sexta-feira, 5 de dezembro de 2014

Pitacos a respeito de uma economia que se reconstrói ou seria desconstrói?

Semana pródiga em eventos dignos de pitacos. A começar pela aprovação, pelo Congresso, da flexibilização da meta de superávit primário fixada na Lei de Diretrizes Orçamentárias - LDO, permitindo ao governo Dilma descumprir a meta fiscal anteriormente proposta; passando depois pela elevação de mais 0,5% da nossa taxa básica de juros, pelo COPOM, o que surpreendeu alguns analistas de mercado que projetavam um aumento de 0,25% apenas; pela divulgação e reconhecimento de um dos piores resultados para nossa balança comercial e, com consequência, para nossa conta de transações correntes para o ano em curso; até terminar com o reconhecimento de que o PIB de 2015 não crescerá mais que 0,8%.
No ar, apenas uma pergunta chave: alguma novidade?
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Contando com maioria no Congresso, muito embora a maior parte dos partidos da base aliada do governo estivesse emitindo sinais evidentes de rebeldia, em claro sinal de insatisfação com a reforma ministerial em curso, não era de se esperar resultado diferente da aprovação da lei que permite abater a totalidade dos gastos do PAC e da perda de receitas provenientes da desoneração de impostos da meta de superávit proposta.
O que, independente de outras análises e considerações é, no mínimo curioso. 
Explico minha perplexidade:  ao elaborar a LDO e fixar a meta de superávit, ou seja de quanto a previsão de arrecadação deveria exceder à previsão de gastos do governo no ano de 2014, para agradar ao deus Mercado - essa entidade sem rosto, abstrata e poderosa, que a todos impõe sua vontade e a todos submete em seus caprichos-, o governo resolveu elevar o resultado obtido.
Dessa forma e a título de ilustração, caso o governo previsse uma arrecadação de 15 e gastos com custeio, com a realização de investimentos e outros gastos de transferências e assistência social, que totalizam os chamados gastos de funcionamento da máquina pública, de 13, o resultado prometido à sociedade seria de um superávit de 2. Entretanto, para elevar o resultado que tranquiliza a seus credores quanto a sua capacidade de pagar os juros da dívida pública, o governo resolveu ampliar o resultado para 3. 
E como fez isso?
Propôs, no próprio texto da LDO que parte dos gastos efetivamente realizados, com obras para o PAC, poderiam não ser incluídos como despesas, o que reduziria aquele valor de gastos e ampliaria o resultado primário. 
As alegações para que tais gastos com obras do PAC pudessem ser deixadas de fora, pelo menos parcialmente, na prática, têm a ver com a importância de tais obras, e seu impacto positivo na sociedade.
O que não seria nenhum absurdo uma vez que, de certa forma, encontra suporte em algumas ideias embutidas naquilo que os manuais de macroeconomia denominaram e apresentam como  modelo keynesiano, a saber:  dentro do contexto de um Estado intervencionista, capaz de administrar a demanda agregada, caso a economia esteja atravessando um período de baixo crescimento, não haverá problema em que momentaneamente esse Estado eleve seus gastos, promovendo uma política fiscal expansionista (e, portanto déficits fiscais), realizando os investimentos requeridos para destravar os gargalos que impeçam a evolução positiva do nível de produção, emprego e renda. 
Recuperada a capacidade de crescer, com a geração de maior demanda, emprego, renda, a produção ampliada elevará,  no momento posterior a arrecadação, o que permitirá resgatar o equilíbrio das contas públicas e, mais ainda, saldar a dívida gerada no primeiro momento.
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Ora, o que não entendo é porque algumas obras do PAC, já que consideradas importantes, poderiam ser abatidas e não sua totalidade, já que, a princípio, todas as obras do Programa de Aceleração do Crescimento deveriam, em tese, ter aquele objetivo de romper os limites que entravam o crescimento da economia. Ou não? Ou algumas obras seriam mais importantes que outras, a ponto de elas merecerem ser consideradas e outras não?
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Independente da questão das prioridades de obras de infraestrutura, o que o governo solicitou e obteve agora foi exatamente a inclusão de todas as obras e seus gastos nessa manobra para aumentar o resultado primário. 
A bem da verdade, no nosso caso, para obter autorização para descumprir qualquer resultado de superávit, tendo em vista que, em ano eleitoral e de Copa do Mundo, o governo gastou mais, bem mais que apenas em obras necessárias e exigidas pela sociedade. 
Assim, a Copa do Mundo e todas as obras que seriam bancadas com recursos eminentemente de origem privada, acabaram tendo uma parcela importante de recursos públicos, seja a construção ou reforma de estádios de futebol, cuja suntuosidade ou mau controle de gastos passaram a se denominar de arenas, seja em obras urbanas e mobilidade, seja em obras de recuperação ou reforma de aeroportos, etc. etc. Sem contar os gastos com os esquemas de segurança para o evento, com deslocamento de tropas, etc. 
Os jogos foram realizados, e com êxito, é justo reconhecer. Ao menos fora de campo, onde Felipão não podia interferir. 
Na área da segurança pública, o trabalho coordenado e integrado de tropas e polícias militares e civis, deu tão certo que, projeto aprovado no Legislativo, ainda essa semana, transforma esse esquema de integração em determinação legal doravante.
