quarta-feira, 27 de agosto de 2025

Agosto, o "mês do cachorro louco" e seus impactos recentes] na vida de nosso país

link: https://youtu.be/TDAGAKTVYNg Foi anunciado ontem pelo IBGE o resultado do IPCA 15 para o mês de agosto, índice estatístico considerado a prévia da inflação e que difere do IPCA, índice de inflação oficial apenas pelo período de coleta dos dados. Enquanto o índice oficial abrange os dias de 1 a 30, o IPCA 15 abrange o período de do dia 16 de um mês ao dia 15 do mês em curso. Recebida sob comemoração da grande imprensa, o índice revelou uma redução da inflação em agosto, indicando ter havido queda de 0,14% nos preços, fazendo o valor acumulado em 12 meses alcançar 4,95%, contra 5,30% em julho e o acumulado nos 8 meses de 2025 atingir os 3,26%. Os dados, dignos de otimismo por indicarem a tão desejada convergência da inflação para o intervalo de tolerância do regime de metas, de 4,5 % ( 3% da meta alvo mais 1,5%), foram causados, por quedas nos preços do grupo Habitação, em grande parte em razão da queda na energia elétrica; à queda na energia elétrica residencial e no grupo de alimentação e bebidas, conforme apurado pelo IBGE. *** De meu ponto de vista, a justa comemoração pelo resultado divulgado e a tendência que sinaliza, exigem perguntar que contribuição para este resultado deve ser atribuída à política monetária recessiva e de arrocho praticada pelo Banco Central, capaz de elevar a taxa básica de juros para o patamar pornográfico de 15%. E, como dissemos em vários pitacos anteriores, além de transferir renda para os endinheirados agentes do mercado financeiro, detentores dos títulos da dívida pública, desviando para estes “glutões de apetite insaciável” recursos que toda a população paga para o financiamento de gastos em prol da melhoria da condição de vida de todos, os juros pornográficos em nada contribuíram para a queda dos preços. Afinal, se caiu o preço da energia elétrica foi devido ao pagamento de um bônus que reduziu as contas residenciais pagos por Itaipú, devido a valores indevidos pagos a mais em períodos anteriores. Isso, apesar da cobrança de bandeiras vermelhas, em razão da escassez de chuvas e do reduzido nível dos reservatórios. Por outro lado, ao contrário de anos anteriores, as condições climáticas e a maior regularidade do regime pluviométrico contribuiu para maior regularidade na produção, colheita e comercialização de produtos alimentícios, com queda de preços de vários produtos da cesta básica (frutas, tomates, batata, cebola, arroz, feijão, café, etc.). O que o Banco Central fez foi apenas e mais uma vez obedecer às ordens do mercado, a quem está subordinado, informalmente, razão que o leva a pressionar, pela aprovação da Proposta de Emenda Constitucional 65, de 2023, que formaliza a submissão do Banco aos capital financeiro, além de “privatizar” a autarquia, e permitir a privatização das funções geradoras de resultado do Banco (gestão de reservas, controle e definição dos meios de pagamento), além de permitir que talvez meia centena de auditores possam romper o teto de pagamento do funcionalismo público, caso não percam o emprego para experts do mercado. Conclui-se que, apesar de ter efeitos importantes, inclusive antecipar eventual movimento de queda dos juros, dando mais gás ao processo de crescimento da economia, e apesar da chantagem do Trumpista alaranjado e seu tarifaço, em conluio com a família dos traidores golpistas, meros falsos patriotas, nada indica êxito da política do Banco em relação ao controle da inflação e nem a continuidade de prévias deflacionárias. *** Outro destaque do mês de agosto que vai se encerrarndo foi o segundo tempo do golpe iniciado em 8 de janeiro de 2023, por congressistas da oposição que ocuparam, mais uma vez, as dependências do Congresso, no retorno das atividades legislativas. A invasão e o assalto à Mesa da Câmara, praticada pela oposição e, felizmente frustrada, revelam o baixo nível de respeito à democracia e ao povo brasileiro e à Casa para que foram eleitos. E serve para mostrar a coerência e consistência de objetivos de quem quer o Brazil cada vez mais big (bigger), seja lá fora, como o poeta romântico Bananinha bolsotário e o neto do último ditador, Figueiredo, seja aqui dentro do território que pretendem transformar em quintal. Mesmo que sem a competência do Fundo de Quintal, e de Arlindo Cruz, que se foi no mês do “cachorro louco”. *** Em agosto o partido Novo, defensor das bandeiras mais emboloradas e antigas da política nacional – muito adequadas ao tempo da República Velha, lançou Zema candidato à presidência da República. O político que, sem pagar um tostão da dívida do Estado, por força de liminar de que se valeu, do STF, conseguiu fazer multiplicar a dívida total recebida mostrou, desde logo, sua vocação para ocupar os ‘trending topics”, o que é muito positivo em tempo de likes e redes sociais. Desta vez, mais que o político que quer subsidiar e até vender o patrimônio público do Estado aos amigos, de preferência àqueles que financiaram sua campanha, Zema obteve likes em se mostrar como um político da paz, não “beliscoso”. Que se soma a sua capacidade de escutar (“eu ouvo bem”) e ao seu conhecimento literário (perguntando se Adélia Prado era funcionária da rádio em que dava entrevista). *** E, apesar do trumpista alaranjado mostrar sua vontade imperial, desrespeitando o mandato fixo de Lisa Cook, diretora do FED, o que serve para mostrar que, mesmo em países antes democráticos e republicanos, a tal independência do Banco Central só funciona quando os músicos seguem a batuta do maestro sem questionamento, não há como reconhecer: os Estados Unidos caminham para uma forma autocrática de governo, senão uma plutocracia. E apesar de todas as ameaças do efeito laranja, não há como, cada vez mais, não perceber e se manifestar: o povo de Israel não é, nem poderia ser, genocida. Essa acusação deve ser atribuída ao governo de Israel, sem apoio popular, mas com apoio e armas do trumpista. Genocida, e responsável por crimes de guerra são Netanyahu e seus ministros, e os sionistas que os elegem e apoiam. É isso.

