quinta-feira, 22 de setembro de 2016

Lula: as falas e as mancadas de nossos políticos e porque não me serviu a carapuça. Pior para os funcionários é o projeto contra a corrupçao. E ninguém reage...

Já passada uma semana da apresentação feita por Lula, procurando rebater as denúncias apresentadas pelo Ministério Público Federal de Curitiba,  com o messiânico procurador Dallagnol e seu ridículo power-point à frente, é possível agora realizar uma análise mais calma e imparcial da fala do ex-presidente.
É disso que passo a tratar agora, nesse pitaco.
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Para começar, devo dizer que durante toda minha vida profissional, tive a oportunidade de fazer e ser aprovado em diversos concursos públicos, valendo recordar - e citar - o Vestibular, quando fui aprovado para o curso de Adminitração de Empresas da Faculdade de Ciências Econômicas da UFMG, no início da década de 1970. De lá para cá, fui aprovado também no concurso de Agente Fiscal de Tributos Estaduais, da Secretaria da Fazenda do Estado de Minas Gerais, em 1985; no concurso de Professor Assistente do Departamento de Economia da FACE-UFMG, no mesmo ano de 85; e, posteriormente, para o cargo de Analista (denominação dada hoje) do Banco Central, em meados de 1990.
Apresento a lista, para deixar claro que sempre fui funcionário público, de carreira, concursado, daqueles que estudaram e se formaram e fizeram um concurso público, conforme a menção feita por Lula em seu desabafo, algo destemperado e influenciado por violenta emoção.
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Mas, confesso que, como funcionário público de carreira, e apesar de ter a opinião de que Lula, como várias pessoas em várias outras ocasiões da vida cotidiana, tenha cometido o mal maior da generalização, não me senti agredido ou ofendido. 
Melhor seria dizer que a carapuça não me serviu. E, embora entenda o zelo que muitos colegas barnabés como eu, tenham por nossos cargos e funções, o que os levou a reagir, acho que a reação foi muito mais motivada por questões ideológicas que por um sentimento verdadeiro de ofensa.
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Para começo de conversa, acho eu, e comigo grande parte de analistas que andei lendo, que Lula não estava se referindo a toda a categoria dos funcionalismo, mas apenas aos procuradores, responsáveis pelo show pirotécnico de acusações baseadas não em provas, mas em meros e muitas vezes frágeis indícios e convicções.
Confesso que não li a denúncia e suas mais de uma centena de páginas com o rol dos alegados indícios. E não o li por ter tomado conhecimento de que grande parte dos fatos que a compunham terem sido resultado de delações premiadas. Delações cuja  veracidade é, para dizer o mínimo, muito questionável, dadas as circunstâncias em que elas se dão ou às informações que vazam e chegam até nós pela mídia.
Para citar um exemplo: que eu me lembre, desde o primeiro instante, e desde a primeira delação premiada negociada e aprovada pelo Judiciário, acompanhamos, surpresos, vazamentos dos conteúdos o que é completamente inusitado, já que pelo que somos informados, todos os depoimentos acontecem sob sigilo, para não acarretar a perda dos benefícios negociados.
Mas, quando foi a vez de Léo Pinheiro, presidente da OAS, e os diretores da empresa fazerem seus acordos, antecipando o que tinham para revelar, o Procurador Geral, Janot suspendeu a delação e as negociações em curso, justamente por ter havido vazamento para a imprensa.
Ou, pelo menos, a irritação despertada pelo fato de parte das revelações virem ao conhecimento público foi a justificativa para que o depoimento fosse desconsiderado. 
Claro, como presidente de uma das principais empresas de engenharia envolvidas nos escândalos da Lava Jato, Léo Pinheiro tinha muito mais a informar que apenas suas relações, ainda que espúrias, com Lula. 
Tal qual a Odebrecht, é forçoso reconhecer que muito mais gente, muito maior quantidade de políticos e partidos foram citados na delação, o que poderia aliviar o espírito de demonização do PT, necessário naquele instante, em que o impeachment ainda estava sem decisão.
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Pior é que não se tratava de vazamentos envolvendo apenas políticos, mas outras altas autoridades, algumas vinculadas ao próprio sistema judiciário do país, mesmo que é preciso, a bem da verdade, dizer que, mais uma vez, as acusações denunciadas em manchetes pelo lixo que é a veja, não mereceriam qualquer consideraçao. Apenas teriam que dar margem a investigações mais aprofundadas, tarefa a que o MPF de Curitiba parece não ser muito afeito.
