quarta-feira, 11 de maio de 2011

Melhoram as expectativas quanto à inflação

Está na Folha, caderno Mercado,  de ontem. Fernando Sampaio, economista, sócio diretor da LCA Consultores, em artigo especial apresenta uma análise positiva da inflação brasileira.
Intitulado "Discurso mais duro do BC ajuda mercado a reduzir expectativa", o autor prossegue dizendo em sub-título que o "Esforço na melhoria da comunicação pode ter reduzido projeção para o PIB, e consequentemente para a inflação". E prossegue: "melhora recente da coordenação de expectativas, embora ainda incipiente, merece ser comemorada".
Ok. Se está tudo bem, e funcionando na direção desejada, porque tratar aqui o assunto, ao invés de partir para a comemoração como recomenda o economista?
Porque a comemoração que o mercado está propondo e orientando a todos que entrem na festa é, em minha opinião, uma capitulação que alguns analistas de instituições financeiras já perceberam no comportamento da diretoria do Banco Central.
Ou seja: como não era de se duvidar, o mercado conseguiu, ou anda pensando assim, capturar o BC e colocar o agente que deveria supervisioná-lo como submisso a suas vontades.
Mas... com cautela. E um certo cheiro de ameaça, velada, no ar.
Senão vejamos: o autor reconhece que "as expectativas de inflação apuradas pelo Banco Central junto a dezenas de bancos, consultorias e instituições de pesquisa tiveram ligeira melhora."
Para além disso, afirma corretamente o que todos os economistas e pessoas bem informadas já perceberam: "(é) provável que o principal fator para a melhora seja o recuo das cotações das matérias-primas, tanto minerais como agrícolas, nas duas últimas semanas. Isso interrompe uma alta que se prolongava há quase um ano e meio -o rali de alta mais longo e mais pronunciado de que se tem notícia."
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Até aqui o que temos?
Sempre afirmamei nesse blog, e os que me acompanham podem se recordar, que a principal causa da escalada dos preços não era culpa nossa, e passava pelo fator que o autor menciona. Daí que sempre critiquei o uso de política monetária, juros em especial, para conter a demanda interna que não era a causa principal da inflação.
Poderíamos até admitir, como o fizemos, que a demanda interna aquecida poderia sim por mais lenha na fogueira, mas o aumento de juros poderia jogar o país na recessão e não combater a elevação de preços.
Não a alimentaria, mas não a eliminaria.
Não é isso mesmo que o autor menciona quando trata a redução da projeção de crescimento do PIB, e convenhamos, até parece querer sinalizar a felicidade dos analistas do mercado por que o país vai crescer menos?
Ora, crescer menos não reduz, por si só, uma inflação cuja origem não depende de nós mesmos. É apenas a velha e já cansativa discussão entre crescimento e inflação, já há muito tratada pela teoria como Curva de Phillips.
Há pouco tempo atrás, inclusive o ex-ministro Mendonça de Barros, o Luiz Carlos, também em artigo para a Folha dizia que acreditava que muitos economistas voltariam a ter de tratar com um conceito que, para ele, felizmente teria de ser retomado: justo a curva de Phillips.
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Quem sou eu para discutir com o prof. Mendonça de Barros. Mas para mim, a curva de Phillips e sua consequência teórica deveriam era serem esquecidas. Afinal, o próprio artigo seminal da teoria de espiral preços-salários, não deixava claro a existência da relação entre crescimento, redução da taxa de desemprego, aumento de salários e aumento de preços que é a explicação da espiral, exceto para pequenos períodos de observação. Estatisticamente, o gráfico mostra que os pontos de taxa de inflação e crescimento do PIB, para a totalidade de anos (quase 100) pesquisados por Phillips, não mostra nenhuma tendência. Muito menos uma curva negativamente inclinada. Apenas uma nuvem.
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Mas voltemos ao nosso artigo. E vejamos como o autor introduz a questão da coordenação exercida pelo BC.
"É bastante incerto, contudo, o quanto o esforço recente do governo, e em especial do BC, para melhorar a sua comunicação com o mercado também pode ter contribuído para a redução da estimativa.
Mas é possível que o endurecimento do discurso anti-inflacionário tenha ajudado na "ligeira" revisão para baixo das projeções para o crescimento do PIB, e que esse tenha sido um ingrediente para os analistas projetarem uma inflação um pouco menos folgada."
Ou seja, enquanto parecia que o BC estava privilegiando a manutenção do crescimento do PIB e, via de consequência, a manutenção do emprego, o mercado revoltado demonstrava cada vez mais sua insatisfação, por meio da deterioração das expectativas. Mas, agora que parece que o BC percebeu que não é do agrado do mercado patrocinar o trade-off entre crescimento e inflação, e que o BC vem tomando medidas mais duras (leia-se aqui, a promessa de continuar usando juros para combater a inflação, como o fez nas últimas reuniões do COPOM), as expectativas melhoram.
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Justiça seja feita, o autor reconhece que o BC, desde o início desse 2011 atuou no sentido de conter a demanda e o crédito, adotando medidas macroprudenciais. Ou seja, já vinha trabalhando no sentido de controle da escalada inflacionária.
Apenas que esse controle estava utilizando instrumentos (clássicos alguns) de política monetária, como " elevações de depósitos compulsórios" e outras medidas novas como as "exigências de reserva de capital, bem como medidas ditas macroprudenciais". E, o autor prossegue: "Essas medidas limitam o volume de recursos que os bancos têm à disposição para emprestar, ou reduzem a liberdade com que eles podem dispor desses recursos."
E, conclui que isso trouxe um problema grande para as instituições financeiras, que não souberam precificar essas novas ferramentas e seu impacto em sua estrutura de custos e formação de tarifas e juros ao tomador de crédito. Problema que já era muito bem equacionado com a utilização da Selic.
O significado disso é claro: os bancos perderam a condição de avaliar o custo das medidas, o que lhes impossibilitou de saber o quanto cobrar e, pior, afetou sua previsão de lucros.
Mas, tudo bem, já que a direção é a correta, e os juros afinal podem voltar a se transformar na ferramenta preferencial adotada pelo BC, as expectativas melhoram.
Mas...
A ameação surge no fim do artigo, com um alerta: "A melhora recente da coordenação dessas expectativas, embora ainda incipiente e sujeita a reversão, merece ser comemorada."
Sujeita a reversão, viu BC? Ou seja, não é para folgar não.
O melhor é que continue se comportando como o Mestre mandar. Desculpe, como mandar o deus mercado.

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