Consulto
o google para entender melhor o significado de independência.
Uma
das mais de 170 milhões de referências indica tratar-se de uma desassociação de
um ser em relação a outro. Uma separação, à moda de um parto, quando o bebê deixa
o ventre materno: um nascimento.
Para
mim, o centro da questão está em haver uma ruptura de uma relação de dependência
anteriormente existente.
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Permito-me
uma reflexão: se o parto explicita o término de relação de dependência entre o
filho e a mãe, como entender a continuidade da relação de dependência que
persiste existindo, principalmente em relação à mãe, desde em razão de cuidados,
especialmente em relação à alimentação?
Dependência
que torna-se até maior, já que sem a proteção do útero, passa a depender além
dos alimentos, das roupas e agasalhos, e dos cuidados de higiene, ampliando-se
até para outras pessoas, como os pais e avós?
Acredito
que apenas dialeticamente podemos compreender a essência dessa autonomia do filho
parido, em relação à sua mãe, para se ver às voltas com novas e mais complexas
dependências.
***
Nesse
mês de setembro não é fora de propósito, muito pelo contrário, aplicar o termo
ao nascimento de um tipo diferente de ser: um país. O que explica o destaque e
as comemorações relativas à independência de um Estado em relação a outro(s).
Nesta
acepção, outra referência do Google (cuja fonte indica o senado.leg.br) vincula
a ideia de independência a vários conceitos citando com exemplos, em primeiro
lugar, liberdade, autonomia, autodeterminação; seguido de isenção, imparcialidade,
neutralidade.
Em
terceiro lugar, aparecem os conceitos de soberania, insubmissão, ausência de subordinação.
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Dessa
forma, se já era difícil captar o significado real de autonomia e autodeterminação
em relação ao recém-nascido, fica ainda mais difícil entender o conceito de
ausência de subordinação de um país ou um Estado em relação a outros.
Por
exemplo, a 7 de setembro de 1822 o Brasil tornou-se um país independente de
Portugal. Sem querer aprofundar a discussão quanto à forma, se um ato isolado e
inesperado de revolta ou o coroamento de um movimento de forças sociais que já
vinham se acumulando; se através de um grito heróico e retumbante ou de acertos
frutos de uma negociação diplomática, o certo é que o Brasil tornou-se um país liberto
e autonômo em relação a Portugal.
***
A
conquista de tal status em relação a Portugal, assegurando-lhe o fim da
subordinação à Metrópole como nos ensina a História, não foi alcançada sem o
apoio e o financiamento da Inglaterra.
Ao
apoio da Coroa inglesa ao novo Estado que surgia, somou-se a concordância de
Portugal em abrir mão, sem uma confrontação militar, da terra onde ‘em se
plantando tudo dá’.
E
de onde as minas de ouro e diamantes sustentaram, por séculos, a opulência de
uma realeza e um classe de negociantes improdutiva e sanguinária.
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Açúcar,
mais tarde café, diamantes e o ouro em seguida, foram algumas das mercadorias que permitiram que as riquezas brasileiras
servissem de mecanismo de sustento de um reino caracterizado por seu caráter parasitário.
Mas
nem de longe essas foram as mercadorias principais do fluxo de comércio entre as
duas nações, e todas as outras que aproveitavam-se da inoperância e improdutividade
portuguesa.
Improdutividade
reconhecida pela opção por entregar a produção de nossas mercadorias a outros povos,
de maior engenho e perícia, consolando-se em obter rendimentos da concessão da
produção de tais riquezas.
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Mas,
dentre todas, a mercadoria que consistia o verdadeiro tesouro não era senão o SER
HUMANO, o negro escravizado capturado na África, cujo tráfico enchia os cofres
de Portugal e das nações amigas, de ouro, riquezas e sangue.
O
que abre espaço para que se dê uma combinação perversa, de caráter externo: nosso
país se torna subordinado a uma nação já por si dependente do trabalho,
engenho, arte e conhecimento de outras nações.
Internamente,
nossos latifundiários, os senhores de terras e da produção de nossas riquezas
eram dependentes da exploração do trabalho de mão de obra escravizada, a que
submetiam pela força das armas, da tortura e de castigos desumanos.