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Ainda para mostrar como temos que tratar com cautela as tais denúncias delatadas, não foram poucas as vezes que vi manifestações, pela midia, de que apenas interessam aos procuradores da Lava Jato os elos com Lula e o PT. Qualquer revelação que diga respeito a outros partidos ou a outros políticos, ensejam imediata mudança de rumo das perguntas e inquirições feitas pelo pessoal concursado do MPF.
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Não desejando me alongar ainda mais, foi o deputado Edson Moreira, delegado mineiro e deputado pelo PR que, da tribuna da Câmara, no dia da sessão de cassação de eduardo cunha, mencionou que a prova testemunhal é considerada, no Direito, a prostituta das provas. O que mostra que pagando bem... 
Com todo o respeito que me merecem as profissionais da mais antiga ocupação do mundo.
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Mas vamos às declarações de Lula, no dia posterior ao da apresentação em rede nacional, ao vivo e a cores, do amontoado de pretensas convicções dos procuradores, em outro show, agora protagonizado por Lula.
Sim, porque não há como não admitir, apesar do tratamento completamente desigual dado pela imprensa, principalmente a televisiva, ao evento, que também Lula não perdeu a oportunidade de protagonizar um show. 
E se as redes de televisão foram unânimes em destacar as pesadas acusações gratuitas disparadas por Dallagnol contra Lula, reconheçamos que foram unâmimes também, em deixar muito patente que a tal entrevista coletiva que Lula anunciara para se defender foi apenas um discurso emocional, que não apresentou qualquer argumento válido em sua defesa, e que, uma vez findo, não deu espaço para qualquer pergunta feita pelos jornalistas presentes.
Assim, como se vê, a nossa imprensa continua como sempre, dando apenas um lado da realidade, distorcendo como deseja e para seu proveito a sua principal missão: informar.
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E o que Lula disse foi que, às vezes, parece que o governo passa, os representantes eleitos pelo povo passam, como se fossem uma locomotiva e seus vagões, em desabalada carreira, enquanto o grupo de funcionários públicos, comparados à estação de trem estão sempre lá, presentes, constantes, parados e, impessoais, já que a impessoalidade é princípio fundamental do exercício da atividade pública.
Lula não disse nada de mais. Apenas reconheceu que os funcionários públicos, concursados que são, não são funcionários de qualquer governo, mas do Estado.
Aliás, há várias carreiras que são consideradas típicas de Estado, justamente para deixar claro que sua função e competências não podem se deixar nortear senão pelo bem público, essa quimera. Pelo interesse público. 
No serviço público, não se encontram trabalhadores dedicados a fazerem proselitismo político, nem é cabível a ideia de que algum partido poderia, enquanto passa pela estação do governo, aparelhar a máquina pública. Simplesmente porque em regimes democráticos, mesmo os de coalizão, e desde que o PMDB não exista para se perpetuar nas tetas do poder,  há a alternância de poder. Alternância que, às vezes não se dá a cada quatro ou oito anos, mas que não pode ser desconsiderada.
Aliás, só lembrando, foi o Sérgio Motta, ex-ministro das Comunicações de FHC quem primeiro falou em ficar vinte anos no poder.
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Desta forma, se os funcionários não devem favores a qualquer partido ou político, ao menos aqueles que são de carreira e não os ocupantes de cargos em comissão, por definição temporários, não há porque acreidtar que possa mesmo haver aparelhamento, senão temporário. 
Ora, amparados pelas leis que lhe asseguram estabilidade, os funcionários podem até mesmo se rebelar e descumprir ordens e decisões adotadas e que firam os preceitos do comportamento ético e legal.
Logo, aqui uma primeira observação: quem mais ofende o corpo de funcionários é Lula, que admite que os funcionários são autônomos e têm a consciência da perpeituidade de sua função ou aqueles que sempre alegam, como os órgãos de imprensa e até certos partidos e políticos, que os funcionários agem em defesa de seus interesses pessoais e não os do público?
Claro está que, seres sociais que são, os funcionários têm suas preferências políticas, como têm as religiosas, esportivas, sexuais, etc. Isso é da vida.
Mas é forçoso reconhecer que ao trabalharem e decidirem em equipe, muitas vezes seria no mínimo estranho que alguma decisão fosse tomada com a plena aquiescência de todos da equipe. E que as decisões eivadas de traços pessoais não fossem denunciadas.
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Lula falou disso, em minha opinião quando afirmou que: 
O concursado não. Se forma na universidade, faz um concurso e tá com um emprego garantido para o resto da vida",

