terça-feira, 3 de julho de 2012

Um gol digno de placa

Já vi muitos gols bonitos.
A começar do gol de Pelé, na Copa de 1958, repetido à exaustão nas tvs, em que ele dava um chapéu, dentro da área, para chutar inapelavelmente para o "fundo do barbante".
Também vi Pelé fazer misérias dentro da área, dando dois chapéus ou lençóis em Ditão, zagueiro do Corínthians. Um chapéu de lá, e enquanto Ditão voltava desesperado, outro chapéu, para o "rei do futebol" acabar mandando a bola para as redes. Talvez o gol mais bonito que Pelé tenha marcado em toda sua vida. Talvez o mais bonito que eu tenha visto de um jogador de futebol.
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Anos mais tarde, lembro-me de um gol espetacular, de fora da área, de uma bicicleta de um jogador do América Futebol Clube. Digo assim, porque agora a memória me trai e não consigo mais ter certeza se o autor daquele gol memorável, em disputa pelo Campeonato Mineiro em uma noite fria de meio de semana foi Juca Show ou o grande artilheiro Jair Bala.
De qualquer forma, a bola foi parar no filó, naquela oportunidade.
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E teve ainda um jogo creio que da Copa América, em que Ronaldinho Gaúcho fez sua estréia com a camisa da seleção brasileira e, na primeira jogada, pela direita da área, deu uma chaleira (aquela com o calcanhar) e, assim deu um lençol no jogador adversário e bateu firme para marcar um golaço. Daqueles que deixou Galvão Bueno rouco de tanto gritar enaltecendo a pintura do gol.
Isso em um dia em que o Brasil goleou, se não me engano, por 7 a zero.
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Mas, se listo gols memoráveis, maravilhosos, frutos de jogadas individuais espetaculares, dignas de placas e pinturas, o gol mais bonito dos últimos anos, talvez dos últimos 20 ou 30 anos foi o gol do Galo no último domingo.
Sem exageros.
Primeiro pela cobrança do escanteio, em que a bola jogada para o meio da área, com a maestria de Ronaldinho Gaúcho - anos mais velho que aquele mencionado antes, foi achar justo a cabeça de Leonardo Silva que, atabalhoadamente desperdiçou o lance.
E ai começa a diferença.
Dessas bolas que vão se perder dengosamente pela linha de fundo. Mansamente. Em mais uma linha de fundo, de uma jogada que tinha tudo para terminar em um lance de perigo de gol.
Mas não!
Eis que surge lá no final do campo, o pequenino e frágil Bernard. Com a velocidade que sua pequena estatura e seu perfil franzino permitem que ele desenvolva, como forma de compensação.
E Bernard deu uma cavadinha na bola para dar um lençol ou chapéu no lateral do Grêmio. E ainda não havia se livrado do primeiro quando deparou-se com outro defensor do time gaúcho, outro gigante.
E foi aí, em questão de um segundo, talvez, que Bernard usou de todo o talento do raciocínio rápido, do improviso e, de chaleira, à la Ronaldinho Gaúcho (o do início da trajetória na seleção brasileira), dando mais um chapéu no becão do Grêmio e, sem deixar a bola picar no solo, tocar a bola para o centro da área.
Aqui tenho que lastimar o fato de que o autor da jogada genial não estava em direção ao gol, não podendo ele mesmo completar a píntura de jogada a que deu início.
Mas, sem ser fominha, fez o certo. Lançou a bola para o centro da área, onde estava Jô. Que de bate-pronto, de primeira, em um voleio espetacular, também sem deixar a bola tocar o chão, mandou a bola para a caixa. Caixa. Caixa. Para alegria dos atleticanos, dos amantes do futebol, dos que apreciam uma jogada maravilhosa de gol, dos que estavam em campo, torcendo, os que estavam em casa vendo pela televisão, enfim para quem gosta da plasticidade do futebol e da beleza da arte, em seu estado mais puro, mesmo que não de todo planejada. Até meio fruto de oportunidades e do acaso. Talvez dos rasgos de genialidade que todos nós, comuns mortais, temos.
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A pintura do gol tem a ver com o fato adicionalmente de não ter sido uma jogada de um craque diferenciado, sozinho.
Foi mais bonita por mostrar o que é o futebol, por excelência: um jogo de equipe. Coletivo.
Um jogo em que um sozinho pode até resolver, em ocasiões muito especialíssimas. Mas não é capaz de vencer a onze. Não é capaz de vencer ao conjunto.
Essa a beleza do jogo de competição coletivo: ser conjunto. Solidário. E quando toda a jogada solidária é feita com toques de arte pura, então...
Que bom estar à frente da televisão e poder ver o que vi domingo.
Que bom, nessa hora, ser atleticano.
Parabéns e obrigado a R49, Leonardo Silva, ao grande Bernard e ao artilheiro Jô.

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