terça-feira, 30 de novembro de 2021

Uma sociedade que está se acostumando à morte e parece ter passado procuração para que matem em nome do que acha o certo

 Um idoso que urinava na rua é falsamente acusado de pedofilia por uma mulher ligada ao tráfico. Indignada a população reage,  promove um linchamento e mata o homem.

Para a delegada, “esse tipo de crime de pedofilia, de estupro, a comunidade .... não tolera. Naquela comunidade não seria diferente. Então, foi morto de maneira cruel”.

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Outro homem, de 52 anos, foi morto a tiros e pedradas na Região Metropolitana de Belo Horizonte, sob a mesma acusação de pedofilia feita por uma vizinha. O

Apesar de negar as acusações, o homem foi chamado a um encontro, onde 2 mulheres e 5 homens o aguardavam. Os homens o agrediram e um disparou um tiro em sua cabeça.

Testemunha afirma que as mulheres gritavam: “Tem que matar. Pedófilo tem que morrer.”

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De há muito sabe-se que se a Polícia prender um homem acusado de estupro em uma cela apinhada com outros homens, ele será justiçado e não permanecerá vivo por muito tempo.

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No Rio, na comunidade de Itaúna, que integra o complexo do Salgueiro, um sargento é morto durante um patrulhamento.

Operação feita pelos soldados do BOPE, para identificar e prender os responsáveis pelo assassinato de seu colega, além de procurar retirar outros policiais que estavam no interior da comunidade, resulta em 8 corpos encontrados em área de mangue,  pela população.

Um nono corpo foi encontrado depois.

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Investigações revelam que foram disparados mais de 1500 tiros.

Apesar disso, o atual governador do Rio, que assumiu o cargo em razão do impeachment daquele outro, que comemorava com pulinhos de alegria o fuzilamento de bandidos, afirmou que “Coisa boa não estavam fazendo.”

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Em atitude típica de ‘chumbo trocado’, outro policial militar, Jamilton Machado de Assis foi morto nessa terça feira, dia 30 de novembro, baleado na cabeça, dentro de uma viatura que fazia patrulha na Zona Norte do Rio de Janeiro. Pai de família, dois filhos gêmeos.

A polícia faz buscas na região.

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No estado de Goiás, a Polícia está à procura de um caseiro, acusado de matar a mulher grávida, a enteada de menos de 2 anos e um fazendeiro vizinho.

Não satisfeito, tentou estuprar a mulher do fazendeiro, que se salvou apenas por se fingir de morta.

Os motivos dos crimes ainda são desconhecidos.

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Mas, independente da espécie do crime, o que eu gostaria de tratar era da banalização da vida.

Ou pior, no caso da série de crimes de feminicídio que vêm ocorrendo em sequência, de como alguns indivíduos se acham dotados de um direito de propriedade sobre a moral, o comportamento, a vida de outras pessoas.

Donos que acreditam ser, acham-se no direito de disporem de sua propriedade como bem quiserem, como alguém que chuta um móvel, ou um objeto que estava em seu caminho. Como alguém que tem o sagrado direito de punir o autor de ato com que não concordaram.

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Punir, inclusive com a morte. Apenas por que, ao manterem algum tipo de relacionamento conjugal ou romance, oficial ou não, passam a se considerar donos, como se a aceitação pelo outro fosse, necessariamente o sinal de submissão plena.

De anulação da personalidade e desejos da companheira.

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Em outros casos, a transferência pela sociedade das atividades ligadas à sua segurança a uma instituição  adequadamente preparada, qualificada,  treinada e até armada para exercer as funções de controle da ordem e bem estar, do policiamento, da investigação de atos definidos como criminosos e atentatórios aos direitos e aos princípios morais e bons costumes, parece dotar a Instituição, no caso a Polícia, do direito de decidir como agir, e o que fazer, uma vez cumprido, com êxito, seu dever.

Parece-me que os policiais se arvoram, em algumas ocasiões, não apenas de guardiões da segurança e da lei, em proprietários da vida pública e da própria sociedade.

A partir desse sentimento de propriedade ou posse, não aceitam aquilo que não corresponde aos valores por eles defendidos.

Qualquer transgressão transforma-se em uma afronta, que merece castigo pesado e imediato.

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Dessa forma, a sociedade, desigual por natureza e nada pacífica ou cordial, vai internalizando as lições que aprende com aqueles que deveriam existir justamente apra impedir que procedam baseada na força e na barbárie.

A população aprende e passa a achar que está autorizada a agir de maneira agressiva e violenta, contra aquilo que não lhe agrada ou provoca sofrimento.

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O resultado é a cada vez maior banalização da vida, contra a qual acho ter chegado a hora de nos insurgirmos.

Antes que a lei de Talião e a vingança pura e simples se transforme em norma de convívio social.

De minha parte, eu não dei a ninguém autorização para matar em meu nome ou em minha defesa. De minha parte, não concordo em respeitar os direitos humanos para humanos direitos, até por não ter dado mandado a ninguém para definir por mim o que é ser direito.

Não concordo com a realização de chacinas, como forma de lavar a honra de quem quer  que seja, muito menos de Instituições preparadas para prender criminosos e PERMITIR A REALIZAÇÃO DA JUSTIÇA.

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Estejam ou não fazendo boa coisa, conforme a ótica do governador do Rio, eram seres humanos, falhos e criminosos. E se cometeram crimes, que a pena da lei lhes caia sobre a cabeça de forma pesada.

Mas, dentro da LEI.

Até como forma de evitar que as pessoas passem a refletir se o comportamento justiceiro teria sido o mesmo, se o tiro que matou um policial de serviço fosse dado em condomínio de brancos ricos. Ou por colegas fora do plantão policial. Ou por milicianos.

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Nosso arcabouço jurídico, legal, não prevê a pena de morte.

Felizmente o tal excludente de ilicitude é apenas ato destinado a suprir a falha de caráter de quem defende tal proposta.

Pessoa nenhuma pode se arvorar em dono de quem quer que seja ou da vida (a sobrevivência fora do útero) de outro ser humano, como forma de punição por comportamento hediondo.

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Para encerrar, trato da questão da normalização da morte em nossa sociedade, em tempos em que, graças à vacinação e medidas de restrição e distanciamento, vamos abrindo as cidades para as atividades normais da vida humana. Incluída a diversão necessária e os grandes encontros festivos.

Afinal, ninguém é de ferro. Não podemos ficar isolados e trancados em casa. Somos seres sociais. Gregários.

E o número de mortes já caiu drasticamente, o que mostra que a pandemia já foi vencida.

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Mas apenas ontem foram 114 óbitos. A média ainda é equivalente aos efeitos trágicos de um grande acidente aéreo.

