segunda-feira, 13 de agosto de 2018

Semana agitada na política: a falta de Estado na violência TAMBÉM contra a mulher. O cenário político em Minas e Bolsonaro, a principal atração da semana

E, de repente, a semana passada que havia se iniciado com a mesma letargia que dominava o ambiente desde ao menos o mês de julho, das férias, da frustração da Copa do Mundo, da persistência demonstrada por nossa economia em andar de lado, acabou me desmentindo, ganhando ares de novidade, de maior dinamismo.
Dinamismo que não se deveu a qualquer nova estatística divulgada pelos órgãos de pesquisa, capaz de mostrar, enfim, um ponto de inflexão. 
Poderia ser dito que, até pelo contrário, as estatísticas divulgadas apenas serviram para indicar a sequência, em escala algo maior, do grau de deterioração de nossa sociedade: aumentou de forma preocupante e assustadora o número de mortes violentas, por homicídios, feminicídios, mortes praticadas por policiais e, como não poderia deixar de ser, morte de policiais.
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Como a morte da soldado Juliane, tão reprovável quanto a morte de outros policiais e capaz de gerar, ou melhor, fato que deveria gerar tanta comoção e sentimento de indignidade quanto a morte de qualquer outra pessoa. No caso de Juliane, qualquer outra mulher. De qualquer outro policial. 
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Mas, se a estatística mostra o avanço das mortes violentas, é importante observar que isso é, em minha opinião, fruto de uma sociedade que já há algum tempo tem aprendido a conviver com a violência em sua prática. Em seu dia a dia. O que acarreta tão somente uma constante deterioração - previsível, do ambiente em que vivemos. 
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Parece que nos acostumamos e que a violência cotidiana começa a fazer parte e até ser aceita de nossa rotina. 
O que nos proporciona a oportunidade de assistir a mortes de, em apenas uma semana, ao menos 3 ou 4 mulheres, cujo único crime foi o de manifestarem seu desejo de deixar de ser uma propriedade, um objeto de humilhação de seus companheiros, na qualidade de "seus proprietários". 
Pior: várias delas, assassinadas quando estavam sob medidas protetivas ou sob a guarda e proteção do Estado. Do Estado não!
De todos nós!
De todos nós que muitas vezes já ouvimos, achando graça, que a mulher levou uns tapas para aprender a ficar calada. Ou que já fomos capazes de fingir ignorar e que até "entendemos" os corretivos aplicados à mulher que queria se divertir, ou que ousou usar roupas que ferem o direito de exclusividade de seus donos.
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A culpa do feminicídio é nossa, da sociedade como um todo. Por aceitarmos que em briga de marido e mulher, ninguém deve meter a colher. Frase que já gerou até uma observação bem humorada, mas ainda assim, que merece ser olhada de um novo ângulo, gracejo atribuído a Tancredo Neves, para quem, em briga de marido e mulher, se o marido for esperto, nem ele mete a colher...
A culpa do feminicídio é nossa, de cada um de nós, que se cala quando vê imagens de homens presos por agressão a sua companheira, chegando sorridentes à delegacia, como se tivessem praticado um ato de heroismo. De resgate da masculinidade e vingança.
Policiais, delegados, outros conduzidos, outros indiciados, nós mesmos, tratamos com desdém as queixas e abusos sofridos pelas mulheres. 
Posição que acaba se transformando na aprovação tácita da brutalidade contra a mulher.
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Mas, se havia medidas protetivas para as mulheres, porque elas não funcionam?
Pelo mesmo motivo de o número de mortes violentas ser, embora recriminável, algo previsível: a ausência do Estado. 
Não o seu contrário, como várias pessoas, muito bem intencionadas e preocupadas em resolver os problemas de nossa sociedade bradam: o excesso de Estado, de burocracia, de impostos, etc. etc.
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A morte de militares, é fruto da ausência do Estado e do poder cada vez maior que esse vácuo, propiciou aos marginais, às facções de bandidos, aos milicianos, até a gente de bem, ou que se acha acima de qualquer censura, por estarem apenas fazendo justiça com as próprias mãos. 
A morte de marginais, em acerto de contas, e brigas por espaços de atuação, é também fruto da ausência de um Estado capaz de punir, com rigor, mas sobretudo com respeito, aos que merecem penas duras, mas castigos justos. 
Antes de mais nada, para destacar bem a diferença entre nós, a maioria da sociedade, e eles. 
Entre nós que respeitamos direitos humanos dos que não respeitam humanos direitos. 
A menos que não queiramos, por princípio, sermos direitos. Já que, continua sendo válida sempre a frase de que se matarmos todos os homens maus, não sobraremos os bons. 
Ficaremos apenas os assassinos. 
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Que a falta do Estado é a maior causa do aumento da violência, fica claro na morte dos Amarildos, de Marielle Franco, e tantos outros, vítimas de crimes sem apuração.
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Agitos Políticos em Minas