quinta-feira, 31 de julho de 2025

Galípolo, o menino de ouro, o PIX e o tarifaço de Trump

https://youtu.be/Qn6FJNih3xs Vai se encerrando o mês de julho. Inaugurado em meio à disputa entre o Executivo e o Congresso Nacional, centrada na elevação das alíquotas do Imposto sobre Operações Financeiras - IOF promovida pelo governo federal (Decretos 12 466, 12 467 de maio e Decreto 12 499, de junho). Alegando desvio de função na utilização de um imposto de caráter regulatório para elevação da arrecadação federal, visando o alcance das metas previstas no arcabouço fiscal, o Congresso Nacional votou e aprovou o Decreto Legislativo nº 176, de 26 de junho, sustando a eficácia da medida do governo. *** Com a medida o Legislativo colocava o governo nas cordas, usando como pretexto o discurso de a sociedade não tolerar mais a prática de se elevar a carga tributária, com a finalidade de se restaurar o equilíbrio fiscal, em detrimento de um corte no gasto classificado como perdulário (especialmente os gastos sociais). No fundo, a medida mal disfarçava uma espécie de chantagem cuja finalidade era tão somente permitir a liberação de emendas. Intenção que, de verdade, pode ser provado pelo fato de os deputados ampliarem o número de cadeiras – e os gastos – do número de representantes na Câmara, além de apresentação de projeto que anula a proibição de acúmulo de aposentadoria parlamentar com exercícios de cargos no legislativo, em qualquer esfera do governo. *** Judicializada a questão, o STF se pronunciou de forma salomônica em 16 de julho, declarando a validade do normativo governamental, com a supressão da cobrança do IOF em operações de risco sacado. Em sua justificativa, a decisão reconhecia a competência do governo para promover alterações nas alíquotas do IOF, sob amparo de dispositivo constitucional e sob o argumento de correção em distorções de operações financeiras e cambiais. Quanto ao risco sacado, quando o lojista negocia recursos com um banco para pagar antecipadamente aos seus fornecedores, tornando-se devedor do banco a um prazo maior, a operação não foi considerada ser uma operação de crédito. *** Com o Congresso em recesso parlamentar a partir de 18 de julho, e praticamente às moscas, e a economia mantendo sua trajetória de crescimento e queda do desemprego, aliada à redução percebida nos preços de alguns produtos alimentícios nos supermercados, os fatos de maior repercussão no mês ficaram restritos às medidas para reposição dos valores indevidamente descontados dos pagamentos dos aposentados e pensionistas do INSS; às medidas cautelares decididas pelo Ministro Alexandre de Moraes e aprovadas por outros 3 de seus compamheiros, com uma única exceção, em relação ao ex-presidente, inelegível e acusado de crimes contra o Estado democrático de Direito, Bolsonaro; e às medidas adotadas pelo boneco reborn alaranjado que, agindo como criança mimada, resolveu tarifar em 50% todos os produtos brasileiros exportados aos Estados Unidos. Quanto ao alarido do trumpete alaranjado desafinado, suas decisões flutuam ao sabor do vento e, como aconteceu com outros países anteriormente, suas decisões já se modificaram, sofrendo atraso no início de sua vigência e com vários produtos ficando de fora da pesada tarifação. *** Mas eu não poderia e nem me sentiria bem em tratar das questões ligadas ao tarifaço, se não abordasse o verdadeiro genocídio promovido por Israel e políticos e partidos sionistas na Faixa de Gaza. Algo que nos traz descrença e desesperança no ser humano e em sua capacidade de aprender e não repetir os erros. Afinal, logo as vítimas do brutal crime do Holocausto, na primeira metade do século passado, tornaram-se, alguns deles, algozes de uma nova proposta de solução final. Agora contra a totalidade do povo palestino que, sob a desculpa de necessária punição a grupos classificados como terroristas como o Hamas, estão sujeitos às mais bárbaras atrocidades: deslocamentos forçados de grupos populacionais, falta de água, gás, energia, medicamentos, além de serem vítimas de ataques com armas de alto poder de destruição, quando não são vítimas de cruel plano de morte por destrunição e fome. Queria começar este texto com a frase “Um fantasma ronda o Oriente Médio: o fantasma do genodídio e dos crimes contra a humanidade”. Somos todos a favor do Estado da Palestina. *** Curiosamente, entre as desculpas várias, múltiplas, usadas pelo trumpete laranja, está a de que nossa Justiça e os responsáveis por sua aplicação abusam de seu poder e autoridade, devendo, alguns dos mais altos magistrados, serem objeto de punição por lei draconiana, com a aplicação da lei da morte financeira, da classe de leis como a de Talião. Estranha forma de se fazer intervenção, sem declaração formal de estado de beligerância, em países cuja soberania não se encontra em negociação. Tudo sob a desculpa ou a chantagem em benefício de quem está sendo julgado por crimes contra a democracia, com todo o direito de defesa assegurado. *** Tudo sob a alegação de os magistrados estarem afrontando os direitos humanos mais fundamentais. Isso usado como desculpa por quem atua contra os imigrantes sem reconhecer o direito mínimo de que deveriam ser merecedores. Por quem apoia e pune ou ameaça sancionar a todos que se manifestam, não contra Israel e a maioria do povo judeu digno de respeito, mas contra dirigentes fascistoides para quem a vida não passa de mercadoria de segunda categoria, a depender do outro. *** Aqui no Brasil, Galípolo, tratado como o “menino de ouro” por Lula, tem se mostrado o que nunca deixou de ser, melífluo, ouro de tolo. Um engodo! Ou o menino de ouro do mercado financeiro para quem, com muita dedicação, se propõe a trabalhar. O que lhe permite manter as taxas de juros em patamar elevado, mesmo quando a economia começa a dar sinais de desaceleração, inclusive na esteira das medidas anunciadas por trump. Mas desde o início do ano o mercado já havia previsto 15% de juros até o meio do ano e a manutenção dessa taxa por longo período. Tal como o comunicado da decisão de ontem do COPOM assinala. Juros que deverão ser mantidos por um bom e longo período. Não à toa Galípolo e seus companheiros de Diretoria Colegiada do BC fazem tanta questão da aprovação da PEC 65, que facilita a privatização do Banco Central e sua captura total pelo mercado a quem deveria controlar. O que fica mais evidente com o ataque risível do trumpete laranja ao PIX, em defesa das instituições de pagamentos estrangeiras. Ataque ao PIX de tamanha gravidade que a Diretoria do Banco Central ainda não conseguiu se pronunciar em sua defesa, com a contundência cobrada até mesmo pelo Planalto.

sexta-feira, 20 de junho de 2025

A que interesses serve mais uma alta de juros?

