Domingo. Independência. Intervalo do jogo. Impossivel, para um atleticano como eu, não ficar repassando a frase de temer de que "tem que manter isso aí, viu?".
Infelizmente, embora o Galo tivesse criado outras chances no segundo tempo, nem ampliou a vantagem, nem manteve isso aí.
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Influenciado talvez pelo cansaço, talvez por uma displicência natural, acabou deixando que um único jogador do Cruzeiro, fosse quem, em meio a 6 adversários mostrasse disposição para disputar e ganhar a jogada que culminaria com o gol do time celeste.
Um gol que recoloca o Cruzeiro na disputa para a conquista do título do Mineiro, no próximo domingo, no Mineirão lotado apenas de torcedores adversários.
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Mas, essa postagem que abre o blog hoje não é a respeito do surpreendente jogo e da ainda mais surpreendente (até para nós atleticanos) atuação do Galo.
Meu foco aqui é a frase de temer que, como outra frase lançada ao vento pelo ex-governador de Minas, Francelino Pereira, em momento de total estupor, acabou se eternizando, inclusive como refrão de música de grande sucesso de Renato Russo e sua Legião Urbana: Que país é esse?
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Diz o ditado que a palavra lançada ao vento não tem retorno. E, é sempre preciso deixar registrado que a frase de Francelino já tratada nesse nosso espaço, foi dita em circunstâncias bastante diferentes da frase de temer.
No último e mais recente caso, a frase foi dita em condições escusas, bastante criticáveis, por uma autoridade ocupante de um cargo a que chegou pela traição. Um usurpador que recebia, fora da agenda e, pois, sem registro, um empresário acusado de uma série de práticas de desonestidade. Encontro para acertarem a continuidade de pagamentos indevidos por ilegais, os quais deveriam ser mantidos, para que atribulações no campo político pudessem alcançar e desnudar o caráter (se algum!!) do usurpador.
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Embora eu não seja filólogo, nem tenha qualquer cacoete para produzir colunas de análise do conteúdo de falas e frases como a de temer, já manifestei minha opinião, em momentos anteriores, de que o Tem que manter isso aí, viu? vai passar para o folclore nacional. Faltando apenas um novo e tão competente compositor, como Renato Russo, para gravar de vez essas palavras na galeria da vilania nacional.
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O pedido de serenidade feito pela responsável pelo pavio, o combustível e o fogo
Assisti pela TV, ao pronunciamento da ministra Carmen Lúcia, presidente do Supremo Tribunal Federal, em seu período de maior desmoralização, ao menos aos olhos dos leigos, da população brasileira.
Com ar grave, mostrando nítida preocupação, real, a ministra procurou desarmar os espíritos daqueles que transformaram em autêntico Fla-Flu, a sessão em que o Supremo decidirá, na sessão de amanhã, sobre a concessão ou não de habeas corpus para o ex-presidente Lula.
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A situação é de fato bastante séria e a ministra vir a público afirmar que diferenças ideológicas não podem ser fonte de desordem social é, nesse momento e dessa forma, no mínimo curioso.
Especialmente porque os ânimos exaltados que poderiam ter sido fonte da preocupação da presidente da Corte têm reforço no próprio comportamento dos demais ministros da Casa, que a par de uma postura que não honra em absolutamente nada a Corte, mostra-se completamente inadequado e capaz de atiçar, mais que acalmar iras de torcidas exaltadas.
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Mas é preciso que se diga, antes de mais nada, que é extremamente curiosa a situação que o STF vive, capaz de chegar ao ponto de que uma decisão sua, possa despertar tanta comoção.
Afinal, como responsável pela manutenção e obediência estrita, além da interpretação dada à letra de nossa lei maior, é de se supor que o STF sempre tenha tomado decisões capazes de afetar a vida de grande parte dos brasileiros, que sequer têm conhecimento da existência daquela instância superior de julgamento.
Ou seja: a menos que o STF tenha sempre se dedicado a ninharias, o que não parece ser nem um pouco verdadeiro, o Supremo sempre se manifesta em questões em que está em jogo o interesse do povo brasileiro como um todo.
