sexta-feira, 8 de julho de 2016

A renúncia de Cunha e como isso ajuda a temer

Cercado de toda a teatralidade possível, que contou inclusive com a voz embargada por um choro interior, Eduardo Cunha renunciou ontem, à presidência da Câmara dos Deputados, depois de idas e vindas, marchas e contramarchas que vêm ocupando espaços na mídia há quase um ano.
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Logo em seguida, anexou ao recurso que já havia apresentado à Comissão de Constituição e Justiça, um pedido, para que seu processo retorne à Comissão de Ética, onde já havia sido recomendada sua cassação, sob a alegação de que houve mudança substancial nas circunstâncias que envolvem seu processo.
Afinal, não que o deputado Cunha tenha conseguido juntar provas, documentos, o que quer que seja, provando não ter nada a ver com as contas de depósitos na Suiça.
Muito  menos, o alegado truste reconheceu que Eduardo Cunha não gerencia, nunca gerenciou e não tem qualquer usufruto dos recursos por ele administrados. Nada disso!
A única justificativa é o fato de que Cunha deixou de ser presidente da Casa.
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Ou seja: a sua alegação para que o processo seja todo examinado novamente, mostra que a Casa age de forma não justa, não legal, não ética, ou pode agir em suas Comissões, especialmente se quem está sendo investigado é gente importante.
E age de forma mais benevolente, caso seja apenas um dos 570 e tantos deputados.
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Brincadeira, para dizer o mínimo.
Ou não.
Afinal, Cunha age sob acerto com ninguém mais que o usurpador temer.
Até do ponto de vista do timing, é interessante observar que a renúncia de Cunha é adotada logo depois de ele ter se reunido com seu companheiro de partido e de golpes. E sabe-se mais de que...
Mas não é apenas isso.
A carta renúncia de Cunha é justamente apresentada no momento em que seu vice na presidência da Casa, e atualmente presidente interino, Waldir Maranhão, ter dado a entender que irá, finalmente, agir no sentido de dar curso ao pedido de impeachment de temer, pelos mesmos argumentos que fundaram o pedido de Janaína, a desequilibrada.
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Então, menos que salvar Cunha e recomeçar o que não teria qualquer sentido, como a análise de se Cunha mentiu ou não na CPI, o problema maior é não permitir que, na cadeira que ocupa interinamente, Maranhão possa dar o golpe dentro do golpe, tirando o usurpador do lugar que não lhe pertence, já que não foi colocado ali, como manda a legislação, pelo voto da maioria da população do país.
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Sem presidente, dada a renúncia, Maranhão não pode mais ocupar a presidência, e temer se livra de dores de cabeça.
Enquanto isso, na negociação ou acordão, Cunha vai garantindo o apoio da base aliada, para sua permanência com o mandato, e consequentemente, com o foro privilegiado.
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A respeito desse acerto, vale sempre destacar aquilo que o ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha, afirmou ontem, em entrevista: que o governo não interfere nas questões internas da Câmara. Que não tem preferências nem desafetos, e que a sua única preocupação é manter a base de apoio aliada unida.
Traduzindo para quem não percebeu o recado: mesmo não interferindo nas decisões internas da Câmara, em especial no que se refere à antecipação da data de eleição do deputado para exercer o mandato tampão de presidente da Casa, temer não vai deixar de apoiar tudo que for favorável à manutenção do mandato de Cunha, seu parceiro.
Afinal, como se sabe, Cunha tem comando, e poder de influenciar vários deputados do chamado baixo clero, alguns dos quais, ao que dizem perto de 150, que ele ajudou, inclusive a eleger, com financiamentos de campanha prá lá de questionáveis.
E, como é do partido do usurpador, e comanda votos da base de apoio, a frase do Eliseu (que contam as más línguas que ACM, vulgo Toninho Malvadeza, chamava de Eliseu Quadrilha) destaca que para manter o apoio e não rachar a sua base, temer irá fazer o que estiver a seu alcance, para manter os interesses de Eduardo Cunha preservados.
