Atendendo a um pedido especial, o pitaco de hoje procura servir
como uma retrospectiva do ano que, felizmente, se encerra hoje.
Ano marcado pela palavra DIFICULDADES, assim mesmo, no
plural, conforme pesquisa popular que o Jornal da Cultura difundiu em sua
edição de ontem, seguindo tradição trazida do estrangeiro e que já vai se consolidando
em nosso país, que busca selecionar uma
expressão para sintetizar o sentimento popular em relação ao ano que se esgota.
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Ano cujo início mostrou total incapacidade ou desinteresse
das forças policiais em investigar e identificar os responsáveis pelo crime
político de execução da vereadora Marielle Franco e seu motorista Ânderson.
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Letargia, de certa forma compreensível.
Afinal, Marielle era
a expressão, a representação de tudo que o país, a partir do resultado das
eleições de outubro de 2018, escolheu demonizar: mulher; negra; homossexual; vereadora
de partido de esquerda; originária e moradora da Comunidade da Maré, no Rio.
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Nesses pitacos, sempre nos referimos à execução, aos seus
desdobramentos, e à inércia das investigações como algo deliberado. Vergonhoso.
Indigno de uma sociedade que se deseja democrática, livre, civilizada.
Marca da vergonha de uma sociedade invadida pela ação das
milícias, em substituição à presença PELO VAZIO, do Estado.
Esse mesmo Estado que, nesse ano de 2019, a sociedade
resolveu reduzir a suas dimensões mínimas. Liberando espaço para os avanços do
crime organizado. Símbolo, talvez, do empreendedorismo que se deseja implantar,
na sanha de se eliminar qualquer formalização do trabalho e do trabalhador.
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Não é demais lembrar que, como um todo, o ano foi marcado
por ações, projetos e propostas vindas do Executivo, com a finalidade de
usurpar os direitos conquistados em anos de lutas, pela classe trabalhadora.
Tudo isso, no afã de reduzir os custos dos empresários.
Reduzir os ditos pesados encargos sociais, a maioria direitos sociais.
Tudo para baratear a folha de pagamentos das empresas e
permitir aumento das margens de lucro.
Tudo isso disfarçado pelo discurso oficial da “intenção de estimular
o empresário a contratar mais trabalhadores”, medida que já se provou falsa
desde que a presidenta Dilma tentou substituir a contribuição previdenciária
sobre a folha, por um percentual cobrado sobre o faturamento de empresas de uns
poucos setores selecionados e responsáveis pela maior geração de empregos.
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Fazendo apenas um parênteses, a medida do governo Dilma
acabou sendo expandida, no Congresso para quase todos os setores da indústria nacional,
abrindo uma fenda gigantesca nas contas públicas e contribuindo para levar o o
país para a crise das finanças públicas que caracterizou o período que se
seguiu.
Claro: tudo sem que nenhuma contrapartida por parte dos
empresários beneficiados fosse cobrada. Ou seja, sem obter o resultado que se
esperava.
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Mas, o ano de 2019 começou com um desastre sócio-cultural: a
posse de Bolsonaro. A elevação da “arminha com as mãos” a símbolo de um novo
governo.
E como no caso dos terremotos, onde o principal tremor se
faz seguir de outros secundários, de menor intensidade, assistimos a um desfile
de banalidades e falta de seriedade na posse dos ministros indicados.
Assim, para a Casa Civil, foi empossado Ônix Lorenzoni, sob
suspeita aliás confirmada da prática de Caixa 2. O que Moro, outro comparsa de
Ministério, tratou de contemporizar, sob a alegação de que o colega já teria
vindo a público reconhecer o erro e se desculpar.
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Para o Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos
Humanos, a escolha recaiu sobre uma estilista, que chegou já definindo que “menino
veste azul, menina veste rosa”. Algo que deve ter deixado a indústria de corantes
e têxtil bastante insatisfeita.
Sinal de que ao subir no pau da goiabeira, e enxergar a figura
de Cristo a lhe aconselhar, a ministra deve ter perdido o equilíbrio e caído ao
solo. Talvez, nunca tenha se recuperado da pancada sofrida na cabeça.
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O mineiro Marcelo Álvaro Antônio, assumiu o Ministério do
Turismo, disposto a fazer a plantação de laranjas desbancar o cajueiro como
monumento turístico do país.
Como notícias ruins vêm sempre aos borbotões, os nomes
indicados, incluindo Moro, o juiz arbitrário e mau intencionado pelo partidarismo
com que guiou suas ações nos processos da Lava Jato, formaram todos, uma das
piores equipes de ministros de todos os tempos, desde a redemocratização.
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Fenômeno percebido pelo próprio Bolsonaro que já no início
de seu mandato se desfez do ministro Gustavo Bebianno, por uma mau contada
história que poderia envolver ao próprio presidente, relacionada ao laranjal do
PSL do ministro do Turismo.