Mas, nos acostumamos, tristemente, à morte diária de apenas 200 seres humanos. Parentes, maridos/esposas, filhos/filhas, pais ou mães, gente como a gente.

Até atleticanos prontos para soltar o grito de Campeão que trazemos na garganta há 50 anos.

A prudência e a experiência de 77-78 nos faz deixar para tratar do Galo em um próximo pitaco.

quinta-feira, 18 de novembro de 2021

O que dá para rir, dá para chorar? E pau que dá em Chico, dá em Francisco? Reflexões sobre a desoneração da folha

Em 1969, o grupo musical Originais do Samba, ao qual pertencia o inesquecível Mussum, fazia sucesso com uma música de autoria de Billy Blanco,  “Canto Chorado”, cuja primeira estrofe dizia:

O que dá pra rir, dá pra chorar

Questão só de tempo e de medida

Problema de hora e de lugar

Mas tudo são coisas da vida...

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Aqui faço um parênteses para mais uma vez render homenagens à Marília Mendonça, nesses tempos da perda lamentável e precoce da  talentosa rainha da sofrência, em acidente aéreo.

É que mais à frente, a mesma Canto Chorado, tem um verso que nos fala e até tenta definir esse sentimento tão nacional, a sofrência:

Só mesmo a palavra sofrência

Em dicionário não tem

Mistura de dor, paciência

Que riso que é pranto também.

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Mas o pitaco não é sobre sofrência ou música, mas de como uma mesma situação permite abordagens tão contraditórias, a depender da visão ou interesse do analista do fato.

Refiro-me, especificamente à política de desoneração da folha de pagamentos adotada pelo governo Dilma, em 2011, destinado a permitir a 4 setores intensivos em mão de obra (call center, TI, confecções e calçados) a redução do custo de manutenção do emprego formal.

Deixando de pagar a contribuição previdenciária sobre a folha, substituída por um percentual sobre o faturamento bruto das empresas, o governo visava a manutenção do nível de emprego, a adoção de planos de demissão e melhorar a competitividade das beneficiárias.

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De 4, a medida se expandiu para 12 setores em 2012 e para 56 setores em 2014, consequência das pautas bomba tramadas pelos golpistas do Congresso, à frente Eduardo Gomes e o moleque Aécio Neves.

Naquele 2014, Dilma anunciou que a desoneração passaria a ser permanente para todos os setores que se aproveitavam do benefício, cuja contrapartida eram a criação de déficits crescentes para o INSS, rombo que era transferido ao Tesouro, agravando a situação das contas públicas.

Em 2015, em meio ao desespero e ao retorno ao receituário liberal,  Dilma tentou retroceder, reduzindo o percentual da contribuição sobre a receita bruta, medida que serviu apenas para solapar de vez qualquer apoio junto aos setores empresariais.

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 A reação dos meios de comunicação às medidas foram sempre controversas.

A revista Carta Capital, por exemplo, em edição recente, de 2 de setembro de 2021, traz a matéria com a seguinte chamada: “Herança da era Dilma, prorrogação da desoneração divide opiniões”.

Logo abaixo, ao chamar a atenção para o ressurgimento da proposta de se tentar conceder o mesmo alívio aos empresários até 2026, assinala que políticos e pesquisadores divergem sobre os impactos.

Citando estudo do IPEA de 2018 cobrindo o período de 2012 a 2015, revela a ausência de efeitos da desoneração na geração de empregos.

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Outro estudo citado, realizado pelo governo em 2020, indicou impacto previdenciário de 28,8 bilhões no mesmo período do governo Dilma.

A própria Central Única dos Trabalhadores, criticou  a medida, por não gerar novas vagas e permitir aos empresários utilizarem os valores economizados para aumentarem seus lucros.

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Em pleno período dos avanços da operação Lava Jato (a Vaza Jato), do escândalo do petrolão e do aprofundamento da crise econômica que jogou o país em ao menos 3 anos de séria recessão, a reação crítica dos grandes veículos de imprensa, orquestrada em um samba de uma nota só, talvez fosse justificável.

Afinal, os empresários beneficiados não honraram o prometido e demitiram (alegam que as demissões teriam sido maiores). O rombo herdado do governo Dilma foi avaliado no equivalente a meio programa Bolsa Família e a própria presidenta fez um ‘mea culpa’ arrependida de ter acreditado que reduzir impostos levaria a novos investimentos.

Segundo Dilma, “Eu diminuí. Eu me arrependo disso. No lugar de investir, eles aumentaram a margem de lucro”....

(Aqui importa lembrar as lições de Keynes: o empresário investe se tiver expectativa de demanda, e situação econômica estável.)

Após o golpe de 2016, o governo conseguiu reduzir o benefício para apenas 17 setores e o atual presidente vetou uma proposta de prorrogação da desoneração para todos eles aprovada no Legislativo.

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No entanto, sob intensa pressão dos empresários e da aproximação do ano eleitoral de 2022; sob pressão dos representantes eleitos pelo povo, também de olho nas futuras eleições, e sob a desculpa da elevação do desemprego em função da pandemia, o governo mudou sua opinião e seu discurso.

Aprovada na Câmara, a medida da prorrogação, ao menos até 2023, deve ir ao Senado com a promessa de ser aprovada em rito sumário e, então irá à sanção do presidente, que já se comprometeu em não alterar a medida.

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Guedes, o ministro fanfarrão, que parece levitar e vê tudo de cima, talvez sob a influência de uma atmosfera mais rarefeita e rósea, ou sob algum tipo de droga vinculada ao poder, já deu seu 'de acordo'.

Concorda com a prorrogação da desoneração, como concorda com a promessa de seu chefe de conceder reajuste aos servidores públicos. 

Aqui, a ideia é dar uma esperança fake, para que os funcionários (principalmente no legislativo e no judiciário) pressionem os parlamentares para que aprovem a PEC do calote. 

Mas, enquanto vê a economia brasileira crescendo mais que média da economia mundial nesse 2021 e prevê crescimento em V, maior que a média para 2022, Guedes nos informa também em evento promovido pelo Banco Itaú que: 

 "O teto de gastos é apenas um símbolo, uma bandeira de austeridade. Não podemos ser dogmáticos a respeito dele. A prova é que fôssemos respeitar o teto, teria sido uma tragédia econômica e sanitária mais agravada (em 2020)."

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Vivendo e aprendendo, ou talvez tenhamos que saudar o pensador e teórico brilhante, que está trazendo inovações ao pensamento liberal que diz professar. 

Em meio a tanto disparate, e em relação à prorrogação, a imprensa, mesmo que de forma acanhada e desconfiada em relação aos impactos da prorrogação sobre a situação fiscal do país, apenas informa. Evita criticar. Talvez até ria.

