quinta-feira, 26 de setembro de 2019

A solução contra a tentativa de destruição do Estado de Direito é pegar em armas com cada um lutando com as armas que possui. Não é possível aceitar passivamente que nosso "Custer" nos conduza para o abismo

Em meio às repercussões e perplexidades provocadas pelo discurso proferido por Bolsonaro na abertura da Assembleia-Geral da ONU, objeto de destaque em todos os meios de comunicação do país e do mundo, a coluna de Hélio Schwartsman, publicada na Folha de São Paulo de ontem, optou por tratar de tema, em minha opinião, menos constrangedor, mas nem por isso menos importante.
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Antes, é necessário deixar claro minha compreensão com a preocupação do colunista:  talvez a coluna já estivesse pronta antes do discurso. Talvez a opção tenha sido propositadamente a de esperar algum tempo, suficiente para que, distante do calor do momento em que foram proferidas,  as palavras e a mensagem de Bolsonaro pudessem ser filtradas e analisadas, levando em conta a forma como foram recebidas e interpretadas.
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Ainda assim, devo dizer que concordo com a opção de Schwartsman em focar a decisão da "sinistra" Damares, de solicitar a abertura de processo das autoras de reportagem sobre o aborto, publicadas na revista AzMina, sob o argumento de apologia à prática de um crime.
Inclusive sou capaz de afirmar que acredito tratar-se de uma questão mais importante que a do discurso feito na ONU.
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Primeiro, pelo comportamento de alguém que ocupa cargo de expressão no governo federal, mesmo sem merecê-lo, liderar mais uma vez, um ataque à Constituição Federal, especialmente no que diz respeito à agressão ao direito de liberdade de expressão, à liberdade à imprensa e, por fim, ao próprio estado democrático de direito.
Segundo porque, como já divulgado, a matéria sobre o tema que tanto causa temor à sinistra, e que, a princípio só deveria dizer respeito à mulher e ao inalienável direito sobre o que fazer com seu próprio corpo, apenas reproduz material de ampla divulgação internacional, elaborado pela Organização Mundial da Saúde, com recomendações relativas à questão de saúde públicas vinculadas ao aborto seguro.
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Corretamente Schwartsman aborda a questão como sendo, no fundo, a da criação de um novo crime, não previsto anteriormente em lei: o crime de tradução de documentos internacionais. Por mais corretos e científicos que sejam os argumentos apresentados.
Ou seja: no fundo, trata-se tão somente da prática de censura. Mais uma. Ou mera intimidação covarde, com vistas a gerar um clima de pânico e insegurança, capaz de levar a sociedade à adoção de procedimentos de auto-censura - a pior forma de prática deste crime contra a liberdade.
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Embora já suficientemente percebido e comentado, vale a pena deixar o meu registro quanto a como é curioso que um governo que apresenta-se como tão liberal, do ponto de vista de questões econômicas pode, concomitantemente, ser tão invasivo, tão controlador, tão impositivamente conservador em questões ligadas a comportamentos e aos costumes sociais.
O que nos leva a refletir que a linha central desse (des)governo não seja, de fato, uma filosofia liberal, individualista, senão seu inverso.
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O governo do ex-capitão se bate e se guia pela lógica da ordem unida da qual ninguém pode se afastar. Conservadora. Tosca. Terraplanista. Anticientífica. Obtusa.
Pior: fascista. Antinatural e contrária ao Homem e seu desenvolvimento e evolução.
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Dentro de tal norma de comportamento, como parte integrante de tal princípio de governo, a Economia e seu ministério passa a impressão de que é muito menos liberal do ponto de vista da lógica do funcionamento, ainda que questionável, dos mercados.
Cheira muito mais à adoção de medidas intencionalmente destinadas a ampliarem o fosso entre o povo, a população e seus valores pessoais, individuais e interesses, muito vezes classificados como muito permissivos, lascivos, repulsivos, e uma classe de pessoas de elite.
Uma elite branca, rica, parasitária, e cujo comportamento se guia por uma falsa moral, um discurso aético que se traduz em fazer o contrário do que prega para os demais.
Onde a liberdade só existe para os integrantes dessa raça superior, de iguais nos abusos que prática, no ódio que destila e na exploração que patrocinam.
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Schwartsman conclui sua coluna com a observação de que se esse desgoverno que está instalado no país além de desprezar informações científicas para a elaboração de políticas públicas passar a censurá-las, caberá apenas que nós, a parte da sociedade que deseja viver em regimes democráticos, "pegar em armas contra o obscurantismo deste governo."
