Bem vindo 2020.
Bem vindo?
Sim. Afinal, 2019 foi-se embora, o Novo Ano chegou e... ao
que parece, poucas são as alterações significativas na situação de nossas vidas,
especialmente do ponto de vista da vida de nosso país.
E, se por pior que tivesse sido, conseguimos superar 2019, honestamente
não acredito que os piores pesadelos que tínhamos com a eleição de Jair
Bolsonaro podem se concretizar nesse ano de 2020.
Senão vejamos.
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2019 foi um ano de uma constante e brutal tentativa de
desconstrução do país. De nossas instituições, de nossa democracia, da imprensa
livre, de nossa cultura, do respeito à nossa diversidade, de nosso meio
ambiente, da paz social.
Não à toa, até a Globo, seu Fantástico e seu amor nunca
disfarçado por Sérgio Moro, que sob as vestes de magistrado impoluto revelou
seu caráter criminoso ao descumprir a legislação, agindo como o inescrupuloso responsável
pelo descumprimento das mais comezinhas
regulamentações relativas ao amplo direito de defesa e a um julgamento imparcial,
impessoal e sem interesses escusos, não consegue mais evitar de tratar a
questão da segurança pública e da Justiça em nosso país.
Em sua edição de ontem, o Fantástico não pode se esquivar de
tratar do autêntico genocídio que tem sido praticado tendo como alvo
preferencial a população negra. Pretos, pobres, moradores de comunidade e
jovens.
É bom frisar essa última característica: jovens. Quem sabe
com a intenção de não deixar que se reproduzam para, “algum tempo depois, o
país estar livre desses afrodescendentes de 7 arrobas, que não fazem nada.”
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Mas se pretos jovens são fuzilados e mortos nas comunidades,
especialmente nas terras que têm como governador Witzel, o sádico comemorador
de morte de bandidos, não dá mais para esconder que tais crimes são cometidos,
em sua maioria por policiais.
Ou seja: está em vigor a lei do cão. Que só não é pior em
selvageria que a de Talião, do olho por olho, porque grande parte das vítimas
nem bandido era. Muitas, ao contrário, trabalhadores, atletas, jovens que
apenas queriam se divertir ou pior, que estavam com a família dando um passeio
de carro ou em casa vendo tevê. Estão aí as meninas todas mortas por balas
perdidas pela Polícia de nosso país.
Essa mesma polícia que Moro, em consonância com seu chefete,
gostaria que fosse tratada de forma mais benevolente, com mudanças na
legislação para que seja aprovada a excludente de ilicitude.
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Como acreditar que, com tal generosidade, o policial não
perceba que está liberado para atirar e matar, a esmo? Mais ainda se estiver
sob violenta comoção, ou tensão, que deve ser algo que dificilmente acontece
com patrulhamento na rua.
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Claro, principalmente se os cidadãos, todos, puderem andar
armados. Outra das vontades de nosso presidente defensor da paz.
Os bons cidadãos, porque são bons (devem ter alguma estrela
na testa!) e devem poder se defenderem. Os maus cidadãos por que, poderão
ampliar o acesso, que se torna cada vez mais facilitado, às armas tomadas dos
bons cidadãos. Isso sem contar que esse são clientes preferenciais das armas trazidas
pelo tráfico ou contrabando nas fronteiras, quando não os principais clientes
atendidos pela venda de armas pelas milícias ou que deveriam estar em mãos dos
policiais...
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Mas, mudou alguma coisa, para valer, com a entrada de
janeiro desse 2020?
O genocídio de índios continuou tão sem controle e sem causar
qualquer reação por parte das autoridades, quanto antes. Não é preciso ficar
todo o tempo lembrando que mais intenso, depois que o discurso bolsoneiro
indicou que as terras dos índios devem ser ocupadas por atividades tão mais
nobres e ambientalmente sustentadas como a agropecuária, o cultivo de soja, ou
mesmo a mineração desenfreada.
Todas atividades predatórias, mas produtivas. Mais
interessantes para o país que sustentar tanta gente que, à semelhança dos
negros, devem ser eliminadas, sob a ótica do nosso presidente.
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Insisto, o que temos de novo nesse janeiro?
Por acaso, descobriram quem mandou matar e porque, Marielle
e seu motorista Anderson?
Já chegaram à conclusão de, a mando de quem, os executores
do crime entraram no Condomínio onde a família Bolsonaro convivia e se
confraternizava com os chefes da milícia no Rio? Esses mesmos que são responsabilizados
pela ordem de execução da vereadora carioca, lembremos: mulher, preta, homosexual,
e de esquerda.
E, afinal, já descobriram como o porteiro do condomínio na
Barra foi pressionado por ele mesmo para errar o registro de quem autorizou a
entrada no condomínio do executor da morte?
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A lista é imensa.
Já descobriram em que escola, ou que curso foi feito por
Olavo de Carvalho, que lhe conferiu o grau de filósofo?
Ou que tipo de inglês que Eduardo Bolsonaro aprendeu durante
todo o tempo que esteve fazendo vários trabalhos de elevada significância nos Estados
Unidos, enquanto fritava hamburgueres por hobby?
Sou curioso: o trabalho que ele fazia era legal? Ele estava
lá com visto de trabalho?
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Mas o que dizer de Weintraub?
Que escola ele cursou, que não conseguiu aprender minimamente
o português? Ou ele está querendo competir com os alunos que tanto critica, por
irem muito mal nas notas relativas ao teste de leitura do PISA?
Ou apenas deseja ser o legítimo representante dos estudantes
que constituem a imensa maioria desse país, completamente despreparados e
incapazes de escreverem qualquer vocábulo de forma correta?
