Velocidade que deve ser comemorada por representar, ao menos, que o governo Bolsonaro não irá conseguir alcançar seu objetivo maior, o de desconstruir ou, mais radicalmente, destruir o Brasil.
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Da desconstrução em curso, já tivemos a oportunidade de tratar aqui, em variados pitacos sobre assuntos os mais diversos.
Foi assim que observamos as declarações, as ações, as medidas adotadas pelo governo Bolsonaro em relação ao desmatamento, à paralisação das ações de fiscalização, à proibição de queima de implementos agrícolas utilizados pelos criminosos ambientais, em relação ao questionamento dos dados de áreas desmatadas e de extensão de queimadas.
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Foi essa sua intenção ao criticar a divulgação de dados de áreas desmatadas e da extensão de queimadas, pelo INPE, Instituto de reconhecimento internacional.
Foi esse o padrão subjacente a cada declaração sua, sempre emitindo sinais de que não iria impedir ou limitar a expansão dos grandes negócios ligados ao setor agropecuário.
Permitindo, senão incentivando, ainda que veladamente, a continuidade das ações predatórias dos empresários vinculados ao agronegócio.
Importa observar que tal atitude significa fazer vistas grossas à prática, não só de crimes ambientais (o desmatamento ilegal, a extração madeireira, a promoção intencional de queimadas para limpeza de pasto), mas de crimes contra a raça humana, como o de genocídio de índios; ou ainda os crimes de invasões às suas propriedades, em flagrante desrespeito à demarcação das reservas, reguladas e protegidas por instrumentos legais.
A expulsão de indígenas, por grileiros, por grandes mineradoras, por garimpeiros são crimes cometidos e tolerados.
Capazes de porem em risco a própria continuidade da Amazônia e seu ecossistema.
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Afinal, em discurso a garimpeiros, foi o próprio Bolsonaro, esse exemplo de dignitário que serve de paradigma para o comportamento ético, de educação e elegância primorosas, que afirmou que o "interesse na Amazônia não é no índio nem na porra da árvore", como forma de se defender, passando ao ataque, das críticas de interesses estrangeiros, em defesa de nossa floresta (de que também são donos).
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Também foi o próprio capitão que, em inúmeras ocasiões, mostrou interesse em promover a total e radical integração do índio em nossa sociedade, o que caracterizaria uma forma de genocídio particular: o final de um grupo étnico e racial, por sua completa aculturação.
Para tanto, seu argumento é de que o índio é quem teria vantagens com a exploração permitida de riquezas em suas terras, por mais predatória e destrutiva fossem tais atividades.
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Para o capitão, um dia convidado a se retirar do Exército, nada disso deveria nos causar espanto.
Afinal, junto com seus filhos, atuando em vários níveis do Parlamento (federal, estadual e municipal) dá demonstração clara de desapreço pela manutenção da ordem democrática, sempre dando declarações com gritante conteúdo de intenções golpistas.
Nessa postura de desrespeito à lei, à ordem constituída, incluem-se as homenagens que prestaram, em várias oportunidades, a verdadeiros criminosos, a milicianos - bandidos comuns que se distinguem de outros tantos, apenas por serem todos ex-policiais ou vinculados ao aparato repressivo legal.
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Bolsonaro não apenas mantém relações com milicianos, um dos quais seu vizinho de condomínio, como mantém relações estreitas de compadrio com elementos destituídos de qualquer reputação, como o Queiroz, de quem empregou familiares e cuja intimidade chega ao ponto de fazer operações de empréstimos pessoais. Esse mesmo Queiroz que prossegue intermediando cargos na Câmara e que continua sumido, ao menos de nossa atenta, vigilante e interessada Polícia.
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Interessado na destruição da ordem democrática vigente, não se acanhou de elogiar torturadores, de nefasta memória.
Mas foi mais além, alimentando sempre que pode, pelo incentivo ou pelo silêncio, as postagens de seus filhos que atentam contra a manutenção do Estado democrático de Direito, algumas de conteúdo claramente autoritário e golpista, que vão desde a de que bastariam um cabo e um soldado para fechar o Supremo, até a do vídeo onde hienas (representando alguma das organizações democráticas que se opõem ou criticam o "mito", o Supremo entre elas, mais uma vez), cercam e desejam atacar sua majestade o leão, o rei dos animais, representando ele... o mitológico animal do Planalto.
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Aqui, um parênteses: Jô Soares, ironizando o vídeo, escreveu divertido texto na Folha, reconhecendo Bolsonaro como o que ele mesmo se declarou: um animal. Se quem foi rei não perde a majestade, é outra questão!
O engraçado foi ver leitores na coluna de Cartas, xingando Jô, por ter chamado de animais 57 milhões de eleitores, do autodenominado rei Leão...
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Destruindo, desconstruindo a passos ligeiros nossa realidade, o que o animal que reina conseguiu até o presente momento foi: recorde de desmatamento (salto de 29%), desta vez, medido conforme o mais adequado sistema de aferição, considerado acima de qualquer suspeita; recomendação de clientes americanos para evitarem a compra (até de insumos do tradicional hambúrguer), além de compradores de outras nações, de produtos do Brasil.
