Comentei rapidamente no facebook a notícia da morte, em Portugal, do professor Fernando Cardim de Carvalho, professor da UFRJ, participante do grupo de Estudos da Moeda do Instituto de Economia daquela instituição acadêmica e coordenador de um dos livros mais adotados de Economia Monetária e Financeira dos cursos de Economia Monetária em nossas escolas.
Pós-Keynesiano, considerado como um heterodoxo em nosso país, o que o coloca em linha de choque com o pensamento novo-clássico dominante em nossas instituições, a divulgação de seu falecimento em Portugal, na quarta feira da semana passada mereceu uma notícia que considerei algo acanhada na Folha de São Paulo. Até mesmo por sua linha contrária ao pensamento hegemônico que domina mentes e corações de nossa academia, neoliberal e de seus pilares, os economistas que se curvam em orações e preces ao deus mercado.
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Na nota da Folha, curiosamente há uma referência ao fato de que ele achava importante haver aqui no país, um espaço maior para discutir-se uma abordagem mais heterodoxa, o que era uma vantagem em relação aos demais centros de estudo.
Pois bem, como aconteceu em outras ocasiões com outros autores e economistas de viés mais crítico, parece que tal conquista não era tão robusta, a julgar pelo tratamento dispensado a sua perda.
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Entende-se, Cardim de Carvalho ajudou a divulgar em nosso país, passagens de quem, como Keynes, dizia ser no mínimo estranho que em um mundo em que a moeda estava presente em todas as transações, a moeda fosse ignorada, junto a seus possíveis efeitos, na análise da vida econômica.
Por outro lado, ajudou a difundir Minsky e sua importante contribuição para a justificativa da presença do 'Big Government', para resolver a instabilidade que é algo inerente ao sistema capitalista., como está proposto em Estabilizando uma Economia Instável.
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A Fernando Cardim de Carvalho, meu agradecimento, pelo pouco que pude aprender estudando seus textos e livros.
E que descanse em paz.
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Juros e Comportamento do Dólar
Justo na ocasião em que o dólar dá sinais de que está rompendo limites previstos, em razão de motivos de natureza alheias a nossa vontade, o COPOM anuncia, também na quarta feira passada, a manutenção da taxa de juros básica da nossa economia, a SELIC.
A manutenção que contraria e, como é óbvio, deve ter imposto perdas aos analistas do mercado, que já contavam com mais uma redução da taxa básica de juros, foi motivo de crítica de toda a comunidade financeira.
Como se o fato de a Autoridade Monetária não ter obedecido ao seu patrão natural - o mercado financeiro, não o povo - fosse um absurdo inominável.
Tal comportamento, algo meio histérico, chegou ao ponto de criticar o presidente do Banco Central que preside o Comitê da Política Monetária, como se ele estivesse vendo e evitando fantasmas debaixo de sua cama.
E fez-me lembrar de outra ocasião - agosto de 2011, quando o presidente do Banco Central, na oportunidade Tombini, em regresso de encontro internacional sob os auspícios do FMI, foi convencido de que a situação de crise internacional, de recessão, alcançaria níveis muito elevados, o que demandava a adoção de medidas imediatas.
Ao chegar ao Brasil, na reunião do COPOM, a provável divulgação dos temores dos analistas internacionais, levou o COPOM a providenciar a imediata queda das taxas de juros, de forma a se antecipar a possível depressão no horizonte.
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Na ocasião, também Tombini foi vítima de críticas pesadas dos analistas que diziam que ele tinha perdido sua autonomia e a do órgão que dirigia e que seguia as ordens da presidenta Dilma, em sua desesperada tentativa de manter os níveis de crescimento do governo que lhe antecedeu: o de seu criador, Lula.
A história da obediência do BC e do COPOM, chegou inclusive a esquecer o fato de que o Comitê é composto de todos os membros da Diretoria Colegiada do Banco, com a presença de membros vindos do mercado e de linhas diferentes de formação e pensamento.
Nas críticas mais ácidas, o nome pelo qual o presidente do Banco Central era tratado era o de Pombini, em uma referência ao fato de que o que deveria ser sempre um "falcão" ("hawk") ter virado um pombo...
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Agora o mesmo acontece com o tão homenageado e cantado em verso e prosa, Ilan, o homem do mercado.
Acusado de estar dando ao problema, mais uma vez de origem externa, uma importância que é muito maior que sua verdadeira dimensão.
Afinal, muito da explosão do dólar nos principais mercados de câmbio, provocando a desvalorização de grande parte das moedas das moedas das economias mais fortes, inclusive a brasileira, deve-se a dois fatos principais: a política monetária americana, que sinaliza uma inflexão maior, para a elevação das taxas de juros, já que suas autoridades já se preocupam com a possibilidade de uma elevação da inflação, em razão dos níveis de crescimento da produção e a redução da taxa de desemprego estar indicando uma aproximação de uma situação de pleno emprego. A segunda, o problema da crise no Oriente Médio e nos países árabes, produtores de petróleo, o que vem levando o barril da "commodity" a alcançar níveis recordes.
Importante lembrar que até mesmo a crise naquela região do mundo tem muito a ver com a política ou as medidas de Trump, em apoio ao Estado de Israel, como a transferência da embaixada americana para Jerusalém, a saída do acordo nuclear com o Irã.