Link: https://youtu.be/UzDKn-XrO-M Sob a alegação da permanência de incertezas no cenário internacional, em função da adoção de políticas econômicas de caráter errático por parte do ioiô alaranjado, somadas às incertezas no cenário doméstico, dada a resiliência apontada pelos indicadores de atividade econômica e do mercado de trabalho, que teimam em manter seu dinamismo, o Copom decidiu elevar a taxa básica de juros da economia brasileira para o nível recorde de 15% ao ano, patamar não atingido desde 2006. De acordo com o Comunicado do Copom, comitê composto pelos 9 diretores do Banco Central, a decisão unânime se deve à necessidade de o Banco ter de se utilizar da taxa de juros como instrumento único da política monetária, visando cumprir seu objetivo de levar o nível de inflação para a proximidade da meta de 3% com tolerância de mais ou menos 1,5%. *** À primeira vista, pode parecer estranho que o Banco Central opte por uma política monetária punitiva, elevando os juros para encarecer o custo do dinheiro, do crédito e dos financiamentos, provocando a queda do nível de gasto das pessoas e empresas. Essa estranheza é ainda maior quando se sabe que menores gastos desestimulam os empresários a expandirem seus negócios, investindo ou ampliando sua capacidade de produção. Isso quando não decidem reduzir o próprio nível de produção que não encontrará saída. O resultado disso é o que se chama de redução do nível de atividade ou do crescimento, ou redução do PIB e seu efeito mais notável é o desemprego. *** Imediatamente uma contradição salta aos nossos olhos: enquanto o governo democraticamente eleito vem cumprindo as promessas de campanha e adotando medidas econômicas de estímulo ao crescimento da atividade econômica, e comemorando a elevação do nível de emprego formal, o Banco Central, instituição típica de Estado por deter o monopólio da emissão de moeda e liquidez opera como inimigo do governo. Ao contrário de utilizar a política monetária de forma compatível e consistente com a política econômica manifestamente desejada pela sociedade, o Banco prefere utilizar a política ou os juros para tornar o governo e suas políticas, especialmente a fiscal, mas não só, refém de sua vontade. *** Para evitar a acusação de tramar contra a melhoria do bem estar da população e contra a política do governo, o comunicado alega lutar contra outro problema, reconhecidamente prejudicial a todos indistintamente: a inflação. E comunica que as expectativas de inflação para 2025 e 2026 permanecem em valores acima da meta, de acordo com o Boletim Focus que estima o índice de 5,2% e 4,5% respectivamente para este ano e 2026. Entretanto, o mesmo comunicado informa que o Boletim Focus projeta uma inflação para 2026 mais elevada que a previsão do próprio modelo do Copom (de 3,6%). Entre a projeção de seu modelo e a do Boletim Focus, a diretoria do Banco parece preferir a do Boletim. E age com base nessa pesquisa. O que exige de nós algumas considerações. *** Em primeiro lugar, esclarecer que o Boletim Focus é o resultado de uma consulta feita aos agentes do mercado financeiro e tão somente a eles, que não têm participação direta no processo de formação de preços dos bens que integram a inflação. Isso torna o Boletim mero porta-voz dos interesses do mercado financeiro, único setor que expande seus ganhos com a alta dos juros. Representantes dos setores que formam preços (agro, indústria, comércio, serviços) não são ouvidos, apesar de profundamente prejudicados pelas decisões quanto às taxas de juros. Uma segunda observação se refere ao uso dos juros para conter a inflação, teoria que tem inúmeros defensores nas escolas econômicas ortodoxas e de inspiração liberal ou neoliberal, como parece ser a formação dos diretores do Banco, fazendo coro aos agentes financeiros e à midia tradicional, que depende dos anúncios do mercado para sobreviver. Mas reconhecer a existência de amparo de caráter intelectual – E NÃO TÉCNICO – para a decisão, não significa que não existam outras formas de pensamento, que encaram a inflação como passível de ser explicada por vários fatores que não apenas a de muita gente querendo comprar produtos escassos. Inflação causada por perda de alimentos devido aos efeitos de desastres naturais (chuvas, alagamentos, seca extrema, geada) ou doença em rebanhos não são afetadas por juros qualquer que seja seu nível. *** Destaque deve ser dado também, para que não pairem quaisquer dúvidas sobre os integrantes do corpo técnico do Banco: embora alguns dos funcionários públicos do Banco possam compartilhar a mesma visão neoliberal da diretoria, grande parte não concorda com essa abordagem. E, independente de suas crenças, como funcionários de Estado e compromissados com o público, entregam suas tarefas, muitas de caráter técnico. No entanto, sendo a política, e dentro dela a política econômica do governo e mais especificamente a política monetária, um campo de disputa de interesses, onde as decisões tomadas favoreceram mais alguns agentes, no caso o setor financeiro em detrimento dos objetivos mais amplos de desenvolvimento nacional, a decisão do Copom é estritamente POLÍTICA. No caso, a decisão de uma instituição que, a título de resguardar sua autonomia frente ao governo, não se constrange de privilegiar ao setor que deveria estar fiscalizando e regulando: o mercado financeiro e seus interesses. Situação típica de captura dos reguladores pelos regulados, muito mais poderosos. *** Para concluir, indica-se a seguir alguns efeitos perversos para o governo e a sociedade como um todo, causados pela decisão de elevação de 0,25% da Selic adotada e que, ainda que inadvertidamente o Comunicado parece ironizar quando informa que: “ Sem prejuízo de seu objetivo fundamental de assegurar a estabilidade de preços, essa decisão também implica suavização das flutuações do nível de atividade econômica e fomento do pleno emprego”. Isso quando critica o dinamismo do mercado de trabalho, com o trabalhador cada vez mais fragilizado e explorado e incapaz de gerar o nível de renda suficiente para atender às necessidades que lhe assegurem e à sua família, uma vida digna. A ponto de, como dá a entender o professor Safatle, um emprego apenas é pouco para seu sustento e o segundo uma miragem. A baixa remuneração de apenas um emprego reduz a qualidade de vida da família. *** Entre os males da alta dos juros, além doss já citados de redução do crescimento econômico, pode ser citado um processo perverso de concentração de renda, com a renda sendo distribuída cada vez mais de forma injusta e desigual. Ao gerar menos oportunidades de emprego, menor inclusão no mercado de trabalho, os salários são mantidos em limites cada vez mais reduzidos, enquanto os empresários produtivos preferem aplicar seus recursos em aplicações especulativas do mercado financeiro, e os agentes do mercado ganham tanto de operações mais caras com o setor privado quanto com o setor público. Por outro lado, ao deixar de ser indissociavelmente conectada com a política fiscal, como lembra o professor Oreiro, a política monetária acarreta a elevação da despesa nominal do governo, despesa nominal dada pela soma das despesas primárias - aquelas que o governo faz para poder funcionar e prestar serviços para a sociedade-, e as despesas financeiras de juros dos empréstimos que o governo toma junto aos agentes financeiros. Com isso, o déficit do governo se eleva, mesmo que o governo esteja cortando gastos essenciais e gerando resultados positivos, mas aquém dos juros devidos. Elevando seus déficits, aumenta a Dívida Bruta do Governo e a grau de endividamento calculado pela Dívida Bruta/ PIB se eleva, tanto pelo aumento dos juros quanto pela redução do crescimento ou do PIB. Resultado que se agrava em razão da autonomia do Banco Central que, mesmo sem qualquer necessidade, como agora, e para tirar dinheiro de circulação, vende ao mercado os títulos públicos que traz em sua carteira, tornados atrativos pela maior promessa de rendimento. *** Isso antes que o Banco Central, Instituição tipicamente de Estado possa ter decretada sua independência total do governo eleito, transformando-se em empresa pública, regida pelo direito e mentalidade privados, para ocupar o papel de um 4° poder da República: o Poder argentário da Plutocracia, como o deseja a PEC 65, que tramita no Senado, com o objetivo claro de impedir a participação de parcela majoritária da população dos resultados de seus esforços e seu trabalho.

