quarta-feira, 19 de fevereiro de 2025
A experiência do regime de metas e metas contínuas: críticas. E a popularidade de Lula
link do youtube: https://youtu.be/_FcxC_8nI7E
Em 2024 a inflação brasileira atingiu 4,83%, ultrapassando a meta fixada em 3% para todo o ano e, inclusive, o limite superior de 4,5%, soma da meta mais o intervalo de tolerância admitido, de 1,5%.
Criado em 1999, o regime de metas de inflação atribui ao CMN a definição da meta e o intervalo de confiança para um dado período de tempo (o ano calendário). Esta meta passa a ser o alvo que o Banco Central deverá perseguir, usando os instrumentos de política monetária que compõem o arsenal a sua disposição. Por ser uma expectativa, ou esperança, a meta pode não ser cumprida, podendo ser afetada por eventos inesperados, impossíveis de serem antecipados e controlados, com que a realidade se impõe aos nossos desejos, razão de se definir um intervalo de tolerância.
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No site do Banco Central o regime de metas é apresentado como um mecanismo exitoso para a manutenção da inflação em níveis relativamente baixos, apesar de várias críticas que têm sido feitas à própria meta ou ao seu alcance.
As críticas abrangem o fato de que a inflação superou o limite superior da meta (mais a tolerância) em pelo menos 8 anos desde 2001, inclusive no último ano. E isso sem considerar que a meta foi fixada em valores elevados nos primeiros anos de sua vigência : 8% em 1999 e 6% o ano seguinte, ambos com um intervalo de 2%. E também sabendo que em 2003 e 2004 as metas dadas foram alteradas para maior. Ou ainda que, enquanto a meta média de todo o período até 2024 foi de 4,356 (4,625% com a alteração citada), a média da inflação foi de 6,3, acima da meta, para um crescimento médio do PIB de irrisórios 2,18%.
Pior: apenas em 1 ano a inflação ficou abaixo de 3% (2,95% em 2017), ou próxima a esse número mágico em 2 anos: 3,14 em 2006 e 3,75 em 2018.
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No site do Banco, afirma-se que o regime ajudou ao processo de ancoragem das expectativas de inflação, sendo utilizado pelas pessoas e empresários, como referência de “inflação prospectiva” e ampliando a previsibilidade dos agentes econômicos.
No entanto, nos países mais ricos, o regime sofre outra crítica, a de a autoridade monetária ser dotada com apenas um instrumento exclusivo de política: a manipulação da taxa básica de juros da economia, em nosso caso a Selic. Crítica dirigida mais à formulação da teoria econômica que fundamenta o modelo de metas, que compreende a inflação como fenômeno unicausal, dependente da variável da demanda agregada -, atrelada ao debate de o uso das taxas de juros ser recomendado apenas aos fenômenos inflacionários provocados por excesso de demanda.
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Outras causalidades possíveis, provocadas por outras variáveis - estrangulamento da oferta, inflação de custos, inflação inercial –, indicam a ineficácia da manipulação da taxa de juros cujo impacto afeta principalmente os gastos totais do governo, o déficit nominal e a dívida pública bruta, já que o pagamento de juros é um importante item de despesa financeira e total do governo.
Tem também um impacto sobre os fluxos de capital, em especial os influxos, como nos anos de 2005 a 2007 quando, ao provocar a valorização de nossa moeda, levou a uma corrida às importações e reforçando o processo de desindustrialização cujos efeitos são visíveis até nossos dias. Sem contar o impacto sobre a distribuição de renda e os ganhos privilegiados dos rentistas do mercado financeiro. Ou ainda pior: provocar recessão para reduzir a inflação, eliminando qualquer nível razoável de atividade econômica. Caso típico da aplicação do remédio que cura a febre por matar o doente.