O que dá para rir, dá para chorar. Ou dois pesos, duas medidas.

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Mas, já de há muito, sabe-se que pau que dá em Chico (se Chico for negro, pobre, favelado),  não vai dar em Francisco (branco, de classe média, morador em zonas de maior padrão aquisitivo nas nossas cidades).

Quer testar, pergunte à Polícia. Ou veja os mapas da violência em nosso pais. Em especial, consulte mortes em confrontos policiais.

quarta-feira, 17 de novembro de 2021

Liberalismo e Economia Brasileira: um caso de amor bandido, não correspondido

                                 “Já não se fazem liberais como antigamente, nem antigamente.” (Paulo Bretas)

O início do período republicano no Brasil não introduz qualquer alteração relevante na estrutura de nossa economia, caracterizada como primário exportadora, recém-saída da escravidão.

Era uma economia concentradora de renda e excludente, baseada na produção e exportação de café, cujas receitas propiciavam os recursos para a importação dos bens de consumo e outros bens, destinados ao atendimento da demanda da parcela mais privilegiada da população.

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Do ponto de vista internacional,  atravessávamos o período de hegemonia e expansão dos interesses comerciais e financeiros do imperialismo inglês (a Pax Britannica), justificada pelas vantagens atribuídas ao livre cambismo.

Assim, não é de surpreender que a economia brasileira adotasse um modelo de desenvolvimento voltado para fora, fundado em  uma política tipicamente de cunho liberal, sob controle das oligarquias agrário-exportadoras.

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Tal constatação fica mais evidente em razão da fragilidade do governo central na República Velha, sob o domínio político dos interesses dos Partidos Republicanos estaduais, onde se reuniam as oligarquias estaduais, compostas pelos grandes fazendeiros (os coronéis), em detrimento dos anseios das camadas urbanas e da maioria da população do país.

Como consequências do citado modelo de desenvolvimento e das políticas a ele atreladas, podem ser mencionados alguns traços que vão implantar ou apenas reforçar algumas das características que passam a definir o perfil de nossa sociedade e de suas mazelas, valendo listar: um padrão extremamente concentrado de propriedade e de renda; a inserção em um padrão de trocas desiguais, que acarreta uma deterioração cíclica das relações de intercâmbio, em desfavor de nosso equilíbrio externo; a perpetuação de uma situação de dependência de financiamentos externos, dentro de uma lógica de relações desiguais centro-periferia. Em alguns períodos, em especial no interior do país, vale citar o fenômeno da carestia, expressa pela elevação de preços dos produtos de consumo básicos.

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 Este panorama vai ser alterado a partir da crise mundial dos anos 30; da eclosão da Segunda Grande Guerra, que contou com o envolvimento das principais economias industrializadas do mundo; e o surgimento de uma escola de pensamento econômico na América Latina com uma proposta de industrialização nos países da periferia com base em forte papel do Estado, segundo um modelo de nacional-desenvolvimentista.

No entanto, a destruição dos aparelhos produtivos dos principais países industrializados envolvidos naquele conflito levou a que a economia brasileira reduzisse seu comércio internacional, embora com as receitas de exportação do café se retraindo em menor proporção que suas importações,  agora fornecidas por produtores norte-americanos.

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Por esse motivo, ao final da guerra, enquanto o Brasil apresentava um razoável estoque de reservas internacionais, enquanto a escassez de produtos de consumo oriundos de exterior dava suporte a um processo inflacionário.

No Brasil, do ponto de vista político, os ventos democráticos decorrentes da derrota dos governos autoritários na Europa provocou um movimento que culminou com a derrocada da ditadura Vargas e a eleição de um novo governo, do general Dutra, para o mandato no período de 1946 a 1951.

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Embora o pensamento estruturalista da Cepal, que pregava a industrialização por substituição de importações começasse a ser implantado na América Latina,  o governo Dutra opta, ao assumir, por adotar uma política de cunho liberal, dirigida pelo empresário Gastão Vidigal, que propunha a liberação de importações como medida para o combate à inflação.

Não durou muito tempo para que se esgotassem as reservas cambiais do país, gerando uma situação de desequilíbrio no setor externo e ampliando sua dependência.

Além do desastre provocado em nossa situação externa pela adoção de políticas liberais, sem que qualquer mudança estruturante fosse adotada de forma a alterar o perfil de nossa economia, outros períodos e governos devem ser lembrados pela adoção de políticas econômicas baseadas na cartilha liberal.

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Assim, em 1964, após o golpe de implantação da ditadura militar, Roberto Campos no Planejamento e Otávio Gouveia de Bulhões na Fazenda foram responsáveis, pela adoção de uma política cuja prioridade era reduzir a inflação, então se aproximando dos 65% anualizados.

Imediatamente os ministros adotaram um arsenal de medidas propostas pela ortodoxia, como o afrouxamento da lei de remessa de capitais, visando atrair capitais externos; uma política de juros elevados que culminou com a quebra de grande parte das empresas de capital nacional, muito endividadas, num processo ironicamente apelidado de saneamento econômico; a derrubada da lei da usura, por meio da adoção do instituto da correção monetária;  além de de duas reformas classificadas como de caráter estruturante, de implementação possível apenas em tempos de regime autoritário, sem espaço para a discussão democrática: a financeira e a tributária.

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Por seus efeitos posteriores, destaco aqui as reforma, por sua capacidade de atuar tanto no esforço se criar mecanismos de capitalização e financiamento do setor privado de produção, a Reforma do Sistema Monetário, quanto no saneamento das finanças públicas, a Reforma Tributária.

A primeira, introduzindo a noção de um Sistema Financeiro, com a definição de agentes normativos e executivos, como Conselho Monetário Nacional e Banco Central,  e instituições operacionais, como bancos, financeiras e outros agentes de capital privado.

A segunda, a Reforma Tributária, atua reorganizando a estrutura de tributação do país, de forma a dotar o Estado de condições de ampliar sua arrecadação, reduzir seus gastos, diminuir a dívida pública, e poder criar instrumentos que favorecessem a formação de capital no país.

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Em suas teses de mestrado e doutorado, Fabrício Augusto de Oliveira destaca a importância da Reforma Tributária, para o desenvolvimento do capital privado no país.

Outro resultado da politica liberal foi a quebradeira de empresas, a desnacionalização da economia, a formação de uma elevada capacidade produtiva ociosa, as altas taxas de desemprego. Em resumo: ARROCHO.

Arrocho e crise, que geraram discussões e críticas, embora sempre intramuros, em especial no Exército.

