quinta-feira, 31 de março de 2022

Eventos históricos e revisionismos

Não são poucos os movimentos militares destinados à tomada do poder pelas armas, registrados por nossa História.

Entre tais atos de caráter golpista que visavam subverter a ordem, provocar a queda do governo ou impedir a posse de governos eleitos, pode ser citada a chamada  Revolta dos 18 do Forte ou Revolta do Forte de Copacabana, primeira de uma série de frustradas tentativas de golpe do que também é denominado movimento tenentista.

Justificava a Revolta o desejo do grupo de manifestar sua insatisfação com o resultado das eleições, além de combater a República Velha e derrubar o governo, para instalar uma nova forma de governo.

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Não é necessária, nem merece defesa o regime político, de poder, característico da República Velha, ou República dos Coronéis, ou do café com leite.

As práticas do regime destinadas a assegurar a permanência da classe representada pela oligarquia agrária no poder, via rodízio entre as suas distintas facções, eleições manipuladas, eleições de cabresto, votos seletivos (não reconhecimento do direito do voto às mulheres, etc.),  estão bem descritas e revelam a falácia de seu caráter democrático.

Examinado por este ângulo, o êxito da tentativa de golpe dos tenentes era mais que tolerável, desejada pela população de excluídos.

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Mas, da autobiografia de um de seus heróis, o então capitão Juarez Távora, pode-se extrair algumas informações que nos permitem formar uma visão mais precisa do preparo, planejamento, capacidade de organização dos patrocinadores de tal Revolta.

Por seu relato, a movimentação não estava bem estruturada, com problemas de comunicação entre os militares, o que o levou a optar por não participar da marcha iniciada a partir do Forte de Copacabana.

Se virou um dos líderes do movimento, como admite, não foi por sua participação ativa na preparação do golpe, mas por estar como comandante do turno da noite, impossibilitado de impedir seus liderados de se insubordinarem, se a memória não me trai.

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Em seguida, veio o movimento liderado pelo tenente Luiz Carlos Prestes, mais tarde transformado no Cavaleiro da Esperança.

Contando com a participação de Miguel Costa e vários jovens oficiais, entre os quais a figura de Távora, a Coluna Prestes  realizou uma peregrinação de três anos pelo interior do país, visando denunciar o regime oligárquico e obter o apoio popular para a aprovação de reformas de cunho efetivamente democrático.

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Em 1930, a união entre políticos representantes das oligarquias derrotadas na eleição daquele ano e os tenentes, permitiu a derrubada do governo, a derrocada da República Velha e a implantação do período de Vargas à frente do Governo.

Interessante observar que Juarez Távora, comandante das tropas militares de apoio a Getúlio no Norte do país, passou a ostentar grande prestígio, sendo tratado pelo apelido de Vice-Rei do Norte.

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Encerrada a II Guerra, os sopros dos ares da vitória das forças aliadas, defensoras da democracia,  levaram à deposição de Getúlio, com quem Távora havia rompido desde a implantação do Estado Novo, em 37.

Mais tarde, já general, quando ocupava o comando da Escola Superior de Guerra, e filiado à UDN, Távora torna-se um dos líderes do movimento de ruptura institucional que exigia a renúncia de Vargas, e que culminou com o suicídio do presidente.  

Resolve então se candidatar à presidência, sendo derrotado por Juscelino Kubitschek que, eleito, teve sua posse questionada,  tornando-se vítima de dois movimentos militares, de Aragarças e Jacareacanga, que não aceitavam o resultado das urnas.

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Algum leitor pode estar curioso com o destaque dado aqui a Juarez Távora.

É que, em minha opinião, o militar e político cearense ilustra muito bem a visão golpista e de salvador e guardião da Pátria que o general acreditava expressar, fruto da deformação que o Exército sempre incutiu em seus integrantes, assumindo o papel de tutor de uma população incapaz de decidir os seus destinos.

A ideia de um povo incapaz de dirigir sua vida exigia a tutela desse povo por uma instância à parte da sociedade e que pairasse sobre ela, papel que, por auto definição, as forças militares se atribuíram com exclusividade. 

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Não à toa, o mesmo Távora e vários de seus colegas de farda, figuras de relevo do tenentismo são os homens por trás do golpe exitoso que, infelizmente para a nação e a sociedade, vai derrubar o governo de Jango em 1964, implantando uma ditadura que se estendeu por 21 anos.

Entre as bandeiras definidas pelos golpistas, incluíam-se: a defesa da sociedade contra a implantação de um suposto regime comunista; a defesa da família, da tradição católica, da conservação dos costumes; o combate à corrupção, somada à proposta de implantação de reformas ditas estruturantes, que nada mais eram que medidas de política destinadas a pavimentar o caminho para o desenvolvimento econômico capitalista, concentrador e excludente.

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Tortura, morte, autoritarismo, corrupção sem controles, censura à liberdade de expressão e de imprensa foram os resultados, do ponto de vista político-social, da tomada de poder, cujos principais artífices incluíam figuras do tenentismo como Castello Branco, Távora (então ministro da Viação e Obras Públicas), Costa e Silva, entre outros.

Do ponto de vista econômico, a maior consequência do período foi a implantação de reformas afinadas a um movimento de modernização conservadora. E a expansão desmedida do nível de desigualdades do país.

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Sobre o golpe de 64, nada melhor que trazer a frase de um de seus eminentes apoiadores, ao menos no início da implantação da ditadura, Sobral Pinto, em carta enviada ao primeiro presidente imposto pelo ciclo militar, Castello:

“Sinto-me no dever de comunicar (…) que os argumentos ora invocados para combater o comunismo foram os mesmos que Mussolini invocou na Itália em 1922 e que Hitler invocou em 1934 na Alemanha. (…)”

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Experiente e conhecedor das tradições políticas de seu país, antes de retirar o seu apoio ao golpe e à truculência daí advinda, Sobral foi direto ao ponto: o caráter fascista da pregação que se dava dentro do Exército, responsável pela formação de militares com visão deturpada da vida política.

Os militares de então, como os que frequentaram a partir daí as academias de formação militar, têm uma formação fascista, antidemocrática, autoritária. Prova desse desvio de mentalidade, ainda hoje, é o comportamento do ex-capitão, expulso da tropa por atos de terrorismo, e que tantos males provoca ainda hoje ao país; os Augustos Helenos e os relatos de massacres praticados por tropas sob seu comando no Haiti; os Bragas  Nettos e seu comando truculento e ineficaz quando da  intervenção militar no Rio de Janeiro, os Mourões, etc.

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Por tudo isso, não há razão para ficar perplexo com a Ordem do Dia, pela passagem da data FAKE do golpe de 64, assinada pelos comandantes militares.

Golpe que não fossem os males que provocou não deveria ser levado a sério, uma vez que até sua data real, 1 de abril, dedicada ao dia da Mentira, levou seus autores a falsearem sua data, antecipando-a para 31 de março.

Em resumo: golpe fake, por motivações fake, por democratas fake, e com data de mesma e igual natureza.

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Não vou comentar as falácias trazidas no conteúdo da nota já que a sociedade, em especial suas camadas urbanas que representam parcela de sua chamada classe média, foram induzidas a apoiarem do golpe, vítimas da manipulação por parte de uma mídia interessada e interesseira. 

Faço apenas um destaque para trecho que faz referência à celebração do Bicentenário da Independência, que menciona o lema “Soberania é liberdade”.

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Meu destaque se deve à visão das forças militares, já tratada em pitaco anterior, que relaciona a Amazônia, sua ocupação e exploração econômica, qualquer que seja a forma de sua exploração (predatória ou não), à expressão de nossa soberania. 

