terça-feira, 10 de maio de 2022

Do respeito aos militares (dignos de respeito) ao "quem cala consente" e os desejos da sociedade brasileira

 Diz a lenda que na maior parte do mundo os militares são profissionais reconhecidos e respeitados em razão de seu patriotismo, de sua disponibilidade e capacidade de sacrificar a própria vida na luta em defesa, muitas vezes, de ideais e valores caros à população que integram e constituem nossa nacionalidade.

Assim, este conjunto de homens e mulheres é capaz de colocar em risco sua própria vida, encarando e enfrentando várias guerras em defesa da implantação e permanência de valores abstratos que dão sentido e fazem a vida valer a pena, como:  Liberdade, Democracia, Soberania e Integridade do território nacional, entre outros.

***

Sabe-se, no entanto, que esta visão romântica (e heroica) situa-se muito distante da realidade, sendo não só uma falsidade.

No fundo, a imagem transforma-se em uma narrativa útil, capaz de justificar o envio de jovens inocentes, despreparados, a maioria ignorante, sem qualquer consciência das razões pelas quais estão sendo enviados a guerras espúrias.

Jovens que, sob a pressão de toda atrocidade e carnificina com que se confrontam, encontram nas drogas e na fuga da realidade ou no desenvolvimento de todo o tipo de distúrbio psíquico, a força para levarem à frente sua missão. Que se transforma apenas na sua sobrevivência.

***

O que levou Erich Hartman a cunhar a frase cada vez mais admitida como uma das que melhor define a guerra, como

                               é um lugar onde jovens, que não se conhecem e não se odeiam, se matam, por decisões de velhos que se conhecem e se odeiam, mas não se matam.”

***

Nem vou abusar, neste pitaco, da paciência dos que amigos que me leem para abordar as motivações reais de tais confrontos, muitas vezes injustificáveis. Algumas vezes baseados em justificativas sórdidas e apenas ilustrativas da pequenez do espírito humano.

Outras vezes, sem qualquer razão exceto as piores imagináveis: o delírio ou personalidade doentia de um líder ou de um conjunto deles; ou apenas a velha máxima econômica da lei da demanda e oferta, examinada sob  ótica e os interesses da indústria armamentista bélica, que estimula demandas que as possibilitem produzir, destruir e LUCRAR.

***

De militares, SERES HUMANOS, poderia abordar várias outras estórias, uma destacando entre todas as demais, pela capacidade que sempre teve de me sensibilizar: a história do Chico que mata o seu melhor amigo e protetor, em pleno Vietnã, na passagem que trago comigo da peça do distante 1977, Os Filhos de Kennedy.  

***

Mas neste pitaco a abordagem é de outra natureza e serve para tratar da inutilidade total de grande parte dos militares que integram, em especial, o Exército Brasileiro.

Porque sendo o Brasil um país sem a tradição de participação em guerras, exceção feita à discutível e questionável Guerra do Paraguai, e à aventura da despreparada, mal treinada e mal equipada Força Expedicionária Brasileira em terras italianas por ocasião da Segunda Grande Guerra, a única função real das Forças Armadas, quando entediadas da caserna, é vir imiscuir-se na vida política nacional.

***

Faço um rápido parênteses para duas observações:

i- a primeira quanto ao despreparo de nossas tropas, descritas em vários livros de combatentes, tanto americanos quanto de pracinhas brasileiros.

Despreparo que levou o Alto Comando do Exército a perceber a necessidade de profissionalização das Forças e de desenvolvimento e formação de programas de treinamento e especialização nos Estados Unidos, função em que o general Lyra Tavares teve destaque.

ii- embora a falta reconhecida de profissionalismo da nossa FEB, todos os militares e autores de livros americanos são unânimes em reconhecer o esforço e heroísmo de nossos pracinhas. A eles e sua dedicação, desassombro e coragem, rendo minhas homenagens. Deles, o Brasil e nosso Exército são devedores eternos.

***

Em razão de sua formação de cunho hermético, hierárquico, disciplinador e, como consequência, AUTORITÁRIA,  os militares tupiniquins são presas da realização de uma autoanálise falaciosa que os induz a se acharem os maiores entendidos das necessidades e das soluções para sanar os graves problemas da nossa sociedade.

Falácia que a história tem comprovado insistentemente, desde o golpe militar que redundou na instauração da República, ou que redundou na Revolução de 30, que levou Vargas ao poder e, posteriormente, ao Estado Novo. Ou ainda ao descalabro de 21 anos, implantado pela Ditadura de 64.