A divergência termina com a chegada ao poder do segundo governo militar de Costa e Silva, a substituição dos economistas ortodoxos pelo pragmático Delfim Netto e sua proposta de promover o crescimento do país.

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Uma terceira experiência fracassada se deu com o professor Mário Henrique Simonsen, cuja política ortodoxa levou a críticas pesadas ao governo Geisel, e ao abandono do apoio até então hipotecado pelos empresários aos governos militares.

Eclipsado por seu companheiro Reis Velloso, do Planejamento, autor de novo Plano Nacional de Desenvolvimento,  Simonsen se dedicou a obter fontes de recursos externos para financiar o aprofundamento da industrialização por substituição de importações, agora nos setores de insumos básicos e bens de capital.

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Contando com o excedente de liquidez internacional e financiamentos a taxas de juros flutuantes, em razão da enxurrada de petrodólares no mercado financeiro internacional privado, Simonsen adotou a política de endividar o país, muitas vezes apenas para apresentar saldos capazes de estimularem os credores a nos fornecer mais créditos.

O equivalente a um pai de família tomar dívidas junto aos bancos para poder ostentar elevados saldos médios.

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A aposta, de altíssimo risco, poderia até ter funcionado, não ocorresse a a triplicação dos juros nos mercados de Londres e dos Estados Unidos, com forte impacto sobre o custo de financiamentos em escala planetária.

Essa aposta de crescimento com endividamento a taxas de juros flutuantes é, em parte, causa da crise da economia brasileira nos anos 80 e princípio dos anos 90, chamada de crise da dívida externa.

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Depois de Simonsen, tivemos a experiência liberal de Collor, e sua re-abertura dos portos do Brasil aos produtos industrializados internacionais, de melhor qualidade.

Segundo Collor, e com razão, os automóveis produzidos em nosso país eram autênticas carroças, graças a um atraso tecnológico que só poderia ser revertido sob o impacto de um choque de concorrência internacional.

No entanto, sem dar tempo para que as empresas aqui instaladas pudessem se preparar para a competição, o resultado dá origem a um processo de desindustrialização, em um país, ainda sob forte e crescente dependência externa.

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Processo de desindustrialização que tem impulso no governo FHC, que adotou, com algum atraso, todo o programa da cartilha neoliberal determinada pelo FMI, e consubstanciada no chamado Consenso de Washington: privatizações (privatarias), tentativa de redução do papel do Estado a um mínimo, a partir da preocupação com a geração de superavits fiscais - em particular na defesa de interesses de credores internacionais;  abertura da economia às importações e aos fluxos de capital, na chamada liberalização financeira; 

Vale lembrar a situação da economia brasileira ao final do período FHC, quebrada internacionalmente, necessitando recorrer ao maior financiamento internacional concedido pelo FMI até aquele instante (2002) e submetido a toda sorte de exigências e imposições do Fundo. 

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Por fim, os liberais reassumem a economia no início do segundo mandato de Dilma, evento conhecido como “estelionato eleitoral” patrocinado pela presidenta reeleita sob a bandeira do PT.

 Desde então, crescimento pífio e juros elevados, ampliação da desigualdade são as consequências das gestões de Joaquim Levy; Nelson Barbosa (este menos influenciado pelas ideias liberais); e Henrique Meirelles, no governo Temer. Por fim, a excrescência de Paulo Guedes, cuja carreira profissional e experiência, toda construída no mercado financeiro, nunca pode ser comparada a de qualquer um dos antecessores.

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Preocupações fundamentais com tripé macroeconômico; ajuste fiscal; manutenção de equilíbrio orçamentário; busca da zeragem do déficit primário; reforma de previdência e trabalhista, sempre em prejuízo de trabalhadores e dos setores mais carentes da população; lei de ouro do investimento; lei do teto de gastos, são o pré-requisitos defendidos pelos liberais para um processo de crescimento sustentado que sempre se frustra.

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Embora crítico da postura ortodoxa, não há como não reconhecer que um mínimo de racionalidade na qualidade dos gastos e em relação às fontes de arrecadação a serem aproveitadas, não deve ser ignorado, do ponto de vista estritamente técnico.

A questão muda de figura de forma significativa quando a realização de gastos, mesmo além da arrecadação obtida, se faz em casos de emergência, como o auxílio pago por ocasião da pandemia da Covid; ou no caso de se tentar mitigar a miséria de quase metade da população brasileira, até então, invisível para efeito da elaboração e execução do orçamento público, dando ao menos uma garantia mínima de alimentação e sobrevivência.

Nesse caso, o social deve se sobrepor ao técnico racional, o político ao tecnocrático.

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A pergunta que não  quer calar e razão desse pitaco é: se as políticas liberais sempre que implantadas resultaram em fracasso, qual a razão do apoio com que conta junto aos meios comunicação, seja nas empresas capitalistas dos meios de comunicação de massa, seja na mídia tradicional ou nas novas mídias digitais? Qual a razão do apoio de parte da classe média ou mesmo da classe menos favorecida e principal prejudicada pelos fracassos?

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Desde logo, devo reconhecer que o histórico feito aqui é superficial e apressado, não considerando os condicionantes, os diagnósticos, os planos, as estratégias, os objetivos de cada política em cada instante.

Importa também deixar claro que, ao criticar instantes pinçados de nossa realidade econômica, onde houve o predomínio de ideias de viés liberal, isso não significa não reconhecer erros havidos nas políticas adotadas por economistas de outras tradições, com resultados também passíveis de críticas.

Em minha defesa, argumento fajuto das limitações de tempo e espaço, aliadas ao meu desinteresse confesso em focar, de maneira crítica, vertentes que contam com minha simpatia.

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É minha opinião que o apoio que parte da população dedica à visão liberal, especialmente os setores que integram a chamada classe média, independente do significado que se atribua a tal conceito, desde que compreendam os profissionais liberais se deve a que as ideias divulgadas pela corrente de economia liberal estão arraigadas a uma falsa concepção de individualismo.

Embora admita que essa seja uma explicação simplória, o individualismo guarda relação com uma pretensa e fantasiosa igualdade de agentes em disputa no mercado. Que tem como ideia que o mercado se comporta baseado em uma regra simples, baseada no utilitarismo, segundo a qual todos anseiam o bem estar e o conforto, pelo qual se dispõem a fazer sacrifícios. Nesse sentido, quanto maior o sacrifício se dispuserem a fazer, maior o prêmio final.

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Fossem válidas essas idealizações do mercado e  dos motivos determinantes do comportamento dos agentes econômicos sempre tidos como racionais, a MERITOCRACIA se imporia como regra de funcionamento e explicação justa e inquestionável, tanto para os resultados do sistema econômico quanto da vida social.