Essa visão de soberania, se faz acompanhar da noção de uma liberdade do ponto de vista econômico. Uma liberdade que, fruto do desenvolvimento econômico de curto prazo, não tem sustentabilidade. Por isso, condena nosso país à degradação, deterioração e miséria a médio e longo prazos.

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Para concluir, devo comentar o parágrafo da nota que afirma que, para analisar e compreender um fato (GOLPE) ocorrido há mais de meio século, são necessárias isenção e honestidade, já que a história não pode ser reescrita nem vítima de revisionismo.

Pena que, mais uma vez, uma narrativa mentirosa tenta ser construída e difundida, aproveitando da covardia da sociedade civil que não cobrou que os militares fossem investigados e punidos, por eventuais crimes da ditadura.

Mas uma hora a sociedade pode aprender a reagir. E nessa hora, essa visão militar revisionista será lançada ao lixo da história.

sexta-feira, 25 de março de 2022

Reflexões sobre o ano de 1955 e a série de eventos e desdobramentos que se seguiram ao longo do tempo

Ter nascido no ano de 1955 sempre me pareceu um presságio de que minha vida seria embalada pela sorte, e rica de experiências e conquistas.

Esta expectativa tinha como base o fato de a data me permitir participar e , mesmo que de forma indireta e sem consciência plena, de capturar as sensações positivas criadas no ambiente, resultado de uma série de eventos extraordinários tanto para a história de nosso país, quanto para as mudanças e transformações experimentadas em todo o mundo, que afetaram toda a humanidade.

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No Brasil, a candidatura e eleição de Juscelino Kubistschek, com seu otimismo contagiante, e o apoio do general Lott, que permitiram que o país fosse invadido pelos ventos da democracia. Ali pudemos resgatar nosso amor próprio e descobrirmos o potencial de nosso povo na tentativa de superar seu atraso histórico.

Em seguida, a implantação do Plano de Metas, os 50 anos em 5, a construção de Brasília, em paralelo às conquistas na esfera esportiva, como a Copa do Mundo de futebol na Suécia, ou a vitória de Maria Esther Bueno em Wimbledon, as conquistas do Basquete bicampeão de Wlamir, Amaury, Kanela, e a repetição da conquista da seleção canarinha de Garrincha.

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No mundo, o lançamento do Sputnik, o passeio de Laika, a descoberta de Gagarin, de que a terra era azul, e os movimentos de libertação das colônias europeias instauradas na África  traziam a esperança de um mundo melhor e mais desenvolvido.

No Vaticano, o Papa Sorriso, João XXIII, dava início a uma mudança radical, quase uma revolução, voltada para a aproximação da toda poderosa Igreja Católica, de seus fiéis. Visando simplificar os rituais, entre outras mudanças, os padres passaram a dirigir as celebrações litúrgicas postados de frente para a assembleia, enquanto o latim era substituído pela língua de cada localidade.

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Mas, da mesma forma que a moeda, também a vida pode ser caracterizada por duas faces. Lamentavelmente o ano de 1955 é também o ano de nascimento do governante nefasto que hoje devasta o país, a partir da lógica de  um projeto de destruição das instituições e de nossas liberdades democráticas.

Da mesma forma, o mundo assistia à construção do muro de Berlim, à divisão em dois mundos antagônicos, à crise dos mísseis de Cuba e, nos países do América do Sul à derrocada dos governos democráticos, vítimas de golpes sempre estimulados por interesses dos Estados Unidos.

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Em nosso país, a partir de 64 passamos a vivenciar anos de chumbo, de ditadura, autoritarismo e tortura. Período caracterizado pela adoção de políticas direcionadas aos interesses de uma minoria privilegiada, responsáveis por patrocinarem uma concentração de riquezas, benefícios e rendas em favor das várias facçoes do capital.

Nesse período, até 1985, a Academia Militar era o local para onde se dirigiam rapazes candidatos a aspirantes à carreira militar e ao oficialato, submetidos a lições distorcidas que reivindicavam um suposto papel moderador e de bastião do equilíbrio, da ordem e da segurança como condição necessária para se alcançar o progresso.

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Pela cartilha das Forças Armadas, cuja finalidade era justificar o papel de lider do processo de desenvolvimento que usurparam à sociedade civil, não havia espaço para a discussão de ideias voltadas ao desenvolvimento inclusivo, que permitissem a manifestação e o reconhecimento de interesses divergentes e a necessidade de soluções socialmente negociadas, de forma a se chegar à criação e manutenção de uma sociedade harmônica e democrática.

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Fazem parte de minhas lembranças de estudante do ensino fundamental e médio, algumas ideias que tentavam nos inculcar, ou nos impingir pela persuasão ou pela simples repetição mecânica, monocórdica, cuja origem e principais defensores se encontravam nas instalações dos quarteis militares.

Do pacote de narrativas, fazia parte a necessidade de se expandir a taxa de natalidade para que pudéssemos povoar o vazio da região Amazônica.

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Era a época em que a fantasia de uma cobiça internacional pela Amazônia e suas riquezas, então predominantemente ligadas à riqueza florestal era difundida, gerando campanhas publicitárias voltadas para a defesa da integridade de nosso território, em sempre embaladas por uma tom de patriotismo exacerbado.

Ocasião em que a cobiça por nossas riquezas era comprovada a partir da análise dos livros de geografia adotados em escolas americanas,  onde a Amazônia era solenemente ignorada. Sinal evidente de que os americanos consideravam aquela área como de domínio internacional.

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Período em que as indústrias poluentes, então chamadas de indústrias sujas, começavam a ser convidadas para encerrarem suas atividades  e se retirarem dos países do hemisfério Norte, em especial dos países nórdicos, inclusive Suíça.

No desespero de se legitimarem no poder, amparados por um processo de desenvolvimento industrial a qualquer custo, guiados pelos objetivos de crescimento da produção e da geração de empregos, os militares nos postos chaves do governo se alvoroçaram em convidar ou atraírem estas indústrias ou atraírem com um leque de incentivos fiscais.

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Tempos de ingenuidade, que ditavam as decisões de movimentos repletos das mais nobres intenções e com forte apelo nas classes estudantis e nas fileiras operárias, de reação em prol da restauração da democracia e da implantação de uma futura sociedade isenta da divisão de classes.

Movimentos que se decidiram pela luta armada, sob a forma da luta de guerrilha urbana e guerrilha rural, sem considerarem as condições objetivas capazes de sustentarem a mudança social com que sonhavam ou mesmo avaliarem de forma rigorosa o tipo de apoio com que contavam junto aos potenciais beneficiários de suas conquistas.

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Momento da guerrilha do Araguaia, em que se somavam as justificativas tanto para o desenvolvimento de ações militares de rara selvageria e covardia, quanto de ataques à riqueza florestal,  cortada pela construção de uma rodovia que ao lado do progresso, conduziria também a população para a exploração de áreas virgens, onde se erguiriam assentamentos destinados a preencher o vazio populacional.

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O golpe de 64 caiu de podre, sem apoio da classes médias urbanas ou das classes empresariais que financiaram seus primeiros movimentos.

A sociedade civil voltou a assumir a posição de liderança do desenvolvimento de nosso país.

Os militares desmoralizados e sob acusações de desvios e corrupção, embora não generalizados, se retiraram de volta aos quarteis, sem aceitarem o fato de terem sido relegados à lata de lixo da história. 

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Mais tarde, a abertura e a investigação de abusos e desrespeitos aos direitos humanos, implicou na condenação apenas moral de seus autores, que escaparam impunes de seus crimes, em razão da aprovação de uma lei de anistia por eles imposta à sociedade. Ainda assim a simples investigação da tortura gerou ostensivas reações corporativas dos militares.  

