Impossível, nos episódios que assistimos e nos tempos que o país atravessa, não nos deixarmos ser influenciados por alguns acontecimentos tornados públicos, alguns de natureza francamente particular, todos igualmente trágicos.
Como não estamos alienados do mundo à nossa volta, tal situação permite que dramas particulares ganhem uma dimensão gigantesca, como que inflados justamente para ocupar o vazio de notícias relevantes ou fatos realmente importantes ou até mesmo da apresentação de debates saudáveis, sobre a nossa sociedade, nosso ambiente político, nossa economia.
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Antecipo que não quero que nossa imprensa, a mídia se preocupe a ficar apenas repercutindo atos e fatos considerados de caráter nobre, ou de espírito elevado.
Acho que uma imprensa assim, rósea ou candidamente influenciada pelo espírito de Pollyana seria muito chata.
E a verdade é que a imprensa pode até noticiar ou destacar, mas não é ela que cria os fatos. Os problemas. As tragédias.
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E, torpedeado por tais fatos, que de forma alguma nos dizem respeito e sobre os quais deveríamos nos abster de emitir juízos de qualquer espécie, acabamos sendo levados a participar, a emitir opiniões, apoiar ou torcer, manifestar-nos.
Ou ainda, no meu caso, a procurar refletir não apenas sobre os eventos e seus desdobramentos, mas sobre outras questões que os cercam, como a coincidência temporal dos acontecimentos.
E, ao dar margem para que o pensamento se transforme em passageiro dessa viagem que é o livre pensar, acabo estabelecendo algumas conexões, ligando alguns fatos que, sem qualquer vinculação causal entre si, dão margem a que cheguemos à conclusão de que, no universo, tudo conspira para que sua ocorrência se dê AQUI e AGORA.
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Senão vejamos: ocupa a presidência de nosso país, eleito democraticamente pela maioria dos eleitores que se dispuseram a ir às urnas, um político que sempre que se manifestou, o fez de forma a destacar sua visão machista, preconceituosa, homofóbica e autoritária.
Que em campanha o candidato tivesse explorado características auto-apregoadas de virilidade para se destacar e conquistar votos de uma parcela do eleitorado, pode ser compreensível, embora sujeito a críticas.
Mas, não devemos nos esquecer que esse candidato, já na oportunidade, sofria um processo movido pela deputada Maria do Rosário, sua colega de Câmara, por declarações com claro conteúdo de estímulo ao crime de estupro.
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Eleito presidente, esse candidato não perdeu a oportunidade, em várias ocasiões, de continuar manifestando sua intolerância, desde a escolha de ministros, como as Damares das cores de roupas, até a exibição em suas redes sociais de cenas do carnaval, com claro conteúdo erótico. Mas não ficou preso na chuva ou chuveirada carnavalesca, passando a protagonizar piadas ridículas sobre o povo japonês, além de outras manifestações descabidas, como a da censura à peça publicitária do Banco do Brasil, ou a assinatura do decreto de armas, etc.
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E aqui devo dizer que, justiça seja feita, o presidente, apelidado de Cavalão quando ainda estava no Exército, nunca mostrou outra imagem ou apresentou uma imagem falsa de sua pessoa ou de sua índole. Se votaram nele, ainda assim, é algo que, mais tarde, afastado do calor dos acontecimentos, deverá ser objeto de pesquisas em psicologia social, de massas, para entender o que representava tal "mito", no imaginário de seus seguidores.
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A ascensão de Bolsonaro e o papel de destaque que passa a ocupar, cada vez mais, no entanto, gera um certo aval, uma sinalização positiva, um certo estímulo a que aqueles que têm mentalidade tristemente comparável à sua, se sintam à vontade para dar asas a sua imaginação.
O que pode ser, mesmo involuntariamente e sem que o presidente compactuasse ou aprovasse tais comportamentos, uma explicação para o aumento recente dos casos de feminicídio, ou de violências policiais, para citar apenas alguns.
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Pois é nesse mesmo momento que vem a público mais dois casos, com ingredientes que misturam alguns desses mesmos elementos, "incentivados" por Bolsonaro.
O caso triste e lúgubre de MC Reaça, cujo espírito em busca de paz o levou ao auto-extermínio, e o caso de Neymar Jr. essa figura cada vez mais perdida, e seu assessor principal, seu pai, cada vez mais patético.
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Esse pitaco hoje não é para julgar a ninguém, nem apoiar a qualquer das partes envolvidas, nem condenar a quem quer que seja.
Seu sentido é muito mais destacar que em ambos os casos, do MC e do jogador, havia a questão da figura do macho alfa envolvido, da mulher submetida e/ou vítima, de agressões que podem ter sido físicas e até morais, e de certos tipos de reações típicas da autoridade que perde o controle da situação, quando contrariado por quem devia prestar apenas e tão somente obediência.
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MC Reaça ao que parece, deixou-se dominar pelo pânico, pelo temor de ter cometido um ato bárbaro e de suas consequências. Do pavor de não ter como encarar sua esposa e as famílias envolvidas.
Dominado por violenta emoção, preferiu a busca da felicidade sob outras vestes.
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Quanto a Neymar, infelizmente parece ter mudado muito.
Lembro-me ainda de quando o elogiava por ter adotado um ato dificilmente visto entre os rapazes que começam a se destacar e ganhar dinheiro, de grande maturidade como o do reconhecimento de seu filho.
Lembro-me de como se portou em todas as ocasiões em que estava presente seu menino, todas sempre dignas de elogios.
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Até me vem à memória uma reportagem feita pela Folha, há muito tempo, em que seu pai dizia que, apesar de estar já milionário, Neymar ainda pedia dinheiro para comprar até um carro, por não estar sob seu controle a administração do que ele recebia. Tudo para mostrar como Neymar era humilde, simples e um bom menino.
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Pena que o gênio tenha se deixado alterar em tão pouco tempo, ou que a máscara que lhe queriam impingir não conseguisse se manter por muito tempo.
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É isso, que MC Reaça descanse em paz. E os demais atores de nosso pitaco tenham condições de analisar e, até rever seus comportamentos.
Para o bem deles mesmos.
Para o bem do ambiente que estamos vivendo
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