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Curiosamente, chegamos a esse ponto. Apenas a preservação dos interesses de Cunha, mantém preservados os mesmos interesses de temer, como se fossem interesses indissociáveis. E devem mesmo ser...
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Antecipa-se a votação para presidente da Câmara para antes da cassação em plenário de Cunha; elege-se mais um marionete da tropa de Cunha; seu processo retorna à Comissão de Ética, como aliás, a CCJ já estava tramando, com o parecer do relator do recurso de Cunha, para quem o voto é diferente, caso a pessoa vota no painel ou nominalmente, como foi.
E Cunha e temer ficam mais algum tempo tranquilos, já que engaveta-se o pedido de impeachment de temer.
Os mercados ficam contentes e tudo passa a sinalizar que o país irá melhorar...
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Uma observação necessária: a questão de que os partidos de apoio a Cunha, e da base de temer, estão alterando o nome de seus representantes nas comissões, de forma a alterarem o resultado das votações, quem sabe agora, recomendando apenas uma advertência e não mais a cassação de Cunha.
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Então, menos a questão envolve menos Cunha e a tentativa de manter seu mandato, como a imprensa faz questão de deixar claro e destacar para não trazer a verdadeira motivação à tona.
E a verdadeira motivação é a manutenção do usurpador no cargo que não lhe pertence, já que um pedido de impeachment, pelos mesmos motivos do que foi aceito contra Dilma, apenas significaria que não faz qualquer diferença que Dilma volte, já que ela sim, foi eleita.
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Nesse meio tempo, Meirelles vai se tornando mais um dos muitos profissionais que vão se queimando, ao  passarem algum tempo sentados na cadeira de ministro da Fazenda.
Agora, por força de um déficit, mais um, projetado para 2017, de 139 bilhões de reais, isso na busca de alcançar um equilíbrio fiscal ou um ajuste fiscal.
Ou seja, a equipe econômica admite que não tem como reverter o quadro, sem que haja algum aumento de impostos, ou sem que a economia volte a crescer significativamente.
Admite que foram as medidas de austeridade do início do mandato de Dilma II que levaram o país ao nível de depressão que vamos assistindo ter lugar. E que, por terem sido adotadas tais medidas, a receita despenca sem travas. E o déficit aumenta.
Claro está que, agora, não dá mais para continuar responsabilizando Dilma e seu governo por mais esse déficit, já na programação de temer.
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Essa a grande questão: ninguém duvida que sem crescimento da arrecadação a situação do país vai melhorar. E para crescer, não são medidas de austeridade que irão levar os empresários a investir, apenas na vã ilusão de que o país com temer é melhor que com Dilma. Ao contrário, o país com o usurpador é pior, bem pior, por seu defeito de origem, ou sua instalação anti-democrática.
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Também não se questiona o fato de que os empresários para investirem, exigem incentivos do governo, o que a equipe econômica de temer já sinalizou que vai manter, tal qual vem funcionando, implementadas tais ações no governo Dilma. Aliás, esse o rombo gigantesco, das desonerações que provoca estragos no resultado primário. E que foi uma das principais falhas de Dilma.
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Mas o problema maior é que se sabe que em nosso país, onde os juros tornam qualquer investimento produtivo menos atraente do que as aplicações no mercado financeiro, tendo em vista a taxa exorbitante de juros básica da economia, os empresários apenas investem a reboque do governo.
Ou seja: se o governo não investir, principalmente em infra-estrutura, os empresários não reagem e não investem, como fizeram durante o mandato de Dilma, onde obtiveram vantagens e não entregaram sua parte no tocante a aumentar a produção.
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E não será com políticas de austeridade que qualquer ajuste fiscal será exitoso, por conta do que foi assinalado acima. O que a equipe econômica de temer parece também já ter percebido, quando projeta aumentos de déficits para 2016 e a sequência desses resultados para 2017.
É isso.

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