quarta-feira, 3 de maio de 2017

Sobre os comentários e a ignorância da greve e o início conturbado de maio. E uma despedida de Belchior

Fim de abril, e uma série de novidades interessantes no cenário político do país. 
A começar da greve geral convocada para o dia 28 de abril, em protesto contra a aprovação pela Câmara da dita reforma trabalhista e contra a proposta da reforma previdenciária enviada ao Congresso por esse governo ilegítimo, usurpador e inteiramente viciado.
Curioso que, no direito, qualquer ato jurídico que apresente algum vício, principalmente de origem, é fuzilado de nulidade plena. 
Ou seja, é considerado nulo, como se não tivesse existido nunca e nem pode gerar qualquer tipo de consequência ou efeito.
Mas, no caso de aprovação de uma lei, ou pior,  um conjunto de leis cuja razão primeira é beneficiar os interesses poderosos do grande capital, principalmente do capital financeiro, o vício de origem não conduz à nulidade. Um governo surgido em consequência de um golpe, portanto, anti-democrático, e integrado por vários políticos delatados e suspeitos de terem recebido propinas, ou desviado recursos públicos, ou ainda utilizado recursos ilícitos do famigerado e criminoso caixa 2, podem propor, votar, e alterar todo um arcabouço legal, na maioria das vezes, mas não sempre, com efeitos nefastos para o conjunto de trabalhadores, ou os estratos sociais menos favorecidos. 
Enfim, esse é o nosso Brasil, país cujas origens coloniais deixaram heranças tão profundas que, ainda nos tempos atuais, insistem em continuar reproduzindo, agora pelas elites nacionais, o mesmo tipo de exploração praticada pela metrópole portuguesa. 
***
Voltando à greve, interessante é ver a forma como a manifestação foi tratada pela nossa grande imprensa, principalmente pelas grandes redes de televisão, Globo à frente. 
Mas, justiça seja feita, a referência à Globo deve-se, sem qualquer dúvida, à importância, à liderança em termos de audiência que a rede carioca ostenta, uma vez que o comportamento da Band, por exemplo, chega às vezes a ser mais vergonhoso, mais deplorável, mais puxa-saco que o de sua concorrente. E isso, independente de seu âncora ser um Ricardo Boechat, um jornalista menos venal que alguns analistas que infestam as outras redes. Alguns analistas cujas opiniões, sempre contrárias aos interesses populares e sociais não surpreendem a ninguém, considerado seu passado de serviçais da ditadura militar de 64.
Bem, a greve exitosa, conforme se depreende de leitura de jornais e sites sérios da imprensa estrangeira, não mereceu mais que algumas poucas frases de nossa mídia, a maioria delas destinadas a noticiar os atos de vandalismo que ocorreram em alguns pontos isolados das principais cidades do país.
Ou então, notícias destinadas a criticarem o fato de que os grevistas impediram aqueles que não desejavam fazer qualquer movimento paredista, de poderem exercer seu direito de trabalharem livremente. 
***
Coisa mesmo de país sem qualquer experiência e cultura democrática, de povo tratado como gado, como boiada, tangida pelos interesses de uma elite completamente divorciada dos interesses da massa a que apenas lhe interessa explorar em proveito próprio. 
Essa mesma elite que reclama de que os grevistas pararam os serviços de transporte público, inclusive alegando que o sucesso da paralisação foi muito menos por vontade do povo participar mas por impedimento de poderem ir ao trabalho, constrangidos pelos "vagabundos".
Elite para quem a greve deveria se dar nos finais de semana, para não prejudicarem o interesse e desejo da alegada maioria que, ao que parece, está plenamente satisfeita em perder direitos e ver os ricos cada vez mais favorecidos. 
Porque o que mais me deixa perplexo é que, sentindo-me partícipe da greve, e tendo me manifestado favorável ao movimento, fui então chamado de vagabundo, como os demais brasileiros que ainda se interessam em lutar na defesa de seus direitos conquistados a duras penas e lutas várias. 
E fui chamado de vagabundo pelas redes sociais, sempre permeáveis a qualquer tipo de pronunciamento por mais cretino que possam ser, por algumas pessoas até conhecidas minhas que, curiosamente, são aqueles que estão mais propensos a se tornarem vítima da precarização do trabalho, especialmente a partir de uma certa idade e tempo de carreira, como também serão aquelas pessoas que mais têm a perder com as novas idades determinadas para a aposentadoria, ou com a nova regra que obriga o trabalhador a ficar mais de 40 anos trabalhando para ter, quem sabe, um salário correspondente a uma média, calculada de forma a reduzir o valor de seu benefício futuro. 
**
Em relação a esses conhecidos, ou a alguns deles, apenas me reservo o direito de pensar que são a ilustração mais cristalina da falta que a educação formal de mais conteúdo possa provocar em um povo. 