Na Igreja, escândalos relacionados a abusos sexuais, há muitos anos denunciados e ignorados, acabaram sendo objeto de veementes condenações, em especial, pelo Papa Francisco, condutor de outra série de transformações importantes para permitir à Igreja retornar à missão que o Cristo lhe confiou.

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Estes são alguns elementos e fatos que justificam a razão de meu entendimento em relação à visão mantida pelos militares de mesma geração do chefe do Executivo, que admito antecipadamente poder estar totalmente equivocado.

Desse entendimento, faz parte meu reconhecimento quanto à extraordinária ocasião que a eleição do ex-capitão terrorista lhes proporcionou, para retornarem ao poder de onde haviam sido enxotados.

Identificada esta janela de oportunidade, esses militares estabeleceram uma estratégia que lhes permitisse a ocupação gradual e subreptícia de espaços de poder, refletida na posse das posições-chaves da máquina do governo, de forma a aplacar seu ressentimento.  

Neste cenário, sua meta é a ocupação do poder sem intermediários, como forma de resgatar o papel de liderança e guia do país e do povo,  que julgam ser sua responsabilidade e missão.

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Daí, a escolha de Braga Netto para companheiro de chapa na disputa pela reeleição do ex-capitão, do ponto de vista dos oficiais, merece ser analisada com mais cuidado. Tal posição pode estar inserida em uma estratégia para suceder ou até derrubar, quando e se for conveniente, o presidente eleito.

Importante lembrar que tal golpe contaria com apoio de grupos não diminutos de nossa população, tanto aqueles que clamam pela volta dos militares, quanto a parcela que compõe a direita mais civilizada e, hoje, profundamente envergonhada .

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Meu palpite é que até que o momento da re-tomada de poder se apresente, Braga Netto e seus colegas de farda continuam compartilhando as mesmas ideias, equivocadas,  paranoicas e anacrônicas em relação à cobiça despertada nos estrangeiros pelas riquezas de nossa antiga Hiléia amazônica.

Assim, os militares nem me parecem confiáveis no sentido da manutenção de nosso Estado de Direito, nem sua atuação é baseada em argumentos minimamente aceitáveis em relação ao uso dos recursos e riquezas que são propriedade de toda a sociedade.

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A candidatura de Lula e o respeito ao resultado das urnas, especialmente das urnas digitais, já sob questionamentos dissimulados por parte de integrantes das próprias Forças Armadas, encontra-se em risco, em minha opinião.

Pior é o fato de o próprio Tribunal Superior Eleitoral, de forma ingênua,  ter convidado as Forças Armadas para virem certificar e assegurar a lisura do processo e do funcionamento das urnas. Com essa atitude, o TSE atribui poder exacerbado a um grupo cuja posição não é digna de confiança.

Por isso, a sociedade civil deve estar atenta e pronta para reagir, se necessário, visando impedir um novo golpe sob a forma de uma nova quartelada.

quinta-feira, 24 de março de 2022

Divagações sobre a evolução das crenças, igrejas e abusos de religiosos e dos que acobertam e se beneficiam da captura do Estado pela religiões

Posso estar enganado, mas acho que a incapacidade de entender e explicar racionalmente sua própria existência, seu objetivo e suas conexões com o outro e com o espaço físico onde habita é que levou os homens, desde tempos imemoriais, a procurarem obter respostas a suas indagações e dúvidas, para além dos limites de seu mundo observável.

Daí o surgimento das religiões, de início politeístas, baseadas em forças da natureza ou em deuses idealizados a partir de uma concepção antropomórfica, a quem se rendiam homenagens e para os quais se celebravam cultos e se faziam sacrifícios.

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Em comum a todas as religiões, a criação e o culto a objetos concretos, representação de símbolos sagrados, sob a forma de totens, imagens, da construção de templos onde se praticavam os rituais, e a existência de uma classe de pessoas com a função de servirem de interlocutores privilegiados, intermediando as relações entre os crentes e as divindades.

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Desta classe de pessoas especiais, é que vão fazer parte os primeiros seguidores de Cristo, os primeiros apóstolos, sob a liderança de Pedro, incumbido pelo próprio Salvador de ser a pedra da fundação sobre a qual se ergueria a Igreja Católica, romana.

No entanto, creio que o papel de Pedro e de seus companheiros, menos que a missão de construção de templos físicos grandiosos, tinha como principal tarefa a evangelização. Seu objetivo: saírem pelo mundo difundindo sua crença e sua Fé, e convertendo os povos.

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Ao longo do tempo, este papel especial, desempenhado nos primeiros tempos pelos sacerdotes, pelas vestais, pajés, anciãos, magos ou pelos primeiros apóstolos, e depois pelos integrantes de ordens religiosas de todas as designações, transmitiu grande prestígio e poder a todos os que se dedicaram ao controle do canal de comunicação direta com os deuses.

Não admira pois, que sua influência tenha se transferido do poder espiritual, eclesiástico, para o poder secular e que, ao lado das tentações da opulência e luxúria, esses missionários tenham se preocupado, cada vez mais, com a construção de templos gigantescos, suntuários, permitindo que usufruíssem de  uma vida de fausto e riqueza, considerado mais apropriado aos representantes do divino.

Tal padrão de comportamento não apenas os identificava como iluminados, como os diferenciava em relação aos homens comuns, pecadores.

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O sustento de tal padrão de vida dependia, inicialmente e em grande medida, da exigência da partilha dos haveres dos convertidos com os mosteiros e ordens religiosas de toda designação, por meio do pagamento do dízimo.

Mais tarde, como sabemos, isso levou à venda de indulgências pela entrega direta dos direitos de propriedades dos pecadores, em troca do perdão que permitiria o ingresso no reino dos justos.

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Como a história nos ensina, tais transações comerciais foram a raiz da indignação de Calvino e Lutero, que desembocou na Reforma protestante.

Nessa altura, como permanece até hoje, a Santa Sé, católica, apostólica, romana, tornou-se uma das maiores, mais poderosas e ricas instituições em todo o mundo.

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Assim, o que testemunhamos hoje, em relação às Igrejas ditas Evangélicas, em várias de suas correntes, é a repetição do mesmo fenômeno já experimentado em relação a várias outras Igrejas. Razão por quê não deveríamos nos assombrar!

Nem mesmo a tentativa e busca de influência, ou mesmo a cada vez maior demonstração de poder destas igrejas nos governos de diferentes países, revelam-se como algo novo. É, apenas e tão somente, o mesmo processo de luta pela conquista do poder secular já praticado por outros ramos religiosos.

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O que preocupa é a confusão entre o Estado - aqui no Brasil por definição laico (por uma opção simples e democrática na essência, a preocupação em atender às necessidades da população de qualquer credo e até dos ateus) -  e os dogmas ou regras de comportamento considerados únicos aceitáveis e corretos, para uma parcela da sociedade.

A opção por não ser uma teocracia tem a vantagem de tentar arejar e adaptar os preceitos de convivência social à evolução dos tempos e dos costumes, evitando a imposição de normas  de comportamentos conservadores e retrógrados indistintamente a todos. Normas retrógradas por seu anacronismo e incapacidade e impossibilidade de aceitarem e promoverem adaptações às novas realidades, sob o risco de facilitarem o não cumprimento, de forma fiel,  de uma suposta verdade, revelada e escrita há muito tempo.

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Mas, sendo laico o Estado, a influência de igrejas nos governos e na formulação de políticas públicas e até na alocação de recursos orçamentários não pode ser tolerada de forma alguma, constituindo crime de responsabilidade do governante que, ao arrepio da Constituição que jurou obedecer, permitir a existência de tal captura.

