quarta-feira, 11 de abril de 2018

Pitacos sobre manifestações e símbolos

Ao menos desde 2013, nossas ruas, avenidas e praças são invadidas por uma série de pessoas, todas no exercício saudável do direito de protestar, seja contra os 20 centavos do aumento da passagem dos ônibus urbanos, seja contra o padrão Fifa das obras faraônicas ligadas à realização da Copa ou das Olimpíadas, seja ainda contra o governo e, mais tarde, contra a corrupção.
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Antecipo que nunca consegui enxergar desde suas origens e talvez por cegueira ou miopia minha, um elemento aglutinador em tais movimentos populares, fator que me preocupava, já que movimentos de massa com objetivos dispersos são, com frequência, bastante sujeitos à influências e interesses de pessoas inescrupulosas, manipuladoras.
Ainda assim, se não consegui entender, tampouco consegui concordar com as manifestações, embora respeitando o direito de todos que ali estivessem de se expressar. Confesso que, ao ver movimentos como o MBL, o Vem pra Rua e outros de mesma feição, e seus líderes, não me arrependo de ter sempre ficado com os dois pés atrás, e não apenas um pé atrás.
Adotei o comportamento de total reserva e evitei até passar próximo dos tais eventos.
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Independente disso, acompanhei pela tevê, as imagens de milhares, talvez milhões de pessoas, a cada instante gritando um slogan diferente, até fixar-se, finalmente, no combate à corrupção.
Claro, naquele instante, a corrupção do governo petista. Ou para ser mais correto, do PT e seus petralhas.
E nesse momento, não vou entrar na discussão de se há ou não algum grupo com corrupto favorito. Volto a esse tema posteriormente.
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Mas as imagens que invadiam minha sala de tevê, mostravam um grande número de pessoas, todas com o fenótipo característico das pessoas "de bem". Raramente algum negro, ou pobre, ou favelado. A maior parte delas brancas, saudáveis, bem trajados, com um certo ar  e gestos de pessoas bem educadas, cultas. Talvez até, intelectuais.
O que a mídia não deixou de perceber e anotar: as manifestações, no geral, eram ordeiras, pacíficas, comportadas.
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E apesar de tudo isso, as pessoas em grande maioria portavam senão várias representações da bandeira nacional, tecidos de cores verde e amarela, quando não usavam, suprema ironia!, a mesma camisa da seleção brasileira.
A mesma camisa da CBF, do futebol da Copa da Fifa (e suas obras!) tão criticadas, do vergonhoso 7 a 1 - apenas para mostrar que nossa indigência é muito maior que apenas a manifestada no campo de jogo.
A camiseta da CBF, praticamente dona, com exclusividade da seleção que já representou, uma vez, a alma do povo brasileiro. Da ginga, da malícia e... da malandragem...
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Claro, não dá para esquecer que a seleção foi apropriada, assim como o futebol, também e principalmente pela Rede Globo que, ciente da qualidade de caráter dos dirigentes esportivos instalados nos gabinetes da entidade máxima do futebol, adquiriram desavergonhadamente, todos os direitos sobre qualquer assunto ou evento relacionado ao time canarinho.
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Em parte, eu credito à Globo parcela da responsabilidade pelo vexame dos 7 a 1. Em grande parte, não desejando se limitar apenas ao futebol, a Globo resolveu dominar toda a manifestação de insatisfação e canalizar tais movimentos, na defesa de seus interesses.
Definitivamente não dá para não citar a manipulação cada vez maior e mais presente dos movimentos e da luta contra o petismo, pela Globo.
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Mas o assunto era símbolo. E o símbolo, as cores da bandeira; a própria bandeira, símbolo augusto da paz; ou até as faixas informando que "nossa bandeira não é vermelha", indicando mais que uma luta ideológica, simbólica, servem para mostrar a existência de uma indigência mental trágica.
Porque ao que se saiba, a cor, por si só, tal qual os números, os acidentes geográficos, as letras e uma série de outros símbolos não são necessariamente ruins em seus significados.
Daí talvez, ser contra o vermelho na bandeira ou no coração (ou no sangue, até!) não represente nada tão ruim quanto aqueles que, vestidos de amarelo e verde, são tão podres em seus comportamentos quanto tudo aquilo que a maior parte das massas bem intencionadas desejam ficar livres.
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E convenhamos: para quem só via corrupção no vermelho ou no PT, ou ainda na esquerda, seria muito útil a camiseta imaculada da seleção brasileira.