quarta-feira, 4 de junho de 2025

Elementos e argumentos que demonstram o equívoco que é a PEC 65 de captura do Banco Central por interesses financeiros

Texto base da entrevista concedida na data de 03/06 ao site Da Prática Política, tratando e enumerando os inúmeros problemas contidos na Proposta de Emenda Constitucional que tramita no Senado, mais precisamente na Comissão de Constituição e Justiça, e os prejuízos decorrentes de possível aprovação naquele colegiado para o corpo funcional do Banco; o funcionamento e cumprimento das atribuições do BC; o governo federal democraticamente eleito; a elaboração e implementação de políticas públicas, principalmente econômico-sociais; para a economia nacional, a sociedade como um todo e para a democracia em nosso país. O texto segue uma estrutura distinta dos demais textos aqui publicados, por estes motivos. “Dêem-me o controle do dinheiro de uma Nação e não me interessa quem faça as suas leis.” Nathan Rothschild Aspectos ligados à legislação -Lei complementar 4595: instituiu SFN, CMN, BC Criou Plano de Saúde Vinculação entre BC e CMN - Lei complementar 179 – definiu objetivos fundamental (assegurar estabilidade de preços) do Banco, e complementares (estabilidade do sistema, flutuações nível de atividade, pleno emprego Definiu como Autarquia especial, não vinculada a Ministério hierarquicamente ou tutela. concedeu autonomia ao Banco – art. 6: pela autonomia técnica, operacional, administrativa e financeira, pela investidura a termo de seus dirigentes e pela estabilidade durante seus mandatos, - Questionamento da constitucionalidade em razão de vício de origem. - Comparação internacional inadequada: institucionalidade de cada país é própria e diferenciada. EP tem definição e atribuições distintas. Ex: não fiscalizam; controle de câmbio; gestão de ativos. - BC entidade típica de Estado com exercício de papel regulador e monopólio ou exclusividade de gestão e controle da liquidez. - EP traz mais uma fratura na estrutura da CF; engessa estrutura na CF, dificultando evolução no tempo. - EP retira força e autonomia operacional: pode ter poderes de polícia, regulação, supervisão e saneamento? - Perda das prerrogativas de órgão do setor público, e demandas na condição de fazenda pública, possibilidades recursais em caso de contencioso. - LCs poderão desmembrar funções, unidades administrativas, desestatização: transferência para setor privado de funções típicas da AM; concessões, etc. Riscos para a segurança do sistema e suas instituições (concorrência) e sociedade. - Futuro das regionais e a alocação de funcionários. - Privatização de setores pode vir a fragilizar o corpo de funcionários e dispensa concurso. - Possibilidade de indicação de indicações técnicas e políticas, afetando a autonomia. Aspectos ligados ao corpo funcional - Estabilidade do RJU; dispensa apenas com devido processo legal e amplo direito de defesa. Sujeita-se à possibilidade de demissão por necessidade de resultado operacional e condições econômicas. - Como está prevê que os ativos poderão optar por congênere ou ficar no banco, cuja estrutura de pessoal será definida em lei posterior. - abre a oportunidade para assédio moral. Não demite, mas pressiona. - constatada necessidade de corpo mais enxuto, tempo de adaptação do pessoal pode ser muito reduzido: demissão branca. - investidura dos ativos sem concurso público em carreira ou cargo congênere. - até que momento o deslocamento poderia ocorrer ou voltar a ocorrer, já aberta a porta? Possibilidade de PDV. - surgiria a questão de contribuição previdenciária: O Banco assumiria os custos junto ao INSS compensando os valores dos anos não retidos? A previdência pública? - quem vai bancar o FGTS para os ativos mesmo no início, caso tenha pressões por demissão voluntária? Como será calculado? Corpo funcional e atividades: - o funcionário estável pode agir com completa autonomia, não respeitando ordens superiores que considerar injustas, ilegais ou prejudiciais. - Fiscalização não submetida a pressões. Aposentados: congênere sem qualquer esclarecimento adicional Aspectos ligados a governança (e seus problemas) - Governo eleito democraticamente define PPGA, que o Congresso aprova e define a política macro geral e micro para serem seguidas por outros órgãos - LDOs devem ser consistentes e coerentes com Metas do PPGA - Risco de BC não estar integrado ao Planejamento estratégico. Política monetária divergente da polítia macro. Conflito de resultados. - CMN define metas de inflação, que o Banco deve procurar atingir, com liberdade operacional. Problemas: ruptura do BC com governo: conflito de decisão independente dos juros com risco de estabilidade via fragilidade financeira; nível de atividade e pleno emprego. - BC é 1/3 do voto do CMN e atua como secretaria executiva. - Fiscalização pelo Congresso – quem fixa objetivos não acompanha, controla ou fiscaliza - em situações de urgência – ação do BC sem consistência com ações do governo, e do CMN. - Congresso poderá acompanhar, definir sem conhecimento especializado e tempestivamente? - Contraria a previsão de fiscalização enquanto a ação está sendo adotada. Qual a importância de fiscalização posterior apenas para registro histórico? Risco de independência do Congresso – BC como 4º poder, tecnocrata ( de acordo com motivos de 1920 e 1922, de retirar dos políticos as decisões sobre questões econômicas nada técnicas). - PEC e autonomia orçamentária - Fora do OGU o BC teria praticamente independência, sem ter sido eleito democraticamente para isso. - Realizados gastos iniciais da transformação, há previsão de economizar 6 bilhões de seu custeio, liberando esse valor para o OGU. - Orçamento consolidado do governo tem passivo de dívida pública no Tesouro e ativos de títulos da dívida – de mesmo valor no BC. Logo, contabilmente se compensam e não têm impactos senão na Dívida Pública. - Receita por senhoriagem: juros dos títulos da dívida que o BC é o responsável por gerir, para fazer política monetária. - Esta receita está vinculada ao patamar dos juros. O BC pode vir a fixar juros para aumentar seus recursos, alegando necessidade de controle inflacionário para metas muito rígidas e fora da realidade de economia em desenvolvimento como o Brasil O projeto partiu da Diretoria, mais especificamente, Roberto Campos Neto. De sua assessoria, saíram e têm saído propostas de legislação de regulamentação da PEC, sem qualquer debate ou apresentação aos funcionários. - Aposentados excluídos de participar de eventos em que a Diretoria apresenta seu apoio à PEC. - 74,5% dos filiados ao Sinal, única entidade com direito legal de representação dos servidores e registro. 51% dos ativos. - Não houve consulta e debates com o corpo funcional. - Diretoria vendeu possibilidade de extrapolar teto de gastos e remuneração ao corpo funcional. - Leis complementares já em desenvolvimento. - Para aumentar juros, o BC alega risco de instabilidade em razão de risco fiscal. Não há risco de crédito para quem emite passivos na moeda que emite. Risco de carregamento existe, desde que taxas de juros positivas. Longo prazo mais elevados que curto prazo. Governo pode solicitar recursos dos lucros de operações com as reservas cambiais. - Ao aumentar juros, amplia o gasto do Governo, comprimindo a possibilidade de o governo bancar as despesas obrigatórias e, principalmente as discricionárias, como investimento em infraestrutura. Transfere renda para detentores do público, e promove um programa de austeridade típico de austericídio. - Tem poder legal de fiscalizar fintechs e cripto. - Receita de operações cambiais e quaisquer outras de resultado das atividades do BC devem ser repassadas ao Tesouro. - Dinheiro é criação do Estado escolhido pela sociedade para organizar a vida social, o que exige gastos. O Estado cria dinheiro e entrega à população para que ela pague os impostos. O Estado não precisa de cobrar impostos para gastar, basta emitir. - Tanto o dinheiro emitido não é, nem pode ser apropriado pelo Banco como se fosse seu, para financiar seus custos, nem as reservas cambiais, que são do governo que as adquire, quando credita o correspondente em nossa moeda, internamente, aos exportadores e aos proprietários dos influxos. - Juros ampliam a desigualdade social e concentram renda. - Papel do BC e das metas inflacionárias, dos juros e seu papel na inflação, na valorização cambial, na desindustrialização, etc. deveriam ser debatidos por toda a sociedade. Não são decisões técnicas. São decisões de vontade dos decisores, capturados.

