quinta-feira, 20 de junho de 2024
Taxa Selic, Austeridade Fiscal e choques entre tecnocratas e políticos
https://youtu.be/NFKCdE-TLK0
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Por unanimidade o COPOM – comitê formado pela diretoria do Banco Central -, responsável pela definição da taxa de juros básica da economia brasileira, a Selic, admitiu curvar-se às diretivas ou às chantagens dos interesses do mercado financeiro.
A decisão de manter a taxa em 10,5% anuais, frente a uma inflação que o tal mercado espera feche o ano em 3,96% significa taxa real de juros, acima da inflação, de 6,54%. O que nos deixa com a segunda maior taxa do mundo, atrás da Rússia em guerra, cujas consequências vale citar.
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Taxas elevadas permitem atrair capital externo para o país, com a entrada de dólares provocando a valorização de nossa moeda e contribuindo para a redução do peso de insumos importados (como petróleo, peças, partes e componentes) nos custos de produção e no nível interno de preços. Isso ajuda o controle da inflação.
Juros elevados, por sua vez, aumentam o custo financeiro da tomada de empréstimo para capital de giro das empresas, que são repassados para preços e elevam a inflação. Além disso, desestimulam o uso dos dólares no financiamento de investimentos das atividades produtivas, geradoras de emprego, produção, renda e receita tributária. Nesse caso, levam os dólares a se juntarem aos capitais internos, ambos direcionados às operações de caráter rentista, especulativas, que nada contribuem para o desenvolvimento da economia do país.
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Além disso, juros elevados visam restringir o gasto de consumo de famílias de baixa renda ou já endividadas; o poder do Estado em expandir crédito, criar poder aquisitivo e induzir investimento produtivo; pressionam o gasto fiscal, aumentando a parcela de arrecadação de tributos a ser paga aos credores dos títulos públicos; alimentam a chantagem dos rentistas financeiros e a campanha orquestrada pela mídia subalterna do perigo de eventual ruptura do limite superior tolerável para a relação dívida/PIB.
Em Camisa de Força Ideológica: a Crise da Macreconomia, André Lara Resende afirma que tal limite superior é “ ... a forma de dar expressão prática à nova restrição conceitual sobre a faculdade do Estado de dar crédito e de expandir o poder aquisitivo na economia”. (p. 28)
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Para caracterizar a falácia que envolve a teoria monetária, Lara Resende argumenta que esta teoria é apenas um “arcabouço conceitual que, sob a pretensão de neutralidade científica” objetiva, hoje como no passado, “restringir o poder estatal”. Para ele: “mimetizando ... o método e a linguagem matemática das ciências naturais, a macroeconomia continuou .... a restringir o poder do Estado e de seus ocupantes”. Transformada hoje em teoria hegemônica, visa direcionar o poder estatal em benefício do capitalismo financeiro.”
Neste século XXI, isso favorece o surgimento de uma relação incestuosa entre uma tecnocracia a serviço do capital financeiro e ocupantes do Estado, políticos eleitos e servidores públicos, que ameaçam a própria viabilidade das democracias representativas.
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Quanto à métrica pretensamente científica para mensurar a capacidade de o Estado honrar seus compromissos, o limite da relação dívida pública/PIB, argumenta que, dado o poder de emissão de moeda (sob forma cada vez mais digital) pelo Estado, eles “ ... podem não ter como honrar compromissos de dívidas denominadas em moeda estrangeira, ... mas, a menos que tomem a decisão política de não honrar a dívida denominada na sua moeda, podem sempre creditar monetariamente o detentor da dívida a pagar.”
Ou seja: não existe risco de calote dado pelo Estado; a restrição ao endividamento serve apenas para restringir o poder do Estado de gastar em benefício de agentes da sociedade que não sejam seus credores. A ideia de restringir o crédito concedido ao Estado afeta, en passant, o problema da inflação, dando poder ao mercado financeiro de optar por expandir o crédito ao setor público ou para o setor privado.
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Ao mencionar a relação incestuosa entre o mercado e seus tecnocratas com os tecnocratas instalados em postos chaves do Estado, nos permite retomar dois pontos abordados por Clara Mattei ( A Ordem do Capital: Como Economistas inventaram a austeridade e abriram caminho para o fascismo): o conceito de austeridade, acompanhado da prescrição de cortes orçamentários e moderação pública cada vez mais atuais em nossos dias, com a finalidade de manter e proteger as relações sociais de produção capitalista.
Nesse sentido, vista como um conjunto de grades protetoras fiscais, monetárias e industriais da economia permite à austeridade a inviolabilidade das relações sociais. Por impor limitações estruturais ao gasto e aos salários alimenta a miragem capaz de garantir que o caminho para sobrevivência das classes trabalhadoras é trabalhar mais e poupar mais.
Além disso, políticas monetárias e fiscais redutoras de pagamentos e do nível de empregos servem para deprimir a atividade econômica, elevar o desemprego e subjugar a maioria de trabalhadores a aceitarem as condições repressoras de produção.
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Isso ajuda a explicar o paradoxo apontado por Luís Nassif no dia de hoje: que os empresários e agentes, vítimas em última análise de juros elevados adotados sob comando das instituiçõoes financeiras, acabam se tornando defensores da medida que os prejudica. É frágil a explicação de tal comportamento por analogia com a chamada Síndrome de Estocolmo. A explicação tem mais vínculo com a eterna luta entre o capital e o trabalho: a ordem do capital.!
Da mesma forma, é equivocada a importância dada ao descolamento entre o principal instrumento de política monetária - a taxa básica de juros- considerada patamar do valor da taxa de juros futura de títulos de longo prazo, e o uso de eventual impacto deste descolamento sobre a dívida pública, como indicador de “risco fiscal” pela “ pressão exercida pela demanda de financiamento do Estado no mercado de loanable funds [fundos disponíveis para empréstimos].”
Ao contrário do que pregam erroneamente os analistas, longe de indicar a avaliação de um prêmio de risco de crédito esperado vinculado ao um default inexistente, este descolamento revela tão somente o risco de carregamento de títulos, expresso pela incerteza da trajetória de comportamento futuro das taxas diárias determinadas pelo Banco Central, em relação à trajetória esperada pelas instituições financeiras. Esta incerteza é que leva o mercado a demandar prêmios maiores para prazos maiores.
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Ao acatar as ordens do mercado e não reduzir os juros o Copom trabalha para mitigar o risco dos bancos e assegurar-lhes maiores ganhos e retornos, com mais segurança, o que acalma o mercado.
Também amplia a concentração de recursos nas mãos dos mais ricos, e mantida constante a arrecadação bruta, representa menos recursos e menor espaço para que o governo possa efetuar os chamados gastos em investimentos sociais, em prol dos menos favorecidos.
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Subalterna, a grande imprensa cobra equilíbrio fiscal, austeridade e cortes de gastos. Critica radicalmente propostas de aumento de receitas tributárias e silencia sobre os gastos fiscais com incentivos e subsídios em proveito dos vencedores de sempre: os capitalistas do mercado financeiro.
Tais práticas representam uma derrota do governo Lula ou de toda a sociedade, que vê negado o acesso a uma sociedade com um de coesão e justiça social?
Quanto a uma suposta derrota de Lula como reação às acusações por ele dirigidas ao comportamento político de Roberto Campos Neto, ao criticar ações do governo e fazer previsões catastrofistas do desempenho futuro da economia, não representa uma análise simplória? Afinal, o episódio não fere de morte a tradição que atribui isenção ideológica às decisões de tecnocratas?
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Um comentário:
Didático! Como sempre. Já vou repassar.
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