quinta-feira, 9 de abril de 2020

O discurso sem nexo de quem não sabe para onde aponta o nariz.

Bolsonaro fez um pronunciamento tranquilo na noite de ontem. Fica a dúvida de até quando vai durar essa tranquilidade.
Ao contráriio da opinião de Emerson Kapaz, exposta em seu comentário para o Jornal da Cultura, não achei um discurso de conciliação, nem de união. Menos ainda de um líder ou, nas palavras de Kapaz, de um capitão por analogia à função de um jogador mais respeitado no futebol, e não em referência à patente.
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E vamos admitir, Mandetta não teve qualquer influência no pronunciamento.
E, poucas horas antes, na entrevista diária da área da Saúde com a imprensa, destinada a promover a atualização da evolução da pandemia no país, o ministro da Saúde fez o possível para adotar um tom conciliatório, amistoso. Até subalterno.
Mostrando já maior conhecimento da personalidade esquizotípica, ou paranóide, ou ambas, de seu chefe, Mandetta fez questão de salientar estarem “jogando no mesmo time”, para prosseguir utilizando a analogia de Kapaz.
Aí, foi suficientemente claro: olhamos todos o mesmo parabrisa, para frente. Estamos unidos. E quem manda no time tem nome: Jair Messias Bolsonaro.
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Mesmo com o ego massageado, em seu pronunciamento noturno, melhor seria soturno, o “capitão” mostrou que o time encontra-se completamente à deriva. Mandetta não apenas não foi citado. Pior: Bolsonaro fez questão de mostrar que se o seu jogador mais avançado, nessa oportunidade, joga para a frente, ele continua fazendo questão de dar chutões para os lados.
Mas tais chutões não têm o objetivo de espantar o perigo de um ataque adversário: são apenas para, sob sorrisos de soslaios por entre a boca torta, arremessar a bola para a pequena claque que, sem prestar atenção ao jogo, se compraz em aplaudir e incentivar seu ídolo mor.
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Nesse sentido, Bolsonaro parece continuar agindo como a criança mimada que, independente dos problemas que pode estar causando, se dispõe a qualquer tipo de comportamento para continuar sendo o centro das atenções.
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Mandetta não joga no mesmo time de Bolsonaro e, a julgar pelo comportamento da tropa de choque de brucutus que põem em movimento as redes sociais de seu Messias, cada vez mais parece estar sendo deslocado para a extrema esquerda. Logo ele, que não tem nada de canhoto.
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Não contente de não fazer referência ao seu subordinado, Bolsonaro ainda se referiu aos encontros que vem mantendo com outros médicos, para tratar da aplicação do remédio que, em sua abalizada opinião, é a panaceia universal: o emplasto Brás Cubas.
Mas, como na história genial do personagem de Machado, Bolsonaro corre o risco de se submeter a enorme frustração.
O que poderia ser evitado se tivessse se dedicado a alguma leitura que permitisse o desenvolvimento do cerébro, ao invés de optar por desenvolver tão somente a musculatura.
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E reconheçamos que Mandetta demonstrou não se opor à prescrição da receita milagrosa. Apenas não quer correr riscos de sua utilização indiscriminada para toda a população, sem a identificação exata sequer da contaminação pelo vírus, temendo possíveis efeitos colaterais.  
Sem qualquer compromisso, exceto com seu pensamento mágico, Bolsonaro não se constrange de receitar o medicamento. Vai mais além: gaba-se de conversar pessoalmente com o primeiro ministro indiano, de forma a assegurar a aquisição e entrega de insumos necessários à continuidade da produção da cloroquina.
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Aqui um parênteses: ao fazer questão de manifestar o telefonema ao premier indiano, Bolsonaro não estava querendo demonstrar prestígio. Tão somente estava reconhecendo que no Ministério das Relações Exteriores, completamente acéfalo de algum ser racional, não há ninguém que possa ser indicado para cumprir os trâmites necessários a tal negócio.