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E isso vale mesmo quando o Supremo, em outras eras e outros tempos, decide contra o que está expresso na Constituição seja para agradar militares que tomaram de assalto o poder, seja para sancionar o confisco de lunáticos desejosos de matar a inflação com um tiro.
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Ainda assim, mesmo sujeito a críticas, até nessas horas, o STF julgou e, embora com ampla repercussão, decidiu contrariamente ao povo e suas leis, mas não provocou tal divisão na sociedade.
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O que mudou agora?
Para responder a essa questão, em minha opinião, não adianta apenas argumentar com a cisão que cada vez mais se amplia em nossa sociedade, o que é por si só, grave e preocupante.
Talvez, em toda a história de nosso país, a população brasileira mostrou-se tão dividida, com interesses de classes sociais sendo tão antagônicos como agora.
Sinal de que, os vencedores eternos, de sempre, não estão mais se sentido capazes de manterem sua condição de vitoriosos. Sinal de que certos setores da sociedade brasileira resolveram, e aprenderam, com as derrotas que sempre lhes foram infligidas, a reagir. E não aceitam mais a ideia de não resistir. Porque aprenderam que os prêmios de consolação a que sempre aceitaram se submeter se tornaram sempre as ferramentas que apertam ainda mais os grilhões a que estão submetidos.
Dito de outra forma: o povo, o povão, a grande maioria de desassistidos e desrespeitados, aprendeu que sua voz será ouvida se mostrarem sua indignação. Não pelo com comportamento que só amplia a exploração.
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Mas, agora mudou o fato de que a presidente do Supremo, sabe-se lá por que motivação ou interesse, talvez até mesmo de cunho pessoal, para ganhar o foco das atenções, resolveu julgar uma questão que é abstrata, a partir de um caso concreto.
Ao invés de julgar a tese, contrária ao que está expresso em nossa Constituição, de prisão antes do esgotamento das decisões em todas as instâncias recursais, preferiu inverter a ordem natural do julgamento. Fulanizou, em má hora, a decisão sobre a prisão ou não em segunda instância.
Assim procedendo, acabou permitindo que o que poderia se tornar uma discussão centrada basicamente em questões jurídicas, de fato relativas ao Direito e sua hermenêutica e que escapam ao conhecimento da população, acabasse se transformando nesse jogo de paixões.
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Adianta alguma coisa, por exemplo, manifestar a opinião de que, em todos os países do mundo, ou na maioria deles, a prisão em segunda instância é tolerada? Será que esses países, sua cultura jurídica, sua cultura, suas leis, sua Constituição são a mesma que a de nosso Brasil?
Claro que não. Logo, citá-los como exemplo ajuda a iluminar e a interpretar nossa Carta Magna?
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Ajuda o fato de também eu, do ponto de vista pessoal, achar que todo o criminoso já poderia estar submetido a prisão caso condenado em segunda instância, uma vez que ninguém admite a impunidade que grassa em nosso país? Ajuda o fato de eu achar que, em respeito à Constituição e sua letra, para não ferirmos o princípio da inocência presumida em toda a situação, ou os tribunais teriam de tomar decisões de forma mais célere e não na morosidade que é sua marca?
Ajuda o fato de ainda, em último caso, há sempre espaço para se procurar alterar a Constituição, já tantas vezes alterada por meio de emendas, algumas completamente injustas?
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Nada disso ajuda, claro. Como não ajuda a ninguém acreditar que o político por não ter cometido crime violento não precisar de ser afastado do convívio social, antes de esgotados os recursos em todas as instâncias.
Em minha opinião, mais maléfico para a sociedade é o político, que em uma canetada ou em uma falcatrua de negociação de propina, retira do dinheiro da Saúde e Educação, por exemplo, e condena à morte física, na Saúde, ou à morte social, na Educação, milhares de pessoas que nem sequer conhecemos ou nos damos conta de sua situação.
