terça-feira, 24 de maio de 2016

Medidas econômicas de ajuste recessivo não farão o país voltar a crescer

Nada contra o corte de gastos anunciado hoje para conter o déficit fiscal do governo, e deter o crescente índice Dívida Pública/Pib, que assusta a tanta gente do mercado e da mídia que lhe serve de porta-voz.
Mas, por favor, não venham dizer como já andei vendo nos sites de notícias que as medidas visam criar as condições para propiciar a retomada do crescimento econômico do país.
Primeiro, porque corte de gastos, e na magnitude declarada é medida de redução da demanda agregada. Logo, se como diz o modelo keynesiano, no curto prazo, dadas as condições de produção e tecnologia do país, o produto, a renda e o emprego são determinados pela demanda efetiva, movendo-se instantaneamente com alterações da demanda, o que podemos concluir é pelo aprofundamento da recessão.
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Não à toa, já na semana passada, em uma das várias entrevistas concedidas a programas da rede Globo, Meirelles deu a entender que o desemprego poderia atingir os 14%, 15% da força de trabalho até o final do ano.
Destaco apenas, nesse pitaco, que acho que ele foi parcimonioso, nesse quesito, que acredito poderá atingir mais, chegando quem sabe, aos 18%.
Parcimônia que, para se cacifar e ter margem de manobra, ele não adotou ao elevar a meta de resultado fiscal para o ano, de cerca de 97 bilhões de reais, para 170 ou 180 bilhões.
Agora fica claro. Não era, como eu postei ontem, para dar algum resultado melhor que o ministro pudesse vender aos mercados como sinal de austeridade e êxito de sua gestão.
Na verdade, era para dar um refresco para o corte pretendido de gastos, já que no novo valor de resultado, algumas despesas foram até ampliadas.
Quem sabe, para não bater a marca recorde de desemprego e recessão que ele sabe estar promovendo.
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Há também que se deixar claro que a queda da produção e vendas, com suas consequências como a queda do nível de emprego e renda, é um dos principais fatores que explicam a queda das receitas tributárias, responsável pelo aumento, a cada mês, do déficit fiscal.
Afinal, cai a produção, a circulação de produtos, a renda e com ele as receitas dos principais impostos como o IPI, o ICMS e o IR.
O que aprofunda o problema ao invés de corrigi-lo.
Daí a minha opinião, de acordo com a leitura de Keynes, mesmo a feita conforme os manuais, de que o governo deveria era estar preocupado em aumentar os seus gastos, em especial, com investimentos em infra-estrutura, para destravar os estrangulamentos e abrir as oportunidades reais necessárias à retomada dos investimentos privados e ao crescimento.
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Para financiar esses gastos, elevaria sua dívida, resultado que seria compensado posteriormente quando, com a demanda agregada voltando a se elevar, e a produção, emprego e renda, a arrecadação voltasse a crescer.
Diga-se que tal solução contraria frontalmente o consenso dos mercados e sua ótica imediatista e conservadora.
Mas é keynesianismo, mesmo que meia boca.
Com a elevação da arrecadação, o governo poderia gerar superávits fiscais e reduzir a dívida que ampliou.
E, por favor, não me venham falar em equivalência ricardiana, alegando que, política como essa seria inóqua, porquanto os agentes econômicos individuais percebendo que teriam que, no futuro, pagar pelo aumento da dívida, iriam desde já começar a poupar recursos para quando fossem chamados a contribuir.
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Mas, entre as medidas anunciadas, vemos a definição de um teto para os gastos governamentais, que não poderão crescer mais que a inflação no ano anterior.
Ou seja, isso significa que os gastos reais ficam congelados, fixados no montante estabelecido para o ano presente, pelo orçamento, agora revisto. Ou seria aquele elaborado em 2015, pelo governo Dilma?
Também para mim não está claro se o limite é para cada uma das principais classificações de gastos ou se para o gasto total.
No segundo caso, o governo estaria patrocinando um embate de proporções imprevisíveis entre, por exemplo, os setores sociais que, para terem seus benefícios majorados, forçariam o governo a cortar, por exemplo, em pagamento da folha de funcionários.
Seria curioso assistir a esses setores de situação mais precária e maior necessidade de atendimento pelos prestadores de serviços públicos, terem que ser assistidos e até reclamarem da melhoria da qualidade dos serviços prestados por profissionais que seriam os que teriam perdas causadas, justamente por suas conquistas.
