quinta-feira, 1 de dezembro de 2016

Solidariedade à Chape resgata a fé no ser humano. Os semideuses de Curitiba e suas reações

Para quem estava descrente em relação aos rumos que nossa sociedade vinha tomando, abdicando de qualquer esperança em relação às tentativas e aos resultados obtidos da busca da construção de uma sociedade mais humana, mais fraterna, mais solidária, o acidente trágico com o avião que transportava a Associação Chapecoense, a Chape, acabou servindo, apesar da tristeza e do luto, como um grande alento.
O que nos traz à triste conclusão de que só nos apercebemos da importância de nos unirmos, de sermos solidários, de aprendermos a conviver respeitando principalmente às divergências, partes de um todo único, íntegro que somos, quando parte de nós já não pode mais aproveitar de nossa tardia descoberta, ou da reafirmação de uma verdade que todos dominamos, apesar de preferirmos ignorar.
Afinal, é nos momentos de dor e luto; de perdas e desespero que acabamos dando conta de nossa fragilidade. De como a vida é efêmera e de quanto somos dependentes uns dos outros.
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O que me leva a lembrar a célebre frase contida no livro de Hemingway e que lhe dá o nome, POR QUEM OS SINOS DOBRAM,  fazendo referência ao pensamento inserido em um sermão de John Donne, que por sua beleza, profundidade e por sua oportunidade, transcrevo a seguir:  

"Nenhum homem é uma ilha, um ser inteiro em si mesmo; todo homem é uma partícula do Continente, uma parte da Terra; se um Pequeno Torrão carregado pelo Mar deixa menor a Europa, como se todo um Promontório fosse, ou a Herdade de um amigo seu, ou até mesmo a sua própria, também a morte de um único homem me diminui, porque eu pertenço à Humanidade. Portanto, nunca procures saber por quem os sinos dobram. Eles dobram por ti”. 

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Mas, em meio a todo o clima de comoção, pesar e de solidariedade que o desastre aéreo provocou em todo o mundo, e não apenas ou por causa do futebol, não há como não destacar algumas reações que mostram que, felizmente, nem tudo está perdido. Que a humanidade ainda tem possibilidades de se tornar mais unida e consciente de que, juntos, sua força se agiganta e somos sim, capazes de superar todos os males e problemas.
E percebemos que devemos aproveitar essa tragédia para extrairmos lições importantes, para modificar nosso comportamento e a forma como enxergamos e lidamos com as nossas vidas.
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É dessa forma, como uma oportunidade de aprendizado e melhoria de nosso convívio, que acompanhei a reação, desde os primeiros instantes, da direção do time do Atlético Nacional de Medellin, Colômbia, e de seus jogadores, logo deixando a rivalidade e a competição de lado, para solicitarem à Conmebol que, em homenagem  póstuma e para eternizar na memória o seu adversário, fosse declarado campeão da Copa Sul Americana o heróico time da Chape.
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Mais emocionante ainda, foi a reação de todo o povo da cidade de Medellin, que compareceu ontem, em massa ao estádio em que a primeira partida da disputa do torneio continental seria realizada, para que por um tempo não inferior ao do jogo, pudessem protagonizar uma das mais emocionantes homenagens que já tive a oportunidade de assistir, ao time valoroso da Chape.
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Ver todo o estádio gritando Vamos Chape! Ver todo o estádio gritando e aplaudindo a Chapecoense Campeã é algo que não vai sair nunca da memória de tantos que, como eu, tiveram a oportunidade de assistir à transmissão do evento pela Fox, também ela, enlutada.
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E o brilho da homenagem de 45 miil pessoas presentes ao interior do estádio, além de perto de 100 mil, do lado de fora, contornando o Atanasio Girardot, ainda foi maior pelo teor de todos os discursos, sem exceção, que foram proferidos na magnifíca e inesquecível homenagem prestada pelo clube, hinchas e povo colombiano ao time, à torcida e ao povo de Chapecó e ao povo brasileiro, de forma geral.
Na verdade, o cidadão colombiano prestou uma homenagem ao gênero e à raça humana.
Discursos que mostram que, para além da rivalidade, há a necessidade de entendermos o jogo como apenas uma disputa esportiva e não como uma disputa de vida ou morte. 
Que as rivalidades por mais afloradas não podem nos deixar esquecer de que somos, antes de mais nada, pessoas comuns, iguais a todas as outras, pais, irmãos, filhos, maridos, hombres esperados em suas casas como disse bem a esposa de um jogador do time verdolaga.
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De tudo o que vi, e do tanto que a emoção me deixou com os olhos marejados, percebi o que tentei traduzir abaixo, em uns versos pobres:

O cimento que provoca as bolhas nos pés
e abre feridas quanto mais o raspamos
cria também o calo protetor
As frustrações que enfrentamos pela vida
ensinam a amadurecer
dizem psicólogos e pedagogos
Aprendemos todos a conviver com as perdas
que nos tornam mais fortes
e nos capacitam à sobrevivência
na luta da evolução das espécies.
Nossas dores nos fortalecem
como se em nossas veias 
o sangue fosse substituído pelo minério de ferro
E uma carapaça nos servisse de abrigo
à medida que a vida segue seu curso 
e a velhice nos domina.
E no entanto, 
a dialética da existência 
faz a velhice nos tornar mais sensíveis
e amolecidos, nossos corações choram,
a cada morte ou cada nascimento
a cada flor que brota e que colore os jardins
a cada sol que insiste em continuar chegando 
iluminando o dia.
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Antes de mais nada, peço aos amigos e leitores, desculpas por incluir esse choro-desabafo. Fruto das lições que a Chape e o povo da Colômbia, além de todos os nossos principais clubes de futebol, por meio de seus dirigentes, jogadores e torcedores nos têm proporcionado.
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E mais uma vez, Minsky

Ainda a respeito do acidente da aeronava da empresa LaMia, e da possível pane seca, sou obrigado a concordar com minha mulher, para quem o piloto e sócio da empresa agia de forma irresponsável, ao voar no limite da tolerância de autonomia de combustível para a aeronave.
Não que, como ela opinou, havia arrogância na decisão do piloto, ou autosuficiência.
Mas havia o que Minsky considerou ser uma das principais fragilidades do modo de funcionamento do sistema capitalista, a saber, a estabilidade econômica.
Estabilidade que, irônica ou dialeticamente,  ele considerava ser um dos principais elementos causadores de sua instabilidade.
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Ocorre que, segundo sua tese, ao fazer suas previsões como guia no processo de tomada de decisões em ambiente de incerteza em relação ao futuro, os homens de negócio seriam levados a criar margens de segurança, no sentido de mitigar os riscos do negócio.
Em sistemas econômicos estáveis, contudo, em que as previsões se mostravam, normalmente, comportando-se dentro das expectativas, os agentes passariam a acreditar que suas margens de segurança tinham maior amplitude que o que seria necessário, face a perdas que não tinham muitos motivos para se manifestarem.
Como a manutenção de recursos parados sob a forma de margens, implica custos de oportunidade, ou seja, são recursos que poderiam, mas não estão sendo aplicados e rendendo ganhos, os agentes resolvem, paulatinamente, ir diminuindo suas margens. 
Até que sobrevenha o inesperado, a crise. No caso, a pane seca.
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O raciocínio de Minsky pode ser lido em sua obra, Stabilizing an Unstable Economy, parece que já traduzido para o português e cuja leitura recomendo aos meus alunos.
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Enquanto isso no nosso país

Embora sejamos todos a favor da Lava Jato, do combate à corrupção e de medidas que visem a endurecer a forma que a legislação brasileira trata os crimes de corrupção e assemelhados, não há como não admitir duas coisas óbvias, em minha opinião:
i- que para o combate à corrupção, caracterizada como ato delituoso, não há como justificar a adoção de atitudes que caracterizam, elas mesmas, atos atentatórios aos direitos humanos e à dignidade da pessoa humana. 
Isso equivale, na minha opinião, a admitir que um crime possa ser justificado, como se houvesse sido criada uma hierarquia de atos criminosos. Uns podendo serem cometidos, para evitar que outros, mais graves, o fossem. Ou pior: que algumas pessoas, por atuarem inibindo crimes, poderiam, eles mesmos, adotarem comportamentos delituosos.
ii- que juízes, procuradores e investigadores são também seres humanos e, como tal sujeitos a não exercerem suas atividades da forma imparcial e isenta que, em tese deveriam atuar. Muitas vezes, até por terem suas convicções ou formarem juízos de valor, certos ou equivocados, acabam adotando atitudes autoritárias, apenas movidos por suas crenças.
Cometem assim, como qualquer outro agente público, crime de responsabilidade, merecendo serem também impedidos de cometerem tais delitos. 
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Por isso, não vejo nada de anormal ou de ato atentatório à continuidade das investigações em curso no nosso país, e de que a Lava Jato é o carro chefe, ao saber que a Câmara resolveu votar a caracterizaçao e as hipóteses dos crimes de responsabilidade de tais agentes públicos. 
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Interessante e suspeita, por tudo que representa, é o comportamento e a reação dos procuradores de Curitiba, ameaçando abandonar a operação invesgativa. Como se seu trabalho não fosse o de zelar pela manutenção de uma sociedade onde o crime impere, sem impunidade. Como se seu trabalho fosse fazer o que quisessem, para punir a quem desejassem, usando dos artifícios de investigação que achassem mais adequados, mesmo que ilegais. 
Na verdade, agem como se fossem semideuses e, como tal, acima de qualquer suspeita ou acima do bem e do mal.
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O que não está longe de expressar o que o comportamento de alguns deles parece confirmar.
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E a economia...

Quanto aos resultados econômicos, pífios, para desagrado da turma que acreditava que a queda da presidenta seria a solução mágica para resolução da crise do país, comentamos em outra oportunidade.
Mas, não há como fazer mágicas, e é isso que os resultados estão mostrando. E pior ainda é, nessa circusntância, cortar demanda agregada, em especial, em prejuízo dos gastos destinados a melhorar a vida da população menos favorecida.
É isso.

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