quarta-feira, 16 de março de 2022

A decisão de hoje do Copom: impactos da guerra, da inflação e de políticas equivocadas de governos e estatais

Uma das consequências mais notórias da guerra entre a Rússia e a Ucrânia se manifesta pela adoção de pesadas sanções impostas à Rússia, pelos países ocidentais, Estados Unidos à frente.

Entre tais sanções, o bloqueio dos ativos financeiros - das reservas e direitos mantidos junto ao sistema financeiro internacional pela Rússia, dos valores de propriedades de empresas e empresários (os oligarcas ou magnatas apoiadores de Putin) e de altos funcionários do governo de Putin, inclusive aqueles do próprio dirigente – destacam-se por seu indeditismo, violência e até de sua ilegalidade.

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Afinal, a medida caracteriza-se como um confisco de propriedade privada, investindo contra a propriedade privada tão cara ao capitalismo ocidental e à ideologia do respeito à liberdade individual e ao livre mercado tão cantado em prosa e verso.

Considerada excessivamente drástica, dramática, sua intenção é sufocar o funcionamento regular da atividade econômica na Rússia, privando aquele país dos recursos necessários para oxigenar os fluxos de comércio e produção mesmo no interior do país. Seu objetivo: cortar o ar que permite a respiração que alimenta a musculatura da produção.

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No fim, promover uma estagnação da economia russa que obrigue empresários e o povo a cobrarem de Putin o fim da guerra, chegando até a sua renúncia.

Em último caso, apearem Putin do poder, mesmo que pela força.

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Apenas que, ao que parece, a Rússia já vinha se preparando para a possibilidade de medidas adotadas como represália, destinadas a promover a fratura de sua coluna dorsal na economia.

Para isso, já teria acumulado reservas próximas de 600 bilhões de dólares, com algo em torno de 40% do total depositado em bancos de países do Ocidente. Além disso, ao que se diz, parte das reservas encontra-se sob a forma da moeda internacional – o ouro, não se devendo desconsiderar também a opção pelo uso de criptoativos.

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O que indica que a invasão da Ucrânia, já no radar há mais tempo e depois da emissão de vários sinais de insatisfação com a situação política que vinha se gestando no país vizinho, não foi uma atitude impensada, de um arrivista.

Foi planejada. O que não impede de a represália em tal nível e escala poder ter trazido surpresa a Putin e a seus assessores.

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Além do bloqueio inesperado, outra medida de represália, esta já esperada foi a adoção de embargos comerciais e da ameaça de punição a todos os países que mantivessem relações econômicas com a Rússia.

Grande fornecedor de petróleo e, especialmente de gás para a Europa, com destaque para a Alemanha, além de alimentos e fertilizantes à base de potássio para todo o mundo, o embargo, ainda que não atingindo no primeiro instante a todos os principais produtos,  não era de se estranhar uma elevação de preços nos mercados internacionais, para produtos como potássio, fertilizantes, trigo, milho, petróleo, gás.

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Elevação internacional de preços que impacta os níveis de inflação em todo o mundo, o que me leva a reescrever a frase inicial deste pitaco:

“Uma das consequências mais notórias da guerra entre a Rússia e a Ucrânia se manifesta pela” escalada de preços de produtos estratégicos em escala internacional, o que se traduz em elevação dos índices de preços na maioria dos países, ou seja, de uma realimentação do processo inflacionário já experimentado por vários deles, em razão da pandemia.

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Este fenômeno da inflação irá afetar de maneira distinta a cada país, elevando a preocupação das autoridades americanas, por exemplo, que já se encontravam às voltas com recorde de inflação desde a crise do petróleo nos anos 70.

No Brasil, já tendo atingido a casa dos dois dígitos em 2021, a inflação dá sinal de não perder força, nesse início de ano.

Apenas que, em nosso caso, mais que consequência específica da guerra, a inflação é mais reflexo da incúria de nosso des-governo.

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Senão vejamos: reduzido o fornecimento do petróleo russo, a menor oferta eleva o preço do barril do óleo tipo brent.

Não nos esqueçamos que, junto ao movimento real, os mercados de commodities e futuros passam a operar também com a criação e manipulação de expectativas, em caráter tipicamente especulativo.

Isso não apenas alimenta as cotações do petróleo, como amplia a volatilidade de seus preços.

