quarta-feira, 17 de fevereiro de 2021

Pitacos de pós Carnaval, quando o ano começa. Ou tem sequência a desconstrução feita pelo responsável por 250 mil mortes

 A sabedoria popular nos ensina que, no nosso país, o ano só começa depois do Carnaval.

Dito de outra forma, vencidas as férias de janeiro, onde a maioria das atividades assume um ritmo de “carro na banguela”, sem aceleração a forçar o motor (uma falácia que obriga muito maior esforço do freio motor), o país ganha fevereiro em compasso de espera. De válvula destinada a liberar a pressão, e preparar-nos para nova etapa de construção: de alegrias, conquistas, sucessos, frustrações, perdas e temores.

Momento da catarse e purificação.

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Mas, o que esperar quando, por força de uma pandemia, o carnaval não acontece, frustrando a alma pretensamente jovial, alegre e libertária, algo descompromissada , dessa brava gente destemida?

O que esperar quando a festa que a todos iguala, e possibilita ao povo a conquista do lugar de destaque do espaço público, ainda que momentânea, dá lugar à sensação de luto? Ou  quando a pandemia cerra a “minúscula brecha no apartheid brasileiro”, e estrangula a possibilidade de eliminação – posto que falsa, ilusória-, de toda segregação social, para usar a feliz imagem expressa por Vera Iaconelli (Folha de São Paulo, Caderno Cotidiano, B3, edição de 16/02/2021)?

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Encarado pelo ângulo do lançamento da pedra fundamental da edificação de um país melhor de se viver, e de um ano de mais e maiores conquistas e benefícios, seja no âmbito produtivo, econômico ou social, a lacuna do carnaval, nesse ano de 2021, nada representa.

Essa ausência apenas escancara a continuidade do projeto de destruição, de desconstrução institucional, de eliminação de todo e qualquer avanço ou conquista social, assim como dos direitos que o povo brasileiro, depois de tanto tempo e tantas lutas e sacrifício, logrou alcançar.

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Afinal, estão aí abertas as porteiras que permitem a passagem da boiada que investe contra o meio ambiente provocando sua destruição.

Está aí a política de eliminação dos direitos humanos patrocinada pela figura maluca e perversa, capaz de ver Jesus na goiabeira, mas incapaz de vê-lo representado em seu próximo.

Salles, Damares; os Ernestos que praticam a diplomacia da sedição internacional; os Olavos e suas cartas astrológicas; os inexpressivos Miltons Ribeiros, aptos apenas a bajular e posar para fotos junto ao energúmeno aos pés de quem deve se prostrar nas inaugurações de escolas cívico-militares, tudo, todos, estão apenas dando sequência ao processo que o criminoso (em sua acepção mais ampla, bastante aproximada da acusação de genocida), tem como projeto para nosso país.

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Mas, listar e criticar ministros desse desgoverno encabeçado por um Messias caído, é inútil.

Afinal, gastaríamos muito tempo e papel ou bytes, apenas para destacar a subserviência do auto-referido ministro da Justiça, que enxerga no anjo caído da morte e destruição, um profeta.... do apocalipse?

Falar do Pazuello, o sargento Garcia, que vai ser punido por não ter tido coragem de se rebelar contra as ordens que não devem ser cumpridas, mesmo e até se quisesse manifestar juízo.

Falar dos militares? Esses falam por si só, em sua arrogância, vaidade, autoritarismo, golpismo indecente e reconhecido. Falar o que de um golpista como Eduardo Villas Boas, ou de um general como Augusto Heleno, o general que a ONU solicitou que o Brasil retirasse do comando das forças no Haiti, para evitar ... mais... massacres.

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Queria falar de Tarcísio Gomes de Freitas, o ministro tido como mais produtivo por Bolsonaro, a ponto de ser sondado para concorrer como vice na chapa de 2022 do capetão... Pois é: Tarcísio, cuja fisionomia aparece alegre, risonha e aplaudindo a fala de Bolsonaro na churrascaria, quando pela enésima vez, ele agrediu a imprensa, mandando que ela enfiasse o leite condensado da denúncia no .... cu (para não fugir à elegância do presidente).

Quem aplaude, concorda. Ou é outro zé ninguém.

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Mas, é forçoso reconhecer que o impoluto ex-tenente do Exército, expulso da tropa, com direito a promoção ao cargo imediatamente superior; o deputado das rachadinhas e rachadonas e dos funcionários fantasmas, que usava o apartamento funcional para pegar mulheres, originário do submundo do Centrão na Câmara dos Deputados; que o pai protetor dos filhos e amigos, alguns milicianos convictos, com longa folha corrida a apresentar à sociedade; esse personagem é muito oportunista e esperto.

O que valeu saber operar e comprar, mais uma vez, votos para eleger quem não pode lhe ameaçar, com a abertura de processos por impeachment, o que lhe assegura continuar permitindo a morte de milhares, senão milhões, de seus compatriotas, seus eleitores.