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Assim,
apesar de o país tornar-se autônomo em relação a Portugal, não apenas não pode
ser caracterizado como um Estado capaz de alcançar sua autodeterminação Ou seja,
se passa a ser um país em SI, não é capaz de adotar diretrizes e políticas capazes
de transformá-lo em um m Estado PARA SI.
Torna-se
um país para atender aos interesses da Inglaterra, nação hegemônica naquele período.
O que ganha imediato apoio das classes empresariais, dos produtores dos bens
primários tornados insumos que sustentavam a oficina do mundo.
***
Império ou república, anos depois, a classe de senhores
da terra e aristocratas, muitos atrelados ao comércio, só conseguiu se manter
às custas de uma produção cujo custo principal não se contabilizava em recursos
financeiros.
Dando sequência à exploração
selvagem e sanguinária oriunda desde a época colonial.
Mudaram as formas de dependência,
mas essas se agravaram a cada nova etapa de nossa história, do que dá
testemunho a decisão de libertar, desassociar o trabalhador escravizado do
senhor que o explorava.
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Deixado à sua própria sorte na luta
por sua sobrevivência, nunca é demais esquecer a decisão de se pagar indenizações
aos senhores escravocratas, pela ‘propriedade’ que lhes foi desapropriada.
Quanto ao cenário de autodeterminação
em relação a outras nações, estando as
classes produtivas, as mais favorecidas economicamente, dependentes das
relações comerciais estabelecidas e cristalizadas desde a época de colônia, e
que tiveram sequência tanto no período do império quanto na república, o que se
constata é que a independência nada mais é que uma quimera.
***
Apenas a queda da hegemonia britânica,
por ocasião do período de guerras, conseguiu nos tornar independentes da
Inglaterra, nos tornando, como à própria nação em decadência, subalternos,
agora, dos Estados Unidos.
Mais uma vez, altera-se e torna-se
cada vez mais sofisticada nossa forma de dependência. Cada vez mais, aparentemente
nos transmitindo uma imagem de um país mais livre, embora cada vez mais subordinado.
E, mais uma vez, contando com a
colaboração de nossa elite financeira e econômica, cada vez mais associada em
seu enriquecimento aos interesses estrangeiros.
***
Capital nacional cuja associação
com o capital internacional, acaba arrastando para a defesa de seus interesses
antipatrióticos, as elites políticas.
Fenômeno que se mantém e até se fortalece,
mesmo quando de propostas internas de desenvolvimento de um programa nacional
de desenvolvimento industrial, capaz de por fim a nossa situação de subdesenvolvimento
e exploração.
***
Um modelo baseado na atração de
empresas de capital externo, que no limite, transforma nossa submissão de
importadores de bens de consumo, ou mais tarde de bens de capital, para importadores
de tecnologia.
Lembrando mestre Celso Furtado, uma
proposta que nos transforma em país de subdesenvolvimento industrializado.
***
De tudo já dito, que independência
há que se comemorar? E para quem?
Para os pobres? Para os pretos? Para
os famintos e miseráveis? Para os abandonados sem escolarização, ou invisíveis que
lotam as ruas das cidades?
Para as mulheres? Para os
trabalhadores cada vez mais precarizados, sem direitos, talvez nem mais o de sonhar,
em meio ao turbilhão que os envolve e que a propanda dissemina, de se
transformar em empreendedores?
***
Nesse instante, apesar de mostrar
todo seu nível intelectual rasteiro e sua completa incapacidade de entender e
discutir a data; apesar de não ter o que falar ou comemorar por total
incapacidade de compreensão de outra coisa que não seja seu próprio ego; o que
esperar de um político inepto e inapto, incapaz de trabalhar e de governar, de
tomar decisões minimamente reveladoras de empatia com a população que desgraçadamente
o elegeu?
O que destacar em campanha fora de
hora e despropositada, em data idealizada e retratada em quadro de Pedro
Américo como a de um grito, onde Pedro ergue valentemente a sua espada?
***
O que esperar de alguém que teria
dificuldade até para ser classificado como escória da raça humana?
Senão a imagem da vara que deve acalentar
a seus eleitores e apoiadores, e o grito que os conduz ao gozo freudiano:
imbrochável!
Apenas mais uma fake-news para incendiar seus seguidores.
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