A partir da hipótese de que todas as pessoas alimentam uma gama de ambições em distintos graus, e que acreditam em suas capacidades e seu potencial, cada sujeito tem a liberdade de ser e se tornar aquilo que acredita que é. Esta liberdade o convence da supremacia do mercado livre.

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A frustração de um indivíduo isolado ao se perceber parte de uma classe social, condicionada por sua forma de inserção no sistema produtivo e com resultados e ambições que lhe deixam pouca margem de manobra ou poucos graus de liberdade, é tão impactante que a maior parte dessas pessoas prefere comprar a imagem onírica que lhes é vendida pela visão liberal.

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Outra parcela da população -  os grandes empresários, os capitalistas em especial do setor financeiro, os rentistas, ou os grandes proprietários de terras, etc. dentre os quais nunca é demais explicitar a presença dos donos dos meios de comunicação e órgãos da imprensa, além de alguns grupos reduzidos de agentes públicos - sejam os representantes políticos, sejam os ocupantes de funções consideradas mais nobres, como magistrados -  só se beneficiam da ficção do funcionamento perfeito e equânime desse ‘deus ex-machine’ que é o mercado.

Como se aproveitam e se beneficiam, não estranha que apoiem e defendam as ideias liberais.

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Quanto à maioria da população, a ignorância, a falta de tempo para a reflexão das condições de vida que experimenta, em razão da necessidade de se focarem cada vez mais e exclusivamente, na batalha diária pela sua sobrevivência, impede de, mesmo sofrendo na pele as agruras do liberalismo, questionar as fontes de sua opressão e da fetichização a que, como mercadorias, são reduzidos.

 

quinta-feira, 11 de novembro de 2021

A aprovação da PEC do calote, da vergonha ou do BOLSOLÃO

Aprovada em votação de segundo turno pela Câmara dos Deputados na noite da última terça feira, a PEC dos Precatóriorios institui, de forma nada surpreendente, o que poderia ser o estopim capaz de desencadear uma ação de desobediência civil pela sociedade.

Afinal, em apenas uma tacada, a Câmara desrespeita o princípio do trânsito em julgado; faz pouco caso de decisões da mais alta instância jurídica do país; admite abertamente a prática do calote de dívidas; rompe contratos; e ignora o senso comum, que ensina que esgotados todos os recursos, decisão judicial não se discute,  cumpre-se.

Não bastasse isso, indica que regimentos e regulamentos podem e devem ser alterados de forma a atender a interesses de alguns grupos, que se acham investidos ou dotados de poder suficiente para passar rasteiras em quem quer que se lhes oponha, bem à feição de Eduardo Lira ou Arthur Cunha. Ou Arthuardo Licunha.

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Além disso, a aprovação da PEC é sintomática de que as leis não devem ser entendidas como normas de controle de comportamentos e ações de indivíduos ou grupos, destinadas a promover, dentro dos princípios aceitos pela sociedade e de forma estável, as bases da convivência social.

Não se caracterizando como regra estável, as leis podem ser mudadas de acordo com as circunstâncias do momento, pela vontade e a força de uma maioria momentânea, de ocasião, em flagrante desrespeito ao direito das minorias.

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Em última análise, ao abrir a oportunidade para que o governo possa romper o limite legal que criou o teto de gastos, o comportamento da Câmara joga no lixo também mais essa lei.

Aqui vale uma observação: por mais que, particularmente, sempre me filiei àqueles grupos críticos à lei e aos seus efeitos deletérios, não há como não recordar o provérbio: “Dura lex, Sed lex”.

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O problema maior da votação, e da sinalização para a tolerância em relação à desobediência civil é que, infelizmente, sabemos que essa ação é, mais uma vez, uma via de mão única. Ou seja, o governo e seus cupinchas, ou cúmplices, podem agir ao arrepio da lei, e se tornarem inadimplentes.

O cidadão normal - esse que trabalha, constrói com seu esforço e suor a riqueza do país, que alguns mal intencionados vão dilapidar em proveito próprio-  esse cidadão que não se atreva a adotar o mesmo padrão de comportamento de seus representantes legislativos.

Para o cidadão comum, a punição é sagrada. E pesada.

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De mais a mais, no momento político e institucional que o país atravessa, não há motivo algum para se apoiar um comportamento de desobediência civil que, se adotado por toda a sociedade, ao contrário de enfraquecer, poderia levar a um recrudescimento das atitudes autoritárias e de destruição do Estado democrático de direito que o governo não esconde ser sua intenção.

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Mas, o maior problema da aprovação da PEC pela Câmara, da forma como ocorreu,  é que a conduta da direção da Casa e do fantoche que a preside, definida e patrocinada pelo executivo federal, reetabelece,  de forma despudorada, a velha e criticada política da compra de votos.

Todos aqueles que achavam estar livres do mensalão sob suas várias colorações partidárias, e votaram em quem prometia o combate à corrupção, assistem atônitos, à instauração do BOLSOLÃO.

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Independente de este resgate das práticas de corrupção e malversação de recursos públicos estar com dias contados, em razão da acertada decisão, tomada em boa hora pela maioria do Supremo, que obriga a transparência da destinação dos recursos de emendas.  

Ao menos com dias contados, sob essa forma pornográfica das Emendas do Relator.

Afinal, mais de 20 bilhões de emendas do relator foram pagas em 2020, e outro bilhão teve o pagamento autorizado apenas na véspera da votação do primeiro turno. Apenas na virada do mês de novembro, 3,3 bilhões de reais empenhados, conforme dados divulgados ontem 

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O que revela que, ao contrário dos princípios que devem nortear o processo de criação das normas legais – transparência, impessoalidade, moralidade,  etc. – a lei (no caso a orçamentária) é tratada, aqui no Brasil, como o instrumento para a utilização de todo o arsenal de ‘sacanagens’, análogos àqueles que ocorrem no ‘escurinho do cinema’.

A expressão pode chocar, mas revela de forma fiel, o modo como alguns maus políticos optam por se relacionar com os seus eleitores.

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Mas, aberto o cofre, vamos ao que conta.

Qual a necessidade e motivação real por trás da PEC?

Segundo o governo, a implantação de um programa de transferência de renda, chamado Auxílio Brasil, e a necessidade de se financiar tal programa, cuja necessidade ninguém em sã consciência pode negar.

Mas, por que a criação desse Auxílio Brasil causa tanta discussão, se em tese, todos concordam com ele, e ele é apenas um substituto do programa Bolsa Família, merecedor de tanto reconhecimento, inclusive internacional?

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Aqui tem início o problema e a confusão.

O novo Auxílio não substitui e é muito inferior em sua concepção ao Bolsa Família. Além disso, aproveita muito pouco a estrutura, a experiência, a forma de gestão já testada do programa anterior.