O que é verdade, sem contestação.E Lula prosseguiu em sua fala afirmando, especificamente em relação ao pessoal de Curitiba que foi quem estava falando no dia anterior, no show que proporcionaram:  
“Ontem eu vi eles falarem dos partidos políticos, dos governos de coalisão, vocês sabem que muita gente que tem diploma universitário, que fez concurso, é analfabeto político”, declarou. “O cara não entende do mundo da política. Não tem noção do que é um governo de coalizão. Leia mais sobre esse assunto 

O que também não há como negar ser verdadeiro. Até porque, especialmente para agirem com isenção e impessoalidade e imparcialidade como se exige das ações dos funcionários públicos, em especial dos que atuam na área da Justiça, como os procuradores, mesmo que tenham convicções políticas, não podem se deixar guiar por tais ideias.
Nesse caso, de estarem atuando em uma investigação, devem sim agir como analfabetos políticos, ou seja, que apenas verificam e fazem valer o império do Direito e da Lei, independente de ser o partido A ou B, o político C ou D. 
Para ter condições de exercerem seu papel, o cara não pode mesmo entender do mundo da política e de seus conchavos. Tem que se pautar pela ignorância em termos de tais acordos, muitos dos quais criminosos. 
E, ainda bem, eu concluo, que os funcionários públicos não se deixam ou não deveriam se deixar levar por entendimentos do mundo da política, essa feita com p minúsculo.
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Mas, façamos uma concessão ao discurso de Lula, ele falou corretamente da situação que, muitas vezes é a que ocorre, de projetos e ideias e propostas e ações que são decididas em instâncias superiores, e que não são implementadas, dormindo nas gavetas de burocratas nas repartições, apenas por ferirem interesses de toda ordem, de tais servidores. 
Lula não mentiu quando tratou dessa questão. A própria Ciência Política é pródiga em estudar e há uma infinidade de trabalhos destinados a analisarem e até mostrarem como lidar com o problema que é chamado de fase de implementação das políticas públicas. 
Esse é um problema que atinge todo o mundo, todos os países, todos os regimes, não sendo privilégio do Brasil.
E ele existe e, muitas vezes, é o responsável por ideias positivas e propostas de ação muito boas se tornarem completamente fracassadas na prática. E muitas vezes é mesmo o concursado de segundo ou terceiro escalão que é o causador de tamanho estrago.
E Lula também está certo, ao afirmar que, muitas vezes os ocupantes de cargos de menor prestígio, acabam tendo mais poder que os ocupantes de cargos superiores.
Isso não é mistério para ninguém e lembra a anedota contada para falar mal do funcionalismo público - não inventada por Lula, diga-se de passagem - que o leão solto na repartição não teve sua presença percebida, até que um dia se alimentou não dos funcionários comuns, mas da moça do cafezinho.
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Honestamente, quem conta e divulga esse tipo de anedota está valorizando o funcionário público mais ou menos que Lula?
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Mas se a fala de Lula não agradou aos funcionários, o que pode ser compreensível, não dá para entender o porque toda a imprensa saiu comentando e repercutindo tal fala, exceto para criar um ambiente desfavorável ao político petista. 
O que é desnecessário. 
Porque enquanto estive na ativa do serviço público, o que pude ver e sentir e ouvir foi colegas comentando que Lula não gostava de funcionários públicos. 
A ponto de ter cogitado de enviar um plano para o Congresso, que manteria congelados os salários dos funcionários, em bases reais, por mais de uma década. 
Lula nunca gostou ou manifestou apreço pela autonomia e independência dos funcionários, assim como vários funcionários mais graduados que se aproveitam dessa regalia, mas querem impor aos seus coordenados sua vontade própria, sua visão particular. Sem discussão. 
E quantos de nós, no Serviço Público não trabalhamos já com tais chefes????
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A fala de Lula dá margem também para tocarmos na questão da meritocracia. Afinal, nada mais meritório que passar no funil do concurso público, 1 em 30 mil, para mostrar a competência pessoal e o nível elevado de qualificação.
Ou não?
Quantos passaram em concursos, por genialidade, e se tornaram péssimos funcionários por apresentarem um nível de capacidade muito superior àquela demandada para o exercício das funções. E quantos nessa situação não acabam se frustrando, com todos os problemas daí decorrentes, para a própria pessoa, para o ambiente, para os colegas, etc.
Quantos não passaram por algum rasgo de sorte e não de competência, embora cada vez mais essa situação tenda a não ocorrer?
E que méritos há em um bacharel que se forma, e se candidata em um concurso para o qual é muito bem aprovado e, acomoda-se ao longo de 30 e tantos anos  de exercício de uma mesma atividade rotineira?
Será que o mérito se mantém mesmo que embotado e não aprimorado?
Será que o mérito é definitivo ou é circunstancial? Temporário? Passageiro?
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Em minha opinião, o que Lula fez de pior foi o elogio, da forma que o fez, da classe política, 
"Eu de vez em quando falo que as pessoas achincalham muito a política, mas a profissão mais honesta é a do político, sabe por quê? Por que todo ano, por mais ladrão que ele seja, ele tem que ir pra rua encarar o povo e pedir voto."