sexta-feira, 30 de maio de 2025

A privatização do Banco Central é o objetivo de Galípolo?

Artigo publicado originalmente no site Brasil247. Link:https://www.brasil247.com/blog/a-privatizacao-do-banco-central-e-o-objetivo-de-galipolo Deve-se à Lei 4595, de 1964, a instituição do Sistema Financeiro Nacional e a criação dos órgãos e entidades integrantes de seus dois subsistemas - um de caráter normativo e outro de atividades de intermediação – submetidos às normas operacionais e rotinas de funcionamento definidas para o sistema. Essa Lei foi a responsável pela criação do Banco Central, sob a forma de Autarquia Federal de natureza especial subordinada ao Ministério da Fazenda, para ser o agente executivo das decisões do recém criado Conselho Monetário Nacional, órgão de caráter deliberativo. Além entre suas atribuições incluíam-se: a emissão do meio circulante, de acordo com a autorização do CMN; autorizar o funcionamento, fiscalizar e até punir as instituições, de caráter privado, responsáveis pelas atividades de intermediação financeira. Antecipando o processo de transformação do papel do Estado ocorrido nos anos 90 e inspirado pelos ventos do neoliberalismo, que resultou em uma política de desestatização da prestação dos serviços públicos, a origem do Banco Central sob a modalidade de Autarquia de natureza especial, confere a ele perfil análogo ao das agências reguladoras - autonomia administrativa, financeira e patrimonial; mandatos fixos para os dirigentes; além da atuação equidistante e isenta em relação aos interesses dos usuários que são toda a sociedade e a economia, e os agentes regulados. Tarefa que torna-se, no caso do Banco, cada vez mais submetida às pressões não do Estado, mas dos agentes ávidos a ampliarem sua renda pela transferência de renda e prejuízos que impõem, parasitariamente, ao conjunto de usuários economicamente fragilizados, em razão da posição privilegiada de que são detentores, os rent seeking. É este papel de órgão regulador que permite analisar o Banco Central pela ótica da teoria da captura do regulado, situação que ocorre quando os interesses dos regulados acabam influenciando e sendo decisivos para que as ações dos reguladores sejam favoráveis aos seus interesses em prejuízo dos interesses de todo o público. Em geral, a captura justifica-se a partir da forma de seleção dos indicados aos cargos de direção, com mandato, dos órgãos reguladores. Afinal, alega-se que, sendo o setor regulado caracterizado por uma série de atividades de ampla especialização e complexidade, seria recomendável que a seleção recaísse sobre um especialista, dono de larga experiência de trabalho em várias áreas de negócios do setor. A crença é a de que, o conhecimento acumulado (learning by doing) e o domínio da forma raciocínio de seus colegas permitiria criar mecanismos de controle e fiscalização mais eficientes. Pensamento que ignora o óbvio: sem saber quem é o bandido para impedi-lo de agir, e se alguma diligência e qual será atacada, o mocinho estará sempre perseguindo o criminoso, depois do crime já praticado. Junta-se a isso a hipótese da porta giratória: se o profissional por suas qualidades foi indicado para a direção do órgão regulador, findo o seu mandato e passado o período necessariamente limitado de quarentena, seu currículo e todo o conhecimento que acumulou o qualificam para ser convidado para ocupar cargo de projeção em qualquer instituição do setor. Inclusive pelo domínio das informações estratégicas de que teve ciência enquanto dirigente com mandato. Cumpre-se, assim, o círculo: por ser qualificado e experiente, veio do setor para o órgão regulador, para onde voltará por estar ainda mais qualificado. De fato, seria um desperdício que ele tivesse que enviar currículos e ser contratado por setor em que não tivesse qualquer conhecimento, exceto o seu networking. Se tomarmos o Banco Central como exemplo, não admira que vários presidentes da instituição vieram do mercado financeiro e que, a cada dia, aumenta o número de seus diretores que retornam para aquele mercado. Onde vão gozar o prêmio das delícias de terem tomado decisões que sempre procuraram evitar que os agentes do setor ficassem em situação de fragilidade e risco. Risco, aliás, que não deveriam adotar, por ter como uma de suas atribuições zelar pela solvabilidade do sistema