terça-feira, 29 de dezembro de 2015

Agressão a Chico mostra como a direita é alimentada por uma imprensa irresponsável do ponto de vista de seu papel público

A agressão verbal sofrida por Chico Buarque mostra bem o ambiente de intolerância que está sendo criado e alimentado em nosso país, em minha opinião pela mídia e pela grande e irresponsável imprensa a que estamos submetidos
Imprensa que em lugar de informar e trazer análises sérias e fundadas sobre os vários temas que se transformam em notícias prefere dar espaço a opiniões eivadas de interesses e preconceitos.
Não sou ingênuo. Os grandes órgãos de imprensa são também empresas, em geral gigantescas, com interesses próprios, o que não é nem um pouco criticável.
Merecedor de crítica é abordar apenas o lado da questão que mais benefícios traz aos seus interesses, na maior parte das vezes, sem deixar claro para sues leitores que interesses da empresa e de seus proprietários que estão envolvidos.
Do ponto de vista mais ético e correto, em minha opinião, seria dar sempre espaço à manifestação das outras partes e interesses envolvidos. Embora eu ache que isso seria ir muito longe e não seria tolerado por quem utiliza de algum meio que deveria se pautar pelo uso em benefício do público, apenas para conseguir impor seus interesses o mais egoísticos e privados.
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Mas, voltando ao caso de Chico e da agressão que lhe foi dirigida, gratuitamente, da mesma forma que antes já haviam sido vítimas o ex-ministro Mantega, o ex-senador e secretário municipal de São Paulo, professor Eduardo Suplicy, ou o nosso ministro Patrus Ananias, em restaurante de Belo Horizonte, a verdade é que o que se percebe é que as acusações e gritos e xingamentos trazem sempre um tipo de conteúdo mais revelador dos estereótipos criados e disseminados pela imprensa.
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Tomemos o caso de Chico, o mais recente e, curiosamente, o que desmonta o argumento que poderia ser utilizado por alguns meios, de que as agressões apenas estão indicando o grau de estresse a que a população  em geral foi levada pela classe política e seus representantes. Todos os representantes.
Argumento aliás, completamente equivocado já que nem é a população como um todo, já que todos os agressores são pessoas tidas como de elevado nível cultural, elevado padrão de vida e de formação e educação primorosas. A verdade é que, os mais desfavorecidos, por não contarem com a impunidade que os mais ricos insistem em acreditar estar a seu lado; por não terem o apoio dos colunistas e jornalistas que insistem em tentar vender a ideia de existência natural de uma associação entre a pobreza e o crime; em geral por serem esmagadoramente pretos, e viverem em condições menos privilegiadas nas comunidades e favelas da periferia, acabam não tendo sequer a oportunidade de frequentarem ou passarem pelos locais onde as agressões têm ocorrido.
Esses, os menos privilegiados, em geral, estão é dormindo para poderem ir pegar o trabalho cedo no dia seguinte, isso se a política econômica cobrada por essa elite tacanha e sua imprensa puxa-saco não lhes tirou já o emprego.
Ah! sim. Às vezes estão nos bares e botecos das vilas bebendo, ou jogando ou simplesmente esperando que justiceiros passem por lá atirando e fazendo a faxina social que seria tão ao gosto de várias pessoas de nossos estratos sociais mais elevados.
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Quanto ao outro argumento, o de que são políticos que são agredidos, essa categoria de 'parasitas que infestam o país' não resiste também a qualquer argumento, já que tal justificativa costuma tratar como iguais aqueles que são desiguais sob todos os aspectos. Significa julgar a todos pela mesma métrica, sem levar em consideração que em qualquer lugar há sempre pessoas diferentes.
Inclusive nos restaurantes de bairros elegantes, em que se nota a frequência de pessoas que podem não gostar da posição política de alguns, mas respeitam, democraticamente o direito de cada um. Por outro lado, existem os fregueses, habitués que são apenas mal criados, mal educados, ou apenas que julgam que são os donos do mundo, e que suas opiniões são as únicas que merecem respeito.