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Como a Petrobras adota a política de preços do barril baseada na Paridade de Preços de Importação-PPI e, sabendo-se que não temos capacidade de refinar a quantidade necessária para atendimento a nossa demanda, é o impacto direto da volatilidade e elevação do preço internacional em nosso país.

Nunca é demais destacar: mesmo sendo um país capaz de se tornar autossuficiente na produção do produto, a formação de preços depende basicamente de dois fatores que não estão sob nosso controle: o preço do barril internacional e o câmbio, ou o preço do dólar.

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Não bastasse isso, a privatização levada a cabo pelos governos ‘nacionalistas’ recentes - de Temer e deste capitão de araque com seu posto Ipiranga  (antes com gasolina adulterada, agora, com resquício de não conter mais combustível) – entregou nossas refinarias a capital estrangeiro, que age com objetivos de desmantelar nossas refinarias, dentro de um planejamento em escala internacional que move os grupos econômicos a que pertencem.

Permitir a um país periférico atingir sua autonomia não é, definitivamente, uma alternativa.

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Em função desta política que favorece a acionistas, especialmente aos internacionais, mais que aos interesses estratégicos do país cujo governo é ou deveria ser o seu controlador, a Petrobras aumenta os combustíveis em 20%, em média, elevando o diesel ainda em maior proporção.

Com isso, toda a cadeia de distribuição e suprimento, assentada no transporte rodoviário, acaba penalizada: o custo de frete se eleva e pesa no preço final das mercadorias.

Isso, se ainda houver caminhoneiro em condições de pagar os custos de combustível para transportar os bens.

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Para não ficar muito extenso, não vou me aprofundar aqui nos impactos do aumento do potássio e dos fertilizantes em toda a cadeia de produção agrícola, capaz de afetar nossa produção, nossas importações e o preço de rações de frangos, porcos, etc. e o preço da carne desses animais.

Vou apenas falar de passagem do efeito sobre alimentos destinados a nossa população, também afetados, problema agravado pela decisão do governo de não mais adotar políticas de formação de estoques mínimos de segurança.

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Sobem combustíveis, repassados depois para os todos os preços da cesta de consumo, sobem as carnes, sobem os alimentos, e o des-governo, em desespero decide dar subsídio para diesel e até gasolina.

Para o povão, que “bate” de ônibus em sua luta pela sobrevivência diária, a redução do diesel terá algum impacto positivo.

Mas o que a população mais pobre, em geral, tem de alívio, ela perde no caso de possível subsídio à gasolina, que representa um gasto a mais nas despesas do governo, tirando recursos de outras áreas, para permitir que os mais ricos e privilegiados possam continuar se deslocando no conforto de seu carro particular.

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Agora, de forma superficial responda: você é diretor do Banco Central, responsável pela fixação da nova taxa básica bde juros da economia, a Selic. Você sabe que nosso país adota para combate à inflação o regime de metas inflacionárias que tem como principal, se não exclusiva ferramenta operacional, a taxa de juros. Sua elevação.

Os modelos econométricos e dados com que você toma decisões indicam que a inflação não dá sinais de arrefecimento. Suas expectativas, moldadas pela guerra e por possível impasse de mais longo prazo, indicam que a inflação deve continuar pressionada.

Você está vendo o celerado (que em raras ocasiões ocupa sua sala no Planalto, preferindo passear de jet-sky e desfilar com motos de alta cilindragem, ao ar livre, fora do gabinete), decidir adotar toda e qualquer medida não só para levar guedes de atropelo, mas para tentar melhorar sua avaliação nas pesquisas eleitorais, de quebra provocando uma escalada de gastos públicos.

Agora me diga: você iria decidir por elevar a taxa de juros em meros 1% ou 1,25%?

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Tomada sua decisão, baseada em regime de metas de viés monetarista, que tem apenas a taxa de juros como instrumento de ação, como se toda a inflação fosse apenas causada por excesso de demanda e não por exemplo, por choques de oferta, como uma guerra, o que você espera para possível elevação do custo do dinheiro?

E para o custo do capital de giro e manutenção das empresas em produção? E para o nível de emprego? E para o povo, esse eterno sacrificado, excluído dos gastos orçamentários que de fato são importantes para a construção de uma nação solidária e justa?

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