quinta-feira, 1 de setembro de 2011

O que muda com a queda da SELIC?

Decidida ontem a redução de 0,5% da taxa de juros básico da economia brasileira, a grande questão que se coloca é: o que muda na nossa economia?
Em primeiro lugar, há que se ressaltar a mudança de postura do COPOM e da Autoridade Monetária, cuja decisão mostra sua disposição de se libertar do mercado, de quem até agora vinha sendo refém.
A redução, já pressentida por alguns analistas das instituições financeiras à medida que a reunião do COPOM avançava, conseguiu surpreender a todos, em função de sua magnitude.
Se alguns analistas previam a manutenção da taxa, e outros começaram a perceber sinais da disposição do Comitê de dar início ao processo de sua redução em 0,25%, como a grande midia conservadora, martelava, a queda em percentual superior causou um verdadeiro alvoroço.
Menos mal. Em minha avaliação, a própria reação dos porta-vozes dos agiotas travestidos de financistas é sinal do acerto da decisão.
A esse respeito, recorde-se do comentário risível e ridículo de Sardemberg no Jornal da Globo, incapaz de conter sua frustração e inconformismo com o fato de seus "patrões" sofrerem uma primeira derrota.
Para o dito entendedor de economia, o Banco Central teria avançado o sinal.
Que bom seria se o Banco Central tivesse mesmo avançado o sinal, atropelando os juros e abrindo espaço para que o setor produtivo pudesse, depois de desobstruída a via pública, retomar sua caminhada rumo ao desenvolvimento.
Que bom seria se o Banco Central tivesse de fato sinalizado o desejo de avançar na direção de liberar a atividade produtiva, - em especial a verdadeira atividade geradora de riqueza, aquela que promove a transformação de recursos em bens materiais úteis- das amarras e do jugo dos parasitas da atividade financeira.
Que bom seria se o Banco Central tivesse avançado o sinal no sentido de passar como trator por idéias que, com o discurso de vender verdades, representa tão somente a propagação de interesses dos mais nefastos para a sociedade.
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Mas não foi assim. O Banco Central reduziu em 0,5% a taxa, o que já foi uma conquista, um ganho a ser devidamente comemorado, mas ainda não conseguiu tornar a nossa taxa básica real, semelhante àquela praticada por seus parceiros comerciais.
Nunca é demais recordar que Japão, Estados Unidos, alguns países europeus estão praticando taxas de juros ou muito baixas ou iguais a zero.
Nem mesmo está afastada do horizonte a possibilidade de que alguns desses países adotem taxas de juros negativas, incentivando um pouco a elevação do nível geral de preços, ou seja, promovendo uma retomada pequena da inflação para tentar evitar o pior: o prolongamento da recessão e a possibilidade de que essa recessão possa se tornar o pesadelo pior da depressão.
Sim, economistas respeitados, esses sim, entendidos do tema; alguns até vencedores de prêmio Nobel, mesmo que esse prêmio pudesse ter seus critérios de concessão colocados em dúvida, têm recentemente recomendado firmemente que os governos dos países desenvolvidos aumentassem seus gastos, ao invés de cortá-los.
Krugman, por exemplo, tem insistido no erro que representaria, nesse momento, a adoção da medida recomendada pelas correntes mais conservadoras, de reduzir ou eliminar déficits primários.
Não são raras as opiniões favoráveis a um novo processo de injeção monetária patrocinada pelo FED, um processo de ampliação de gastos e colocação de moeda para estimular a demanda agregada em seu processo de reação, denominado de QE 3, ou o 3° alívio monetário.
Ora, com mais dólar, e considerando que isso possa trazer uma elevação de preços nos Estados Unidos, a taxa real,  já próxima de zero, poderá tornar-se negativa.
Supondo que em função dessa taxa as pessoas não queiram realizar investimentos; e somando a isso, o medo de realizar grandes gastos de consumo por parte de trabalhadores que temem perder seus empregos, levados pela onda recessiva, o que poderíamos esperar dessa inundação de dólares seria a corrida para aplicações no exterior, atraídos por taxas de juros mais favoráveis.
É aqui que a decisão do BC incomoda, ao menos a mim. A redução, no sentido de estimuar a economia foi positiva. Mas não foi e nem será suficiente para deter a corrida para nosso país, dos fluxos de capital em busca de valorização.
Leia-se aí, como resultado: continuidade de atração de dólares e elevação de seu influxo; valorização de nossa moeda; dificuldades para a indústria competir com importações de peças, partes componentes e matérias primas; dificuldades para elevação das exportações com maior valor agregado.
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Claro que sempre pode-se argumentar que essa situação descrita nos dois últimos parágrafos já estava presente na situação anterior à queda da Selic. É verdade. E sempre pode-se defender a medida de redução adotada, mesmo que, em minha opinião, muito cautelosa, tímida, por mais que o mercado a tenha achado exagerada.
Aliás, melhor assim, que o mercado e eu estejamos em campos opostos.
Mas, é inegável sim que se a situação não vai mudar muito, ao menos no curto prazo, ela funciona sempre como um alento. Estimula sim a indústria. Afeta as expectativas, o que talvez seja seu melhor e maior efeito, em sentido e direção positivos. E a economia produtiva ficou melhor agora depois da decisão do que como estava antes.
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Quanto à idéia de que também o setor financeiro produz riqueza para o país, através da produção e venda de seus serviços, incluídos no PIB (o que é conceitualmente e contabilmente verdadeiro), lembremos que ninguém nega a importância desse setor em seu papel tradicional de prover recursos para financiar as atividades de produção, seja industrial, agrícola e até do setor de serviços do país.
E nem seríamos ingênuos a ponto de não aceitarmos a idéia da importância de alguma atividade especulativa no mercado, seja para assegurar a existência de mercados secundários consolidados, seja para assegurar liquidez para algumas operações, seja até mesmo para permitir que, como dizia Keynes, sempre possam ter agentes cujas expectativas os coloquem na posição de touros ou ursos (altistas ou baixistas, ou otimistas e pessimistas).
Afinal, o próprio Keynes já deixava clara a importância desse tipo de comportamento dos  agentes financeiros, que lidam com o ativo que, exatamente por isso, é capaz de servir como reserva de valor: o dinheiro.
Mas, o próprio Keynes condenava o rentista, como um parasita da sociedade.
E, é bom lembrar que, tornar o país um cassino, como é o que o mercado financeiro vem tentando e conseguindo fazer, de forma exitosa, não pode ser considerado criação de riqueza. Salvo a riqueza fictícia.
Que se esvai no ar, ao primeiro momento de investigação mais aprofundada de seu conteúdo (mero papel), e incapaz de alimentar bocas famintas e proteger e cobrir milhões de pessoas.
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Bem vinda redução da SELIC.
E que seja seguida de outras, nas próximas reuniões.




Um comentário:

Anônimo disse...

bastante coerente, mas vale ressaltar que os fundos institucionais, ou seja, aqueles com volume vultuoso de dólares estão sujeitos à discriminação por parte de suas politicas de investimentos no que diz respeito às alocações de recursos em países com grau de investimento inferiores a nota A (que infelizmente são determinadas pelas agencias de classificação mais parciais do mundo), mas que ainda assim conseguem influenciar na ação dos investidores. Outro ponto fundamental é que, apesar de sermos um mercado especulativo e visto por muitos como de curto prazo, as atuais medidas de tributação de capital especulativo podem "reprimir" parte do volume de dólares que podem entrar no país - soma-se a isso o fato da aversão ao risco que em momentos como este deixa nossa economia menos atrativa para capitais especulativos.