segunda-feira, 19 de março de 2012

Pitacos econômicos

Duas entrevistas ontem, com economistas renomados discutiam a questão da queda dos juros, câmbio, etc.
Na Folha, Ilan Goldfayn, ex-diretor do Banco Central e atual diretor e economista chefe no Itaú e na Band, à noite o economista Luiz Carlos Mendonça de Barros, no programa Canal Livre.
Goldfayn, considerado o responsável pela implantação do programa de Metas Inflacionárias, questionado se considerava que o Banco Central estaria abandonando o instrumento foi bastante político em sua resposta. O fato de, em alguns momentos a taxa Selic deixar de ser usada como principal instrumento, não significa uma mudança da postura da Autoridade Monetária, preocupada em manter o controle do nível da inflação. Apenas, segundo ele, há momentos em que há espaço para que a taxa de inflação possa ser levada a convergir para a meta em prazo mais longo, a depender das condições da economia.
Na entrevista deixou claro que as condições econômicas e financeiras em vigor no mundo, levaram à criação e desenvolvimento de outros instrumentos para lidar com o controle inflacionário, como os controles macro-prudenciais, que têm sido utilizados pela nossa autoridade, de forma a liberar a Selic do papel de instrumento privilegiado de combate à inflação, então atribuído a ela.
Questionado sobre a questão da transparência do Banco Central, foi também elegante em seu comentário. O Banco Central tem mantido a mesma transparência hoje, que nos últimos anos, o que fica claro com a leitura da Ata do Copom divulgada na semana passada.
Segundo o economista, não há, no ar, como analistas de mercado andam espalhando de forma irresponsável, qualquer sobreposição de interesses políticos capazes de servirem de cabresto às ações do BC.
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Mendonça de Barros no Canal Livre, por outro lado, abordou mais especificamente a questão do câmbio, criticando a preocupação manifestada pelo governo, em relação à entrada desenfreada de dólares em nossa economia, responsável pela valorização de nossa moeda.
Para o ex-ministro do governo FHC, o governo tem vendido à sociedade uma idéia de que há uma guerra cambial, ou uma tsunami que tem sido causada especialmente pela entrada de recursos externos em busca dos juros elevados pagos em nosso país.
Para ele, ao utilizar de imagens tão drásticas, o governo cria condições e espaço para acelerar a redução da taxa de juros básica de nossa economia, o que ele acredita que não vai resolver a questão da valorização de nossa moeda, nem conseguir impulsionar uma recuperação de nossa indústria, cada vez mais prejudicada pela competição com produtos importados.
Para Mendonça de Barros, não é a taxa de juros que atrai capitais, de caráter especulativo. Em sua argumentação, elenca dois outros fatores responsáveis pelo grande afluxo de capitais que têm sido destinados a nosso país: o ambiente econômico de dinamismo dos países emergentes, dentre os quais o Brasil tem se mostrado o de fundamentos mais sólidos e confiáveis; e a condição de economia exportadora de commodities.
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Mendonça de Barros não o afirmou, mas a verdade é que o Brasil, como já afirmado por outros economistas, como Bresser Pereira, e até aqui mesmo nesse blog, corre sérios riscos de estar sofrendo do problema diagnosticado como Dutch Disease, ou um processo análogo ou similar a isso,  a saber:  um país com receitas de exportações elevadas, provenientes de venda de produtos primários, em nosso caso, ferro, aço, soja, capaz de acarretar no influxo de grande quantidade de moedas estrangeiras. Em decorrência, nossa moeda se valoriza o que implica em encarecimento dos produtos nacionais, principalmente dos industrializados, que perdem competitividade.
Para compensar esse encarecimento, a indústria nacional teria que promover ações para desenvolver sua competitividade genuína, o que implicaria em desenvolvimento de ações destinadas a aumentar a capacidade de inovar e realizar programas de pesquisa e desenvolvimento tecnológico, além de eliminar certos gargalos de nossa infra-estrutura.
Claro está, e concordo com Mendonça de Barros, que entre esses gargalos, deveríamos retomar e levar a cabo a discussão relativa à Reforma Tributária, tão necessária em nosso país, já de tantos anos. Mas, para a realização e aprovação dessa reforma, não creio que a questão fundamental seja localizada em reduzir a carga bruta total, de 35 ou 36% do Pib, para 25%, números citados pelo professor.
Na verdade, a questão é como fazer com que a Carga líquida seja efetivamente maior que a de 12%, que acaba sendo o valor à disposição do governo, depois de devolvidos para os setores empresariais, a título de juros, subsídios, incentivos, etc. - e para toda a população, através dos mecanismos de assistência social, a parcela de transferências que são mecanismo perverso de distribuição da carga tributária.
Tão ou mais perversos que o peso que os impostos indiretos representam na arrecadação total, porque enquanto esses são conhecidos e divulgados, aquelas transferências, não são de conhecimento público.
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A segunda explicação para a entrada de dólares é que o ambiente econômico em nosso país apresenta oportunidades de negócios lucrativos cada vez mais raros para estimular os empresários a decidir por investimentos nos países mais avançados. Ou seja, enquanto Estados Unidos e Europa, mais Japão, não têm perspectivas de crescimento econômico capaz de induzir gastos de investimento, os países em desenvolvimento ainda têm amplos investimentos a serem feitos, seja na construção de sua base econômica, ou na sua atualização ou manutenção, seja em áreas de produção de commodities, etc.
No caso do Brasil, ainda há no horizonte próximo, a questão das obras de infra-estrutura, demandadas pela realização dos eventos esportivos agendados, como a Copa do Mundo de futebol e as Olimpíadas.
Para o professor Mendonça de Barros, de todos os Brics, nosso país é o que vende ainda, uma imagem mais confiável, e apresenta condições, como a de um comportamento fiscal responsável mais responsável, capaz de atrair investidores.
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Citando a entrada recorde de capitais para Investimentos diretos, no ano passado, ele demonstra que, também por esse lado, a questão da entrada de divisas é muito maior que a provocada apenas pelos juros.
Ora, ninguém em sã consciência pode desprezar os dois motivos apontados pelo professor, embora, não seja possível minimizar, como ele o fez, a entrada de capitais em busca das elevadas taxas de juros de nossa economia.
A taxa Selic estava sim, elevada, e atraindo capitais em grande quantidade, e a prova disso é que, as medidas de taxação impostas pelo Ministério da Fazenda começaram a funcionar, e os bancos acreditam que o dólar vai sim, sofrer uma pequena valorização. Tanto que os bancos estão todos ou a grande maioria, com dólares em seus ativos.
E, por estar elevada a Selic, fruto de um cenário traçado pelo mercado e seus analistas, aqui sim, apenas para criar um ambiente de pavor frente a uma possível retomada da inflação, nosso país viu, durante todo o primeiro semestre de 2011, o Copom elevar a taxa básica. Com o BC capturado pelo mercado e seus interesses, a consequência foi que a economia brasileira apresentou uma das 3 taxas menores de crescimento do PIB das Américas, ficando atrás da média de elevação do PIB dos países da América do Sul, no patamar de 4%, e bem atrás de taxas apresentadas por nossos vizinhos com Argentina, Equador, etc.
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Mas, se é verdade que a Selic inicia seu processo de queda, tão aguardado. E se é verdade que a nossa economia vai continuar atraindo ainda grandes quantidades de capitais externos (embora com alguma redução),  cada vez mais é necessário que se debata e façamos uma reforma tributária e se proceda à colocação em funcionamento um verdadeiro programa de política industrial, acompanhado pela implantação de um autêntico programa de Desenvolvimento Científico e Tecnológico.

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