Todos agindo de forma a retaliar o governo e sua inoperância, em relação a medidas de apoio ao meio ambiente.
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Agora, de saída de seu Partido, o PSL
Não bastassem as atitudes e comportamentos já listados, Bolsonaro investe agora na destruição do partido que lhe deu legenda: o PSL.
E parte em direção à criação de um novo, uma Aliança pelo Brasil, formado por seus seguidores mais fiéis, e sob a orientação do prestidigitador Olavo de Carvalho, o astrólogo e filósofo autodidata que guia e ilumina a família do presidente.
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A decisão de deixar o PSL que lhe permitiu chegar ao Planalto não deveria causar surpresa, no entanto.
Afinal, faz parte de quem não preza pela democracia, se vincular a qualquer agremiação que lhe dê o direito de concorrer a vagas eletivas, independente de suas ideias e propostas serem antagônicas aos princípios, à linha ideológica daquela agremiação, conforme descritos em seu programa. Faz parte não tomar conhecimento e, por isso, desrespeitar seu estatuto e as normas internas quanto ao seu funcionamento, administração, patrimônio.
Desconhecendo o programa do partido, o político que assim se comporta nega os objetivos políticos que norteiam a atuação do partido.
Por seu lado, a sigla se transforma em mera sigla de aluguel, contribuindo para que aqueles que não prezam pela organização política consciente e representativa se estabeleçam na sociedade. Dessa forma, o partido deixa de contribuir para o aprimoramento do funcionamento da sociedade.
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Curioso, mas que reforça a ruptura com seu partido, é observar que o programa de um partido não pode contrariar o regime democrático, e deve respeitar a soberania nacional, o pluripartidarismo e os direitos fundamentais da pessoa humana.
Tais exigências, mais que declarações vazias de conteúdo e feitas por mera formalidade, servem no caso de Bolsonaro, para entender o seu interesse em não permanecer em uma agremiação contrária a seu projeto pessoal de poder autoritário.
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Digno de interesse é observar como o programa do novo partido irá dissimular suas verdadeiras intenções golpistas e de busca pela formação e aperfeiçoamento de uma sociedade que só respeita os iguais, em comportamento e forma de pensar e agir.
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E em se tratando de direitos e respeito...
Cada vez mais chocados vemos a barbárie tomar conta de nosso convívio social.
E pior! Mais que o desrespeito, a agressão gratuita, a falta de diálogo, o que vemos sendo plantado é a semente da intolerância, da discórdia.
Só assim para entender como que, no dia da Consciência Negra, um grupo reduzido de fiéis de católicos ultraconservadores invadisse uma igreja, com a intenção de impedir a celebração de um culto em homenagem à data e à raça negra que, ecumenicamente, incluiria alguns ritos sagrados das religiões afros.
Reduzidos em número, mas completamente afastados do intuito maior da religião e da fé que alegavam defender, que é o amor ao próximo, os invasores passaram a rezar em latim, tentaram tomar o microfone das mãos do celebrante, além de provocarem e tentarem agredir alguns dos presentes.
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Na Câmara, um imbecil que já tinha se notabilizado pela quebra de uma placa de rua em homenagem à vereadora carioca Marielle Franco, ocupou a tribuna para defender a atitude ignorante, de censura, de um colega, que havia quebrado uma obra de arte em exposição no local, apenas por não concordar com a mensagem da obra.
O imbecil assumiu a tribuna, mas mais que a defesa de seu colega, patrocinou foi uma grande quantidade de ataques e ofensas a todos os pretos, negros, esses heroicos trabalhadores e não reconhecidos responsáveis por nossa formação social.
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Quanto ao outro deputado,o da agressão a uma obra de arte, ex-militar, seu comportamento nem tem vínculo necessário com uma atitude racista, contrária à raça negra.
Embora a obra retratasse um negro (talvez jovem), aparentemente sem qualquer instrumento de defesa, abatido por um policial militar que abandona a cena com a arma ainda fumegando, em minha opinião, o que o deixou o deputado revoltado foi a acusação implícita na gravura: um policial que mata a qualquer pretexto, antes de interrogar ou investigar.
Cena que é tão patética e realisticamente atual que as autoridades até pensam em criar a figura do excludente de ilicitude, por atos de policiais sujeitos a violenta comoção ou pressão emocional.
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No caso do ex-militar, se de todo o gesto é intolerável, não parece ter racismo como fundamento.
Mas condenável, independente de outros juízos, é esse autonomeado censor da exposição pedir que fizessem fotos de sua ação de vandalismo.
Fotos que sua excelência fez questão de postar em suas redes sociais quase que imediatamente.
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O que nos leva a perceber que Bolsonaro está no caminho certo na sua jornada de esgarçar a já frágil tessitura social existente nesse nosso país TÃO NEGRO na alma e no físico, tão diverso, mas tão desigual.
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É isso. Que bom que o ano está passando ligeiro e que não deverá ter tempo para destruições muito maiores.