segunda-feira, 5 de novembro de 2018

Da tragédia de Mariana, à fuga da Samarco de suas responsabilidades, ao caso Marielle e à presença de Moro na Justiça.

Há exatos 3 anos na data de hoje, um dia 5 de novembro, o Brasil vivenciou seu maior desastre ambiental, causado pela ruptura de uma barragem de rejeitos da mineradora Samarco, em Mariana.
Repleta de episódios heroicos, como a história da moradora que, enquanto pode e teve combustível, utilizou sua moto para ir alertando a todos que encontrava pelo caminho, o mar de lama liberado pela barragem rompida causou a morte de 19 pessoas, soterrou por completo o distrito de Bento Rodrigues, além de avançar para ir se escoar principalmente no Rio Doce.
Ali, prosseguiu sua jornada de destruição de margens, vida natural, peixes, e vida e sonhos de todos os que viviam em suas margens e dependiam das águas contaminadas.
A fúria do mar de lama, invadindo e corrompendo as águas do rio, mudaram o panorama de várias regiões, municípios, estados, como o Espírito Santo e até a Baia de Todos os Santos, na Bahia.
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Desde então, várias foram as ações e sentenças condenando a Samarco ao resssarcimento do prejuízo material causado, desde o pagamento de vultosas indenizações em dinheiro, até a reconstrução da vila destruída, com suas moradias. 
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No entanto, passados 3 anos da tragédia de Mariana, somos informados que, por meio de uma série de recursos interpostos, a mineradora, controlada por empresas do porte da Vale e da anglo australiana BHP Billiton, não efetuaram qualquer pagamento das indenizações a que foram condenadas. 
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O que revela apenas o que é o Brasil, e nossa justiça morosa. Justiça sempre lenta, repleta de desvios e descaminhos, todos devidamente previstos nas leis, o que lhes dá um caráter de legalidade, mas não lhes confere o valor maior da ética, da moral. 
Justiça sempre burocrática, demorada, em especial, quando deve decidir entre os interesses dos mais necessitados, os mais fracos, em conflito com os mais fortes, aqueles que podem se valer de batalhões de advogados, para arrastar as causas por anos a fio. De tal maneira que, tais interesses mais poderosos, ao serem derrotados, acabam beneficiando, muitas das vezes, os herdeiros e não a verdadeira vítima do problema objeto de conflito, muitas vezes, falecida, por não ter como suportar anos de miséria, espera e dor. 
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Vítima desse tipo de comportamento moroso, sem interesse em resolver as situações problema que explodem a cada instante, sem intenção em definir responsáveis e, principalmente, atribuir a cada um a justa punição, temos o caso também de Marielle e de seu motorista. Caso de morte política, não apenas pelo fato de Marielle ser vereadora no Rio de Janeiro mas, independente disso, por não ficar esperando que a justiça caísse dos céus, como milagre, e ir às ruas, tratar de agir, em prol dos interesses em que acreditava. 
É sempre político o papel de quem toma a frente de questões que interessam a maior número de pessoas e se dispõem a ocupar parte de seu tempo, para dedicá-lo a essas outras pessoas. De forma a criar em cada uma das pessoas o sentido de dignidade, de altivez, de responsabilidade e de luta para conquistar seus direitos. 
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Marielle fazia parte dessa categoria de animal político de que todos nós fazemos parte, embora alguns mais entorpecidos que outros. E lutava ao lado de todos os que sofriam as ações violentas e criminosas das milícias. 
A que denunciava, tal como participava de grupos para lidar com outras lutas necessárias para acabar com o desrespeito e a discriminação. 
Foi justamente essa sua luta incansável, pelos ideais em que acreditava, que Marielle foi assassinada. 