financeiro. Galípolo não é o primeiro, nem será o último. Profissional de formação reconhecida, sempre conviveu com as várias correntes do pensamento econômico e seus representantes, sempre interessado em aprender e expandir sua rede de relações. O que lhe valeu ser reconhecido como tendo uma posição heterodoxa moderada, longe da adoção de uma posição ideológica mais nítida. Sem ser um liberal, viu uma janela de oportunidade no processo de desestatização das vagas neoliberais. Esforçado e inteligente, especializou-se em estudar o tema das parcerias público-privadas e notabilizou-se pela participação em processos de privatização da CEDAE, enquanto ocupava a presidência do Banco Fator. Dado seu perfil “fora da caixa”, fez parte de governos de várias tendências e partidos. É um bom e competente quadro, e por isso, Haddad o convidou para o Ministério da Fazenda e o indicou a Lula. O que o tem poupado de críticas públicas, especialmente quanto à política de juros que vem comandando. O que nos leva a um ponto crucial: se não é o perfil de Galípolo a defesa de posições econômicas de perfil mais ortodoxos; se sabe que a elevação dos juros é incapaz de debelar uma inflação que não é de escassez de oferta de produtos por elevação de demanda e gastos de consumo; se sabe dos impactos de juros elevados nos fluxos de entrada de dólares e a consequente apreciação do real; se tem conhecimento de como a apreciação do real alimentou o processo de desindustrialização quase fatal para nosso desenvolvimento autônomo e nosso desenvolvimento científico e tecnológico; e se tem a informação do quanto a política de juros concentra renda na mão dos grupos de renda mais favorecidos, o que o faz seguir dando declarações de manutenção da Selic, em eventos que o coloca sempre em contato com banqueiros, agentes do mercado financeiro e grandes empresários? O que o faz se dobrar à pressão da mídia, sempre parceira dos interesses de seus clientes e patrocinadores? O que o faz manifestar contrariedade com políticas voltadas para a preservação, ainda que menos indicada, de equilíbrio fiscal como o fez com a elevação do IOF, um imposto regulatório, da mesma regulação quanto ao órgão que dirige? Imposto que pode sim restringir o crédito, e a demanda em alternativa aos juros? Porque ignora que a economia dá sinais de arrefecimento do nível de atividade e a inflação começa a dar sinais de desaceleração? Por que essa ameaça aos outros mandatos do Banco que dirige – estabilidade da economia e manutenção do nível de emprego não são parte de sua preocupação? E, afinal, em meio a tudo isso, qual a razão de: antes de discutir no CMN a alteração da meta de inflação, completamente irreal para uma economia indexada e em desenvolvimento – eterno? Ou antes de discutir a mensuração da inflação por um índice que não seja influenciado por elevações de preços de produtos sujeitos a fatores atípicos e alheios ao nosso controle (a chamada core inflation), porque prefere dedicar sua atenção, e até defender a aprovação, da indecorosa proposta que afasta o Banco Central cada vez mais do governo e o joga nos braços, sem amparo e proteção, do Sistema Financeiro? A PEC 65 é a antessala da privatização do Banco Central. A transformação do Banco em Empresa Pública não assegura nem acesso a maior quantidade de recursos orçamentários e financeiros, nem de melhores recursos humanos. Abre sim, a possibilidade de dispensa dos contratados concursados, substituídos por profissionais indicados pela maior experiência e maior conhecimento dos produtos e interesses do mercado financeiro? A quem serve a retirada do status de profissional estável e zeloso da fiscalização que executa junto aos agentes tutelados? A quem serve fragilizar a condição de órgão tipicamente de Estado que o Banco Central possui hoje? A quem interessa alterar profundamente a Constituição, nesse momento, para que no futuro, legislações infraconstitucionais, de processo mais fácil de aprovação possam retalhar e privatizar as atividades passíveis de geração de lucro do Banco Central? Não aos 74% de funcionários do Banco que se manifestaram veementemente contra a PEC 65! Não à economia brasileira e aos seus setores produtivos? Não à sociedade? Aos banqueiros e agentes financeiros? Aos capitais externos a eles associados? A serviço de que interesses está esta malfadada PEC 65?