Mas o agito da semana veio da política, da realização das convenções partidárias, e dos arranjos de última hora, capazes de trazerem maior tempo de exposição nas mídias, maior tempo de propaganda, ao tempo em que já se caracterizam como os acertos de loteamento da máquina do governo e de sequência assegurada, sem ameaças quaisquer da continuidade de falcatruas de toda espécie.
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Claro, de tais acertos não resultam apenas flores, e muito desgosto e frustração também acabam por surgir. 
Como no caso de Márcio Lacerda, o candidato ao governo de Minas, pelo PSB - Partido Socialista Brasileiro. 
Alijado do páreo, por manobra e acerto que o Diretório Nacional de seu partido fechou com o PT. 
E que apenas representa o mesmo comportamento, criticável e sem qualquer resquício ético, que o próprio Márcio adotou em 2016, em relação ao nome por ele indicado para concorrer, pelo partido, à Prefeitura de Belo Horizonte: Paulo Brant.
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Apenas que, ao contrário do economista, do técnico, do empresário Paulo Brant, que se retirou frustrado, mas em silêncio, Márcio resolveu se insurgir, como menino birrento, contra a decisão que julgou prejudicá-lo.
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A esse respeito, é interessante até notar que, a muitos passa despercebido, mas Márcio Lacerda ser filiado ao partido socialista, já é uma das excrecências de nosso sistema político-partidário. Logo ele, Márcio,  o empresário que conseguiu se despontar como dono de empresa considerada de área estratégica, na época da ditadura militar que tinham a incumbência de gerir e desenvolver a área de tecnologia e informática.
E veja bem: Márcio, cuja trajetória de vida em minha opinião pode indicar ser tudo, menos socialista, não é o responsável por essa extravagância. 
O PSB é muito mais responsável por tal situação. 
Razão porque quando Márcio se insurge contra o partido, ele não adota comportamento muito criticável. Porque típico de situação política em que pessoas se atribuem maior importância e valor que os próprios partidos. 
O que transforma os partidos em tipos de ônibus. Conduções ou veículos para permitir que as aspirações individuais possam ter espaço para se manifestar. 
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Jogadas que se reproduzem com o candidato do DEM, em Minas, Rodrigo Pacheco. Com a diferença que o deputado federal mineiro pode ter negociado mais que apenas o abandono de sua candidatura, sem muito apelo popular e apoio político e partidário, ao governo mineiro nesse momento. 
Ele pode ter acertado, desde agora, o apoio dos políticos tucanos, para eventual candidatura futura.
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E já que Minas é o nosso foco, vale lembrar que Fernando Pimentel, governador que tenta sua reeleição é justamente o mesmo político que, eleito, tratou o funcionalismo a pão e água. Em relação aos aposentados, não apenas propôs e parcelou o pagamento dos salários, como anda atrasando até mesmo o cronograma de pagamentos que insiste em divulgar. 
Apenas para trazer mais decepções, e para mostrar sua completa insensibilidade com a fatia da população menos apta para se defender e a seus interesses. 
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Mas isso não admira a quem se lembra que Pimentel também foi protagonista de um verdadeiro golpe quando, como prefeito de Belo Horizonte, se aliou a ... Aécio Neves, então governador, para lançar Márcio Lacerda candidato. 
Situação que, mais uma vez com a empresa do agora revoltado Márcio, serviu para desmobilizar e fragilizar companheiros de seu partido, o PT, de maior prestígio e até envergadura moral que Pimentel.
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Que a lembrança da tramoia de Pimentel, então com a promessa de se tornar o candidato de consenso de Aécio e do PT em Minas, e mais tarde ludibriado como qualquer criança inocente pelo esperto Aécio, que acabou indicando e fazendo Anastasia seu sucessor, possa servir para que Rodrigo Pacheco ponha suas barbas de molho. 
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Política nacional