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E por envolver interesses poderosos, alguns misturados a toda uma concepção de policiamento e segurança que têm mais relação com a insegurança, e a corrupção, é que até hoje, passados mais de 7 meses desde aquele 14 de março, a polícia carioca continua sem pistas, ou escondendo-as; sem informações conclusivas a respeito da autoria do crime, o que levou a própria Procuradora Geral da República, a invocar o auxílio ou solicitar que o crime passe a ser investigado pela Polícia Federal.
Sob a triste argumentação de que há fortes indícios de que não há interesse, por conivência ou cumplicidade, de a polícia carioca identificar os responsáveis pelas bárbaras mortes de Marielle e Anderson.
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Em meio a todo esse comportamento atrasado, lento, burocrático das forças de segurança de nosso país, de nossa Polícia que nada investiga, quando não é de seu interesse, e dos tribunais e magistrados, é com estranheza que vimos surgir no país uma exceção. 
Honrosa exceção: o juiz da Vara de Curitiba, Sérgio Moro. 
Tão cioso de seu dever e da incumbência que lhe foi atribuída que, em menos tempo que qualquer outro processo teria levado, conseguiu levar a julgamento pessoas tão poderosas como os ex-políticos e empresários e empreiteiros, que representam justamente a categoria de pessoas mais beneficiadas pela longa duração dos processos legais. 
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E não há dúvidas, tão preocupado em não deixar a sensação de impunidade se revelar mais uma vez, o juiz de Curitiba até em suas férias continuou monitorando as ações e atitudes que poderiam interferir no andamento dos processos de que participou como autoridade máxima.
Tamanho desvelo em mais que julgar, punir, e exercer a vigilância de que seus atos não seriam objeto de alteração ou ineficácia por força de interesses inconfessáveis, muitas vezes inseridos na própria rotina dos tramites jurídicos, só poderia projetar o nome do Juiz para outras esferas e mais ainda para o imaginário coletivo. 
Permitindo ao juiz ter um lugar assegurado no Panteão dos Heróis nacionais. 
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Afinal, foi por seu conhecimento da operação Mãos Limpas, desenrolada na Itália e que culminou também com a prisão de autoridades de governo, que Moro pode definir uma linha de atuação para repetir o mesmo procedimento em nosso país. Foi por ter podido conhecer e criticar o que os políticos italianos conseguiram fazer, posteriormente com a operação, interrompendo-a, dificultando-a e no fim, quando já afastada dos holofotes da midia, tornando-a um arremedo de punição, que Moro percebeu a importância de ser célere, e de não dormir sobre os louros, mantendo a eterna vigilância, mesmo em férias, mesmo no exterior. 
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Ao agir como tem agido, Moro conseguiu colocar na cadeia, em Curitiba, os maiores líderes de quadrilhas especializadas em promover a corrupção no setor público nacional. 
Esse mesmo setor público classificado como deficiente pelo diretor do Centro de Competitividade Mundial do IMD.
Conforme o diretor, em entrevista publicada no dia de hoje, 5, pelo jornal Valor Econômico, o Brasil ocupa a 60ª posição entre 63 países, no quesito competitividade. Entretanto, a situação é ainda pior no que diz respeito à eficiência do governo. Segundo Bris, 
O Brasil não podia estar pior. Por exemplo: no indicador de eficiência do governo, o Brasil está no último lugar, pior que a Venezuela. Isso faz alusão a deficiência do setor público, corrupção, finanças públicas, transparência, excesso de regulação.
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Não me escapa a comparação e, por isso, a obrigação de fazer um parêntese no assunto que vinha tratando: porque a fala me permite descobrir porque muitos brasileiros acusam parcela do eleitorado que não votou como eles, no capitão da reserva, de quererem transformar nosso país em uma Venezuela. 
Agora entendi: quem votou contra o eleito, como eu, talvez quiséssemos que, como primeiro passo, pudéssemos alcançar o patamar daquele país nosso irmão. Afinal, como já dizia o companheiro Mao, toda caminhada começa com um primeiro passo. E atingir a posição, ou nos transformarmos em uma Venezuela poderia ser esse primeiro passo, para conseguirmos continuar buscando novas evoluções. 