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Bem, Trump deve isso aos seus eleitores, certamente. O que o leva a adotar medidas provocativas, que ao invés de solucionar o conflito, apenas atiça ainda mais o fogo que arde, em terreno tão cheio de material combustível.
Assim, ao invés de promover a paz; exigir a devolução das terras ocupadas por Israel, ou a paralisação e destruição de todos os assentamentos irregulares; em lugar de usar de todo o peso e prestígio e força de sua nação, para finalmente dar início à formação do Estado palestino, o que ele faz é sinalizar àquele país agressor, sua concordância com a política de tolerância com atos de morte contra o povo árabe.
Ou seja, dá aval a uma política que, de há muito deixou de ser de defesa da sobrevivência israelense, para se tornar quase um genocídio, logo por quem deveria ter se tornado, por tudo que passou e sofreu de horrores, o povo que mais lutaria contra tal comportamento.
Enfim, em Israel, na região ocupada, na faixa de Gaza, parece que matar árabes a cada dia, está se tornando um esporte. Sob as mais diversas alegações, incapazes de justificarem a barbárie promovida.
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Mas no Brasil, a situação é de inflação abaixo da meta. Economia incapaz de reagir, exceto pela contribuição sempre positiva e recorde, proveniente da agroindústria, o que assegura uma taxa de crescimento do PIB de não menos de 1%, não mais que uns 2%, isso se a proximidade das eleições e seu ambiente de incertezas não reduzir ainda mais as previsões.
Por isso, e contando com reservas de mais de 375 bilhões de dólares, o país não deveria estar tão temeroso a possíveis explosões do preço do dólar, ainda que tal fato pudesse servir para elevar alguns pontos percentuais em nossa inflação.
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Afinal, não há como esquecer que se nossa indústria não reage, como não vem reagindo, deve muito desse comportamento à doença holandesa, das taxas de juros elevadíssimas ainda da época de Meirelles no Banco Central do governo Lula, que provocou a perda de competitividade de vários setores nacionais, incapazes de competirem com preços internacionais mais baixos.
Agora, com setores das cadeias produtivas com maior grau de participação de conteúdo importado, a alta dos juros poderia trazer algum ressalto, mesmo que pequeno, na inflação.
Mas não é apenas isso, em minha opinião, que move o Banco Central, já que a inflação subir um pouco até parece ser desejo da Autoridade Monetária, já que encontra-se abaixo do limite inferior da faixa de tolerância do regime de metas.
No fundo a questão é ainda manter os influxos de capitais internacionais, evitando uma fuga para os Estados Unidos, em momento que o dólar em alta, limita o ganho cambial nos donos dos grandes capitais internacionais.
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Ou seja: mesmo que as apostas feitas pelo mercado financeiro nacional e seus analistas fossem desastrosas, com a manutenção dos juros, a verdadeira intenção das autoridades é sustentar a entrada dos dólares ou sua permanência, para evitar que uma fuga, em momento de sua valorização representasse perdas no chamado risco cambial para os grandes interesses financeiros internacionais.
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Mas Ilan experimenta agora, a mesma ira de Tombini, e se quiser pode extrair lições desses analistas e consultores de mercado, fartos em elogios, especialmente se as políticas adotadas asseguram os ganhos de suas operações.
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Mais novidades das atrocidades do período militar
Divulga-se hoje no Bom dia Brasil, da Globo, documento da CIA, indicando que desde o seu início o governo da ditadura militar sanguinária do Brasil sabia da verdadeira história do atentado ao Riocentro em 1981.
O que era um segredo de Polichinelo, já que todos sabiam ou sempre souberam que a bomba que explodiu no colo do sargento era mais uma das atitudes desesperadas dos setores militares, desejosos de criarem tumulto e impedirem o processo de redemocratização em curso.
Embora ainda tenha inocentes ou mal intencionados que acreditem que os militares não seriam capazes disso, já que são tão bonzinhos...
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Entre alguns que questionam porque tais notícias só surgem agora, quando o medíocre ex-capitão bolsonaro está na liderança da disputa eleitoral, desde que o impeachment antecipado de Lula parece decretado; e outros que acreditam que tudo não passa de armação ou farsa "fake news" patrocinado pela esquerda, vemos ganhar corpo a tese de que policial bom é o que reage e mata bandidos.
Afinal, como o afirmou o governador de São Paulo, uma agressão à farda é uma agressão equivalente à agressão ao próprio policial em sua integridade.
Com isso, parece-me está dada a ordem para que, ao estilo de James Bond, o 007 famoso de Ian Fleming, também nossos valorosos policiais militares adquiriram o direito de matar...
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Que os policias à paisana possam estar armados, uma exigência de sua própria função e sua segurança, ninguém há de negar. Mas que ao começarem a agir, e reagir, chegando até a matar bandidos, e serem premiados por tal comportamento, o que temo é que a corrente que demanda a liberdade de andar armado para sua segurança pessoal ganhe força e adeptos.
Afinal, porque o policial, mesmo em trajes e agindo como civil pode???
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O meu temor é que, tal reforço para a campanha de fim da lei do desarmamento, possa fazer de nosso pais, e nossas escolas o campo de extermínio que as escolas americanas vêm se tornando.
Enfim... há sempre gente que não está nem aí para essas tragédias tipicamente americanas...
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