Uma das consequências mais notórias da guerra entre a Rússia e a Ucrânia se manifesta pela adoção de pesadas sanções impostas à Rússia, pelos países ocidentais, Estados Unidos à frente.
Entre
tais sanções, o bloqueio dos ativos financeiros - das reservas e direitos
mantidos junto ao sistema financeiro internacional pela Rússia, dos valores de
propriedades de empresas e empresários (os oligarcas ou magnatas apoiadores de
Putin) e de altos funcionários do governo de Putin, inclusive aqueles do próprio
dirigente – destacam-se por seu indeditismo, violência e até de sua
ilegalidade.
***
Afinal,
a medida caracteriza-se como um confisco de propriedade privada, investindo
contra a propriedade privada tão cara ao capitalismo ocidental e à ideologia do
respeito à liberdade individual e ao livre mercado tão cantado em prosa e verso.
Considerada
excessivamente drástica, dramática, sua intenção é sufocar o funcionamento
regular da atividade econômica na Rússia, privando aquele país dos recursos necessários
para oxigenar os fluxos de comércio e produção mesmo no interior do país. Seu
objetivo: cortar o ar que permite a respiração que alimenta a musculatura da
produção.
***
No
fim, promover uma estagnação da economia russa que obrigue empresários e o povo
a cobrarem de Putin o fim da guerra, chegando até a sua renúncia.
Em
último caso, apearem Putin do poder, mesmo que pela força.
***
Apenas
que, ao que parece, a Rússia já vinha se preparando para a possibilidade de
medidas adotadas como represália, destinadas a promover a fratura de sua coluna
dorsal na economia.
Para
isso, já teria acumulado reservas próximas de 600 bilhões de dólares, com algo em
torno de 40% do total depositado em bancos de países do Ocidente. Além disso, ao
que se diz, parte das reservas encontra-se sob a forma da moeda internacional –
o ouro, não se devendo desconsiderar também a opção pelo uso de criptoativos.
***
O
que indica que a invasão da Ucrânia, já no radar há mais tempo e depois da
emissão de vários sinais de insatisfação com a situação política que vinha se
gestando no país vizinho, não foi uma atitude impensada, de um arrivista.
Foi
planejada. O que não impede de a represália em tal nível e escala poder ter
trazido surpresa a Putin e a seus assessores.
***
Além
do bloqueio inesperado, outra medida de represália, esta já esperada foi a
adoção de embargos comerciais e da ameaça de punição a todos os países que
mantivessem relações econômicas com a Rússia.
Grande
fornecedor de petróleo e, especialmente de gás para a Europa, com destaque para
a Alemanha, além de alimentos e fertilizantes à base de potássio para todo o
mundo, o embargo, ainda que não atingindo no primeiro instante a todos os
principais produtos, não era de se
estranhar uma elevação de preços nos mercados internacionais, para produtos
como potássio, fertilizantes, trigo, milho, petróleo, gás.
***
Elevação
internacional de preços que impacta os níveis de inflação em todo o mundo, o
que me leva a reescrever a frase inicial deste pitaco:
“Uma das consequências mais
notórias da guerra entre a Rússia e a Ucrânia se manifesta pela” escalada de preços de produtos estratégicos em escala
internacional, o que se traduz em elevação dos índices de preços na
maioria dos países, ou seja, de uma realimentação do processo inflacionário já
experimentado por vários deles, em razão da pandemia.
***
Este
fenômeno da inflação irá afetar de maneira distinta a cada país, elevando a
preocupação das autoridades americanas, por exemplo, que já se encontravam às
voltas com recorde de inflação desde a crise do petróleo nos anos 70.
No
Brasil, já tendo atingido a casa dos dois dígitos em 2021, a inflação dá sinal
de não perder força, nesse início de ano.
Apenas
que, em nosso caso, mais que consequência específica da guerra, a inflação é
mais reflexo da incúria de nosso des-governo.
***
Senão
vejamos: reduzido o fornecimento do petróleo russo, a menor oferta eleva o
preço do barril do óleo tipo brent.
Não
nos esqueçamos que, junto ao movimento real, os mercados de commodities e futuros
passam a operar também com a criação e manipulação de expectativas, em caráter
tipicamente especulativo.
Isso
não apenas alimenta as cotações do petróleo, como amplia a volatilidade de seus
preços.