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Não podemos deixar de destacar que, em certo momento e mais uma vez, como um disco arranhado que fica repetindo sempre o mesmo trecho da música, fez questão de deixar claro sua intenção de respeitar a autonomia dos entes federativos, indicador de que já tinha tomado ciência da decisão do Ministro Alexandre de Moraes, assegurando a autonomia das instâncias subnacionais para tomar decisões sobre como lidar com a pandemia.
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Bolsonaro acusou o golpe. Tanto que, novamente, fez questão de transferir a responsabilidade ou o ônus das medidas de isolamento social para governadores e prefeitos.
Mais tarde, e sempre, qualquer que seja o resultado ele poderá apontar o dedo e falar: eu avisei.
Exatamente, o que ele falou ninguém sabe, mas... não é ele o responsável.
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Dois comentários: o primeiro, relativo aos ataques que começarão a ter como foco a figura do ministro Moraes, em razão da sentença contrária ao interesse do megalomâno e suas legiões.
Não há problema: além dos brucutus descerebrados, os ataques virão de quem não conhece nem para onde aponta o nariz, quanto mais o que significa o respeito Constitucional à autonomia dos poderes.
Curiosamente: a verdadeira ilustração do dito mais Brasil, menos Brasília a que os desmemoriados de sempre (e os sem caráter) poderão fazer vistas grossas.
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Segundo: os ataques e transferência de responsabilidades para governadores como Witzel e Dória funcionam com a história de Caramuru. Bolsonaro atira no que vê, e erra. E acerta o que não viu.
Eleitos na esteira da histeria provocada pelo vírus corrosivo para os neurônios que levou ao poder o energúmeno lá instalado, Dória e Witzel, além da mesma truculência e despreparo, apenas mostram o mesmo problema de ego de Bolsonaro.
O que explica a ridícula disputa da paternidade da aplicação da cloroquina.
Isso independente de, em minha opiniao, bem assessorados, terem os dois governadores agido como as autoridades devem agir, em momentos de insegurança.
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Procurando não se alterar, Bolsonaro mudou o tema de seu discurso passando a tratar de questões econômicas, e aproveitando para, mais uma vez, como agulha emperrada, falar da liberação dos R$ 600,00 reais para os mais necessitados. Além da liberação de cota de um salário mínimo do FGTS.
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Quanto a essa parte do discurso, apenas um registro. O capitão começou afirmando que seu governo tinha duas preocupações: a luta contra o vírus, e a luta contra o desemprego.
Ora, dado que seu (des)governo já completou um ano de exercício de mandato, e que a Covid-19 nos atingiu apenas recentemente, o fato de colocar a luta contra o vírus como preocupação é algo a se comemorar.
Afinal, não há muito tempo, esse vírus era causador apenas de uma gripezinha.
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Quanto ao desemprego é forçoso reconhecer que, transcorrido já um ano, nada foi alterado. Independente de medidas destinadas à precarização do trabalho e à retirada cada vez mais agressiva dos direitos dos trabalhadores (o que inclui a possibilidade de, no futuro próximo, assistirmos, no limite da retirada de sua própria remuneração), os dados mostram que o aumento de emprego se deveu à elevação dos informais, ou autônomos. Aqueles que vivem de bicos, mas por terem CNPJ, acreditam que se transformaram em empresários empreendedores.
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Bem, com um ministro da Economia capaz de vender a imagem de superior competência, entregando um resultado como o obtido até aqui, convenhamos que o corona vírus é até uma excelente desculpa para tanta incompetência.
Do jogador, e do técnico que o escalou e o  mantém.
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Ainda assim, prefiro Bolsonaro, o ex, esquentando a cadeira, já que a tinta da caneta se esgotou, que uma farda ocupando aquele espaço.
É isso aí.  Como ele falou, boa Páscoa. Que não seja apenas a passagem para o outro mundo, mas a reabilitação da vida e dos ideiais que a fazem dignas de serem vividas.

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