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Bolsonaro não é bobo, velhaco que é.

Elege Lira e destrói, de um só golpe, a dois partidos e potenciais adversários, vindos das hostes da direita envergonhada, do PSDB, e nem tão envergonhada assim, do DEM.

Mas, não lhe escapa a necessidade de se fortalecer e se armar, literalmente para, na hora apropriada, colocar o golpe na rua.

Golpe em que as polícias militares estaduais, por ele aduladas e beneficiadas, transformadas em forças militares nacionais; unidas à soldadesca dos quarteis, a que se uniram apenas para garantir alimento e estudos, várias vezes, e agora beneficiárias de churrascadas chiques e regadas a milhares de litros das melhores cervejas; terão ainda ao seu lado milicianos, direitistas extremados e extremistas e milhões de inocentes úteis, armados até os dentes, para promoverem o banho de sangue que muitos historiadores alegam nunca ter acontecido, e ser a origem de nossa pasmaceira e imobilismo, como povo.

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Digo que essa ideia de povo cordato é falsa. Cordatas são as elites e as classes mais favorecidas, médias urbanas, que dançam a música que a orquestra toca e invade os salões, apenas trocando de pares, quando necessário. São os chamados acordos por cima, feito pelas ditas elites que empesteiam e apodrecem o país.

Porque o povo, sempre foi vítima de verdadeiras carnificinas, muitas delas, verdadeiro genocídio, a que assistimos inertes, a cada edição do jornal da noite.

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Não nos iludamos. O golpe já está em curso. Ele não virá. Ele já é.

E conta com os Rodrigos Maias, sentados sobre mais de 60 pedidos de abertura de processos de impeachment. Com os Liras, cuja música toca apenas melodias destinadas a distraírem os ratos e salvarem a cidade.

Com os generais golpistas, cuja atenção dedicada pela imprensa é injustificada. Afinal, dar voz a golpistas e descrever o sucesso de golpes, apenas reforça o comportamento criticável.

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Mas a imprensa não faz isso à toa. Afinal, a grande mídia e seus interesses empresariais, aplaude e deseja, se não golpe armado, o golpe contra o povo. O golpe contra os direitos e conquistas sociais, com a eliminação total do aparelho do Estado e dos funcionários que, concursados, cumprem o seu dever público.

A imprensa, seus líderes, como Guedes e sua sanha destruidora, os Lemanns da vida, elogiando o governo Temer, que fazia as coisas andarem; os faria limmers, despudorados, em sua “ação rent seeking”, tudo isso já é parte do golpe em andamento.

Destinado a alijar o povo de qualquer benefício civilizatório.

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E tudo sob as vistas do sistema carcomido e corrompido da Justiça e seus procuradores, juízes venais, quando não criminosos, como Moro e sua companheira a juíza Gabriela Hardt. Para não falar nos destemidos Fachin, aquele que enseja comemorações de estádios de futebol (Aha! Uhu! O Fachin é nosso!). Ou nos Fux, plenamente confiáveis (In Fux we thrust!).

O relator do “habeas corpus” de Lula, cuja negativa permitiu sua prisão, foi deverasmente intrépido, ao tentar silenciar ao general golpista e sua nota de ameaça. A ele, e sua coragem destacada, apenas a resposta do general golpista, mas que não é bobo: afinal, demorou apenas 3 anos para o relator se pronunciar. Em mais uma cena digna de pastelão. Ou de um paspalhão!

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Do início de fevereiro, a aprovação da independência do Banco Central pela Câmara, para tirar a influência dos políticos, e não deixar essa influência e interesses escusos se fazerem sentir quando da adoção das medidas de política monetária e econômica, dado que áreas técnicas por excelência!

O que cria um novo poder: o não eleito. O da tecnocracia e da porta giratória em relação ao sistema financeiro, de onde virão e para onde voltarão os diretores, agora com o poder de, durante 2 anos, por a perder toda a política de quem foi eleito pelo povo, para representar seus interesses.

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Quanto a essa conversa de que os diretores da Autoridade Monetária não podem ser influenciados por interesses e questiúnculas políticas, triviais, vale lembrar que os Villas Boas, generais do Exército, instituição de defesa do país e da Constituição brasileira, também não deveriam se deixar levar por interesses políticos.

E que os moros da vida, esse criminoso de toga, também era esperado que não deixasse a política influenciar suas ações e decisões.

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Termino com um trecho de texto que passei a alguns amigos, tratando dessa independência do Banco Central, que tem minha oposição:

“Por último, a transformação do BC tira a influência dos políticos e joga no colo dos banqueiros e do sistema financeiro o domínio e o controle do Banco, que deveria fiscalizar os bancos. Em síntese, os fiscalizados controlando quem devia  controlá-los. E  se alguém acreditar que por ser técnico, o diretor do Banco não tem interesses políticos e ideológicos, basta lembrar do imparcialíssimo juiz moro (com minúsculas pra fazer jus ao caráter dele)."