Ouvido
na Comissão de Assuntos Econômicos do Senado no dia de ontem, o presidente do
Banco Central, Roberto Campos Neto, declarou não ser possível afirmar a partir
de quando os juros poderão começar a cair em nosso país.
Justificou
alegando que tem direito a apenas um voto no Comitê de Política Monetária – COPOM,
em meio a 9 votos.
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Fosse
eu mais maldoso, poderia achar que o problema é não ter sido ainda autorizado
ou recebido a ordem de reduzir os juros de seus patrões, os grandes magnatas do
capital financeiro rentista, especulativo e estéril.
Mas
não seria deselegante a tal ponto. Afinal, o neto do paladino do liberalismo
nacional, Bob Fields, mostrou que não é presidente do Banco Central à toa e que
sabe bem a importância da questão e do debate dos juros, que ele classificou de
meritório.
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Pelo
que vi nos jornais da noite, chegou até a falar que Lula tem o direito de criticar
os juros, situação que me dá tranquilidade: ao saber que o presidente do BC autoriza o
presidente eleito do país a se manifestar sobre política econômica.
Mas
Roberto Campos mostrou que entende de seu ofício: fazer a inflação convergir
para a meta ou trazer a inflação para a meta, sem elevado custo social.
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Em
sua defesa, argumentou com a obviedade
de que a inflação é o mais importante elemento de corrosão social, de
desorganização do ambiente econômico e gerador de concentração de renda e aumento
do grau de desigualdade.
Em
suma: a inflação penaliza os mais pobres, cujos rendimentos não lhes asseguram
acesso aos bens mais necessários, ao contrário da camada social mais
privilegiada, que consegue aplicar as sobras de sua renda no mercado
financeiro, aplicados a taxas de juros capazes de assegurarem remuneração
apropriada ao seu risco.
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Por
seu discurso, ao presidente do BC, pouco importa que a relação entre juros e a
decisão de investimentos seja negativa, ou seja, maior os juros, menores os
investimentos produtivos: aqueles que geram emprego, produção e mais bens e
serviços no mercado.
Em
sua opinião, para crescer o país deverá
atrair investidores – e investimentos. E, não reconhecendo a relação citada
acima, insiste em que basta ao governo cortar gastos e reduzir ou estabilizar a
proporção de dívida bruta em relação ao PIB, que estará feito o passe de mágica
para o crescimento.
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Em outro momento de sua fala, explicou a mecânica da calibragem da tomada de
decisão quanto aos juros pelo COPOM baseada no sistema de metas, afirmando “ser
muito difícil hoje um país seguir o sistema de metas que a gente segue sem ter
um regime de disciplina fiscal.”
Lembremos
que esse sistema de metas, cuja única ferramenta disponível é a taxa de juros é
hoje muito questionado, inclusive por aqueles que consideram ser a inflação
causada apenas por excesso de demanda, o que está longe de ser nosso caso
atualmente.
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Recordemos
que tal sistema se insere no conjunto de políticas propostas no âmbito do
pacote ideológico do neoliberalismo, que condena qualquer ação do Estado no ambiente
econômico, de forma a criar cada vez mais espaço para a atuação sem limites (e
exploração da sociedade) pelas garras do capital.
Além
disso, há que se destacar que, parte da argumentação em que se assenta o
sistema de metas é a influência das expectativas de inflação feitas pelo
mercado.
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Daí
a razão de o BC pesquisar e publicar semanalmente as expectativas que os agentes
e instituições poderosas do mercado criam e que impõem a todos.
Aí
é que entra a questão das expectativas trazidas pelo “arcabouço fiscal” que ele
considera ter sido um movimento na direção certa. Embora candidamente tenha admitido
não haver relação automática entre a apresentação da nova regra e o corte de
juros.
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E
essa é uma questão que me preocupa. Muito.
Até
aqui defendi a nova regra fiscal proposta em comparação à fatídica regra do teto
de gastos. Afinal, a outra nunca foi cumprida nem pelos liberais do último
governo (como bem sabe o bolsotário que dirige o BC).
Tenho
afirmado que melhor uma regra que nenhuma. Que melhor uma regra que incorpora o
crescimento vegetativo da sociedade para definir valores mínimos para variação
dos gastos públicos, sociais principalmente.
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Condicionar
gastos públicos ao comportamento da arrecadação, limitando o crescimento das
despesas a 70% da variação da receita é algo com que não concordo. Mas, vá lá: no
momento é o que a correlação de forças permite ser aprovado.
Ruim.
Mas melhor que o que tinha. Ainda mais se tivermos uma reforma tributária progressiva,
taxando pesadamente grandes fortunas, heranças, grandes rendas. E liberando as
classes mais pobres de pagar impostos pesados que incidem sobre consumo.
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Mas,
quando o presidente do BC e os representantes do capital financeiro manifestam-se
favoráveis à nova regra, desvinculada da Reforma Tributária que necessita ser
feita (e que dificilmente será a possível!), começo a perceber que a luta para
tornar o país mais justo e menos desigual ainda está longe de ser enfrentada.
Volto
ao tema dos interesses do capital financeiro na limitação dos gastos públicos
em outra oportunidade.
Até
lá, resta-nos o topo do ranking infeliz de juros reais mais elevados do
planeta.