Apenas um adendo: toda a plantação de laranjas tinha a
mulher como a figura a ser explorada, ou sacrificada.
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De ministros da Educação, não é possível falar: tivemos a
indicação de dois, e não tivemos nenhum. Tanto que a Educação não fez
desenvolver qualquer projeto, salvo aquele que procura cortar verbas das
Universidades públicas, estabelecer regras menos democráticas para indicação de
reitores, a que procura reduzir o Fies.
Tudo bastante compatível com o ministro ou sinistro liberal
desde a época de Pinochet e sua sanguinária ditadura, o posto Ypiranga: Guedes.
Ou melhor, no caso, bastante conveniente para sua irmã e o papel por ela
exercido junto às entidades de ensino superior privadas.
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Como o ministro das Comunicações efetivo foi Carluxo, o
filho, e o das Relações Exteriores, uma composição entre Eduardo, o 03, e o
astrólogo Olavo Carvalho, o Brasil, durante o ano beijou o chão pisado por Trump
e suas idiossincrasias, para amargar apenas o cheiro e sabor da lama que o americano
amassou.
Não fomos recomendados para a OCDE; não melhoramos as
relações comerciais com os americanos; estamos sendo constrangidos a não entrar
na tecnologia 5G, dominada pela Huawey, chinesa. Para coroar, esse
comportamento nos trouxe a ameaça de contratempos com nossos parceiros comerciais
árabes e chineses.
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Mas ainda não falamos dos desastres naturais, que tanta dor
e sofrimento trouxeram ao país em 2019, como o desastre da barragem da Vale em
Brumadinho, em janeiro.
Os desastres do desmatamento que avançava no país, denunciado
por órgãos públicos como o INPE e que valeram a crítica de Bolsonaro ao cientista
de reconhecimento internacional que presidia o Instituto.
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Acusando o cientista de estar ao lado da esquerda, Bolsonaro
o demitiu, como faria com gerente de marketing do Banco do Brasil, por causa de
uma propaganda que pregava inclusão social.
Mas o que esperar de quem, como uma das primeiras medidas, cobrou
punição para o fiscal do Meio Ambiente que o multou. Alega o presidente que não
estava pescando, embora segurasse artefato de pesca. Mas se o presidente não
pescava, porque estava com sua embarcação estacionada em lugar que é proibido ao
acesso de qualquer tipo de barco?
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Confesso que estou tentando, mas não dá para fazer um texto
mais cômico, quando os fatos ao longo do ano vieram se atropelando: fogo na Amazônia,
com acusação a Leonardo DiCaprio e desmantelamento da fiscalização das
agressões à natureza; avanço da fronteira agrícola junto com a área desmatada
na região do Pantanal e da própria Amazônia; avanço de mancha de óleo nas praias
do litoral do nordeste.
Tudo isso com a complacência do condenado em São
Paulo por crimes ambientais e que não é outro senão o ministro do Meio
Ambiente, Ricardo Salles.
E some-se a tais lembranças o genocídio de grupos indígenas,
incluindo a destruição de sua cultura, seu estilo de vida, suas terras; o
genocídio da raça negra, a mortandade de jovens negros, sua demonização, junto
com a das religiões de matriz afros.
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Mas não posso negar ter havido fatos engraçados: a fala do
presidente em relação à esposa do presidente francês, Emmanuel Macron (acompanhada
por comentário tão jocoso quanto deselegante desse exemplo de modernidade e visão
cosmopolita, Guedes); a fala em relação à defensora do meio ambiente, a
pirralha Greta Thunberg; o “golden shower” do carnaval; o discurso fake a favor
do meio ambiente desde Davos, culminando na ONU.
As respostas grosseiras, ríspidas, homofóbicas, misóginas,
aos repórteres postados na passagem do Palácio da Alvorada. As piadinhas com o
tamanho do órgão sexual dos japoneses.
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Mas preocupa, e não dá para ficar feliz, o retorno da censura,
desde a propaganda do BB, até a crítica ao filme Bruna Surfistinha; à ideia de acabar
com a TV Escola, com a ANCINE, a suas escolhas sempre destinadas a colocar em
alguma instituição justamente a pessoa capaz de provocar sua destruição, como tem
sido na área da Cultura, na Fundação Palmares, na Secretaria de Cultura.
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Para concluir, em 2019, ao menos descobrimos que os Beatles
eram espiões comunistas da KGB, infiltrados na cena musical inglesa; que o rock
é fábrica e inspiração para abortos; que o governo não teve nenhuma acusação da
prática de atos de corrupção. Descobrimos, enfim, que o filé mignon, embora
caro, deve ser reservado aos filhos; e que a experiência como ilegal na terra
do Tio Sam é suficiente para nos representar, na nova dinâmica que se exige de
quem precisa apenas ser capacho de Trump e do Tio Sam.
É isso.
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