Daí não ser apenas uma ampliação dos valores a serem transferidos para as famílias beneficiárias, nem do número desses potenciais beneficiários.

Na verdade, na visão distorcida e eleitoreira do presidente, há que se sepultar o Bolsa Família petista. E criar algo, qualquer coisa, mesmo que parecida, embora sem sustentação.

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Pois a proposta do Auxílio Brasil, é tão somente eleitoreiro. E tem prazo de validade.

O auxílio e os recursos para seu financiamento duram até dezembro de 2022.

E depois ... o dilúvio???

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Mas, para bancar o Auxílio, de onde viriam os recursos?

Parte,  do golpe desferido contra o conjunto de cidadãos, já prejudicados por erros e falhas do governo, sempre muito eficiente em cobrar,  e mau caráter para cumprir suas obrigações. Dessa inadimplência ou calote dos precatórios, estima-se a obtenção de R$ 44, 6 bilhões.

Outros 47 bilhões deverão vir da alteração na forma do cálculo da inflação utilizada para a correção dos valores de gastos orçados.

A alteração da metodologia, que corrige os valores não pela inflação acumulada em 12 meses até junho do ano anterior, mas pela inflação apurada até dezembro, em uma economia vivenciando índices crescentes de inflação, permite uma maior sobra do limite ao governo.

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Em português claro, trata-se apenas de um artifício tecnicista para permitir o estouro do teto de gastos, em 2022. Com consequências futuras, quando se quiser e a necessidade impuser o retorno da regra fiscal.

A geração de uma brecha fiscal que libera 91,6 bilhões para o governo bancar os 400 reais pretendidos para cada um dos 17 milhões de beneficiários ultrapassa em alguns bilhões o gasto total do programa.

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E o que será feito com os valores excedentes?

Ao que se sabe, algo em torno de 10 a   12 bilhões irá para financiar as emendas de relator. Aquelas que serviam,  até ontem, para que deputados comprometidos com a corrupção do governo atual, possam assegurar sua re-eleição. E, assim, assegurar a tranquilidade ao atual presidente, caso infelizmente reeleito, de mais 4 anos de destruição da estrutura do Estado, para a implantação de um Estado de terror e de barbárie.

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Resta apenas pressionar para que a Câmara Alta (Senado) - ao que parece mais consciente das necessidades sociais e de suas responsabilidades que os seus colegas de Câmara (baixos) -, não dê ao governo e aos seus interesse pouco republicanos os votos necessários para a aprovação da PEC, cujo melhor apelido seria a PEC da vergonha. Ou PEC do Bolsolão.

 

quarta-feira, 10 de novembro de 2021

A PPI de Pedro Parente e os preços de combustíveis; gasolina a 8 reais; Se fosse imputável, a CVM já deveria ter aberto processo contra falas de privatização do presidente; E o Bolsolão

Criada por Pedro Parente no início do governo Temer, em 2016, a Politica de Paridade de Importacao - PPI, é a base da determinação do preço dos combustíveis adotada pela Petrobras.

É esta política NEFASTA que justifica a constante elevação dos preços de derivados do óleo cru, com destaque para a gasolina, já a R$ 7,00 o litro e o diesel.

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A adoção da PPI visa evitar a defasagem entre o preço internacional desta importante ‘commodity’ e os preços praticados pela estatal, cujas plantas, inadequadas para o refino do óleo pesado extraído no país, obriga a continuidade da importação de óleo de qualidade superior para permitir a produção de combustíveis de melhor qualidade.

Ao lado disso, e tendo em vista a decisão de seguidos governos, em priorizar investimentos nas atividades de pesquisa e exploração de petróleo,  reduziram-se os investimentos em nossa capacidade de refino. Por esse motivo e como nossas refinarias foram instaladas em época em que o país não era autossuficiente e necessitava importar o petróleo mais leve, nossa capacidade de refino encontra-se defasada tecnologicamente.

Situação que explica a subutilização das refinarias da Petrobrás, razão para o Brasil precisar de importar inclusive derivados como gasolina, diesel, etc.  importa ainda combustíveis

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Tais fatores sustentam os argumentos em defesa da paridade do preço internacional para evitar uma elevação de custos de produção dos combustíveis, e a preocupação em não se deixar criar uma diferença de preços domésticos, com resultante queda de receita.

Combinação explosiva, a redução da receita concomitante à elevação dos custos afetaria a rentabilidade da estatal, o que acarretaria prejuízos aos acionistas da companhia,  com consequências sobre sua capacidade de obtenção de recursos para financiar programas de investimentos.

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Não devemos nos esquecer que por ser uma companhia com atuação no mercado aberto, com ações em bolsa, mesmo o governo brasileiro sendo detentor da maioria das ações e do controle e gestão da empresa, a adoção de políticas que afetassem os interesses de acionistas minoritários poderia ter consequências, ruins para a saúde econômica e financeira da Petrobras, sujeitando-a a medidas de caráter jurídico, relativas à própria manutençãodo controle.

Mas se como empresa de capital aberto, a companhia deve se sujeitar a certas práticas regulamentares de governança, nunca devemos perder de vista o fato fundamental de a empresa ser uma estatal,  com atuação em setor estratégico para a economia do país.

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Para ilustrar este caráter estratégico, basta mencionar a importância dos combustíveis tanto em nossa matriz energética quanto especialmente na de transportes em nosso país; do impacto e do peso que alterações de preços destes produtos provocam na coleta dos índices de inflação; na externalidade negativa, que caracteriza o espraiamento da alta de combustíveis para outras mercadorias;  e por último, mas não menos importante, do papel que uma das maiores empresas de nosso país desempenhou desde os anos 80, de alavancagem para o desenvolvimento, principalmente tecnológico, de setores fornecedores de equipamentos e serviços.

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A adoção de uma política de compras pela companhia era, então, mais um instrumento dentro de uma politica industrial destinada a promover um processo de desenvolvimento industrial nacional para o país, além de coerente com as políticas macroeconômicas, em uma época em que o país ainda adotava um sistema de Planejamento.

Infelizmente, uma sucessão de governos de inspiração econômica neoliberal dissolveu este sistema de planejamento,  e sua visão de médio e longo prazo, substituída por uma visão míope, curto prazista, voltada apenas para os interesse rentistas e especulativos do capital financeiro.

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Em prejuízo de sua população, sujeita à volatilidade de preços dos combustíveis, a opção de se adotar a PPI,  retira do governo qualquer condição de afetar os preços praticados pela empresa, sujeitos a variáveis sobre as quais o governo não tem nem pode ter qualquer influência: o preço internacional do barril, fixado em mercado internacional fortemente oligopólico, de um lado, e de outro do preço do dólar.