Portanto, não é o ministro-pastor da Educação que deve ser o acusado da prática de qualquer crime. Afinal, ele foi colocado lá para isso: desmontar a estrutura então vigente, desconstruir tudo que pudesse minimamente levar a enfraquecimento dos dogmas e crenças da igreja a que ele se vincula. Aniquilar qualquer mecanismo de defesa institucional que previna o ataque a  comportamentos distintos ou outros credos.  

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Nesse sentido, o ministro da educação cumpre o mesmo papel e tem a mesma finalidade da indicação de um ministro terrivelmente evangélico para o Supremo. E até poderia perguntar porque o uso do termo terrível: será por ser evangélico, o ministro André Mendonça?

Tanto uma quanto outra situação configuram atos contrários ao que prega a nossa Constituição. O que apenas inclui mais um crime, à lista extensa de outros atos praticados pelo miliciano que desgoverna esse país.

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No entanto, tais considerações não causam qualquer ação seja de nossos representantes no Legislativo, tão ou mais venais que os pastores associados informalmente ao Pastor ministro e à estrutura administrativa daquela pasta, seja de nosso PGR, o Procurador Geral, que também serve de Principal Garantidor do Retrocesso institucional a que estamos submetidos.

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Dominado pelo Centrão e sua volúpia em acessar maior fatia de recursos públicos, por Arthur Lira, que apenas dá sequência ao comportamento omisso adotado desde o período de Rodrigo Maia; o fato de o pastor ministro entregar a gestão e a chave do cofre do Ministério da Educação a dois elementos com o objetivo de delinquirem é apenas mais um retrato de como se dá o combate à corrução empreendido pelo miliciano que ocupa o Executivo e é responsável por rachadinhas, funcionários fantasmas, prevaricação, peculato, genocídio.

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O problema ganha maior gravidade em razão de afetar a área responsável pela formação das futuras gerações, a quem caberá o futuro do país.

A julgar pelo exemplo vindo da cúpula, o futuro de nosso país já se mostra condenado desde agora.

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Crítica a pastores evangélicos e a bancadas de mesma crença, não resolvem o problema.

A sociedade deve exigir sim, que sejam feitas investigações, e comprovada a corrupção, isso dê lugar a condenações, prisões e outras punições.

Mas a punição primeira e mais necessária é a retirada do capitão miliciano do poder para que, sem foro privilegiado, ele possa pagar pelos crimes a que deu origem, atrás das grades.

terça-feira, 22 de março de 2022

Pitacos sortidos: ainda sobre guerras e sobre nosso país. Como diria Debord: um espetáculo

 Ainda de guerras

Já tive a oportunidade de reproduzir, aqui nos pitacos, a frase tornada chavão, que estabelece que a primeira vítima de qualquer guerra é a verdade.

Seja como forma de criar comoção, atrair apoios para um dos lados, afetar positivamente o moral de suas tropas e população, ou de forma negativa as forças oponentes, a banalização da frase não diminui o teor verdadeiro e trágico de seu significado.

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De fato, a concepção idealizada de verdade sempre sai derrotada nos relatos e comunicados apresentados pelos lados em conflito, o que contribui para reforçar – e tornar lugar-comum – o provérbio chinês, que diz que a verdade tem sempre 3 versões: a sua, a minha e a verdade verdadeira,  ideal.

No entanto, tendo como principal motivação uma análise das transformações e inovações geradas pela sociedade capitalista visando destacar e criticar sua transformação em uma sociedade doente - a sociedade de consumo- , o filósofo Guy Debord já havia enfatizado esse predomínio da aparência sobre o real.

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Em seu clássico A Sociedade do Espetáculo, importante obra de crítica às relações sociais resultantes da evolução de nossa sociedade, Debord nos leva a refletir nessa mesma direção da manipulação da verdade.

Baseado em seus argumentos, pode-se identificar algumas prioridades que vieram marcando as fases da sociedade e de suas relações humanas, desde a etapa em que privilegiava o SER, até aquela típica da sociedade capitalista, de priorização do TER, para chegar ao seu ponto culminante, de deformação, onde a principal preocupação é o PARECER TER, na condição do ESPETÁCULO.

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Daí sua denúncia da existência de um controle social, não determinado por uma pequena minoria consciente (autocrática?), mas que surge em resposta ao funcionamento aleatório, de forças individuais, autônomas, independentes, à semelhança e típicas do livre mercado, fundado em  “uma sociedade democrática” (mesmo que para poucos).

Tal espetáculo, que elimina a verdade e a submete às distintas narrativas e ao efeito das influências por ele geradas e transmitidas, afeta a consciência e a capacidade de pensamento de todos nós e nos induz a não duvidar das informações a que estamos expostos, a dizer apenas SIM. Em síntese: serve à mais pura ALIENAÇÃO.

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Mas, se a primeira vítima das guerras é a verdade, as vítimas definitivas são os seres humanos: civis ou militares, jovens ou idosos, solteiros ou casados, brancos, pretos, homens, mulheres, adultos ou crianças.

E estas são as vítimas que não deveriam nunca ser esquecidas ou abandonadas. No mínimo, para impedir que o espetáculo midiático a que a carnificina tem sido reduzida tivesse espaço para todo tipo de representação manipuladora ou deturpadora: dramática, chorosa, lírica até (crianças cantando, pianistas se apresentando, etc.).

No limite, para que as profusão de cores do espetáculo em torno de pessoas brancas, de olhos azuis, europeus de classe média, não roubasse a cena de outros palcos onde vítimas pobres, pretas, crianças e  mulheres morrem destroçados pelas forças aliadas dos pretensos gendarmes do mundo, se não das próprias forças que se arvoram no papel de responsáveis pelo policiamento mundial: os Estados Unidos.

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Nunca é demais revisitar o passado, antes até que seja alterado (por um equivalente ao Ministério da Verdade do livro 1984), para recordar que Berlim já havia sido sitiada em abril/maio de 45, encontrando-se derrotada. Que a Segunda Grande Guerra já estava definida e a rendição japonesa, era questão de tempo, dispensando o lançamento da bomba de Hiroshima.

Também não devemos esquecer de que nunca foram encontradas armas químicas no Iraque de Saddam Hussein, sob o fogo dos bombardeios, dos ataques e mortes.

E que ainda há guerras submetendo crianças e mulheres a todos os tipos de violência, inclusive à morte, por bombardeios como os promovidos pela Arábia Saudita, aliada dos Estados Unidos, no Iêmen. Que persistem as atrocidades cometidas nas invasões de terrenos palestinos promovidas pelo exército de Israel, aliado preferencial dos americanos. Ou da permanência de conflitos, sob os olhares complacentes dos Estados Unidos, na Síria, Somália, etc. 

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No entanto, a hipocrisia nos faz dizer SIM a tudo que seu mestre mandar,  e o Tio Sam não está para brincadeira: pune a Rússia econômica e até esportivamente. Tira o país russo, suas delegações e atletas de competições em diversas modalidades, sob uma justificativa: sanção ao país agressor, responsável pela promoção de uma guerra; punição a um país que não respeita direitos humanos e valores democráticos.

Atos e manifestações contrários à guerra e ao desrespeito à democracia são promovidos em todas as competições, forma de mostrar um mundo unido em um mesmo ideal de combate à barbárie.

Chama a atenção, em meio a tais protestos, a presença de atletas israelenses, sauditas, árabes, americanos, ou seja, personagens de um espetáculo cujo pano já caiu. Ou de espetáculo sem cores vibrantes e comoventes.

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Pitacos breves sobre o Brasil

 

Em nosso país, a pedido da Polícia Federal, ministro indicado ao Supremo pelos ótimos e discretos serviços prestados à família de Temer, esgota todas as formas possíveis de estabelecer contatos com o Telegram, ameaçando bloquear o aplicativo.