quinta-feira, 22 de maio de 2025

Manifesto contra a PEC 65

Este texto é exatamente o mesmo já publicado nos sites brasi247 (https://www.brasil247.com/blog/manifesto-contra-a-pec-65-ov7regcb) e ggn (https://jornalggn.com.br/congresso/manifesto-contra-a-pec-65-por-paulo-cesar-machado-feitosa/). Dada a importância do assunto e ter sido publicado por sites tão importantes em nossa luta pela manutenção da democracia no Brasil, achei que devia publicá-lo também em meu próprio blog. Eis o texto. Espero que apreciem e divulguem. A sociedade brasileira precisa dessa sua ajuda. Foi a Lei Complementar 4595 de 1965 que instituiu e regulou o Sistema Financeiro Nacional e o conjunto de instituições que o integram, como o Conselho Monetário Nacional e o Banco Central do Brasil. Novamente foi uma segunda Lei Complementar, a LC 179 de 2021, que concedeu ao Banco Central sua autonomia técnica, operacional, administrativa e financeira, mantida sua natureza de Autarquia de natureza especial sem vinculação de tutela ou subordinação hierárquica a Ministério. Ressalta-se a importância da LC 179, que definiu o objetivo fundamental do Banco Central de assegurar a estabilidade de preços, ao lado de outros objetivos secundários como zelar pela estabilidade e pela eficiência do sistema financeiro, suavizar as flutuações do nível de atividade econômica e fomentar o pleno emprego. Para cumprir seu mandato, a LC estabelece que compete ao Banco Central conduzir a política monetária necessária ao cumprimento das metas de política monetária estabelecidas pelo Conselho Monetário Nacional, colegiado de que o Banco Central faz parte com direito a um voto entre três. Por outro lado, visando concretizar a autonomia do Banco, a LC estabeleceu o mandato fixo e não coincidente dos membros indicados para sua Diretoria Colegiada, inclusive seu presidente. Assim, uma leitura atenta da Lei 179 revela a preocupação do legislador em fornecer as condições e os instrumentos para que o Banco Central pudesse proporcionar, no futuro, a alta qualidade de serviços financeiros que vem prestando à sociedade no presente e que se orgulha de ter fornecido no passado, e que lhe assegura o reconhecimento de mérito por todo o corpo social. Assim, e ciente da prodigalidade de alterações juridicas e constitucionais características de nossa evolução institucional, política e social, uma pergunta salta imediatamente em nossos espíritos, corações e mentes: qual a necessidade da proposta de uma Emenda Constitucional, especificamente a PEC 65, para abordar temas tratados cuidadosa e eficientemente ao longo de nossa história, por legislação infraconstitucional? Por quê se introduzir uma cunha a cindir o texto de nossa Lei Maior, fragilizando sua integridade e contornando a intenção do parlamentar constituinte, que sob o título da Ordem Econômica e Financeira determinou, em seu art. 192, a regulação do Sistema Financeiro por meio de Lei Complementar? Sabendo que a promoção de alteração de preceito constitucional, por exigir quorum qualificado nas duas casas legislativas, é de extrema complexidade, por que a preocupação, nessa hora, de dar curso a uma ruptura desse texto? Trata-se apenas do oportunismo de contar com um Legislativo dominado por forças da oposição, ou que cada vez se sente mais poderoso para avançar sobre prerrogativas e direitos de outros poderes, de forma indevida, como se dá na participação crescente na execução da peça orçamentária, via Emendas? Pior é a sensação de que, a partir dessa primeira dúvida, arromba-se a porta da insensatez e outras perguntas insistam em vir à tona: se a PEC 65 que se pretende aprovar visa assegurar autonomia financeira e orçamentária ao Banco Central – permitindo a um boeing não ter oçamento de um teco-teco – por quê não exigir o cumprimento, e fiscalizar como compete ao Legislativo, que o Executivo adote as medidas necessárias para que o art. 6° da LC 179 se torne realidade? Para isso, bastaria exigir que o Banco Central tivesse orçamento próprio definido e executado sem se sujeitar às injunções orçamentárias que afetam, como os contigenciamentos, todo o OGU – Orçamento Geral da União. Por quê não permitir que o Orçamento do Banco lhe permita ter tratamento semelhante ao de outros Poderes, ou de outros órgãos como a Procuradoria Geral, a Advocacia Geral ou a Defensoria Geral da União? Todos órgãos cujo orçamento negociado com o Executivo é recepcionado pelo OGU. Para que a Autoridade Monetária assegure os recursos necessários ao desenvolvimento de tantas funcionalidades na área dos meios de pagamentos; regulações e controles na área da regulação e da fiscalização que assegurem a estabilidade e saúde do Sistema Financeiro, por que não se criar uma taxa de fiscalização que incida sobre os entes regulados? Taxa de fiscalização que entraria direto no caixa do Banco Central. Esta receita, junto a outros mecanismos, trariam a tranquilidade ao Banco para dar sequência à evolução de funcionalidades como o PIX, a moeda digital DREX, desenvolvidos apesar das limitações orçamentárias sempre citadas. A verdade é que a PEC 65 não visa a promover maiores recursos à disposição do Banco, muito menos ampliar a atratividade do Banco na disputa pelos mais qualificados, adequados e adaptados profissionais no mercado. O objetivo da PEC é destruir a essência de instituição tipicamente de Estado mantida pelo Banco, dotado da competência exclusiva de emissão da moeda, em nome da União, o que envolve o controle da liquidez e o exercício das políticas relacionadas a esse encargo, como monetária, a creditícia e a cambial. Que outra razão justificaria a transformação do Banco em Empresa Pública, sob a órbita do Direito Privado, ainda que de natureza especial? Qual a motivação para transformar servidores públicos, regidos hoje pelo Regime Jurídico Único – RJU, em trabalhadores do regime privado da CLT? As promessas de que, como empresa pública, o Banco não estaria submetido ao OGU; seus funcionários não estariam mais sujeitos ao RJU e poderiam ter remunerações de mercado, superiores ao teto do funcionalismo, são apenas promessas vãs. Ouro de tolo! Tornar-se empresa amplia a distância entre o Banco e as propostas em benefício da sociedade, que levaram à escolha democrática do governo eleito. O resultado é deixar a instituição típica de estado, orfã! Pior, sob a influência dos interesses dos agentes a que ela deve regular. Abre oportunidade, não desprezível, para a manifestação da teoria da captura do regulador pelo regulado, de forma mais escancarada daquela que já ocorre hoje, como reconhecido por alguns parlamentares. Quanto aos funcionários, a possibilidade de serem dispensados e seus cargos ocupados por apadrinhados dos setores financeiros privados, não poderia ser afastada. Independente dessa incerteza, estariam prejudicadas a falta de garantia e estabilidade que permite ao servidor público não se curvar a interesses escusos e a propostas de vantagens muito maiores. Em suma, a PEC 65 apenas dá força a que a política de juros adotada pela Autoridade Monetária permaneça em níveis pornográficos, capazes de elevar os rendimentos dos títulos mantidos em posse dos magnatas das finanças, contribuindo para promover a sequência da mais perversa distribuição de renda no país; elevando a carga de endividamento público e implodindo qualquer proposta governamental de responsabilidade fiscal. Finalmente, desestimulando o investimento gerador de empregos e de crescimento da nossa economia. Por tudo isso: 74% dos funcionários do Banco, entre ativos e aposentados, auditores e técnicos manifestaram-se contra a PEC 65 com um rotundo e sonoro não. PEC 65 NÃO!

sexta-feira, 21 de março de 2025

Mais uma elevação de juros. Necessária? Exorbitante? Para derrubar a inflação? Quais os efeitos colaterais dos juros altos?