Notamos que não há qualquer expectativa para que os preços internacionais do barril possam se comportar como apresentado nos compêndios iniciais e enganosos de princípios econômicos, a partir do jogo de mercado entre as forças de procura e oferta.

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E importa observar que,  mesmo o governo tendo à sua disposição instrumentos de política cambial, capazes de afetarem o câmbio, sua margem de manobras tende a ser mínima, dada a política de liberalização dos fluxos de capitais a que estamos submetidos. A liberdade de movimentos de capitais reduz os graus de liberdade para ações do governo que fica refém dos interesses dos detentores de capitais externos.

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Em economias cada vez mais interligadas, dependentes e associadas aos interesses dos proprietários de capitais externos, uma ameaça mínima aos estes interesses podem provocar o fenômeno de fuga de capitais, gerando subsequentes, constantes e excessivas deteriorações da moeda nacional.

Também crises políticas, assim como ameaças  de rupturas institucionais, devido à insegurança e incerteza que têm capacidade de gerar, têm efeitos similares sobre o câmbio.

E aqui não há como ignorar a carga potencialmente  explosiva que o (des)governo errático  e de viés golpista,  autoritario,  posto em prática por Bossalnato propicia.

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Daí que: majorado o preço do barril de óleo no mercado internacional,  a necessidade de se converter o preço do barril para reais, com base em um dólar cada vez mais valorizado,  obriga a Petrobras, via PPI, a promover aumento automátivo nos combustíveis, com o disparo de um circuito vicioso, que incorpora: aumento dos preços dos combustíveis, aumento dos custos de energia (e produção)  e  transportes; aumento da inflação e realimentação das expectativas inflacionárias, com impactos sobre nova depreciação cambial.

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Nessa hora, o presidente inepto e inapto, desesperado para se reeleger e assegurar mais 4 anos de fuga em relação ao momento do acerto de contas de seus vários crimes e de sua familícia, ameaça intervir  nos preços, dando subsídios para derivados  específicos.

Chega ao cúmulo de manifestar vontade de privatizar a estatal, pela venda das ações em poder do governo.

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Só tal declaração, feita pelo responsável pelo controle da empresa – que tem ações em bolsa – já é motivo para que a CVM abrisse processo administrativo contra este energúmeno, por divulgação de informações falsas, capazes de provovar alterações no valor desses papéis.

Talvez a CVM considere o chefe do executivo inimputável. Mas a manipulação ou difusao de informações falsas é passível de investigação e apenação.

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Pior é o energúmeno fazer tais ameaças, parecendo crer em uma alteração da politica de preços em mãos da iniciativa privada, que por algum milagre, não iria se esforçar em buscar a a maximização de seus  lucros e dos dividendos de seus acionistas, em favor de interesses de cunho político e social do povo brasileiro, pela simples transição de controle do setor público para o privado.

Ou a hipótese mais plausível e mais nefasta: de que a ameaça serve apenas para que este estrupício possa, mais uma vez, se eximir da responsabilidade de adotar medidas que permitam preços mais estáveis e mais adequados à estrutura de custos da nossa economia.

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Se for esse o caso, ele estaria agindo como  agiu em todos os momentos e circunstâncias em que se defrontou com problemas: transferindo suas responsabilidades para outras esferas.

Ou para usar um termo da moda: TERCEIRIZANDO as responsabilidades. Como tentou fazer ao tansferir a culpa das alterações de preços de combustíveis do ICMS, constantes há anos, e dos Estados.

Tal postura serve para apenas para escancarar sua preocupação nula  com a situação da população e até dos caminhoneiros  que alega defender.

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Durante a noite de ontem, quando a pátria mãe, tão distraída já se preparava para dormir, o Congresso, Liracunha, o mentecapto guedes, conseguiram a aprovação da PEC do Calote, ou dos Precatórios, descumprindo decisão judicial, e abrindo rombo fiscal para financiar a farra de gastos eleitorais de deputados e do presidente.

Mais um crime que o presidente deverá explicar, a partir de 2022, este BOLSOLÃO. Sobre o qual trataremos em outro pitaco.

terça-feira, 9 de novembro de 2021

Resgatando os pitacos de um mês de desatinos: relatório da CPI; cassação antecipada e futura da chapa de 2022; o presidente pária em viagem sem finalidade; Lira e o calote e segurança a bala em Minas

Existe sim, uma explicação para passar um mês sem vir postar qualquer pitaco: o fato de eu ter que admitir que estou longe de entender o nosso país. O que convenhamos não é qualquer privilégio meu, a julgar pela frase do grande Tom Jobim, de o Brasil não ser para principiantes.

Se a frase passou por uma adaptação depois do advento e posterior explosão da internet e das redes sociais, como nos revela o Google, tornando-se agora “o Brasil não é para amadores”, devo reconhecer estar longe de ser um expert ou um profissional.

Seja no que se relaciona à ocorrência de eventos (que se sucedem como autênticas ‘jabuticabas’), quanto com referência ao ritmo em que os fatos se sucedem,  mesmo os mais esdrúxulos.

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Convenhamos que os desatinos são tão avassaladores que fica difícil tecer comentários sobre qualquer um deles, já que sempre atropelado por outro ou outros, o que me leva a uma dificuldade: dentro de tanta excrescência, qual merece ser objeto de meu pitaco?

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Apenas nesse último mês vimos, por exemplo, o encerramento da CPI, e a leitura de um relatório que, conforme consta, foi redigido com assessoria e aconselhamento de grandes juristas de nosso país. Um deles, Miguel Reale Jr., um expert em argumentação pró golpes e até impeachments.

Não apenas pela orientação jurídica de qualidade, - só tornada possível por ser fruto de um trabalho digno de todo o elogio, pelo nível de aprofundamento da investigação por parte da Comissão da Covid e dos senadores dela participantes -, o documento deveria ter destaque muito superior ao que, em minha opinião, conseguiu gerar.

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Assim é que entregue com pompa e circunstância, discursos e até cobrança por parte do presidente dos trabalhos, o senador Omar Aziz,  ao Ministério Público Federal, na pessoa de Augusto Aras, o documento parece não ter causado impacto nem ter tido força suficiente para animar o Procurador Geral a dar consequência imediata às investigações.

Ao contrário, na própria imprensa e até em círculos mais respeitáveis da esfera jurídica, como alguns dos ministros do próprio STF, manifestações em relação à dificuldade de se conseguir avançar em processos de criminalização do Executivo foram abordados.

