Ou o ministro Guedes deliberada... mente. Ou mente pura e
simples...mente.
Senão vejamos.
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Reformas tributárias em nosso país foram sempre resultado de
modificações mais amplas no nosso aparato legal, sempre atreladas à promulgação
de Constituições, fruto de rupturas mais profundas do próprio regime de governo
ou associadas a golpes exitosos contra a normalidade institucional.
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Ao meu juízo, excetuada a de 1891, associada à implantação
da República, a rigor podem ser classificadas como democráticas as
Constituições de 46 e a Constituição Cidadã de 1988.
Dessa forma, talvez pudéssemos classificar a reforma tributária
patrocinada pelo primeiro governo da ditadura militar, dos anos 1965/66, como a única reforma
autêntica no campo da tributação que conseguiu ser realizada em nosso país.
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Ainda assim, a referência ao governo autoritário se faz
necessária, para assinalar a dificuldade de se aprovar qualquer reforma tributária
em períodos de normalidade, de forma a permitir que a sociedade possa contar
com fontes de financiamento modernos, inovadores, afinadas com a dinâmica das
mudanças sociais.
É que, como nos lembra Giambiagi, a questão tributária é extremamente
complexa, por implicar na discussão de como deverá se dividir a renda da
sociedade, em modo amplo.
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Ao tratar da reforma patrocinada pela ditadura militar (em
que o consenso era automaticamente compulsório) Fábio Giambiaggi, em seu
reconhecido livro Finanças Públicas Teoria e Prática no Brasil (em co-autoria
com Ana Cláudia Além, 4ª edição, Elsevier, 2011), traz o seguinte comentário:
“O principal aspecto modernizador da reforma foi a
mudança da sistemática de arrecadação, priorizando a tributação sobre o valor
agregado, em vez de “em cascata” – referente a impostos cumulativos.” (itálicos
originais) (p. 248)
Em nota de rodapé, prossegue:
“Um fato que merece ser destacado é que a adoção do IVA no Brasil
– ainda que sem ter este nome precedeu o uso desse instrumento tributário na própria
comunidade econômica europeia, com exceção da França. O Brasil, portanto, em
1967, passou a ter um dos sistemas tributários mais modernos do mundo na época.”
(p. 248)
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Por esse motivo, ou falta de informação sobre a evolução das
finanças públicas em nosso país, já que estava mais preocupado com leituras de Keynes
(três vezes, em inglês) ou com as finanças do Chile de Pinochet, não é há como
se admirar com a afirmação de Guedes da importância da proposta do governo,
apresentada ontem na Câmara, que moderniza e inova o sistema tributário, com a proposta
da criação de impostos com a sistemática do IVA, valor agregado.
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O próprio ICMS, por mais retrógrado e confuso que possa ter
se tornado, trabalha em Minas Gerais com o conceito de valor adicionado
fiscal...
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Pior é que o ministro nem
sequer apresentou uma reforma, que não tem estruturada.
O que fez foi apresentar um
remendo, uma meia-sola, de proposta natimorta.
Oportunista, o que o sinistro
fez foi tentar pegar uma carona na proposta do deputado Baleia Rossi (baseada em outra de autoria de Bernard Appy) que
visa unificar vários tributos com características semelhantes, incidentes sobre
a produção e circulação de mercadorias (o IPI, o PIS, o Cofins da esfera
federal, com o ICMS estadual e o ISS municipal) em apenas um único, o IVA.
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A proposta de Guedes,
unificando apenas os tributos federais Pis e Cofins, nasce portanto já embutida
no projeto em discussão na Câmara, não trazendo qualquer novidade exceto a da unificação
da alíquota de 12%. Ou seja, nada inova e não é ampla o suficiente para solucionar
qualquer questão.
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Mas, antes de prosseguir,
devo trazer uma palavra de alerta aos leitores deste pitaco.
