quinta-feira, 2 de maio de 2013

Primeiro de maio: crise, desemprego e inflação

Primeiro de maio, talvez o único feriado realmente universal de nosso calendário.
E na data em que os trabalhadores de todo o mundo deveriam estar unidos, comemorando conquistas e melhorias, o que a imagem das televisões nos mostram são passeatas e manifestações em protesto, algumas até com direito à eterna repressão policial armada.
Foi assim em Barcelona, onde a manifestação transformou-se em confronto com a polícia e ataques a lojas comerciais. Foi assim em Portugal, e na França, embora as manifestações nesses dois países, mais pacíficas.
Tudo em reação às políticas adotadas pelos governos europeus, sob a égide e inspiração do governo alemão, favorável renitentemente à adoção de políticas de austeridade.
Isso, mesmo na Alemanha onde o nível da atividade econômica sinaliza para desaceleração.
Dessa forma, a comemoração do Dia Internacional do Trabalho, realiza-se em meio a uma das mais agudas crises de desemprego, em anos.
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E nem adianta argumentar, como o tem feito Paul Krugman, que medidas de austeridade fiscal, quando prematuras, acarretam ou reforçam uma tendência de queda do emprego que conduzem o país à depressão. Como ele próprio reconhece, em sua coluna publicada no portal UOL no último dia 29 de abril sob o título de "A história do nosso tempo", seus argumentos favoráveis à elevação de gastos governamentais e dos déficits orçamentários costumam ser recebidos com desdém, sob a acusação de pessoas como ele sempre querem mais gastos.
Krugman, ao contrário, se defende dizendo que não defende indiscriminadamente tal política, e que se o faz neste momento, é apenas por estarmos vivendo um momento raro, e grave. Como ele afirma, " ... neste momento esamos enfrentando o "dia seguinte" a uma crise financeira do tipo que só acontece uma vez a cada três gerações. AGORA NÃO É HORA DE AUSTERIDADE." (letras em caixa alta por minha conta).
Em seu argumento, que vale a pena registrar, a questão tem origem na forma que os problemas econômicos são entendidos e tratados.
Assim, muitos encaram a economia como se fosse exatamente semelhante a uma família individual, o que desde cedo é apresentado aos alunos de economia, como podendo dar origem ao conhecido sofisma da composição, que significa que o que é muito bom considerado de um ponto de vista individual pode, se generalizado para o conjunto de indivíduos, ser muito ruim.
No raciocínio de Krugman, as famílias ganham o que conseguem e gastam o que desejam. Pelo ângulo de cada uma isoladamente, ganhar e gastar dinheiro são coisas (e se dão em instantes) diferentes.
Entretanto, na economia como um todo, receitas e gastos são dois lados de uma mesma moeda: os gastos de uns são a receita ou ganhos de outros. Daí que se todos reduzem seus gastos simultaneamente, também as receitas serão reduzidas.
Ora, com a crise financeira de 2007/2008, que atingiu a muitas famílias quando já estavam com seu grau de endividamento muito elevado, muitas dessas famílias foram forçadas a reduzirem seus gastos.
Somadas a essas reduções de gastos, várias outras famílias optaram por reduzir seus gastos, em função da própria incerteza que cerca o ambiente de crise.
A redução de gastos do setor privado da economia foi vertiginosa, e nessa hora, apenas os gastos governamentais poderiam sustentar o nível de demanda agregada, até que o setor privado se reequilibrasse e voltasse a seu padrão de gastos tradicionais.
Caso o governo adotasse políticas fiscais mais expansionistas, isso não provocaria, na visão do Nobel de Economia, um efeito deslocamento, com os gastos públicos competindo com o setor privado. Nesse sentido, afirma que os gastos governamentais não desviam recursos de utilizações privadas, apenas  colocam recursos não empregados para trabalhar.
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Faço aqui um parênteses para recordar que nada como reabilitar o velho e surrado princípio da demanda efetiva, de preferência conforme a abordagem de Kalecki, consubstanciada na máxima de que "enquanto os trabalhadores gastam o que ganham, os capitalistas ganham o que gastam".
Ou seja: são os gastos capitalistas, em consumo capitalista de bens sofisticados e bens de capital que são determinantes da expansão da produção e renda, o que implica que mais gastos não irão pressionar a renda aceita como dada. Ao contrário, mais gastos irão expandir a demanda, a produção e a renda.
No caso, como o ambiente de incerteza e crise não é capaz de estimular o aumento de gastos empresariais, restaria ao governo gastar no lugar de...
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Assim prossegue Krugman, dizendo que empréstimos contraídos pelo governo não tomam o lugar dos investimentos privados, mas serve para que esses recursos financeiros, mobilizassem recursos reais, de outro modo ociosos.
Krugman prossegue mostrando que, ao contrário do que defendem e projetam os analistas que recomendam a austeridade, os efeitos de políticas monetárias e fiscais expansionistas, não culminariam em um processo inflaçionário.
Pois bem, vou transcrever um trecho mais de sua coluna, antes de apresentar sua conclusão e tentar extrair daí alguma lição para nosso país.
Diz ele, porque acreditar em seus argumentos? Afinal, " há pessoas que insistem que o problema real está no lado da oferta da economia: que os trabalhadores não possuem as qualificações necessárias, que o seguro-desemprego acabou com o incentivo para trabalhar... "
E conclui dizendo que as propostas de austeridade têm como verdadeira motivação a visão de que a crise traz uma oportunidade impar, para DESMONTAR A REDE DE SEGURANÇA SOCIAL.
E finaliza, praticamente todos que fazem parte da elite política se pautam no pensamento de uma minoria rica, que não está sofrendo muito.
Bingo!
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É aqui que a gente começa a entender as propostas e críticas de pessoas como o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, ou de seus colegas de partido ou de oposição, para quem já acabou a crise, mas o governo brasileiro continua gastando e incentivando gastos de forma irresponsável.
Bem, pode ser mesmo que já tenha acabado a crise que afetou mais de perto a minoria rica no Brasil, porque de caráter meramente financeiro. Já a outra, a crise que significa redução de demanda, de produção, emprego e renda, essa continua ainda bem presente. Em especial potencialmente, pelo efeito contágio, já que a depressão na Europa significa menor demanda por produtos de exportação brasileiros.
Se, nesse momento, reduzem-se as compras internas do setor privado e as compras públicas, o que teremos é a desmontagem daquilo que os programas de bolsas ou assistencialistas, ampliados e tornados mais universais pelo PT, começaram timidamente a tentar montar.
Alegar que isso está trazendo de volta a inflação, sem considerar as várias outras causas que explicam nesse momento a reaceleração inflacionária, que já está em processo de arrefecimento, é apenas a demonstração de como a questão econômica é sim, utilizada como arma de interesses políticos.
E demonstração de como os social-democratas de nosso país, na verdade, apenas defendem os interesses de classe que representam.
Como não poderia deixar de ser, Aécio aí incluído.

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