Decidido o bloqueio depois de insistentes contatos, nunca atendidos, o dono do Telegram investe em outro espetáculo. Lider na área de comunicações e troca de mensagens, admite que seu aplicativo não estava informado das inúmeras tentativas de contato feitas por nossa Justiça.

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Eu não confiaria em um aplicativo de mensagens que incapaz de gerenciar suas próprias mensagens!

Mas sou apenas um, que não gosta de dizer sempre SIM!

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Pavel Durov, criador do aplicativo se justificou, pediu desculpas e atendeu a todas as solicitações do Supremo. Que suspendeu o bloqueio.

Ou seja: os responsáveis pelo aplicativo apostaram e blefaram. E perderam e tiveram que pagar. 

E não adiantou que adeptos do ex-capitão fizessem as críticas mais pesadas ao ministro, que não só agiu corretamente em sua decisão e postura, como ainda foi bem  parcimonioso e cauteloso em suas ações.

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A meu juízo, as críticas a Alexandre de Moraes são justas. Os motivos é que são questionáveis.

São sem sentido as críticas a ele por sua atuação, como advogado, na defesa de réus ligados ao ao PCC.  Afinal, independente de seus vínculos e das facções de que fazem parte, também aos criminosos está assegurado o direito constitucional de defesa.

Salvo se a raiva dos bolsotários é pelo ministro não ter optado por tomar a defesa dos interesses do miliciano e sua familícia: filhos, ex-esposas e agregados.

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Não confio em Moraes e, depois de tanto se antagonizar com o chefe da milícia, ele sempre vai parecer insuspeito, quaisquer que sejam as suas decisões como presidente do TSE, se favoráveis ao militar que o Exército não quis em suas fileiras.

Mas, admito que posso estar errado, apesar de sempre ter ouvido e lido que, na Inglaterra, o Partido Trabalhista ter sempre sido o mais rigoroso ao tratar as reivindicações dos trabalhadores. Afinal, tinham que mostrar que governavam para todos e não para um nicho.

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Quanto às falas do presidente, não há o que comentar: reclamando da retirada da informação falsa que postou no Telegram, ironizando a importância de sua fake news: e, mais tarde,  preocupado com o bloqueio ao aplicativo que, segundo seu discurso, prejudicaria até os contatos entre pessoas comuns e médicos,  o que poderia ocasionar prejuízo ao atendimento médico, podendo causar até algum óbito. 

Para quem não queria vacinas, recomendava cloroquina e ignorava a gravidade da pandemia; para quem carrega a responsabilidade pela morte de centenas de milhares de brasileiros, a fala do presidente é, no mínimo, risível. (pelo argumento! não a morte!)

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Mas vivemos no Brasil, já por si só, um espetáculo da natureza pujante. Tão pujante e esplendorosa que provoca ciúmes capazes de levarem à adoção de políticas de incentivo à destruição do meio ambiente.

Natureza capaz de ofuscar o espetáculo deprimente protagonizado pelo soldado que o Exército expulsou sob a acusação de atos de terrorismo.

Espetáculo rocambolesco, ao menos. Já que o ex-capitão é hoje o chefe dos Helenos, Bragas... ou seja, todas as pragas que insistem em destruir nosso país.

 

quarta-feira, 16 de março de 2022

A decisão de hoje do Copom: impactos da guerra, da inflação e de políticas equivocadas de governos e estatais

Uma das consequências mais notórias da guerra entre a Rússia e a Ucrânia se manifesta pela adoção de pesadas sanções impostas à Rússia, pelos países ocidentais, Estados Unidos à frente.

Entre tais sanções, o bloqueio dos ativos financeiros - das reservas e direitos mantidos junto ao sistema financeiro internacional pela Rússia, dos valores de propriedades de empresas e empresários (os oligarcas ou magnatas apoiadores de Putin) e de altos funcionários do governo de Putin, inclusive aqueles do próprio dirigente – destacam-se por seu indeditismo, violência e até de sua ilegalidade.

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Afinal, a medida caracteriza-se como um confisco de propriedade privada, investindo contra a propriedade privada tão cara ao capitalismo ocidental e à ideologia do respeito à liberdade individual e ao livre mercado tão cantado em prosa e verso.

Considerada excessivamente drástica, dramática, sua intenção é sufocar o funcionamento regular da atividade econômica na Rússia, privando aquele país dos recursos necessários para oxigenar os fluxos de comércio e produção mesmo no interior do país. Seu objetivo: cortar o ar que permite a respiração que alimenta a musculatura da produção.

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No fim, promover uma estagnação da economia russa que obrigue empresários e o povo a cobrarem de Putin o fim da guerra, chegando até a sua renúncia.

Em último caso, apearem Putin do poder, mesmo que pela força.

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Apenas que, ao que parece, a Rússia já vinha se preparando para a possibilidade de medidas adotadas como represália, destinadas a promover a fratura de sua coluna dorsal na economia.

Para isso, já teria acumulado reservas próximas de 600 bilhões de dólares, com algo em torno de 40% do total depositado em bancos de países do Ocidente. Além disso, ao que se diz, parte das reservas encontra-se sob a forma da moeda internacional – o ouro, não se devendo desconsiderar também a opção pelo uso de criptoativos.

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O que indica que a invasão da Ucrânia, já no radar há mais tempo e depois da emissão de vários sinais de insatisfação com a situação política que vinha se gestando no país vizinho, não foi uma atitude impensada, de um arrivista.

Foi planejada. O que não impede de a represália em tal nível e escala poder ter trazido surpresa a Putin e a seus assessores.

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Além do bloqueio inesperado, outra medida de represália, esta já esperada foi a adoção de embargos comerciais e da ameaça de punição a todos os países que mantivessem relações econômicas com a Rússia.

Grande fornecedor de petróleo e, especialmente de gás para a Europa, com destaque para a Alemanha, além de alimentos e fertilizantes à base de potássio para todo o mundo, o embargo, ainda que não atingindo no primeiro instante a todos os principais produtos,  não era de se estranhar uma elevação de preços nos mercados internacionais, para produtos como potássio, fertilizantes, trigo, milho, petróleo, gás.

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Elevação internacional de preços que impacta os níveis de inflação em todo o mundo, o que me leva a reescrever a frase inicial deste pitaco:

“Uma das consequências mais notórias da guerra entre a Rússia e a Ucrânia se manifesta pela” escalada de preços de produtos estratégicos em escala internacional, o que se traduz em elevação dos índices de preços na maioria dos países, ou seja, de uma realimentação do processo inflacionário já experimentado por vários deles, em razão da pandemia.

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Este fenômeno da inflação irá afetar de maneira distinta a cada país, elevando a preocupação das autoridades americanas, por exemplo, que já se encontravam às voltas com recorde de inflação desde a crise do petróleo nos anos 70.

No Brasil, já tendo atingido a casa dos dois dígitos em 2021, a inflação dá sinal de não perder força, nesse início de ano.

Apenas que, em nosso caso, mais que consequência específica da guerra, a inflação é mais reflexo da incúria de nosso des-governo.

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Senão vejamos: reduzido o fornecimento do petróleo russo, a menor oferta eleva o preço do barril do óleo tipo brent.

Não nos esqueçamos que, junto ao movimento real, os mercados de commodities e futuros passam a operar também com a criação e manipulação de expectativas, em caráter tipicamente especulativo.

Isso não apenas alimenta as cotações do petróleo, como amplia a volatilidade de seus preços.