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Mas, quanto dos que estavam ali, nas manifestações, vestindo as cores nacionais, não são os mesmos bem nascidos, integrantes da classe média ou das elites, responsáveis, há séculos pelo atraso de nosso país?
E quantos desses classe média, não correram para preparar a documentação necessária para solicitarem a dupla cidadania, já que a brasileira apenas lhes seria muito "humilde" (para não dizer rastaquera, ou na falta de termo equivalente).
Nossos manifestantes, os da bandeira e seus simbolismos, foram quem sabe os que, sentindo-se muito mais que meros cidadãos brasileiros, desejavam e até obtiveram a condição de cidadãos europeus, o que em sua visão distorcida e parcial, lhes asseguraria a condição de cidadãos do mundo.
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Pois bem, e o que dizer dos que, a título de procurarem sua proteção e a segurança própria ou de sua família, não procuraram sair do país, estabelecendo domicílio seja em Portugal, seja em Miami?
E quantos desses não enchem a boca para dizer que moram em lugares civilizados, mesmo com os Estados Unidos, a cada dia que passa, dando mais demonstrações de uma sociedade cujas relações mais se esgarçam, mais se deterioram.
Uma sociedade que vai se tornando putrefata, e cada vez mais desigual.
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E isso, apesar do povo americano, que como a grande maioria das pessoas, tem a vida de gado que já nos cantava Zé Ramalho. E não necessariamente concorda, ou em grande parte não concorda, com os rumos da situação de seu país.
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Mas, esses que fugiram das mazelas do nosso país, são os que não tiveram coragem para vir somar esforços em prol das mudanças capazes e necessárias para mudar o curso da história de nosso país. Preferiram fugir, quando o problema que agora lhes aflige, estava ainda em germe?
Silenciaram-se quando, por exemplo, Darcy Ribeiro falava no deserto em favor de se gastar mais em educação, para não precisar gastar com a construção de presídios no futuro.
Criticaram os CIEPs, taxados como forninhos para crianças.
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Esses mesmos que fugiram do país eram os que não se manifestaram na época em que as políticas não se preocupavam em melhorar as condições de vida para a grande maioria da população brasileira, nem em tirá-los do nível de miséria absoluta ou nem combater a fome do povo.
Muitos deles são os que preferiram o silêncio que os beneficiava quando a abertura indiscriminada da economia brasileira, a atração do capital externo, as privatizações mais escandalosas, a visão neoliberal de então, acabava por beneficia a uma minoria privilegiada, à qual muitos dos setores nacionais se associavam.
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São os que se comportaram, como lacaios, dos interesses econômicos mais fortes, mesmo que não verde e amarelos. Até pelo contrário, muitos deles, com faixas vermelhas...
E que, por isso mesmo, receberam como prêmio, a possibilidade de serem aceitos como um entre eles. Embora nunca em condições de igualdade. Mas sempre em condições de submissão e subalternidade.
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Esses são os que ou estavam, ou têm vínculos com os presentes nas manifestações verde-amarelas anti corrupção de nosso país.
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E em sua maioria são os mesmos que, sem qualquer escrúpulos, postam em redes sociais os convites para que os que se sentem órfãos e irados pela prisão de Lula, deixem a raiva diminuir sua intensidade para, só então, irem cuidar de outros corruptos. Que até lá estarão livres, leves, soltos.
E até em condições de disputarem eleições e até ganharem.
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Na verdade, comportam-se assim, por saberem que não há no meio ordinário dos corruptos dos partidos que defendem, ninguém com a mesma força política ou o carisma de Lula. O que demonstra o timing, a pressa, a necessidade de tirar o líder petista do páreo.
Pior: parecem não ter qualquer convicção de que a população brasileira, em sua maioria não pertencente aos quadros de que são partícipes, não seria capaz de derrotar Lula.
Apesar de tudo de que lhe acusaram.
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O que apenas alimenta a ideia de que o crime maior de Lula, quem sabe, não foi fazer um governo que parecia voltado a melhorar os interesses dos menos privilegiados de nossa sociedade.
Mesmo que também essa ideia de que o governo Lula só se preocupou com os pobres ou mais necessitados seja outra mentira.
Ou apenas mais um símbolo a ser difundido por aí.

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