quarta-feira, 26 de outubro de 2022

Auxílios ilegais e imorais, créditos consignados e os riscos de crédito e de privatização da CEF

 



Em julho desse ano, visando pavimentar o caminho que poderia conduzi-lo à reeleição, e em flagrante desrespeito à legislação  eleitoral, o governo conseguiu aprovar uma Emenda Constitucional que decretava um fantasioso Estado de Emergência, destinado a permitir implantar um vergonhoso pacote de benefícios eleitorais.

Com um custo estimado próximo dos  51 bilhões, a chamada PEC do fim do mundo,  que chamei de Pec da universalização da Corrupção trazia, entre outras medidas e na tentativa de comprar o voto dos mais necessitados, um aumento do valor do Auxílio Brasil, de 400 para 600 reais, a serem pagos somente até dezembro.

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Para não restar qualquer dúvida quanto ao caráter despudoradamente eleitoreiro da PEC,  a proposta de lei orçamentária encaminhada em agosto pelo governo previa, o pagamento do valor de 405 reais para o substituto do Bolsa Família.

Tudo isso sob a conivente sonolência e a inação cúmplice do Tribunal Superior Eleitoral.

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Já tendo arrombado tanto a porta quanto as contas públicas, sem qualquer punição, em agosto, por meio de uma Medida Provisória, o governo aprovou a concessão de crédito consignado para os favorecidos com o Auhxílio Brasil.

Com base nesse aparato legal, a Caixa já registrava mais de 1,8 bilhões de créditos concedidos nessa modalidade em outubro, quando o TCU recomendou a suspensão dessas operações.

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Com um custo de  juros de 3,45% ao mês, ou 50,23% ao ano, e comprometimento máximo da de 40% do valor do benefício pago, a prestação não poderia superar os 160 reais, não podendo o crédito se estender por período maior do que 24 meses.

Sob tais condições, não foram poucos os analistas que alertaram para os perigos embutidos e as condições draconianas de tal operação.

Vários deles, inclusive, destacaram que, passado o mês de dezembro, e com o benefício de volta ao seu verdadeiro valor de 400 reais, restariam ao devedor apenas 240 reais para financiar os gastos de alimentação e sustento de suas famílias.

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Considerado o valor de uma cesta básica, acima do valor dos 600 reais do auxílio, a tomada do empréstimo acarretaria um problema insolúvel no futuro imediato.

Adicionalmente, para atender aos limites fixados, o valor máximo do benefício não poderia superar os 2500 reais, o que daria para acertar a vida financeira do beneficiário e, dificilmente, para tentar a sorte como empreendedor. Ainda assim, ao fim do período do contrato ele teria pago o montante 48,6% a mais que sua dívida.  

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Meu interesse aqui não é repisar os riscos e dramas do devedor da operação. Meu foco é entender o silêncio do Banco Central, responsável pela fiscalização e manutenção da saúde do sistema financeiro nacional.  Para atender a esta função, o Banco adota um modelo de supervisão prudencial, visando reduzir riscos.

Para deixar mais clara minha preocupação, recorro à Resolução 2682, de 1999, que estabelece os critérios de classificação das operações de crédito e regras para a constituição de provisão para créditos de liquidação duvidosa.

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A Resolução prevê que compete à instituição financeira a classificação de risco de crédito – o risco de o devedor não conseguir pagar sua dívida, ou não fazê-lo na hora contratada -  fixa algumas variáveis que devem guiar tal classificação.

Em relação ao devedor e seus garantidores a classificação do nível de risco deve considerar sua situação econômico-financeira e seu grau de endividamento.

Em relação à operação, deve-se considerar, as características das garantias, particularmente quanto à suficiência e liquidez.

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Se ninguém põe em dúvida a suficiência e liquidez do consignado ( o valor do auxílio é a própria garantia), há que se questionar seriamente a situação econômico-financeira do devedor. Afinal, exatamente sua reconhecida situação de penúria é que o habilita a receber o antigo Bolsa Família.

Em relação ao seu grau de endividamento, a situação fica mais drástica, a se considerar o alto volume de inadimplência da sociedade brasileira e as taxas e contas todas em atraso.

E olhe que em seu parágrafo único, a Resolução ainda afirma que o crédito de titularidade de pessoas físicas deve levar em conta as situações de renda (?) e de patrimônio (???) bem como outras informações cadastrais do devedor.

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Quanto à classificação de risco, maior o risco maior a perda potencial estimada e maior a provisão para perdas, ou seja, a dedução do lucro da instituição.

O que permite que uma instituição lucrativa e sólida venha a começar a apresentar perdas que possam ..... JUSTIFICAR SUA INEFICIÊNCIA e, no caso de instituição pública, levar à discussão de sua PRIVATIZAÇÃO.

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Para quem tem um guedes na mão e nenhuma empatia para com os que vivem na miséria absoluta; para quem tem planos e estudos para achatar o salário mínimo, reduzindo todos a uma situação de igualdade na penúria, nada mais interessante.

O que não deveria ser novidade, tantas as vezes que a CEF já foi objeto de declarações de privatização e venda retalhada de suas várias carteiras lucrativas.

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Enquanto isso, a prévia de inflação, o IPCA-15 sobe em outubro, para 0,16 % , ou 6,85% em 12 meses, para uma inflação cujo teto máximo era de 5%.

Com queda em grupos de transportes (combustíveis, em especial, gasolina e etanol), comunicação e artigos de residência. Os dois primeiros sob influência da redução ‘inconstitucional’ do ICMS.

Por outro lado, roupas, saúde e alimento e bebidas, gastos que afetam mais de perto aos menos favorecidos prosseguem em elevação.


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