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Procurando acompanhar os países mais avançados, que promoveram mudanças visando aperfeiçoar o regime, o Brasil promoveu uma mudança fundamental em seu regime de metas: a partir deste ano de 2025, o sistema não fixa uma meta para o ano calendário. Fixada em 3% mais o intervalo de confiança pelo CMN a meta vale para o período de 12 meses, a cada mês. Ou seja, divulgada a inflação para o mês de fevereiro de 25, verifica-se a inflação acumulada nos 12 meses compreendidos entre março do ano anterior até fevereiro deste ano. Se a variação de preços no período for de 3% a meta foi alcançada.
Se a inflação acumulada superar a meta mais o limite de tolerância, o Banco Central deverá começar a adotar as medidas julgadas necessárias. Haverá estouro da meta quando a inflação romper o limite superior da meta ao longo de um prazo de 6 meses consecutivos. Nesse caso, o presidente do Banco deverá encaminhar carta pública ao ministro da Fazenda apontando as razões do estouro, as medidas que serão adotadas e prevendo um prazo para que a inflação retorne à meta.
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Este sistema de meta contínua é que levou o BC a prever um estouro da meta para os próximos 6 meses, com a inflação atingindo 5,2%, e uma previsão de 4% para o 3° trimestre do ano.
O rigor imposto pela nova sistemática, agravando um problema já identificado por economistas de várias tendências e escolas, motivou a divulgação de uma carta aberta ao CMN. Ali, a meta de 3% é criticada por este patamar estar se mostrando disfuncional. A ideia é que se há um consenso de que a estabilidade de preços não significa inflação zero, mas uma inflação suficientemente baixa, adotar um valor apenas para copiar o padrão de países mais desenvolvidos, não respeita as distinções entre as várias economias, inclusive quanto ao grau de rigidez que elas carregam. Deste ponto de vista, a economia brasileira padece de “resquícios de indexação formais e informais”, que permanecem como no caso dos alugueis residenciais ou das tarifas de serviços públicos, como energia, corrigidos pela inflação do IGP de 12 meses; ou dos reajustes salariais e benefícios sociais, atrelados ao INPC.
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Com vários conjuntos de preços rígidos para baixo ou indexados à inflação passada, representando uma parcela importante dos índices de preços, uma meta de inflação excessivamente baixa coloca uma pressão adicional sobre os setores cujos preços não apresentem essa rigidez. Daí a inflação de serviços e preços monitorados apresentarem maior resistência à queda, dificultando o alcance da meta. Essa a razão para que, sem criticar as bases do arcabouço adotado, a carta proponha elevar a meta para 4%, o que a tornaria mais factivel. Afinal, a inflação ficou em 3% ou abaixo desse valor em apenas 1 ano ao longo de todo o período de 25 anos, apenas às custas de elevado desemprego o que leva as previsões do próprio mercado a superarem os 3%.
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Para concluir, um breve pitaco sobre a queda da popularidade do presidente nas pesquisas, apesar dos bons índices de nossa economia, como a queda de desemprego (baseada em ocupações de qualidade discutível, elevada precariedade e produtividade aquém da necessária); expansão do PIB perto de 3,8%; melhoria dos rendimentos e retirada do país do mapa da fome.
Por óbvio, o povo não come PIB. Ao contrário, ele tem a informação de que a economia está crescendo, a produção de bens e serviços vem se ampliando. O que ele não vê na casa dele, onde a quantidade de alimentos, cada vez mais caros, é menor. Junto a isso, ele sente maior dificuldade de transporte e locomoção dado o preço das passagens, o aluguel mais caro, material escolar, lazer, até o preço do futebol mais caro.
Corretamente pensa que só ele, seus familiares e amigos, estão perdendo. Quem está ganhando? Os empresários, que já têm muito e ficam com mais. Na igreja, que ele sustenta com o dízimo, ouve críticas à gastança do governo, alimentada por tributos cada vez maiores. Ele percebe que os juros caros são seu maior inimigo e problema. Quem fixa os juros? O Banco Central, sempre disposto a acusar o governo de ser o responsável pelo aumento de preços e juros altos, em razão da gastança. Gastança com quem? Com os juros? Não. Com emendas secretas e corrupção.
Como continuar a crer que o candidato que ajudou a eleger está está preocupado com a vida miserável que ele está levando?
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