e de uma série de outros fatores, muitos dos quais incontroláveis, acaba capturando e estragando o que era um fruto bom, anteriormente.
Mas, se boas pessoas formam bons partidos, um partido representa e por isso traz, expressa para todos nós, uma noção de união. União de ideias, de propósitos, de objetivos e modos de alcançar o que se tem em mente. Uma visão de mundo comum que, por força da união, se agiganta, ganha forças e pode fazer a diferença. Porque é capaz de catalisar a vontade de todos em busca dos princípios julgados mais fundamentais.
Entretanto, e não troquei mais de meia dúzia de palavras com ele, nem teria qualquer motivo para bajulações gratuitas, Patrus é diferente. E, mesmo não sendo do partido que venho repetidamente apoiando, ao menos com meu voto, não acho que sua postura e suas ideias sejam distintas ou muito distantes das que também o PSOL procura alcançar e concretizar.
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E, confesso, já que não há razão para ficar fazendo jogo de cena. Da mesma forma que votei em Patrus que tem com minhas crenças mais proximidade, votei, há algum tempo atrás, no Deputado João Leite, do PSDB. Naquela ocasião, voto decidido apenas para fortalecê-lo, já que em seu próprio partido ele não era bem visto ou aceito, ou junto a parte dos eleitores tucanos, apenas por ser o presidente da Comissão da Defesa dos Direitos Humanos na Assembleia de Minas Gerais.
Votei nele, uma única vez, para dar a ele a força e estímulo, por menor que fosse e mais frágil e individual, par prosseguir lutando em defesa de uma bandeira em que acredito.
Mais ainda, parafraseando Patrus em seu discurso de posse, para ajudar a derrubar barreiras e limites, AS CERCAS que nos limitam a uma visão individualista e excludente, também aqui, do processo social.
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Mas voltemos a Patrus e ao seu discurso, feito no instante em que assume a função espinhosa de lutar para ampliar as oportunidades de vida daquelas populações que, desde o início de nossa civilização sempre foram excluídas e, como ele mesmo afirmou, tratadas como mão de obra escrava. Populações rurais, a quem nenhum direito era reconhecido. Exceto o de ser explorado.
A ponto de não terem nunca reconhecido o direito à propriedade, esse legítimo direito assegurado pela Constituição a todos os brasileiros. Direito, contudo, que também é e já de há muito está consagrado na Lei Maior, deve se submeter ao direito maior, da função social da propriedade.
Por isso, a importância de, logo no início, Patrus mencionar:

" Na perspectiva do projeto nacional brasileiro, um tema da maior relevância é a aplicação efetiva do princípio da função social da propriedade, que está nas Constituições Brasileiras desde 1934. Penso que devemos trabalhar para que ele seja cada vez mais reconhecido, regulamentado e aplicado. Ele está na raiz das duas grandes reformas que ainda desafiam o Brasil: a reforma agrária e a reforma urbana."

Como não poderia deixar de ser, Patrus ratifica que não se trata, nem se poderia tratar de negar  
"( Não se trata de negar)  o direito de propriedade que é uma conquista histórica e civilizatória. Trata-se de adequar o direito de propriedade aos outros direitos fundamentais, ao interesse público e ao desenvolvimento integral, integrado e sustentável do Brasil, o nosso bem maior."