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Fixar esse congelamento de gastos é cruel também sob outro aspecto. Afinal, se a população do país amplia-se, como é natural, e demanda mais bens e serviços públicos, a decisão de não elevação dos gastos públicos implica que, no médio prazo, mais pessoas terão que ser atendidas e se virarem com os mesmos recursos destinados a um número inferior de pessoas.
Ou seja, o gasto por habitante ou gasto por demandante de serviço público tenderá a cair, partindo já de um patamar de qualidade ridiculamente baixa, o que apenas indica que a qualidade irá despencar ladeira abaixo.
Ao menos em relação ao atendimento ao povão.
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Outra questão: como limitar gastos com educação e saúde, que não estão indexadas à inflação, mas vinculadas à elevação da receita.
No caso muito remoto de o país voltar a crescer, o que não acredito irá acontecer até 2018, ao menos como consequência das medidas anunciadas, como ficará a situação dos gastos voltados para essas funções?
Ou o governo irá fazer passar uma PEC no Congresso, alterando a conquista da população brasileira, obtida com a aprovação da Constituição considerada cidadã, certa ocasião?
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Outra medida, como o fim do fundo soberanao com recursos do petróleo da extração do pré-sal, nada acrescenta, ao repassar 2 bilhões de reais para o governo poder abater sua dívida.
Ora, o que significa essa quantia, para um déficit cuja meta anunciada é de 170 bilhões?
Tal medida apenas sinaliza que nada em relação ao pré-sal será mantido, como foi delineado nos governos anteriores.
O que inclui a possibilidade de retirar da exploração dessa nossa riqueza, a participação obrigatória mínima da Petrobrás, como já o determina projeto do senador José Serra, que tramita no Senado.
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O final dos subsídios vai atingir aquela parte de gastos que o governo faz para permitir ao pequeno agricultor familiar sobreviver, com o fruto de sua atividade produtiva precária. Ou aquela parcela de gastos que o governo banca para a população de baixa renda ter acesso a sua casa própria, dentro das condições do programa Minha Casa, Minha Vida.
Não vi, nem sei informar se a medida vai alcançar e reduzir ou eliminar subsidios em taxas de juros e outros que afetam não aquela parcela da população mais necessitada, porque mais carente.
Porque os subsídios concedidos nos financiamentos liberados por órgãos públicos a empresários não foram objeto de maior detalhamento.
Como também não foi tocada a questão das isenções e desonerações e outras, que atingem ao andar superior do estrato social.
O que, do ponto de vista de corte de gastos para proceder a um ajuste fiscal é curioso. Ou não, já que os beneficiários desses cortes são os beneficiários de sempre.
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No mais, a outra medida anunciada é a antecipação da parcela que o Tesouro passou ao BNDES, para ampliação de seu potencial de fornecimento de crédito, ainda no governo Dilma.
Essa medida, que poderá carrear até 100 bilhões para o Tesouro, por um lado, vai reduzir a capacidade do Banco financiar projetos de investimento que permitiriam ao país retomar o crescimento desejado.
Por outro lado, há que analisar ainda e preliminarmente, se isso não seria considerado uma antecipação de recursos junto a banco público controlado, o que caracterizaria um tipo de pedalada fiscal.
Muito embora, nesse caso, os órgãos de imprensa já assinalam que o governo está verificando a possibilidade  de tal medida ser contrária à lei de Responsabilidade Fiscal que veda operações de antecipação de receita efetuada por banco público. Caso isso pudesse juridicamente ser considerado como uma operação vedada, restaria ao governo alterar o contrato do BNDES com o Tesouro, para escapar da acusação de obter recursos de banco controlado.
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Tudo bem. Mas pau que dá em Chico, se não dá em Francisco é porque tem algo de podre no ar. Pois foi exatamente esse argumento de Dilma em sua defesa de que não fez operações de crédito, já que as operações caracterizadas como pedaladas fiscais eram geridas por contratos de convênios de prestação de serviços financeiros, dos bancos com a União.
No entanto, há mais coisas entre o céu e a terra que supõe nossa vã filosofia.
E, como o sabemos, há algo de podre, muito podre onde a democracia não é respeitada como o ilustra o país e o momento em que vivemos.


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