No cenário nacional, dominado pelo debate inaugural, promovido pela Bandeirantes, a agitação da semana foi praticamente toda decorrência da presença de Jair Bolsonaro no páreo. Pior: com condições de passar ao segundo turno. 
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Bolsonaro já começou a semana, participando do programa Roda Viva, onde mostrou seu despreparo intelectual para poder pleitear o cargo. 
Despreparo que também era característica de Lula, e que não impediu o metalúrgico de se tornar presidente do país e, justiça seja feita, realizar um governo com mais méritos que desacertos em minha opinião. 
Falo aqui de governo de Lula, políticas e programas de governo colocados em marcha e não de questões e comportamentos pessoais. 
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Mas ao participar do programa, mais uma vez pode expor suas ideias, capazes de preencherem bastante perfeitamente o figurino do homem que trata a mulher como ser inferior, tal qual descrevemos no início desse post. 
Machista, homofóbico, autoritário como convém a todo aquele que considera, como ele deixou claro no debate da Band, que educação tem que ser com disciplina e autoridade. Só faltou falar com hierarquia. 
Como no Exército. Aliás, base de sua proposta para o ensino médio: a criação de vários colégios militares. 
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Nada contra colégios militares, de renomada tradição no ensino de qualidade reconhecida. O que valeu até movimentos, como o da sociedade mineira para evitar seu fechamento, e para dar suporte a sua continuidade, na década de 70, ou 80. 
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Mas, o que valeu mais críticas a Bolsonaro, já denunciado por ofensas racistas dirigidas a quilombolas, foi uma frase sua, para justificar sua postura contrária ao sistema de cotas para negros. 
Parece que, em seu entendimento, as gerações atuais nada devem à raça negra, por não serem os escravizadores. Por não terem culpa e não viverem o passado condenável de exploração do trabalho escravo, especialmente do negro. 
Bolsonaro chegou ao cúmulo, para se justificar, de afirmar que Portugal não esteve na África, para aprisionar e escravizar os povos da região. 
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Em se tratando dessa questão, Bolsonaro parece ter lido (se é que pratica essa modalidade violenta de comportamento!), ou ouvido o galo cantar, sem saber onde.
Mas, isso não significa que as críticas feitas a ele nas redes sociais, estivessem cobertas de razão. 
Pode-se até questionar a fonte, mas é verdade que negros africanos se não vieram navegando para nosso continente, para se entregarem à escravidão, também foram vítimas de guerras tribais, da situação de miséria extrema vivenciada no continente. 
Como falei antes, se aceitarmos a fonte, Geoffrey Blainey, em sua obra Uma Breve História do Mundo, publicação da Editora Fundamento, dedica um tópico à questão da escravidão.
Nesse tópico, recorda que: "A África, durante muito tempo, exportou uma mercadoria polêmica que tinha alta demanda em quase todos os lugares: os escravos.
Deve-se imediatamente ressaltar que a escravidão foi de extrema importância em vários outros países e tribos. A China antiga possuía milhões de escravos... Os indianos possuíam escravos antes e depois de Cristo. ...alguns estados da América, muito antes da chegada de Colombo...."
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Em outro trecho, infoma que "Em muitas partes do mundo, era quase uma regra que, em conflitos, os prisioneiros fossem mortos ou escravizados."
Como as guerras eram frequentes....
Mas, em se tratando de escravidão moderna, a que fere nossa ideia de dignidade e que, de fato, considerava o negro, a mais lucrativa das mercadorias, Blainey, afirma, sem que isso sirva de justificativa para o crime menor de portugueses:
"Muito antes de os navios europeus começarem a levar escravos da África, os próprios africanos eram atarefados comerciantes de escravos.
Na África, muitas pessoas eram escravizadas pelos próprios parentes. Pais, às vezes, vendiam seus próprios filhos para a escravidão; irmãos vendiam irmãos. .... Os escravos eram geralmente devedores, criminosos, desajustados, rebeldes e, principalmente, prisioneiros de guerra.
No século 16, a maioria dos escravos exportados da parte ocidental da África era de mulheres, ... para terras islâmicas. Um século depois, a maioria era de homens, ... em navios de bandeira européia para as colônias cristãs na América. Os portugueses foram os pioneiros do comércio de escravos para a América – eles já os usavam em suas plantações de açúcar, nas Ilhas de Cabo Verde e da Madeira..."
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É essa herança maldita da raça africana para aqui trazida, que merece, a meu juízo, que nós, nos dias de hoje, não esqueçamos que os negros não tiveram, não puderam ter a oportunidade que muitos de nós tivemos. E nem é uma questão social, na linha de "existem também brancos pobres, miseráveis".
Porque esse empobrecimento dos brancos é fruto do funcionamento desigual e injusto, em nosso país, mais que em qualquer outro lugar, do sistema capitalista de produção. Cheio de privilégios. 
Mas, a verdade é que os negros não chegaram nem a ter essa mesma oportunidade de se justificarem pelo funcionamento da máquina capitalista - da qual foram vítimas - mas a questão relativa a eles, antecede a implantação aqui, do capitalismo industrial, com suas feições de modernidade. 
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Para mim, temos sim, uma dívida com os negros, para poder permitir-lhes, a todos, já que há sempre aqueles que conseguiram por esforço próprio se destacarem. Mas a todos, sem qualquer distinção, há a necessidade de trazê-los, se for o caso, para o mesmo patamar que lhes permtiria, como outras raças, ser objeto de exploração, expropriação e empobrecimento, do sistema que já conta com mais de noventa anos de sua implantação no nosso país. 
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Por isso, aprovo e defendo o sistema de cotas, embora, sempre, como tudo na vida deveria ser, por um período que não poderia se expandir por várias e várias gerações.
Como é comum acontecer no Brasil, e que acaba, por não ter prazos delimitados de funcionamento, se transformando em privilégios ancestrais. 
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Em outro dia, Bolsonaro foi entrevistado na Globo News, onde lembrou aos jornalistas que o criticavam por ser um saudosista da ditadura, que a própria rede em que eles tinham emprego e ganhavam seu sustento, também apoiou a ditadura. 
Por ter dito verdades, levou os jornalistas a se calarem, ou pior, a terem de cumprir o papel de empregados em defesa de sua empresa, com a Míriam Leitão assumindo o papel de reproduzir um texto editorial, rabiscado às pressas, por seus patrões.
Antes tivessem a hombridade e independência de admitem que sim, trabalham em empresa que foi favorável à implantação do regime autoritário e torturador no país.
O que não significa que não houve mudanças da filosofia da própria empresa (o que é bastante questionável!!!) e que por serem empregados, os profissionais de imprensa não tenham direito de ter opiniões contrárias e até críticas a tal postura ( igualmente tão questionável).
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Do debate tedioso da Band, apenas assinalar que Bolsonaro se comportou de forma tranquila, e que não foi o que todos esperávamos. A ponto de ter se saído bem, nas avaliações feitas por várias análises. 
O que deixamos para comentar amanhã, o debate da Band, e que ainda assim vale o alerta: este Bolsonaro é o perigo, por seu comportamento camaleônico. 
***
A ver...