O ministro Weintraub estaria apenas, de forma subliminar, querendo
desnudar nosso país e sua realidade, “digna de Kafta”?
Se for essa sua intenção, é forçoso reconhecer que é “imprecionante”
sua capacidade de mimetizar os nossos estudantes. Chega a causar “paralização”
ficar “vizualizando” a atuação do ministro.
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Mudando de assunto,
alguém viu punição qualquer de que tenha sido alvo nosso ministro das laranjas,
Marcelo Álvaro Antônio? Ou ele não está trabalhando, fazendo apenas turismo?
Então, como querer cobrar alguma medida, nem que seja um
mero afastamento temporário de Wajngarten, o secretário da Comunicação que
aprova e autoriza gastos de verbas oficiais, reajusta contratos, negocia
valores com empresas que são clientes de sua empresa privada?
Como cobrar de quem manteve seu ministro titular da Casa
Civil, mesmo tendo o subordinado reconhecido ter utilizado do recurso de caixa
2 em sua eleição, qualquer ato em favor do combate ao crime e à corrupção?
Ah, sim! Onix reconheceu e se escusou, como bem lembrou esse
sabujo que usurpou a personalidade de Moro.
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E o que falar de Ricardo Salles, notoriamente ministro
competente do Fim do Ambiente, já que em termos de meio ambiente, o que se sabe
é do processo em que foi condenado por fraude, ou do processo em que é
investigado por improbidade administrativa, para citar apenas alguns?
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Dirão os mais crédulos: mas Bolsonaro agiu imediatamente no
caso de seu Secretário Ricardo Alvim, o secretario nazista da Cultura.
Sim, nesse caso pesou uma condenação que teria alcance
internacional e a perda total de suas condições de permanência no poder. Veja a
reação da própria Alemanha, da Comunidade Judaica, de tantas outras nações que
abominam a postura claramente nazifascista de Alvim em sua representação tupiniquim
de Goebbels.
Quanto ao secretário, apenas uma pergunta: como seu ídolo,
quando caído, será que ele também pode chegar a um ato tresloucado como o de ou
impor sua ideia ou ser NADA?
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Sejamos sérios: Bolsonaro nem sequer se manifestou quando da
descoberta de que Eduardo Fauzi, o empresáro integralista e, pois, fascista,
foi o responsável pelo ato terrorista contra o
escritório do Porta dos Fundos.
Fauzi era e parece ser integralista. Material de propaganda
do partido de Plinio Salgado, a Aliança Integralista Nacional foi achada em seu
poder. Além disso, o empresário era filiado ao mesmo partido de que fazia parte
Bolsonaro: o PSL.
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O silêncio de Bolsonaro em relação ao ataque integralista
não deve ser esquecido nessa hora, em que ele foi forçado a agir. Há que se
deixar claro que no início ele aceitou as escusas de seu auxiliar, para quem apenas
houve uma coincidência retórica.
OK. A ação de Alvim, em minha opinião (e daí me preocupo)
foi mais uma tentativa de se ir testando a sociedade e nossa capacidade de reação
em defesa da democracia e de seus valores.
Primeiro foi Carluxo, criticando a democracia por não
permitir a adoção das “medidas necessárias” para o desenvolvimento do país.
Houve reação, mas de pouco alarde.
Depois foi Eduardo, o 03, que falou em retorno do AI-5. Aqui
a reação foi mais ativa.
Mas, aí veio Guedes e o tiranete da Economia, menino bem
mandado da turma de Pinochet, também falou da possibilidade do retorno do Ato Institucional,
caso não fossem adotadas, por bem, suas propostas.
No caso do queridinho dos mercados financeiros e empresariais,
dos grandes meios de comunicação, a reação foi mais comedida.
Reação meia boca, como quando surgiu a notícia, tratada como
falsa, de que Guedes estaria sob suspeição e investigação da CVM, por força de sua
gestão junto a aplicações de Fundos de Pensão.
Pois bem: agora é seu assessor que está sendo processado por
esse mesmo crime financeiro. E mais uma vez, o tratamento da grande midia é
bastante insuficiente.
Para dizer o mínimo.
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Tantas vezes tentada, a censura à imprensa, tem levado a
reações mais agudas da sociedade.
Mas, o que está em curso e não acaba com a demissão de
Alvim, é uma escalada de ações para levar a paciência da sociedade civil ao
limite.
Aí, quem sabe pelo cansaço de tantas idas e vindas, ao longo
do tempo, Bolsonaro não consiga emplacar algumas medidas capazes de não provocarem
comoção real do público, acabando por implantar o regime com que sonha.
Não podemos nos esquecer: Bolsonaro é um desequilibrado que
tem tudo para assumir e, no futuro passar para história como genocida da
liberdade no Brasil. E dos povos menos favorecidos.
Golpista, autoritário e antidemocrático, mas populista,
esperto e oportunista, a aprovação do Fundo Público partidário comprova que ele
sabe ser. Sempre seu desejo se impõe. Como no presente caso dos 2 bilhões sob
uma desculpa mais ridícula (não fosse ele o mentor da aprovação desse valor).
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Daí que para mim, só nos resta uma atitude: não esmorecer
jamais. Não se calar. Não se deixar abater e cansar. Não deixar de dar o peso
real às ações que podem parecer menos significativas. Devemos evitar o avanço
das forças da obscuridade, embaladas pelos discursos de patriotismo, nacionalismo
e conservadorismo, inclusive religioso.
Para impedir a hecatombe, vale a dica: “ninguém larga a mão
de ninguém”.