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Como a Petrobras adota a política de preços do barril baseada na Paridade de Preços de Importação-PPI e, sabendo-se que não temos capacidade de refinar a quantidade necessária para atendimento a nossa demanda, é o impacto direto da volatilidade e elevação do preço internacional em nosso país.

Nunca é demais destacar: mesmo sendo um país capaz de se tornar autossuficiente na produção do produto, a formação de preços depende basicamente de dois fatores que não estão sob nosso controle: o preço do barril internacional e o câmbio, ou o preço do dólar.

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Não bastasse isso, a privatização levada a cabo pelos governos ‘nacionalistas’ recentes - de Temer e deste capitão de araque com seu posto Ipiranga  (antes com gasolina adulterada, agora, com resquício de não conter mais combustível) – entregou nossas refinarias a capital estrangeiro, que age com objetivos de desmantelar nossas refinarias, dentro de um planejamento em escala internacional que move os grupos econômicos a que pertencem.

Permitir a um país periférico atingir sua autonomia não é, definitivamente, uma alternativa.

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Em função desta política que favorece a acionistas, especialmente aos internacionais, mais que aos interesses estratégicos do país cujo governo é ou deveria ser o seu controlador, a Petrobras aumenta os combustíveis em 20%, em média, elevando o diesel ainda em maior proporção.

Com isso, toda a cadeia de distribuição e suprimento, assentada no transporte rodoviário, acaba penalizada: o custo de frete se eleva e pesa no preço final das mercadorias.

Isso, se ainda houver caminhoneiro em condições de pagar os custos de combustível para transportar os bens.

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Para não ficar muito extenso, não vou me aprofundar aqui nos impactos do aumento do potássio e dos fertilizantes em toda a cadeia de produção agrícola, capaz de afetar nossa produção, nossas importações e o preço de rações de frangos, porcos, etc. e o preço da carne desses animais.

Vou apenas falar de passagem do efeito sobre alimentos destinados a nossa população, também afetados, problema agravado pela decisão do governo de não mais adotar políticas de formação de estoques mínimos de segurança.

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Sobem combustíveis, repassados depois para os todos os preços da cesta de consumo, sobem as carnes, sobem os alimentos, e o des-governo, em desespero decide dar subsídio para diesel e até gasolina.

Para o povão, que “bate” de ônibus em sua luta pela sobrevivência diária, a redução do diesel terá algum impacto positivo.

Mas o que a população mais pobre, em geral, tem de alívio, ela perde no caso de possível subsídio à gasolina, que representa um gasto a mais nas despesas do governo, tirando recursos de outras áreas, para permitir que os mais ricos e privilegiados possam continuar se deslocando no conforto de seu carro particular.

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Agora, de forma superficial responda: você é diretor do Banco Central, responsável pela fixação da nova taxa básica bde juros da economia, a Selic. Você sabe que nosso país adota para combate à inflação o regime de metas inflacionárias que tem como principal, se não exclusiva ferramenta operacional, a taxa de juros. Sua elevação.

Os modelos econométricos e dados com que você toma decisões indicam que a inflação não dá sinais de arrefecimento. Suas expectativas, moldadas pela guerra e por possível impasse de mais longo prazo, indicam que a inflação deve continuar pressionada.

Você está vendo o celerado (que em raras ocasiões ocupa sua sala no Planalto, preferindo passear de jet-sky e desfilar com motos de alta cilindragem, ao ar livre, fora do gabinete), decidir adotar toda e qualquer medida não só para levar guedes de atropelo, mas para tentar melhorar sua avaliação nas pesquisas eleitorais, de quebra provocando uma escalada de gastos públicos.

Agora me diga: você iria decidir por elevar a taxa de juros em meros 1% ou 1,25%?

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Tomada sua decisão, baseada em regime de metas de viés monetarista, que tem apenas a taxa de juros como instrumento de ação, como se toda a inflação fosse apenas causada por excesso de demanda e não por exemplo, por choques de oferta, como uma guerra, o que você espera para possível elevação do custo do dinheiro?

E para o custo do capital de giro e manutenção das empresas em produção? E para o nível de emprego? E para o povo, esse eterno sacrificado, excluído dos gastos orçamentários que de fato são importantes para a construção de uma nação solidária e justa?

terça-feira, 15 de março de 2022

A guerra mostra que a humanidade não deu certo. A atuação da imprensa e mídia mundial, comandadas desde os EUA provam o acerto dessa conclusão

Em meu último pitaco, prometi voltar a tratar da invasão da Ucrânia patrocinada pela Rússia. Já naquela oportunidade, acreditava que, para impedir o avanço ameaçador da OTAN, leia-se Estados Unidos, sobre todos os vizinhos territoriais da Rússia, a opção de um Putin acuado, foi virar o jogo: partir para o ataque.

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Assim, entendia que o exército russo iria contar com facilidades em seu avanço por territórios das repúblicas independentes da região de Donbass, permitindo cumprir a estratégia inicial da campanha militar, de proteger a população pró-russa ali instalada, que vinha sendo vítima de severos ataques de forças ucranianas. Não necessariamente ataques de responsabilidade das forças do Exército legal ucraniano, mas de milícias de forte viés nazifascista, instaladas no mar de Azov.

Importante recordar que, conforme o discurso de  Putin, uma intenção da campanha militar no território vizinho era desnazificar aquele país.

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A partir de Donetsk e Luhasnk, acreditava eu que o exército russo aproveitaria a oportunidade para empreender uma  campanha rápida de conquista de cidades de significativa importância econômica e geopolítica, como Odessa,  o que facilitaria o acesso russo ao Mar Negro e Mariupol, que propiciava o estabelecimento de uma ligação  terrestre com a Crimeia, sob controle russo desde 2014.

Claro, a conquista de Kiev seria um trunfo importante de negociação para Putin, da mesma forma que o controle sobre as usinas nucleares de Chernobyl e Zaporizhia, por sua capacidade de geração de energia atômica.

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Talvez por ingenuidade de minha parte, não acreditava no desejo atribuído a Putin de conquistar um território apenas em razão de sua população ser descendente do mesmo Estado Rus, origem de russos e bielorussos, mesmo depois de sua afirmação de que a “Ucrânia nunca teve tradições próprias de Estado”.

Tampouco, acreditava que Putin era movido pelo interesse em dominar os recursos naturais que fazem da Ucrânia um dos países mais ricos de toda a região.

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Fora alguma ingenuidade e desconhecimento, que raciocínio embasava meu pensamento?

Primeiro, e principal motivo, a necessidade de reagir a um suposto estrangulamento promovido à Rússia pelos Estados Unidos, antes que já não houvesse qualquer capacidade de reação possível no futuro.

Além disso, o fato de que, fora a região mais oriental, de fortes influências russas desde sempre, o território ucraniano sempre foi ocupado por uma série de povos e impérios de distintas origens, o que lhes dá certa indiferença à Rússia.

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Piora o quadro, o fato de parte da população ucraniana, residente na região mais ocidental do país, ter maior identificação ou maior atração pela perspectiva (talvez enganosa) de um padrão de vida europeu.

Sem nos esquecer de algum tipo de repúdio a qualquer tipo de retorno ao jugo a que se sentiram submetidos, quando integrantes da União Soviética.

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Caso a Rússia de Putin quisesse de fato atacar, conquistar e manter o domínio sobre a Ucrânia, todos esses fatores levariam a um problema incontornável para um país detentor de imenso poder bélico, atômico, mas de economia de médio porte e bastante fragilizada.

Em minha opinião, além do gasto militar inerente ao ataque – que se amplia a cada dia a mais de combates em território ucraniano – as despesas com manutenção de tropas aquarteladas por longa duração em território derrotado seriam muito elevadas.