Um comentário:

Anônimo disse...

O processo sucessório em Minas apresenta os mesmos vícios do início século passado: a dimensão do coronelismo. Infelizmente os partidos repetem o processo a cada eleição. Pimentel ao se aliar a Aécio, rachou o PT, deixando quadros importantes do partido na geladeira. Condenando o PT a um papel lamentável em todos os aspectos.
O PSB nas eleições deste ano está relegado a um papel de mero coadjuvante no plano nacional, ao se submeter às articulações de Lula.
Assim ficará muito fácil para o capitão, que vem se posicionando como a proposta nova: não tem alianças com grandes partidos, não vendeu suas crenças e de quebra não está envolvido na "Lava-Jato". Para seus eleitores estas são bandeiras fortes o suficiente para ignorar toda a incapacidade intelectual e política. Afinal a grande maioria da população desconhece o regime de presidencialismo de coalizão.
O debate foi morno e aqueles que se dizem progressistas perderam ótima oportunidade de cercar o capitão e se posicionarem melhor: Ciro foi um "gentleman", e aquela história de tirar 63 milhões de pessoas do SPC foi de amargar; Boulos (de quem eu esperava melhor preparo) veio com o discurso panfletário que causa muita repugnância, Marina... bem, continua Marina...
O quadro que se avizinha é desalentador.
O ovo da serpente está chocando!

Fernando Moreira