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O articulista não menciona em sua coluna, mas enquanto a sinistra se preocupava em acionar sua equipe para ocupar inutilmente o Ministério Público com solicitações com tal conteúdo de mesquinharia e autoritarismo, a menina AGATHA, de apenas 8 anos de idade era fuzilada no Rio.
Por uma Polícia que em nada honra as tradições de outras épocas, em que seu comandante chefe não ficava pulando e dando socos no ar, para comemorar a morte de um bandido, na verdade um pobre coitado desajustado, portador de problemas mentais, levado ao ato insano por pressões do ambiente que o cerca.
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No caso da menina, o governador em solenidade na mesma data, dizia que a população de seu estado não concordava mais em conviver com aqueles personagens que levavam insegurança, e atiravam aleatoriamente, atentando contra a vida de cada um de nós.
Esses, tinham que ser tratados, segundo a linha de pensamento do governador, em conformidade com a lei do abate.
Mereciam ser mortos antes de colocarem em risco a vida de quem quer que fosse.
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Para cumprir fielmente as ordens do governador do Rio, ele deveria ser o primeiro a levar o tiro disparado pela parte de sua polícia formada por sádicos e monstros.
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Entretanto, tanto o comportamento desse capacho que é o ex-juiz Witzel, governador do Rio, quanto o de Damares, ou de Paulo Guedes, ou dos ministros menos cotados do Meio Ambiente ou da Educação, apenas reforçam a lógica que o governo Bolsonaro persegue e deseja implantar, como mostrado em seu discurso na ONU.
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Como se percebe, a lista de ministros acima não contém o nome de Sérgio Moro, o ex-juiz cujo comportamento cada vez mais se comprova apartado da lei e, desse ponto de vista mais amplo, criminoso.
Moro pode ser herói, como mencionado por Bolsonaro, para que tem o capitão como mito. Hoje em dia, a julgar por recente pesquisa IBOPE, quase ninguém. Ou muito pouca gente.
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Mas o ex-juiz, patrocinador da licença para matar por parte da Polícia, travestida da proposta de excludente de ilicitude para mortes provocada por policiais em ambiente e circunstâncias sob efeito de forte emoção ou temor não merece nem entrar na lista de puxa-sacos, lambe-botas de seu patrão, reproduzindo o comportamento de seu mito em relação a Trump.
E não merece porque não consegue manter nem mesmo a dignidade pessoal que se exige minimamente de qualquer pessoa vítima da fritura a que o presidente o submeteu publicamente.
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Mais uma vez vale a pena lembrar que moro, essa figura que se prestou tanto a se deixar diminuir que as minúsculas se agigantam para tratar dele, também era o autor da ideia de se aceitar e considerar provas obtidas mesmo que por meios ilícitos.
Que agora ele rechaça.
Prova de que o feitiço volta, sim, contra o feiticeiro.
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Já Guedes, o suspeito de comportamentos ilícitos no trato com fundos de investimentos, ou de proximidade espúria com interesses vinculados à educação privada e as instituições privadas que comercializam diplomas, esse mantém ao menos o nariz empinado.
Talvez por saber que se concordar em baixar a cabeça como o fez moro, poderá sentir náuseas do cheiro que subir do local onde estava postado.
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Chegamos então ao discurso de Bolsonaro na ONU.
Discurso que parece redigido pelo guru dessa lástima de governante - infelizmente eleito, democraticamente, ressalve-se, que é Olavo Carvalho.
O pensador que pensa, em nada de útil, senão que seja a reencarnação de Deus.
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Não vou abordar a quantidade de fakenews, de dados falsos ou meias verdades ditas por Bolsonaro.
Nem tampouco o tom patriótico de sua mensagem.
Afinal, como já foi dito pelo inglês Samuel Johnson, o patriotismo é o último refúgio do canalha.
Claro, a frase aceita plural: canalhas.
O que Bolsonaro fez foi criar uma atmosfera belicosa, rancorosa, quase paranoica, de alguém que reage com agressividade a injusta agressão. Agressão inexistente, fantasiosa.
Feita de encomenda para que a questão da soberania possa ser levantada como bandeira e um patriotismo tosco possa ser insuflado no povo que, mesmo sendo o grupo de pessoas que mais tem a perder com as medidas desse governo, é quem mais facilmente pode servir de massa de manobra.
Sem contar que, de longe é o maior contingente de pessoas da sociedade.
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Povo que pode perfeitamente servir de Exército Urbano de Reserva, já que há muito não tem mais emprego para ser denominado de Exército Industrial.
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O discurso de Bolsonaro foi isso. Coerente com a falta de qualquer ação política destinada a melhorar a forma de convívio social. Coerente com tudo que o presidente já falou, em campanha, ou depois de eleito. Ele que não tem qualquer conteúdo para expressar que faça ou tenha significado.