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Isso, sem considerar os problemas de perdas humanas na invasão, e posterior desgaste com a manutenção de combatentes fora de seu país, distante de seus familiares e amigos, fora de seu ambiente e sujeitos a potenciais ataques terroristas ou de forças de guerrilha. Estas, fortalecidas pelas tropas de milicianos ultrarradicais de direita.

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Invadir a Ucrânia como trunfo para a negociação, fazendo exigências como a do compromisso de não alinhamento à Otan, ou de condenação e combate às milícias nazistas, mantida a independência das repúblicas pró-russas, seria uma opção mais viável do ponto de vista humano e econômico.

Nesse meio tempo, negociar com os países adversários visando um abrandamento das sanções impostas à Rússia e aos seus principais empresários, seria outro importante ponto a considerar.

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Uma alternativa menos aceitável, mas tolerável seria a inclusão da Ucrânia no pacto do Atlântico Norte, com o compromisso expresso de não instalação de qualquer base militar ou armamento naquele território. Dessa forma, a Ucrânia e seu povo iriam aproveitar-se apenas de algum benefício econômico de pertencer àquela comunidade.

Encarada como uma “punição”, embora de menor peso, a Rússia ainda se comprometeria a devolver a capital Kiev e outras cidades conquistadas ao povo ucraniano e a respeitar a vontade do povo expressa na eleição de um novo governo, admitida a possibilidade de Zelensky concorrer a novo mandato.

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Finalmente, a Rússia admitiria algum tipo de pagamento de indenização de guerra, sob a forma de aquisição de produtos ou mesmo reconstrução de alguma infraestrutura danificada pela ação militar.

Ou seja, em minha opinião, a Rússia teria feito da campanha e da conquista de toda a Ucrânia apenas um grande e caro e sangrento blefe.

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Se eram estas minhas impressões quando do início da invasão, confesso que a guerra que eu acreditava que seria travada alterou-se completamente.

Isso porque a guerra principal não está sendo travada com apoio do exército e forças aéreas de combate russas. O Exército avança a passos lentos, como se a opção de conquistar territórios e mesmo a capital não fizesse parte dos planos.

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A utilização da artilharia parece ser, em alguns casos, de elevado grau de precisão e muito focada, com mísseis sendo disparados de forma a destruir bases importantes para defesa de forças ucranianas, e desbaratamento de possíveis instalações de organização das milícias ali existentes.

Pouco uso tem sido feito de potentes e sofisticados aviões de combate que, ao que parece, estão despejando bombas com prazo de validade vencido, em bombardeios com armas tradicionais e ultrapassadas. Com a grave consequência de tais armas, de precisão muito menor, causarem estragos não desejados junto à população civil.

O que aumenta o ódio dessa população em relação à Rússia. E permite antever que a conquista e manutenção da Ucrânia, pura e simples, seria como a criação de um Afeganistão para Putin.

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Mas, pior que tudo isso, é que a verdadeira guerra tem sido travada pelos meios de comunicação, pelas redes sociais e meios digitais, pelos constantes relatos manipulados seja por partidários da causa russa, seja por todos que se aliam aos interesses americanos.

Ou seja: a verdade, como é de se esperar, tem sido a maior vítima do conflito, em que pesem as perdas inúteis de vidas. Mesmo essas, parcialmente objetos de manipulações e 'fake news'.

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Um fato não pode ser negado: o Exército russo não avançou e destruiu o vizinho com o uso de seu potencial e toda sua estrutura e armamento. Razões para isso não são analisadas nem investigadas.

Toda a mídia, a favor e dominada por interesses outros que não a informação correta, prefere apontar como motivos o heroísmo do povo ucraniano; a liderança e a postura de estadista até então não percebida de Zelensky; o ego e o desejo de restabelecimento de um império ultrapassado por parte de Putin e o seu fracasso em convencer o povo russo de suas reais e justas preocupações.

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A mídia, a imprensa escolheu um lado e já relata os fatos ainda em fase de seu desenrolar, como história acontecida. Por essa visão, Putin e a Rússia já perderam.

Nos comentários, todos os analistas já programaram as próximas ações de Putin, já mostraram como ele está fraco e sem apoio, como será condenado, e já o consideram uma carta fora do baralho. Um tirano fora do poder.

Tomara que Putin seja mesmo destituído, e punido por crimes de guerra e outras atrocidades. Mas, torcer, o que fiz agora, não significa que isso é o que vai ocorrer.

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De resto, torcer não significa que sendo essa a narrativa vitoriosa, ao final, o mundo tenha sido vitorioso.

O(s) vencedor(es) mais que batatas, pode(m) deixar que sua arrogância e incontestável superioridade  se transforme em mal maior para toda a humanidade.

quinta-feira, 3 de março de 2022

De fato, a humanidade não deu certo. E a guerra, que deixou o russo Putin sem opção, por erro de estratégia americana

Um colega, meu amigo, aproveita sempre que pode para me ironizar e à minha ingenuidade, recomendando que eu aceite que dói menos: para ele o Brasil é um país que não deu certo... e nunca vai dar.

Simples assim.

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Mas, não. É pior: cada vez mais chego à conclusão que A HUMANIDADE NÃO DEU CERTO (conclusão a que já chegou o filosocômico José Simão!).

A verdade é que é o ser humano que não deu certo e que, talvez, não seria justo ter destino distinto ao dos dinos.... Em nosso caso, por nossos atos e decisões. Por responsabilidade ou IRRESPONSABILIDADE nossa.

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Sim. Refiro-me à guerra que completa hoje 8 dias e que, desde então é o único assunto que domina mentes e corações. Razão de a divulgação do número de óbitos diários da Covid no Brasil ter deixado de ser feita (o que vale o ‘meme’ de Putin ter conseguido eliminar a Covid!!) e da paralisação dos pitacos.

No caso mais prosaico dos pitacos, confesso, a culpa da necessidade de ler mais, pesquisar mais, conhecer mais, para poder emitir alguma opinião minimamente razoável.

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Mas, antes de abordar a guerra, devo tratar de um outro assunto, característico de nossa total e cada vez maior insânia.

E, não! Não falo dos ataques feitos por drones a Al Shabab, Somália, a grupos classificados pelo Comando Militar americano como terroristas, e com número de mortes de civis ainda não confirmados.

ATAQUES EFETUADOS NO ÚLTIMO DIA 22, DOIS DIAS ANTES DO ATAQUE RUSSO. (Revista Forum).

Você viu? Ou só ouviu falar de ataques no Iemen, na Palestina, Somália, Síria, um total de 28 países, feitos ininterruptamente?

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Direto ao ponto: minha incompreensão quanto a dimensão infinita da insensatez humana, diz respeito à colega economista mexicana Paola Schietekat, que trabalhava na empresa responsável pelas obras de estádios e infraestrurura da Copa do Qatar e foi ESTUPRADA e, depois,  CONDENADA A 7 anos de prisão e 100 chibatadas.

Paola, ajudada pelo Comitê organizador da Copa fugiu. Mas, nestes tempos de machismo cada vez mais tóxico e dogmas religiosos irracionais, vale repetir a pena: 7 anos de prisão e 100 chibatadas.

O motivo: ter tido relações sexuais extraconjugais com seu agressor, que afirmou manter uma relação amorosa com vítima.

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Retomo a guerra, condenável por todos os motivos, por todos os seres humanos, no mínimo, pelas vidas perdidas ou destroçadas; pelos sonhos e realizações de toda uma vida destruídos.

Guerra que todos sabem como começa, mas ninguém sabe como acaba. Onde a primeira vítima é sempre a verdade. Como nos lembra todo este conjunto de trivialidades citados nesse momento.

A verdade é que nas guerras tradicionais, sempre o povo é que perde. Sempre o mais pobre é o mais afetado e prejudicado.