Antes uma observação, dadas falhas de sua dicção, alguns jornais, o Globo, por exemplo, trouxeram posição no texto acima, onde Lula falou em profissão. Pouca diferença faz. 
O que o presidente queria dizer talvez fosse que o político, por maiores que sejam as acusações contra ele, e mais constantes, deve sempre dar satisfações à sociedade e a seus eleitores, sob o risco de não obter sua reeleição. 
Certo. Isso é correto. E se ele se apresenta à luz do dia, em público para pedir votos, sendo passível de ser cobrado ou acusado, deve ser dado a esse político o benefício da dúvida. A presunção de inocência. De forma que sua imagem e carreira não possam ser  corroídas por maledicências. Boatos. Imputações por convicções e não comprovadas. 
Tudo isso é muito bonito, não fosse Lula ter se emocionado e ter se entusiasmado. Até soltar uma bobagem ao estilo de Ademar de Barros. 
Tipo rouba mas faz
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Não sei se foi isso mesmo que Lula quis dizer, mas foi o que está dito. E não há defesa para tal bobagem. Note bem, em defesa dos políticos, porque não vi, honestamente, qualquer ataque ou ofensa ao funcionário público que, com orgulho,sempre fui.
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Mas como nossas visões estão cada vez mais turbadas pela nossa ideologia e nesse momento, pegarem uma frase, mesmo que infeliz e completamente indefensável, vale para que todo o tipo de ódio seja destilado, vale apenas lembrar que Lula não foi o primeiro, nem será o último presidente  ou político a falar mais que o devido. 
Para mostrar isso, e enfim, comentar a necessidade de todos dosarmos também nossas criticas e reações a discursos inflamados, posto abaixo a frase que, dita por Fernando Henrique não causou, na mídia tanta repercussão.
O ex-presidente tucano referia-se à necessidade de reforma da Previdência, tal como hoje, necessitando que fosse fixado um limite mínimo de idade. Mas ele soltou em discurso contra aqueles que cumpriam seu tempo de contribuição e se aposentavam com pouca idade que: 

Não se locupletem mais, não se aposentem com menos de 50 anos, não sejam vagabundos num país de pobres e de miseráveis 


Vagabundos, por estarem em pleno gozo do seu direito reconhecido de ter um ócio, depois de tanta contribuição dada ao país e à sua construção!!!
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Agora. vamos ser justos e coerentes. 
Porque tanta reação de funcionários em relação a Lula e ao que ele disse a respeito do concursado?
E quem sabe aqueles que estão mais raivosos e reajam com mais indignação não sejam os que tenham apoiado a proposta do MPF de medidas para combater a corrupção, já sob análise do Congresso.
Porque, em minha opinião, o tal projeto é mais agressivo a todos os funcionários indistintamente, cometendo o mesmo erro de generalização que imputei a Lula, no início dessa postagem. 
Senão vejamos, o texto abaixo, transcrito da proposta conforme apresentada no site do MPF:

Outra proposta é a previsão da possibilidade da realização de testes de integridade, isto é, a “simulação de situações, sem o conhecimento do agente público ou empregado, com o objetivo de testar sua conduta moral e predisposição para cometer crimes contra a Administração Pública”. A realização de tais testes pode ser feita por órgãos correicionais e cercada de cautelas, incluindo a criação de uma tentação comedida ao servidor, a gravação audiovisual do teste e a comunicação prévia de sua realização ao Ministério Público, o qual pode recomendar providências. O pressuposto desses testes não é a desconfiança em relação aos agentes públicos, mas sim a percepção de que todo agente público tem o dever de transparência e accountability, sendo natural o exame de sua atividade. A realização desses testes é incentivada pela Transparência Internacional e pela ONU.

O texto por sua clareza dispensa maiores análises.  E o que ele faz é considerar, embora negue, que não se trata de desconfiança. Apenas simular situações para verificar e testar a conduta moral do agente público...
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Bem, se isso não é desconfiança, então mais uma vez as convicções de Dallagnol e seus colegas vão na direção oposta a de minhas convicções. 
Mas, admira-me que esse texto não tenha merecido, ao chamar todos os funcionários públicos de ladrões em potencial, não tenha merecido a divulgação, a repercussão, a reação, ou o repúdio de tantos que agora se voltam contra Lula. 
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Para mim esse texto me ofende muito mais que as bobagens ditas por um Lula destemperado e entusiasmado.
É isso. 

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Deixo para tratar depois a classificação do Galo na Copa do Brasil, por um lance de oportunidade, contra um adversário que foi melhor todo o tempo e que foi desclassificado por um capricho do futebol. Uma injustiça.
E mais uma vez uma partida de péssimo futebol a ser creditada na conta de Marcelo Oliveira, o técnico que, junto a Tite é uma das maiores frustrações minhas.

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