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Ainda na área jurídica, até a opinião de advogados, alguns com a notoriedade da golpista Janaína Paschoal, ridicularizaram o Relatório, a investigação realizada, os pretensos crime imputados ao chefe do governo, contribuindo para reduzir seu impacto junto à sociedade e a relegá-lo ao esquecimento.

Na Câmara, onde o presidente Arthur Lira já se encontra sentado sobre uma pilha de mais de 100 pedidos de impeachment, a reação foi ainda mais gélida e distante. O que torna o relatório apenas mais um volume destinado ao esquecimento.

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Na área jurídica houve ainda mais: o Tribunal Superior Eleitoral depois de apenas 3 anos das eleições de 2018, levou a julgamento as acusações que pesavam contra a chapa eleita, relativas a abuso de poder econômico, em função de disparo em massa de mensagens de Whatsapp, e de mensagens portadoras de ‘fakenews’ e divulgações destinadas a prejudicarem adversários políticos.

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O placar de 7 a zero, ou seja, a decisão de não cassação da chapa por unanimidade, apenas serve para confirmar, em minha opinião,  a frase de Nelson Rodrigues, de que toda unanimidade é burra.

Ou burra ou conivente. Ou apenas uma forma mais tolerável de admissão da morosidade da Justiça. O que faz da Justiça algo completamente INÚTIL.

Ou no dizer de ninguém menos que Rui Barbosa: “A justiça atrasada não é justiça; senão injustiça qualificada e manifesta.

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Curioso, no caso específico, é que o Tribunal não apenas reconheceu a existência dos disparos e da influência maléfica por eles causada, inclusive com possível influência no resultado, como ainda ameaçou ficar de olho e punir a repetição de tais fatos, caso venham a ocorrer na eleição de 2022.

O recado de Alexandre de Moraes, futuro presidente do Tribunal quando das eleições de 2022, foi claro e duro e pode ser traduzido assim: ‘vocês cometeram um crime eleitoral e mesmo estando com as mãos sujas não há provas suficientes para responsabilizá-los. Mas prometo que em 2022, mesmo sem qualquer prova, não admitirei que se repita tal procedimento. Sua chapa será cassada”.

A essa altura, o estrago já foi feito. E o país pode não ter tempo para reconstruir o que o presidente eleito prometeu destruir.

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Ainda nesse intervalo de um mês, Bolsonaro prometeu dar o Auxílio Brasil, no valor de 400 reais e, de uma penada, acabou com o Bolsa Família, programa muito mais bem estruturado e executado.

Nunca é demais chamar a atenção para que o tal auxílio bolsonarista tem prazo de duração. Sua validade expira ao final de 2022, depois de passadas as eleições e de ele poder ter tido êxito em ‘comprar os votos dos pobres’, que ele tanto criticou nos governos petistas.

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Mas, se tem prazo de validade, o auxílio não tem, ainda, recursos assegurados em orçamento.

Razão da violência da presidência da Câmara e do Centrão, para aprovar a PEC apelidada dos precatórios, que concretiza o que o sempre suspeito sinistro da Economia afirmou em 3 de agosto último: “Devo não nego, pagarei assim que puder”.

Mais  uma jabuticaba para os anais (embora a força do trocadilho imponha outro termo, para tratar daqueles cujos direitos estão sendo lesados): o sinistro investigado por rombos em fundos públicos de pensão e dono de fortuna em paraíso fiscal, fora do país, instituiu a política econômica do calote.

Ministro de linhagem liberal, ‘Chicago boy’, instituindo a quebra de contratos como norma.

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Houve também a reunião do G-20, em que o presidente brasileiro só conseguiu manter contatos e encontros com brasileiros residentes na Itália, ainda assim, alguns poucos bolsopatas, pinçados por serem apoiadores do Mito (?).

Presidentes, governantes, ministros, empresários, todos os ocupantes de funções  que importavam para a realização de alguma reunião, evitaram e fugiram da representação do mal, em escala internacional.

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Sem o que fazer, nosso representante torrou milhões de reais para ir se encontrar, na Itália, com representantes da ultradireita internacional, sendo recepcionado pelos fascistas da Lega Nord ou Liga Norte.

De passagem, diga-se que o presidente idiota ganhou um título de cidadania, de terras onde seu bisavô nasceu. Apesar dos protestos e contra toda a população da comunidade local.

Por fim, prestou homenagens aos que combateram´, na Guerra, ideias que ele defende e representa.

E não foi à reunião do clima, COP26, em Glasgow, onde a delegação brasileira teve oportunidade de mentir em discurso quanto a comportamentos e práticas adotadas, e promessas para o futuro.

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Não poderia deixar de manifestar que, da passagem do presidente por terras italianas, resultaram agressões a jornalistas, fato que já virou costume posto em prática pelos seguranças da comitiva.

Pior é que, questionado pelo Supremo, o governo afirma que não passam de mentiras sensacionalistas, as agressões que as imagens dos meios de comunicação, inclusive internacional, insistem em nos mostrar.

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No Brasil, Lira altera regimento, leva a plenário uma emenda aglutinativa que tem a capacidade de criar novidades nos temas que deveriam tratar apenas de agregar assuntos de mesmo teor, tudo para aprovar, por míseros 4 votos, em primeiro turno, a PEC do calote dos precatórios.

Mais grave e violento, utiliza-se das emendas do relator, ou orçamento secreto, para comprar votos de deputados recalcitrantes em relação à matéria.

Como bom corretor de negócios, acena aos seus colegas com maior quantidade de recursos, que a PEC irá liberar para as emendas secretas, justo quando do ano eleitoral de 2022.

E, há quem pense que a PEC visava arrumar recursos para financiar um programa necessário de transferência de renda aos mais carentes. Como há aqueles que, cegos, irão defender a lisura do BOLSOLÃO.

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Não sou favorável ao teto de gastos. Nunca fui.

Mas ter ao meu lado, agora, furando o teto, gente do nível de guedes e lira, me deixa muito mal.

Preferia estar do lado dos que vão perder, como diria Darcy Ribeiro.

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Para terminar, o país traz o impacto da morte de Nelson Freire, o pianista erudito, e de Marília Mendonça, a cantora dos sentimentos dos grotões, e da alma do povo.

Em comum, em ambos, a humildade. Nela, o carisma e o saber-se poderosa.

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Enquanto isso, Minas dá o exemplo de como Zema trata a segurança: a bala.

Com a Polícia Militar matando, para depois iniciar os interrogatórios.

E ainda faz propaganda de como a segurança é respeitada em Minas.

Estranho: logo Minas, a terra da Liberdade, onde os direitos sempre foram reconhecidos e respeitados. Seja de gente honesta, seja de trabalhador, seja de bandido.

Afinal, Minas é terra onde direitos de seres humanos eram respeitados.