É uma pena. Mas alguns dos que estavam nas redes reclamando dos vagabundos são os que mais ralam, e menos obtém rendimentos, por serem os que menos tiveram acesso, seja por que motivo for, a uma educação e capacitação profissional de qualidade.
***
Saídos da greve, já no primeiro dia útil do mês de maio tivemos a oportunidade de verificar o acerto daqueles que sabem que direitos só se conquistam com muita luta. Afinal, depois do espetáculo da invasão do Congresso, com direito a quebradeira, pelos policiais federais, exigindo alteração na proposta previdenciária do governo, em relação à sua categoria profissional, ontem quem partiu para o movimento de invasão e ameaças e quebradeira, agora no Ministério da Justiça em Brasília, foram os agentes carcerários. 
Assim como os policiais federais, não duvido que os agentes serão atendidos em suas justas reclamações, como o foram também, por serem considerados policiais, os servidores que integram a polícia do Legislativo. O que é uma brincadeira. 
Daqui a pouco, também serão retirados das alterações da previdência - aquela que tinha como principal conquista igualar a todos os trabalhadores sem exceção -, os seguranças, inclusive, privados, que travam luta muito mais renhida e diuturna, com maior exposição a riscos, inclusive de vida, que os policiais do Congresso. 
***
Ou seja, no afã de aprovar ou mais ainda de criar um temor gigantesco na população trabalhadora do país, inclusive mentindo e apresentando dados senão falsos, pelo menos incompletos, sob a situação de viabilidade futura da Previdência, o governo admite abrir mão de alguns de seus princípios (como o da igualdade), desde que, contando com o apoio sempre explícito da grande imprensa, a ideia de previdência privada complementar possa continuar a ser difundida e a conquistar cada vez mais adeptos e consumidores. 
***
Maio teve início como é costume, com um discurso do presidente da República em comemoração ao dia Internacional do Trabalho. 
Ou não.
Porque nosso usurpador e golpista temer, não tem coragem para se dirigir às redes de tevê para fazer qualquer aparição, desejando fugir do panelação que, tolamente, acredita que iria ocorrer. Coitado, mal sabe que a Globo não mandou ninguém fazer panelaço. E ainda que alguém insista em fazer ruído em protesto, não seria notado. Ao menos não seria noticiado de forma alguma. 
Mas nosso fugitivo das luzes corre para se esconder nas redes sociais, mostrando o acerto de todos que criticam sua imagem pessoal: não fosse assemelhado fisicamente ao nobre conde Drácula, agora ficamos sabendo que, do ponto de vista mercadológico, não convém aparecer em público que o compara com uma representação demoníaca. 
E esse é o homem que vai mudar o Brasil, aproveitando de sua notória impopularidade e sua falta de estatura moral para se livrar das forças que o colocaram onde se encontra, para ajudar a construir um país mais justo e digno.
***
Ainda no início de maio, vimos mais uma vez Dallagnol querer se mostrar maior que o seu tamanho real, achando-se com forças suficientes para constranger ao Supremo, o que lhe valeu uma severa reprimenda pública de um dos ministros da Corte, justamente aquele que mais motivos dá, perante à sociedade, para que o respeito devido à Suprema Corte do país, seja cada vez mais lançada ao ralo. 
Com isso, Eike, Zé Dirceu e outros vão fazer companhia à Adriana Anselmo, mulher de Cabral, ou ainda a outros criminosos de renome e projeção que gilmar mendes não viu qualquer problema em determinar sua liberação. 
***
E, mais uma vez, vemos uma crise institucional se instalar em um país que atribuía a culpa por todos os seus problemas à mera presença do PT no poder. Assim como toda a corrupção que se acreditava e divulgava que era fruto apenas do governo petista, já que os demais partidos eram compostos por candidatos à santidade, ainda em vida. 
***
E maio está apenas começando. Mas promete, inclusive na economia, onde parte dos índices e estatísticas, inclusive do número de desempregados, continua, insistentemente, não concordando em se comportarem como as redes de televisão e a equipe do governo fingem estar ocorrendo. 
***
Para concluir esse primeiro pitaco do mês em que se comemora o dia do trabalho, das mães, do centenário da aparição em Fátima, e da Abolição da Escravidão (que temer parece querer anular), uma despedida sentida de apenas um rapaz latino americano, sem dinheiro no bolso e vindo do interior. 
Alguém que ousou querer que seu canto, como faca, cortasse a carne de todos que o ouvíamos. 
Ou que romanticamente, mas não inocentemente, com medo de avião, segurou pela primeira vez na mão de alguém...
Belchior, grande poeta, segue agora pelas paralelas que não levam ao infinito do Corcovado, mas levam a outros mundos e outros planos.
Quem sabe?

Nenhum comentário: