quarta-feira, 6 de março de 2013

A morte de Chaves

Para além de qualquer opinião pessoal, de cunho político ou ideológico, a morte de Hugo Chaves deve ser analisada, em minha opinião, a partir das reações do povo venezuelano, mesmo com todas as suas dissensões.
Nesse sentido, é inegável que a comoção popular apresentada nas telas das rede de tv, a ocupação das ruas da capital venezuelana pelas camadas mais pobres da população com bandeiras e palavras de ordem evocando e homenageando o político morto devem levar a uma reflexão de seu real papel e sua importância para o país vizinho.
Como todo político, o julgamento de Chaves, de sua obra e seu legado exige um certo distanciamento, difícil de ser alcançado nesse momento.
E como é comum na trajetória de alguns políticos, há que se analisar e separar com cuidado o que foi a figura de Chaves e sua retórica e suas ações concretas.
Afinal, como citado no Bom Dia Brasil, da rede Globo dessa manhã de 6 de março, embora mantivesse um discurso excessivamente crítico aos Estados Unidos e a seus interesses, ao mesmo tempo, o governo bolivariano chavista fomentou ou não agiu para criar óbices a uma expansão significativa das relações comerciais com o país de Obama. De fato, os Estados Unidos constituem o principal parceiro comercial do país venezuelano, com fluxos de comércio que superam os 50 bilhões de dólares.
Além disso, o reconhecimento de que a economia venezuelana, por mais fragilidades que apresente atualmente, cresceu de forma espetacular desde a chegada de Chaves ao poder ajuda a explicar os motivos que tornaram o "caudilho"  tão popular. E tal feito não perde sua importância por se afirmar que todo esse crescimento foi fruto tão somente do petróleo - riqueza natural abundante na Venezuela, e de uma conjunção de fatores internacionais que permitiram o aumento dos preços do óleo.
Isso porque muitos outros países, hoje citados como exemplo de crescimento (até como forma de alguns analistas criticarem o pífio crescimento de nossa economia brasileira), também se beneficiaram e se beneficiam de melhora das condições internacionais de seus principais produtos naturais.
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Mas, mais importante que o crescimento econômico da República Bolivariana, foi a política praticada por Chaves, de estímulo à educação e à saúde, especialmente voltada para as camadas mais pobres, de onde vem toda a sua popularidade.
Por esse motivo, dizer que Chaves foi populista ou demagogo, ou paternalista ou que praticava assistencialismo é no mínimo curioso, já que mesmo os conservadores sempre disseram que o principal papel do Estado é promover o fornecimento de ensino e saúde de qualidade à população.
Ao promover tais políticas, o que se tem notícia é que a Venezuela deu um salto significativo na melhoria dos padrões de distribuição de renda, diminuindo em muito os níveis de desigualdade existentes.
A esse respeito, cito importante artigo publicado pelo professor Bresser Pereira no ano passado, na Folha, caso a memória não me falhe, em que o ex-ministro do governo FHC, faz análise isenta das razões econômicas e sociais que fundam o que é considerado a idolatria dos pobres venezuelanos por seu falecido líder.
O artigo do professor sustenta, inclusive, que não seria crível que um político fosse reeleito pela terceira vez, não tivesse apoio popular sustentado por melhorias verdadeiras e percebidas no padrão de vida de seus eleitores e suas famílias. O artigo pode ser visto no link a seguir:
 http://www1.folha.uol.com.br/fsp/mundo/73373-a-luta-de-chavez.shtml
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Que a inflação hoje tenha se elevado ao nível de 30 %, ou que a violência urbana esteja em alta, ou que algumas medidas de tentativa de controle da mídia ou dos poderes Legislativo ou Judiciário possam ter sido intentadas, são críticas que exigiriam um conhecimento mais aprofundado da realidade institucional e jurídico constitucional do país vizinho, o que confesso não saber. Por esse motivo, me abstenho de comentar.
Apenas recordo aqui a tentativa de golpe tramada por poderosos interesses econômicos venezuelanos com apoio ostensivo de interesses americanos, e amplo apoio dos meios de comunicação e difusão que operavam na Venezuela, que tiveram desde a prisão de Chaves e sua derrubada do poder, até a sua volta triunfal nos braços da população.
No caso, algumas das redes de comunicação chegaram a forjar notícias e plantar notícias falsas de forma a tentar enfraquecer a resistência ao golpe em marcha.
Foi contra essas redes e contra o ato de traição que elas perpetraram que Chaves se insurgiu, depois de reconduzido ao cargo, e que lhe valeu não apenas críticas internas, mas uma verdadeira onda de indignações e críticas de outros órgãos de imprensa solidários a seus congêneres.
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Vai Chaves. E que a Venezuela encontre um caminho de evolução, inclusive no âmbito político, pacífico e capaz de continuar respeitando os interesses do povo venezuelano e contribuindo para sua construção de uma sociedade mais rica e mais justa.

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