Os ricos, ou oligarcas, até aproveitam-se para aumentar suas fortunas, não apenas pelos lucros expandidos da indústria bélica, e indústrias fornecedoras, mas também pelo aumento de preços resultantes de toda a desorganização imposta aos mercados e cadeias de fornecimento.

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Por mais que a propaganda faça questão de mostrar o cuidado com a proteção e segurança dos civis, a decisão de Putin, como qualquer ataque do gênero, atinge vidas de pessoas que eram contrárias ou inimigas ao agressor, e até daquelas que eram pró Putin ou pró Rússia.

A morte, em sua dinâmica não escolhe as vidas a serem ceifadas.

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Mas, condenado o ataque bélico e destruidor, o que minhas leituras exaustivas me indicam, mesmo reconhecendo não ter chegado a qualquer conclusão relevante.

Vamos tentar ser sucintos.

O que não me impede de recordar uma lição que um amigo e colega,que não vejo há mais de 40 anos me transmitiu. Em homenagem ao Luis Fructuoso Correia, narro a história da caçada ao rato.

Paulo, ele me disse, se você entra em um cômodo e procura acuar o rato, levando-o a um canto, onde pretende deixá-lo sem saída para liquidá-lo, você está cometendo um erro de estratégia. No canto, sem opção para onde ir, ele se encolhe, crispa os pelos, e salta para o espaço, para conquistar a vida e liberdade. Com dentes arregaçados e suas garras prontas, o ataque, em geral no rosto do caçador, provoca consequências e feridas terríveis.

Como proceder estrategicamente? perguntei.

Você prepara a ratoeira ou armadilha em um local. E começa a perseguir o rato cortando-lhe os caminhos de fuga, deixando SEMPRE uma rota de fuga. Essa rota é a que ele vai usar. É também a que o conduz à armadilha.

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Como estudante, no ensino médio ou na faculdade, na época da PEG (Política de Educação do Governo, militar) e do famigerado DL 477, ou no mestrado ou doutorado, confesso que a bibliografia utilizada era mais do tipo Yankees. Go Home! Nunca quis ler textos americanófilos, criado no quinta dos americanos (um país sem qualquer condição de implantação do comunismo e porso, longe de trazer preocupações para os americanos).

Se não merecíamos atenção e não éramos nem motivo de preocupação, também nunca tivemos financiamentos. (Texto de Demosthenes Madureira Pinho Neto, na Introdução ao livro dos 50 anos do Plano de Metas, do BNDES).

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Avesso aos americanos, sua pretensão a gendarme do mundo, e sua liderança imposta pelas armas, gostava de recitar No caminho com Maiakovski, então erroneamente atribuído ao poeta russo, de autoria de Eduardo Alves da Costa.

Dizia:                    Na primeira noite eles se aproximam
e roubam uma flor
do nosso jardim.
E não dizemos nada.
 

O poema finaliza quando não podemos fazer mais nada, quando o mais frágil deles entra em nossa casa e nos rouba a luz, e por nunca termos reagido, nosso medo impede-nos de dizer alguma coisa.

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Fui pesquisar o que é a Organização do Tratado do Atlântico Norte, para verificar a data de sua criação (1949), objetivos: inibir o avanço do bloco socialista, na Europa; oferecer ajuda militar a todos os países membros, etc.

Sem disfarçar seus reais motivos, esta associação política tem um orçamento com gastos que respondem por 70% de todo o gasto militar no planeta. Engloba as maiores economias do mundo, além da maior, os Estados Unidos e tem em seu artigo 5º a exigência de os estados membros auxiliarem a qualquer membro sob ataque.

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Procurei, mas não encontrei nada, embora reconheça, por deficiência minha, maiores informações sobre gastos em investimento, em financiamentos ao desenvolvimento dos seus membros. Coisas que, além da criação de demanda para a indústria bélico-militar, trariam benefícios a quem se associasse. Principalmente depois de a Guerra Fria ter acabado, a União Soviética ter se desestruturado por completo, dando origem a vários outros estados, e a Rússia, passar por períodos trágicos ao fim da experiência malfadada do socialismo real.

A Rússia hoje é tão capitalista, com grandes fortunas e capitais, quanto os Estados Unidos. Apenas com um PIB muito inferior.

Logo, não há qualquer razão para a persistência da OTAN. Nem para a entrada no clube, de nações antes integrantes do bloco soviético.

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Exceto para pressionar e cercar o líder ultradireitista Putin, com armas, exércitos, bases e mísseis, localizados em sua fronteira, para atemorizar o povo russo. E, talvez, cortar qualquer possibilidade de seu desenvolvimento.

Putin tem Aleksandr Dugin como guru e conselheiro, o filósofo fascista do atraso das Teorias Conservadoras que visam resgatar o tradicionalismo, o retorno da sociedade hierarquizada, a formação da grande Eurásia.

Dugin, amigo, parceiro de Olavo de Carvalho, defensor da invasão da Ucrânia.

Razão para o discurso de Putin, de estar desnazificando a Ucrânia cair no vazio.

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Não que a Ucrânia não tenha um forte movimento nazifascista, embora os movimentos existentes, mesmo unidos, não tenham conseguido eleger nenhum representante para Câmara.

Não que não haja conflitos entre os povos do lado oriental ou ao sudeste (Donbass), pró-russos ou de origem russa, e os povos do lado ocidental, que se sentem mais europeus.

Conflitos, até sangrentos, sempre aconteceram, mais recrudescidos pós 2014, e a quebra dos acordos de Minsk. Aliás, acordos que não foram os primeiros  a serem rompidos pelos Estados Unidos e seus interesses imperialistas.

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Quanto à frase, Faça Humor não faça a Guerra, corruptela de Faça Amor... não se aplica ou explica Volodymyr Zelensky, embora o presidente eleito e no poder na Ucrânia, seja um comediante de origem.

Forçoso reconhecer que, comunicador hábil, vindo de área da comédia, que considero uma das mais sensíveis ao ser humano, o que deve ajudá-lo na utilização de argumentos e falas que tocam a sensibilidade e o emocional das pessoas, tem se mostrado um líder hábil.

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Líder que poucos reconheceriam em sua figura, quando candidato mostrava-se antidemocrático. Ao extremo de pouco antes de sua eleição, representar um quadro satírico onde, presidente eleito, invadia o Congresso e metralhava os representantes eleitos pelo povo.

Líder popular e antipolítica, em mais uma contradição desta guerra.

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Há muito mais para analisar e tratar sobre o assunto, mas deixo para outro pitaco a análise da reação ocidental, de utilização de armas econômicas, na tentativa de sufocar a economia de porte limitado da Rússia. Ou as consequências do ataque e até de uma possível invasão vitoriosa e exitosa dos exércitos de Putin.

Até algum comentário sobre a amizade, solidariedade e imparcialidade de Bolsonaro a Putin, menos por questões de fertilizantes ou acesso a trigo, milho etc. Acredito que mais em razão do desejo de se aproveitar dos mesmos hackers que tanto ajudaram na eleição de Trump, e nos ciberataques a Hillary.

Nosso presidente, que questiona a segurança das urnas digitais, deve ter interesses muito maiores e inconfessáveis na arma cibernética dos ataques russsos.

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Mas não posso encerrar sem lembrar. Putin, o rato, estava sendo acuado. Calado, não reagia, talvez por medo.

Então, para não lhe roubarem a luz, partiu para o ataque de desespero(?).

À sua frente, a Ucrânia, dividida, com parte da população apoiando os russos e vários motivos para discursos capazes de justificarem até que a terra voltou a ser plana, como as teorias antigas de seu guru.