Daí trazer de volta a questão da guerra fria.
Ele que mostra claramente completa falta de sintonia com os tempos modernos.
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Por isso ele reabilita a figura mitômana e midiática do General Custer.
E agride os índios, mentindo sobre o número de agressões, invasões e mortes de que os nativos são vítimas.
O que serve também para transmitir o recado de que ações desse tipo, contra as tribos ainda existentes, serão toleradas. E não serão objeto de mensuração, não farão parte de estatísticas, nem mereceram qualquer punição.
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O Custer brasileiro quer matar os índios não por ataques traiçoeiros, aproveitando a saída dos guerreiros machos do acampamento, em busca de caça.
Nosso Custer quer instilar nos povos indígenas a ideia da cobiça, do consumo, da riqueza, para que eles possam aceitar se submeterem à exploração predatória das riquezas contidas no território que lhes foi assegurado pela Constituição.
Reconhecimento ao direito dos donos primitivos.
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Mais uma vez, a pílula é dourada mas nem de ouro, nem doce.
Aceita pela sociedade a proposta de exploração pelos índios dos recursos naturais de suas terras,  e convencidos os povos nativos que tal atividade econômica lhes permitirá obter a fonte de poder e riquezas que lhes permitirão ter uma vida de conforto e maior prazer material, os índios irão amargar um processo de aculturação sem precedentes.
A consequência a prazo não muito longo será seu desaparecimento como povo, como cultura, o desaparecimento de suas tradições sob a ação livre de mercado dominada pela especulação em torno das terras que, mais cedo do que pensam, estará na mão dos grandes grupos de interesses econômicos.
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A sociedade não pode permitir que nossos índios desapareçam, sob pena de sacrificar sua própria história.
E sob pena de amanhã a vítima ser os trabalhadores urbanos, a pequena burguesia que compõe a classe média e até mesmo profissionais liberais, de classes mais elevadas de poder aquisitivo.
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Por esse motivo o discurso de ódio às manifestações, classificadas equivocadamente como colonialistas, em defesa de nossa floresta.
Ora, é sabido que, quando for a hora e se for o caso, se a sobrevivência dos Estados Unidos ou outros povos aliados e ricos estiver ameaçada pela questão do aquecimento global e pela destruição de nosso grande ecosistema capaz de por em risco a preservação da própria água doce no planeta, não haverá aliados ou amigos que impeçam de a Amazônia ser invadida e dominada à força.
Exemplos disso já foram dados na invasão do Iraque em função de armas químicas nunca encontradas, mas de um petróleo que continua jorrando na região.
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Mas, além da questão indígena que atormenta nosso Custer, ou da questão do desmatamento para gerar a expansão das atividades do capital de exploração predatória predominantemente de cunho primário, com destaque para as atividades do agronegócio e da pecuária, resta a postura de guardião dos valores da moral e dos costumes.
Postura de defensor da liberdade religiosa, da crença cristã, mero eufemismo para ganhar pontos com as igrejas evangélicas que o apoiam e que têm entre parte de seus rebanhos, grupos prontos a não aceitarem o convívio com outros tipos de credos e crenças.
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O trecho que prega contra a perseguição religiosa, então, não pode ser levada em consideração, exceto como um grito falso, suspenso no ar, contra ataques terroristas, de fundamentalistas que, felizmente, ainda não têm ocorrido em nosso país.
Não por culpa de nossa segurança ou de nossa cultura democrática de aceitação e respeito à tudo que vai contra o que pensamos e acreditamos, como o comprova Damares.
***o
Se não existe terrorismo no nosso país, o que é uma falácia, é porque o terrorismo aqui é patrocinado pelo próprio Estado, que estabelece o monopólio do terror, como o comprova Witzel e as propostas de moro.
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Daí a solução é mesmo aquela proposta por Schwartzman: a de pegar em armas.
Concretamente, sem perceber a existência de condições objetivas para se deflagrar um movimento nas ruas e praças e comunidades do nosso país, que leve a manifestações populares de maior expressão e peso, interpretando o pegar em armas, da forma de cada um cidadão consciente lutar com as armas que possui, contra o autoritarismo e alguns borrões de fascismo que podem ser percebidos em nossa sociedade.
Por uma minoria esclarecida, fazendo uso de uma maioria manipulável.
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Que possamos em nossa luta diária pela sobrevivência, encontrarmos e criarmos sempre oportunidades para lutar pelos ideais de liberdade e respeito.
Eu continuarei a luta. Em sala de aula, com minha arma de ideias e palavras.
É isso.

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