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Pois completados uma semana das eleições e de termos um novo presidente eleito, ficamos sabendo que Moro vem emprestar seu brilho à política. O que pesa a seu favor. Afinal, quantos de nós não achávamos que ele se julgava, como vários de seus colegas magistrados, como um deus?
Agora ficamos sabendo que ele é capaz de abrir a mão de seu papel de deus, para ser um humano, mísero mortal, e ainda mais sob a chefia ou comando de alguém como o capitão da reserva. 
Castigo que, talvez ele não merecesse. 
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Como ministro da Justiça, contudo, fica evidenciado que sua ação sempre precisa, oportuna, não podia ficar circunscrita apenas a uma operação Lava Jato. Deveria ir se sobrepor a ações menores, para ganhar o espaço de atuação de toda a Justiça.
Tratando de vez, de casos como de policias corruptas, de milícias, de contrabandos de armas e de drogas, além claro de continuar agindo para combater o crime organizado, os doleiros, a lavagem de dinheiro, o caixa dois das empresas, todos os episódios de sonegação, e até os políticos corruptos que continuam infestando o país. 
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Claro, ainda há muito político corrupto a ser alcançado pelas mãos imaculadas de Moro. Assim como muitos doleiros, alguns conhecidos de Moro de longa data, desde o caso do Banestado. 
Entre os políticos, há ainda a Gleisi, o Mercadante, o Paulo Bernardo, o Lindenberg, quem sabe o Randolfe, o Boulos, a Marielle já não precisa mais, a Áurea de Minas Gerais, o Requião, o Renan.
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Não precisam ficar ansiosos, nem atemorizados aqueles com quem Moro convivia e participava de reuniões e eventos sociais, como seus amigos Aécio Neves, ou Temer, ou aqueles políticos que fazem apologia do estupro, já que não estupram apenas as feias, ou aqueles que consideram que não apenas a tortura é algo útil, como ineficiente, já que melhor seria matar a todos os torturados. 
Ao menos, o que restou do físico ou psíquico dos torturados não poderia voltar para cobrar ou exigir respostas, justificativas morais para os atos de selvageria e brutalidade a que foram submetidos. 
Opa! mas isso não é para o Moro que, por ser de boa índole, não iria voltar-se contra seu chefe. 
Nem trair seus amigos. 
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De mais a mais, caso não se torturassem aos que têm opiniões antagônicas, mas simplesmente os eliminassem, o problema real acabaria. 
Nem teria divergências, nem subversivos (muito menos comunistas!!).
E como todos são homens crescidos, adultos, dificilmente terão medo de almas penadas. 
Pero que las hay...

Um comentário:

Anônimo disse...

Meu caro,
O ex-capitão tem se mostrado esperto. Nomeando ministros pela popularidade, e o aspecto simbólico de mudança que representam. Assim temos o midas, o buz lightyear, o batman... pelo menos aos olhos do senso comum. O que não é pouca coisa.
Conversei com pessoas comuns no feriado e todas fizeram, sem exceção, fizeram elogios às nomeações (inclusive gente que não votou no ex-cap), a grande maioria por ingenuidade, outras pelo sentimento de aqueles são pessoas ilibadas e de fato heróis.
Embora não tenha elementos conclusivos,parece que a expectativa de que o país sairá da lama é definitivo... o que pode ser ruim para o próximo governo, afinal a propaganda enganosa não consegue fazer milagres, ou sustenta-lo por muito tempo. Como mostra e escancara a história.
Por outro lado muita coisa espúria pode acontecer em nome desta expectativa. A chegada do juiz revela quem de fato ele e o que representa. No entanto ele está blindado pelo mito de herói, ardilosamente construído pela mídia de massa e alimentado por ele. E os mitos podem fazer coisas terríveis... mas percebidas apenas quando já é tarde demais.

Fernando Moreira