***

Sempre é bom lembrar que os generais atuais, condecorados por bravura nas guerras de travesseiro que travam nos quartéis, são aqueles que optaram pela carreira militar justamente na época dominada pelos generais da linha dura do pós 64, que são contemporâneos dessa fase trágica de nossas Forças Armadas.

 E que são estes militares que tiveram sua formação baseada nos cursos e apostilas de Segurança Nacional da Escola Superior de Guerra, formação deturpada e deformada pela visão antidemocrática, como já expressa antes pelo professor Sobral Pinto.

***

Essa turma de militares que, agora ao lado de um ex-colega, expulso das fileiras da tropa por atos de terrorismo, não tem qualquer pudor de mostrar seus interesses mais recônditos de poder e autoridade.

Nem mesmo se preocupam em disfarçar o fato de, em seguidas situações,  terem sido conduzidos à humilhação pública por esse ex-militar a quem hoje, por força da opção equivocada e enganada de mais de 30% da população votante em 2018, além da disciplina e da legislação, acabam tendo que prestar obediência, como comandante em chefe das Forças Armadas.

***

Militares com comportamento tão torpe e criticável que, por obediência cega (e interesses escusos) aceitam se submeterem a ordens ilegais emanadas do autoritário e intelectualmente limitado chefe de ocasião. Um chefe golpista, antidemocrático, sempre ameaçando rasgar e descumprir a Constituição que jurou obedecer e preservar.

Uma caricatura de ser humano, que faz questão de se mostrar admirador de valores contrários à preservação da vida e da dignidade humana e dos direitos humanos mais básicos.

Um homem que elogia a tortura e torturadores, ou seja, que demonstra satisfação não com o mais cruel, mas com o mais covarde ato causado pelo Estado contra seus cidadãos.

***

Nossos militares no poder, e os ministros militares desse descalabro de governo, como o general Heleno (de trágica e vergonhosa experiência no Haiti), além do outro, ávido por se tornar candidato a vice, o Braga Netto (comandante da intervenção de resultados negativos no Rio) e agora este general da defesa, Paulo Sérgio, são incapazes de entender que sua função é servir a um Estado. Não a um governo, mesmo que os benefícios que auferem dessa decisão sejam atrativos.

Não se intimidam de tentar promover a descrença fantasiosa no nosso sistema eleitoral, funcionando de forma exemplar há mais de 25 anos.

Assim se comportam, como instrumentos manipuláveis, para agradar aos desejos de seu chefe,  atemorizado por provável derrota eleitoral e as consequências de perda de imunidade que daí advinda.

***

Para posarem de democratas, aceitam o convite para participar da comissão do TSE que cuida de sugestões para aperfeiçoamento das eleições.

Como homens infantilizados que fazem “tudo que seu mestre mandar”, aceitam tentar criar narrativas que desrespeitam a lei, a Constituição, as instituições e até a Justiça e o Tribunal que lhes serviu como Anfitrião (o infeliz grego da mitologia!).

***

Rápido para soltar notas em tom de ameaça, exigindo retratação do ministro Barroso, quanto ao papel subalterno que estão se prestando exercer, o ministro da Defesa mostra-se extremamente lento para vir a público condenar e deixar clara a posição das Forças em defesa da democracia e do Estado de Direito, deixando claro não compactuarem com qualquer tentativa de tomada do poder, senão pelo voto.

Ao não se expressar, mesmo vendo o atual chefe desfilar entre partidários de medidas antidemocráticas no dia 1 de maio, como o fechamento do Supremo, do Congresso ou mesmo o golpe militar com o ex-militar, a Defesa, as Forças mostram-se no mínimo omissas, ou favoráveis ao golpe contra a democracia.

Afinal, diz o ditado que quem cala, consente.

***

Comportam-se bem diferentes da postura que, nos Estados Unidos, as forças militares – aquelas que lutam, guerreiam e têm o respeito do povo e o peito cheio de medalhas por atos de bravura no campo real de batalha -, demonstraram quando Trump irresponsavelmente sugeriu a invasão do Capitólio a 6 de janeiro último.

Agindo assim, dão apenas cada vez mais munição e argumentos para todos que são favoráveis a medidas como a tomada há mais de 70 anos na Costa Rica: a dissolução das Forças.

Afinal, para que ficar bancando e gastando com órgãos inúteis, dispostos a se voltarem contra o desejo da maioria da sociedade?

Um comentário:

Anônimo disse...

Bom pitaco!