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Acho que os crimes políticos deveriam ser tratados como crimes de mais elevado grau de periculosidade. Incluído aí, crimes de ex-presidentes ou ex-governadores, ou presidentes e governadores atuais.
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Mas, voltando ao nosso tema. Carmen Lúcia, agora no figurino de bombeira, foi que, por teimosia, e declarando que não aceitaria pressão de qualquer espécie, armou a fogueira, trouxe o combustível, e foi vista com a caixa de fósforo na mão.
O que ela desejava, realmente?
Ou alheia ao que acontece na sociedade à sua volta, ela não viu a divisão que ia se cavando, e que é capaz de cindir a própria classe de advogados e juristas?
Será que ela só percebeu agora, ao receber os manifestos de procuradores, juízes e advogados, de uma lado, exigindo a manutenção da decisão de prisão em segunda instância; e por outro lado o de defensores públicos, advogados e também juízes, tomando posição oposta, o clima em que sua atuação ajudou a criar no país?
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Triste Corte, essa nossa. Justo na hora em que, por ser dirigida por uma mulher, deveria mostrar a todos a serenidade e sabedoria de que a mulher é dotada. E que tanto tem contribuído para solucionar problemas graves de toda espécie. Em todo mundo.
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Marielle, presente
Mesmo que ausente nos avanços de notícias de êxito de investigações policiais. Ou até, como trouxe a Folha de São Paulo de ontem, com a denúncia de que testemunhas de acusação, foram tratadas com descaso e dispensadas pela Polícia que investiga a morte da vereadora e de seu motorista.
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Mas, o que eu gostaria de comentar brevemente aqui é de que todo ser humano que morre é parte de cada um de nós que se vai. Assim como toda terra chora quando um torrão seu é levado pela enxurrada e a força das águas do rio.
A frase, de John Dunne, é cada vez mais importante e verdadeira.
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Dito isso, quando alguém assaltado reage, comete uma imprudência criticada pela própria Polícia.
Quando alguém é visto portando uma arma, e recusa-se a entregá-la a um assaltante ou bandido, assume um risco que a ninguém é lícito desconhecer.
Quando nossa sociedade miserável é submetida a todo o tipo, cada dia, de vandalismo, agressões, assaltos, roubos, violência sexual ou agressões à mulher ou outros gêneros, a situação mais que preocupante merece repúdio enérgico de todos nós, e severa reação da Polícia Militar.
Sempre dentro do que prega o respeito à lei e à dignidade do ser humano. Mesmo criminoso.
Afinal, bárbaro e selvagem é ele, o bandido.
Nós não. Devemos zelar por nos manter como homens e mulheres de bem.
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Devemos querer justiça. Não vingança.
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Mas já tem se banalizado tanto a matança em crimes do dia a dia, que apenas a comoção apenas dá lugar, infelizmente, à estatística.
A respeito de estatísticas, inclusive, era importante que chamássemos a atenção para as de morte de policiais.
Porque há a morte daquele que estava no cumprimento de seu dever, e que é um herói e como tal deveria ser tratado. Mas há aquele que estava a paisana e que reagiu, ou não quis entregar a arma, ou como qualquer um de nós, foi morto por tentar fazer o que a cartilha da polícia não recomenda.
Morrer em uma praia, de férias, uma soldado e seu marido também da PM, é lastimável. Tanto quanto morrer um mendigo no ponto de ônibus, ou deitado sob a marquise de um prédio, por fogo ateado por inconsequentes.
Causa repulsa. Raiva. Reação desesperada de quem se percebe impotente.
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Mas, uma pessoa que morre assassinada por defender suas ideias, a maior parte das quais dizia respeito a outras pessoas e suas condições de vida, no mais das vezes, deploráveis, causa mais comoção, e não apenas no Rio ou no Brasil. Causa em todo o mundo a mesma reação que os heróis da Polícia deveriam merecer, se no exercício de seu estrito dever.
Afinal, como Marielle, também os guardas em trabalho, são defensores da sociedade, que sobrevive por suas ações e riscos.
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É isso.
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