Além disso, gastos de investimento foram feitos dentro do que se convencionou, na literatura econômica a ser chamado de ciclo eleitoral, ou seja, ampliam-se gastos, antecipam-se até alguns cronogramas, dada a proximidade das eleições, para mostrar um governo atuante, se movimentando. Um governo dinâmico e preocupado com fazer nossa sociedade deslanchar. 
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Somado a isso, redução de alíquotas e desonerações de tributos, destinadas a, sem grande sucesso, estimular o empresariado a elevar o nível de inversões no país, acabaram tornando o resultado primário negativo. 
No final das contas, o governo gastou mais que arrecadou e descumpriu a lei. 
Logo, a necessidade de, para escapar de uma acusação de crime de responsabilidade, a necessária utilização de contabilidade criativa. Aqui nem tão criativa assim. 
Apenas a aceitação pela sociedade de que, nesse momento, o governo está autorizado a aumentar sua dívida, lançando títulos para cobrir a diferença constatada. 
Dentro da concepção do keynesianismo neoclássico, quem sabe um crescimento posterior não permite pagar a dívida agora autorizada?
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Nesse meio tempo, Dilma indica para cuidar de nossa economia e obter as bençãos do mercado um triunvirato que tem como principal nome o de Joaquim Levy, considerado pelo próprio mercado um liberal, um discípulo de Armínio Fraga, de quem seria e agiria como um genérico. 
E, se antes das eleições, aqui nesses pitacos eu já criticava a indicação de Armínio Fraga para o cargo de ministro da Fazenda pelo candidato oposicionista Aécio Neves, por suas vinculações, especialmente com o grande capital financeiro internacional, não haveria razão, agora para não criticar Dilma, eleita, pela indicação de alguém cuja trajetória o torna bastante próximo de seu amigo e tutor. 
Dessa forma, não seria de se esperar outra coisa, especialmente depois da aprovação da lei que isenta o governo Dilma do cumprimento da meta de superávit em 2014, de que o novo ministro já assuma dando sinais de um endurecimento do ponto de vista fiscal, com muito mais austeridade e corte de gastos na carne e até nos ossos, se necessário. E, do ponto de vista monetário, um arrocho maior, com elevação dos juros para controlar a inflação e fazê-la voltar no mais breve tempo possível para o centro da meta. 
Ou para remunerar melhor os credores do governo, prejudicados nesse ano em seus ganhos. Quando nada para remunerar a tais capitais, e aos seus donos, pelo desconforto de terem passado por um período de incertezas, dado o resultado deficitário. 
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Com juros maiores estaremos aptos a atrair maiores influxos de capital externo, com evidentes efeitos no nosso câmbio. O que, do ponto de vista dos mercados é algo necessário, já que as apostas são todas na direção de que os Estados Unidos irão começar a elevar as suas taxas de juros interna. 
O que significa que, para continuarmos atraindo capitais que venham contribuir para financiar nosso desenvolvimento, é necessário que nossos juros estejam ainda mais atraentes. 
E, com o dólar fluindo livremente, sua cotação será mais dúvida mais baixa, o que contribui também para a redução da inflação. 
Mas, se contribui para a redução da inflação, contribui mais ainda para que nossa balança comercial continue apresentando os resultados que já vêm sendo verificados, deficitários.
O que nos leva a contas correntes mais negativas e maior necessidade de financiamentos internacionais. 
O que junta a fome com a vontade de comer. Mais necessidade de capitais externos, mais juros, mais real valorizado, mais déficits comerciais, mais contas correntes negativas, mais necessidade de financiamentos e de capitais externos...
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O problema de ter juros em alta, para conter a inflação, mais rigor fiscal e política de responsabilidade com o cumprimento de metas, ao menos as ditadas e de agrado dos mercados, é que o capital financeiro, que virá para nosso país, não quer nada com a aplicação produtiva, capital rentista e parasitário que é. 
Sua única preocupação é se valorizar, sugando nossas riquezas, nossa energia e nosso emprego. 
Afinal, há uma taxa natural de desemprego contra a qual não adianta lutar, ao menos a longo prazo. Não é verdade? 
Ao menos do ponto de vista da corrente principal do pensamento econômico, e que domina mentes e corações nos dias de hoje, tornando-se a prece que procura louvar ao deus mercado. 
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Por isso, não há nenhuma novidade nos resultados todos pífios apresentados por nossa economia e citados no primeiro parágrafo desse comentário. 
E por isso todas aquelas mazelas são naturais e se encaixam. Inclusive com um PIBinho de apenas 0,8%, já que as taxas de juros estarão elevadas, o desemprego estará em alta, o governo não estará gastando, ou conterá seus gastos ao máximo, e as nossas empresas e nossa indústria, virará apenas mais uma foto amarelada na parede. 
Mas, estaremos consumindo cada vez mais produtos globalizados, comprovando que o mundo de fato tem se tornado cada vez mais plano. 
E nós, não vinculados aos mercados financeiros e seus interesses apenas uma pasta. Inodora e insossa.


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