Ainda assim o governo comemora, com o secretário do Tesouro salientando tratar-se de uma reversão importante nos números, já que fevereiro teve como resultado um déficit de 7,5 bilhões.
Considerado todo o trimestre, as receitas apresentaram queda de 4,4% em relação ao mesmo período do ano anterior, enquanto a queda dos gastos foi bem menor, de apenas 0,8%.
Apenas em março foi obtido superávit de 1,5 bilhão de reais, contra 3,5 bilhões alcançados no mês em 2014.
Insisto que o resultado não deveria causar surpresa. Afinal, os manuais de macroeconomia costumam destacar que as despesas do governo costumam ser incompressíveis. Difíceis de serem cortadas, tanto do ponto de vista legal quanto do ponto de vista político. E pior, são gastos que uma vez não realizados em uma área, acabam provocando elevação de gastos posterior em outra área.
Como por exemplo quando o governo corta os gastos com a conservação de estradas, o que contribui para a elevação do número de acidentes, acarretando maiores despesas com saúde ou com pagamento de benefícios sociais.
E é desse tipo de corte que estamos falando, quando se anuncia que os investimentos caíram 31,3%, sendo que a queda nos investimentos do PAC alcançou percentual ainda maior.
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Mas, se as despesas não podem ser comprimidas como o governo desejava, as receitas apresentaram queda, mesmo com elevação da carga tributária, sinal evidente da retração que toma conta de nossa economia. E que já havia sido e tem sido prevista pela grande maioria dos analistas, que já projetam queda de mais de 1,2% do PIB para o ano.
Cai o PIB, cai a renda, cai a arrecadação. E nem adianta querer aumentar alíquotas de impostos, ou eliminar as desonerações como o ministro Levy abordou em visita ao Congresso.
Porque, ao aumentar a carga tributária, reduzindo a renda disponível das famílias, ou ao retirar as desonerações e, dessa forma, provocar algum tipo de elevação no preço final de alguns produtos, o que teremos é uma retração maior ainda da demanda agregada. Com direito a algum respingo sobre o índice de inflação.
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O que nos traz ao outro elemento importante de nossa conjuntura econômica: a inflação. E com ela, que dá sinais de resistência, a elevação das taxas de juros, dentro do receituário do Sistema de Metas de Inflação.
Situação que levou o COPOM a, pela quinta vez seguida, elevar os juros em mais 0,5%, o que leva a taxa meta da Selic para o patamar de 13,25% há muito tempo não atingido. Desde 2008, pelo que informam os meios de comunicação.
Com a elevação dos juros, elevam-se os pagamentos de transferências, o que obriga a uma majoração do superávit primário programado pelo governo.
Como o superávit não vem apresentando a tendência esperada, não haverá recursos suficientes para o pagamento dos juros, o que obrigará o governo a ampliar a colocação de títulos públicos, elevando a dívida bruta.
Com maior dívida bruta e PIB declinante, a proporção dívida pública/PIB se eleva, o que pode sinaliza uma fragilização das contas públicas. E pode ter alguma consequência na classificação de rating das agências internacionais para o nosso país.
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Curioso é que, no Congresso, Levy ameaça com o rebaixamento que o país sofreria na avaliação de seu grau de risco, caso não fosse aprovado o pacote de ajuste fiscal.
E, na verdade, em minha opinião, mais ajuste e aperto que seja adotado, mais o PIB apresentará queda, mais o governo terá superávits menores e mais o endividamento irá se elevar.
Ou seja, o remédio ajuda a agravar o quadro do doente, e não a promover seu restabelecimento.
O que é também projetado pelos analistas de mercado, ouvidos pelo Focus do Banco Central, para quem o governo não irá conseguir cumprir sua meta de ajuste.
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E, em minha opinião, até com certa cara-de-pau, analistas e técnicos do Banco Central anunciam que deve haver uma ligeira melhora dos níveis de inflação, como se tal melhoria estivesse ligada ao conjunto de medidas que essa Autoridade Monetária tem patrocinado.
Na verdade, a partir de abril deveremos ver uma melhora da inflação por efeito da desvalorização do dólar, parte em razão de a economia americana continuar apresentando sinais de que está difícil manter uma evolução favorável mais sustentada. Parte pela necessidade de o dólar parar de se valorizar em todo o mundo, para evitar que os exportadores americanos continuem sendo prejudicados.
Ambas as situações são interessantes por assinalarem que os juros americanos não deverão subir, pelo menos não até o final do ano, o que sossega um pouco o mercado de câmbio brasileiro. Com a elevação de nossa taxa básica de juros e a manutenção dos baixíssimos juros americanos, parte da volatilidade provocada pelo temor de uma fuga de capitais fica contida.
E o dólar pode voltar a um patamar mais adequado.
Além dessa questão, que independe de nossas ações, outra contribui para a queda da cotação do dólar: o balanço auditado da Petrobras, que permitiu à empresa assegurar algumas concessões de financiamento externo.
Com a entrada de recursos, especialmente de empréstimos chineses, o dólar mais abundante, tende a se desvalorizar.
E tudo isso contribui para que a nossa inflação apresente alguma retração. Às custas, claro, de nosso setor exportador, e de nossa indústria.
Mas, muito pouco por influência de medidas de política econômica, ao menos em minha opinião.
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E vem Levy dizer que o país precisa de elevar a poupança, especialmente pública, quando o que o país precisa é decidir gastar - decisão que antecede à da poupança - em investimentos. Porque ao investir, os recursos assim utilizados irão, naturalmente, deixar de ser usados para produção de bens de consumo. E, por definição, sem serem utilizados para a produção de bens de consumo, tais recursos estarão sendo poupados. É automático.
Mas, a decisão primeira é a de gastar, e da forma de gastar para levar o país a crescer. Tudo contrário ao que o ministro está anunciando.
Enfim, é esperar para ver.
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