Em geral, pessoas que não têm, eles sim, condição para viverem em democracias, autoritários e bossais que são.
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Mas, Chico desmonta o argumento por não ser político. E tem a visibilidade que a carreira de compositor e cantor, inclusive engajado na luta pela redemocratização do país, lhe proporcionou.
Daí a ser atacado por acreditar e ter convicções que podem não ser as que algumas pessoas têm, é no mínimo lamentável. Ou risível, Já que ao que me consta, não foi ele que deu origem às agressões e ataques verbais.
Assim como não foram os agredidos, Suplicy, Mantega, ou Patrus que deram início aos bate-bocas lamentáveis.
Ou seja, até aqui, os acusados de serem de esquerda, unidos ao que há de pior no nosso mundo político, são esses que têm mostrado mais elegância, mais educação, mais sofisticação. Para não dizer que esses, democraticamente, estão cuidando de suas vidas, se divertindo, sem se preocupar com o que fazem ou pensam os que estão nos mesmos ambientes que eles. Esses agredidos sim, mostram o que é ter nível elevado, de tudo, principalmente educação.
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Claro que todos reagiram e reagiriam às agressões gratuitas, na maior parte das vezes, como convém a qualquer ambiente e pessoas democráticas, com argumentos e discussão de ideias.
E aí é que vemos a culpa da imprensa: Chico foi acusado, pelo que foi noticiado, de eleger qualquer político "ruim" para administrar o seu país, seu município, já que não está nem aí, já que mora em Paris.
O que é uma mentira, mesmo que ele possa ter imóveis lá, ou que passe temporadas pela capital francesa.
Paris, Roma, não foi lá que ele foi exilado quando lutava pela possibilidade de seus agressores de agora terem espaço para fazerem o que lhes dá na telha?
E mais, Gabriel Garcia Márquez deixou de ser colombiano por ter passado grande parte do tempo no México? Ou Scott Fitzgerald ou Hemingway perderam as suas nacionalidades por terem passado muito tempo longe de seu país natal? Ou teriam sido Niemeyer ou Jorge Amado menos brasileiros por terem passado temporadas em Paris, assim como Chico, eles que eram comunistas?
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E mais, o imóvel que Chico utiliza, seu ou não, foi conseguido às custas da exploração de algum trabalhador, do sacrifício imposto a algum semelhante, ou fruto de seu trabalho, de sua arte, até digamos de sua genialidade?
Diferente dos "meninos mimados" que agrediram verbalmente ao nosso compositor, cuja atividade a que estão vinculados é desconhecida e a única informação que se tem a respeito de cada um deles é de serem filhos de empresários, o que os permite fazerem parte do grupo de parasitas sociais composto por pessoas que nunca trabalharam.
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Mas, estamos vivendo um momento que já havia sido antecipado por Thom Hartmann, entre outros analistas sociais, que antecipava que ocorreria no nosso país a mesma reação conservadora, de pessoas medíocres, que ocorreu no seu país, os Estados Unidos, tão logo os programas de assistência social e distribuição de renda lá implantados nas décadas de 50, 60 mostraram os primeiros resultados.
Em entrevista, aqui já citada, ao programa Millenium da Globonews, o autor de The Crash of 2016, já previa essa reação, como sendo "natural" por parte dos que se julgam os donos do mundo.
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É uma pena, mas é essa reação que tem levado pessoas de tradição democrática e jurídica inquestionáveis a deixarem de lado até mesmo suas crenças mais íntimas, para poderem criar situações, como a do impeachment, apenas para conturbarem o ambiente social.
E isso é que tem dificultado - esses interesses mais mesquinhos, de grupelhos sem qualquer visão mais ampla que a de seus próprios umbigos -, que o país possa se entender, e que o entendimento venha a proporcionar as condições para que o país possa resolver seus problemas políticos, destravando o caminho para a retomada do crescimento e do desenvolvimento tão desejado por toda a maioria da população.
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