Não foram os funcionários
públicos, esses demônios corporativistas e que só pensam em promover sangrias
no cofre do Estado brasileiro que deturparam nosso imposto de características
inovadoras em 1966. Não foram os burocratas ou os gestores públicos, que
promoveram tantas distorções no nosso sistema de tributação sobre valor
agregado, que o transformaram nesse lodaçal de regras, decretos, regulamentos,
regimes especiais.
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Esses funcionários, embora
com estabilidade para não terem de se submeter a ordens e interesses pouco
republicanos de governantes de plantão, sem risco de perda do emprego, apenas se
comportaram como o fazem na maioria das vezes.
Cumpriram ordens. Determinações
dos militares em cargos do Executivo, ou da esfera política dos governos, dos
ocupantes de cargos investidos de autoridade, e que até os anos 1980 eram ou
apaniguados, protegidos dos fardados, ou conhecidos como tecnocratas, também
sob as bençãos da tropa.
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Foram esses militares e seu
séquito que, detentores de poder usurpado por um golpe autoritário, sempre se curvaram
aos interesses maiores, e foram abrindo tantas exceções, regimes especiais,
tratamentos diferenciados que culminaram na barafunda do cipoal que hoje criticam.
E seu objetivo não era apenas
o de criar confusão. Mas o de atender ao interesse dos grupos de empresários,
poderosos, que em última análise buscavam burlar o pagamento da carga de tributos,
negociando e obtendo vantagens particulares.
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Os empresários hoje sofrem e
criticam o que eles mesmos, com sua limitada e falaciosa preocupação com a responsabilidade
social foram protagonistas. E beneficiários.
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E isso permanece. Sob
desculpas várias.
Como é exemplo, a manutenção
do regime do Simples.
E a Zona Franca de Manaus que
não pode sofrer alteração (apesar de estar-se discutindo uma PEC). E também as empresas
de transporte coletivo, não atingidas pela nova alíquota.
Mas, qualquer que seja a
justificativa, difícil entender que, enquanto o setor de serviços em geral
sofrerá um aumento de arrecadação, contra o qual estão reclamando, os bancos –
coitadinhos – estarão sujeitos à alíquota de apenas 5,8%.
Nunca é demais lembrar que
Guedes é banqueiro.
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E sua proposta real, a única de
um sujeito que só pensa naquilo nem é essa unificação.
Menos ainda a questão da
eliminação da regressividade que envergonha nosso país e é uma das principais razões
de nossa indecorosa distribuição de renda, e entrave reconhecido a nosso
processo de desenvolvimento e mesmo crescimento econômico.
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Junto à questão compreensível
de não promover uma reforma com perda ou redução de arrecadação, o que Guedes
quer, além de fugir da implementação de um imposto sobre Grandes Fortunas, é criar
o moderninho Imposto sobre Movimentações Financeiras. A rediviva CPMF.
Mas não pela CPMF, que mesmo
sendo também regressiva, até considero ter pontos positivos (permitir rastrear
o dinheiro!).
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A proposta de Guedes e de
Marcos Cintra, seu ex-escudeiro é a criação do imposto único. Sob a sistemática
que será testada, em seu potencial arrecadatório com a nova CPMF.
Afinal, Guedes, no fundo só
quer dar boa vida a empresários e aqueles que vivem de rendas (não de salários).
Evitando tributar lucros, dividendos, patrimônio, forçando a deterioração da
previdência e eliminando qualquer ônus sobre a folha de salários.
Para ao final, chegar a
eliminar o INSS e poder promover sua ideia de previdência complementar.
Privada.
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Para quem sabe ele até voltar
ao mercado financeiro, como gestor de fundos de previdência.
Da proposta da Câmara, mais
limitada que a que está sendo tratada no Senado, tratamos em outros pitacos, já
que o tema é não apenas espinhoso, como complexo e vasto.
Um comentário:
O que Guedes quer, além de destruir qualquer aparato social do Estado é aparecer como mentor de uma reforma, que contribuirá para deformar, ainda mais, o país. Sob os aplausos de uma elite econômica asquerosa.
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