Como já afirmei antes, bem diferente da ideia da Ministra da Agricultura e do agronegócio, Kátia Abreu, para quem a terra é apenas e tão somente, meio de produção, capaz de transformar-se em mercadoria, sujeita à livre negociação no mercado onde se subordina ao capital. Especialmente ao capital em sua forma mais abstrata do Dinheiro. 
Ninguém nega que a terra seja um fator de produção importante. Mas há uma ideia em curso, e que a Ministra representa, de que se a terra produz e produz volumes tão elevados de grãos e outras lavouras, como a nossa economia do agronegócio tem condições de o fazer: se já se extrai da terra tanta riqueza, inclusive que nos assegura acesso a mercados internacionais e resultados positivos em nossa conta de transações, a discussão e a necessidade de se fazer uma reforma agrária extingue-se. 
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O argumento  parece se fundamentar nas ideias antigas que viam a necessidade da reforma agrária, como forma de impedir o abuso da manutenção de terras improdutivas. Assim, estimulando o cultivo em terras antes ociosas, por parte de pequenos produtores rurais, a produção agrícola se elevaria. 
Tal ideia, correta em algumas circunstâncias, foi vencida pela produção em grande escala, com uso de tecnologia intensiva e sofisticada, que para seu maior proveito, muitas vezes exigia grandes extensões de terras. 
Mas, o fato de parcela das terras se tornar produtiva não significa que não há mais razão para se condenar o latifúndio, nem se fazer a reforma fundiária. 
Muitos argumentam que, sem condições de plantio de forma racional, sem uso de técnicas que o trabalhador do campo desconhece e às quais não tem acesso, sem recursos financeiros para plantar, a concessão de propriedade aos trabalhadores rurais seria perda de oportunidades e criação de riquezas. Alegam e alegaram ao longo dos tempos, que a reforma agrária não poderia ser feita se antes não fossem assegurados recursos para esse financiamento, etc. 
De forma perversa, apoiavam a reforma, mas sob tantas condições e pressupostos e exigências que, no fundo apenas ganhavam tempo, mantendo os privilégios.
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Esses, entre os quais se inclui a ministra, não são capazes de entender uma lógica diferente de funcionamento da sociedade, são míopes para em sua abordagem que ao não permitir ao trabalhador rural, ter seu próprio pedação de chão, permite-lhe o sustento, a geração de emprego para seus familiares; a manutenção de laços familiares, cada vez mais sob o risco de se esgarçarem com a necessária busca pelos filhos de emprego nos centros urbanos, sem o preparo mínimo necessário para ali, não se aviltarem.
O acesso à propriedade possibilita ao trabalhador não ter de se submeter ao mercado de trabalho e, assim, não se transformar apenas em mercadoria. 
Dá a ele a dignidade de SER HUMANO.
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É a isso que Patrus se refere no trecho de seu discurso, que inclui o reconhecimento de que o direito à propriedade não deve ficar restrito apenas pelo direito de propriedade da terra dada sua função social, mas cada vez mais também pelo ângulo da questão ambiental, que destaco:  

"    À questão social acresce agora e cada vez mais a questão ambiental, para nos lembrar que o direito de propriedade não pode ser, em nosso tempo, um direito incontrastável, inquestionável, que prevalece sobre todos os demais direitos e sobre o próprio projeto de realização das possibilidades nacionais, que, no limite, é a realização de todo o povo brasileiro."

E retoma a abordagem histórica, para mostrar que, mais que a visão da produção para o mercado, outras são as motivações de um processo que tem na função social da terra sua base:  
 " O princípio da função social da propriedade remonta às origens da tradição cristã, com os textos evangélicos e os chamados Padres da Igreja, e foi bem acolhido e atualizado no Ensino Social Cristão e de maneira especial nas encíclicas sociais dos Papas João XXIII, Paulo VI e João Paulo II, e agora nos textos e pronunciamentos notáveis do Papa Francisco."

E conclama a toda a sociedade nessa luta transformadora e redentora: 

" Sabemos que é um tema que ainda desperta polêmicas e encontra resistências. Por isso sua tradução na realidade brasileira e na solução dos conflitos não depende apenas da vontade da Presidenta da República e seus ministros. Passa pelo Congresso Nacional, pelo Poder Judiciário, pelo Ministério Público, passa, sobretudo, pela sociedade, pelos meios de comunicação, pelas organizações sociais que mencionei."

Ao manifestar suas crença na construção de um país mais justo e igual, destaca: 

" O Brasil de hoje seria um país menor e menos justo, se milhões de famílias do campo não tivessem sido incorporadas à cidadania, por meio das políticas públicas para a reforma agrária e a agricultura familiar implementadas nesses 12 anos de governo do presidente Lula e da presidenta Dilma.

   Nossos governos mostraram que é possível combinar o justo e necessário estímulo à agricultura empresarial com o não menos justo e inadiável reconhecimento dos direitos dos agricultores familiares e das famílias de trabalhadores rurais sem-terra.
   
     E isso não teria sido possível sem ouvir as vozes que vêm do nosso chão profundo. São elas que nos despertam para a dura realidade dos mais humildes e para os muitos desafios que ainda temos a enfrentar.  
 
     Ignorar ou negar a permanência da desigualdade e da injustiça é uma forma de perpetuá-las. Por isso, não basta continuar derrubando as cercas do latifúndio; é preciso derrubar também as cercas que nos limitam a uma visão individualista e excludente do processo social."  (grifos originais).
***
Brilhante discurso, porque brilhantes não são as meras palavras mas o ideal que está subjacente a elas. 
Pena que nessa equipe que é o conjunto de Ministros, não basta ser Pelé. É preciso que os outros companheiros e parceiros possam estar visando um objetivo comum. 
O que acho que será muito difícil de se tornar realidade, até mesmo pelas dificuldades financeiras de um governo que tem, no Ministério da Fazenda, um técnico que tem mostrado nutrir tão pouca  simpatia e sensibilidade pelos problemas sociais. Ou por problemas que não sejam os que atingem aos proprietários da riqueza financeira.
É isso. Torcer para que Patrus não esmoreça. E que possa por em curso, junto com todos nós, as necessárias medidas que sabe imprescindíveis. 
Sucesso a ele. E a todos nós.