Link: https://youtu.be/C3A4n_UkTHI Em seu livro mais conhecido, de 1936, Keynes afirmou que o empresário capitalista caracterizava-se por ser dotado de “animal spirits”, cuja definição na internet é uma disposição ou intuição que o capitalista forma com base em seu estado de confiança e que oleva a agir. Na guerra pela sobrevivência no mercado, sempre atribuí à expressão a ideia do espirito irracional do animal que se lança ao ataque, em busca do alimento ou como comportamento de defesa. Concordando com Keynes, acho que o ambiente econômico caracteriza-se por ser dominado por incertezas, o que leva as decisões de prazo mais longo a serem tomadas com base em expectativas incertas, meros palpites. O mesmo vale para as decisões de curto prazo, mas com menos efeitos inesperados. *** Pior, no espaço social estas expectativas incertas dão origem à tomada de decisões cruciais, aquelas que modificam definitivamente e conformam o espaço da atuação futura dos agentes decisores, criando realidades que impedem o arrependimento e o retorno à situação original. Nesse ambiente, as decisões tomadas por um agente específico - por exemplo, construir uma fábrica - acabam tendo resultados afetados pelas atitudes e comportamentos das decisões de outros agentes, e esta interação de decisões podem reforçar, se contrapor, até anular os efeitos esperados de qualquer uma delas. A título de ilustração, ocorre-me a decisão de um investidor montar uma fábrica de carruagens, na mesma localidade em que Henry Ford instalava sua linha de montagem. Independente de tal situação, o empresário passa a imagem de um louco ou visionário. Pode se decidir a produzir um tipo de produto muito desejado pelos consumidores, que pouco depois poderão abandonar o produto por questões de saúde, de mudança de hábitos sociais, por outros concorrentes novos e de maior qualidade. *** Sempre apontei esse lado meio insano do empresário que, como dizia Smith, começa antecipando capital, ou seja, gastando recursos para erguer uma fábrica (compra de terrenos, despesas com a construção civil de instalações), gasta na compra de equipamentos e de matérias primas ou insumos, na contratação da força de trabalho, na compra de energia para que a máquina possa gerar dada quantidade de produtos que levará ao mercado (gastos de transportes) para eventual venda aos consumidores (gastos de comercialização, lojas, publicidade e até as despesas com financiamento de parcela de seus fregueses, o que deve incluir provisões para perdas). Mas não é só, não falamos ainda dos custos de seguros, do recolhimento de impostos, com o serviço de contabilidade e até da dor de cabeça com a visita de fiscais. Tudo para os consumidoresao final, poderem não adquirir a quantidade projetada pelo empresáro, resultando em que ele antecipou recursos que não irão dar retorno, ou com retornos menores que os esperados. Daí a dificuldade de o empresário ter condições de bancar seu negócio com recursos próprios, o que o leva a solicitar finaciamentos tanto para inversões quanto depois, para capital de giro. O que custa dinheiro. Juros. Visando obter lucros, no caso de êxito, de 10, 12, talvez 15% ao ano. *** É neste ambiente, que o COPOM -colegiado dos diretores do Banco Central- a quem compete definir a taxa de juros básica da economia decidiu elevar, na reunião de ontem, os juros para 14,25% ao ano. Terceira elevação, novamente de 1% conforme prometido em dezembro, o que significa que, desde aquela data, a Selic já aumentou 25% em relação ao patamar que ela estava de 11,25%.. Comparando este aumento de 25% à inflação do mesmo trimestre de 2%, ou à inflação acumulada de 12 meses de fevereiro, de 5,06%, pode-se concluir da existência de alguma incoerência gritante, entre pretensa doença e a dose do remédio adotado. *** Voltando ao empresário, nenhuma aplicação de renda fixa, que pague 1,3 do CDI (taxa média de juros para empréstimos entre as instituições financeiras, agora, em 14,15%) vai render menos que os 15% de sua rentabilidade esperada e incerta. E, mesmo sendo um animal irracional, ele será tentado a aplicar seus recursos no mercado financeiro, paralisando ou vendendo sua empresa, ou reduzindo o nível de produção, emprego, bem como diminuindo o nível de problemas e riscos com que se defronta. Cai a produção, emprego e renda; cai o consumo, o investimento; cai a arrecadação do governo; cai o PIB, o que já promove a elevação do índice Dívida Pública/PIB. Menor arrecadação eleva o déficit primário do governo e a insatisfação popular; eleva a pressão dos mercados financeiros e da mídia, o que pode gerar até queda de autoridades. Seria isso um golpe em andamento? Dado pelo BC autônomo e que o mercado quer independente – DO GOVERNO - se prosperar a PEC 65, que privatiza o Banco Central? *** E em relação à inflação? Em minha opinião deverá subir, o que vai alimentar a falácia teórica de que estamos em dominância fiscal que é quando os juros não conseguem mais cumprir seu papel de derrubar os preços, dada a situação de "gastança da máquina pública e a continuidade dos déficits". Na verdade, os juros maiores elevam os custos financeiros de todo o setor empresarial. Como um dominó, sobem os custos de toda a cadeia de produção, transportes e comercialização da indústria e serviços do país. Repassados para os preços, e dada a enorme indexação de nossa economia, tudo acaba capturado pelos índices de preços, que serão usados para correção de salários, preços de aluguéis, câmbio e produtos em geral. Os juros elevados são os principais elementos realimentadores da inflação. *** Juros pornográficos alimentam, no entanto, os rendimentos dos títulos públicos, na mão dos grandes bancos, grandes agentes financeiros, grandes empresários com geração própria de caixa, grandes fortunas individuais. Talvez os 141 mil cidadãos a que o governo se propõe agora a tributar, e que o Congresso já deu sinais de discordância. Aplicações no mercado financeiro, para famílias de classe média mais alta, acabam trazendo perdas, caso tenham que vender os títulos. Ocorre que o preço dos títulos cai com a elevação dos juros. O raciocínio é simples: se um título que custou 100 paga juros fixos de 10% ou 10 reais em um ano, com juros maiores, de 20%, eu teria o mesmo rendimento de 10 reais com um título de 50. Logo, se precisar vender sua carteira de títulos, haverá perda. *** Conclusão: só se beneficiam os grandes interesses financeiros, aqueles que parecem trazer o Banco Central como refém. O que torna o Banco Central um dos principais agentes do processo de distribuição desigual, iníqua, injusta e vergonhosa da renda em nosso país. Pornográfica mesmo. É isso.