***
Como
a Petrobras adota a política de preços do barril baseada na Paridade de Preços
de Importação-PPI e, sabendo-se que não temos capacidade de refinar a quantidade
necessária para atendimento a nossa demanda, é o impacto direto da volatilidade
e elevação do preço internacional em nosso país.
Nunca é demais destacar: mesmo sendo um país capaz de se
tornar autossuficiente na produção do produto, a formação de preços depende
basicamente de dois fatores que não estão sob nosso controle: o preço do barril internacional e o câmbio, ou o preço do
dólar.
***
Não
bastasse isso, a privatização levada a cabo pelos governos ‘nacionalistas’
recentes - de Temer e deste capitão de araque com seu posto Ipiranga (antes com gasolina adulterada, agora, com resquício
de não conter mais combustível) – entregou nossas refinarias a capital
estrangeiro, que age com objetivos de desmantelar nossas refinarias, dentro de
um planejamento em escala internacional que move os grupos econômicos a que pertencem.
Permitir
a um país periférico atingir sua autonomia não é, definitivamente, uma
alternativa.
***
Em
função desta política que favorece a acionistas, especialmente aos internacionais,
mais que aos interesses estratégicos do país cujo governo é ou deveria ser o seu
controlador, a Petrobras aumenta os combustíveis em 20%, em média, elevando o
diesel ainda em maior proporção.
Com
isso, toda a cadeia de distribuição e suprimento, assentada no transporte
rodoviário, acaba penalizada: o custo de frete se eleva e pesa no preço final das
mercadorias.
Isso,
se ainda houver caminhoneiro em condições de pagar os custos de combustível
para transportar os bens.
***
Para
não ficar muito extenso, não vou me aprofundar aqui nos impactos do aumento do
potássio e dos fertilizantes em toda a cadeia de produção agrícola, capaz de
afetar nossa produção, nossas importações e o preço de rações de frangos, porcos,
etc. e o preço da carne desses animais.
Vou
apenas falar de passagem do efeito sobre alimentos destinados a nossa população,
também afetados, problema agravado pela decisão do governo de não mais adotar políticas
de formação de estoques mínimos de segurança.
***
Sobem
combustíveis, repassados depois para os todos os preços da cesta de consumo,
sobem as carnes, sobem os alimentos, e o des-governo, em desespero decide dar
subsídio para diesel e até gasolina.
Para
o povão, que “bate” de ônibus em sua luta pela sobrevivência diária, a redução
do diesel terá algum impacto positivo.
Mas
o que a população mais pobre, em geral, tem de alívio, ela perde no caso de
possível subsídio à gasolina, que representa um gasto a mais nas despesas do
governo, tirando recursos de outras áreas, para permitir que os mais ricos e
privilegiados possam continuar se deslocando no conforto de seu carro
particular.
***
Agora,
de forma superficial responda: você é diretor do Banco Central, responsável
pela fixação da nova taxa básica bde juros da economia, a Selic. Você sabe que nosso
país adota para combate à inflação o regime de metas inflacionárias que tem
como principal, se não exclusiva ferramenta operacional, a taxa de juros. Sua
elevação.
Os
modelos econométricos e dados com que você toma decisões indicam que a inflação
não dá sinais de arrefecimento. Suas expectativas, moldadas pela guerra e por possível
impasse de mais longo prazo, indicam que a inflação deve continuar pressionada.
Você
está vendo o celerado (que em raras ocasiões ocupa sua sala no Planalto,
preferindo passear de jet-sky e desfilar com motos de alta cilindragem, ao ar
livre, fora do gabinete), decidir adotar toda e qualquer medida não só para
levar guedes de atropelo, mas para tentar melhorar sua avaliação nas pesquisas
eleitorais, de quebra provocando uma escalada de gastos públicos.
Agora
me diga: você iria decidir por elevar a taxa de juros em meros 1% ou 1,25%?
***
Tomada
sua decisão, baseada em regime de metas de viés monetarista, que tem apenas a
taxa de juros como instrumento de ação, como se toda a inflação fosse apenas causada
por excesso de demanda e não por exemplo, por choques de oferta, como uma guerra,
o que você espera para possível elevação do custo do dinheiro?
E
para o custo do capital de giro e manutenção das empresas em produção? E para o
nível de emprego? E para o povo, esse eterno sacrificado, excluído dos gastos
orçamentários que de fato são importantes para a construção de uma nação
solidária e justa?
Nenhum comentário:
Postar um comentário