Símbolos de modernidade e
do avanço tecnológico que arrebata nossa sociedade, para o bem ou para o mal,
as redes sociais são periodicamente invadidas pela história do encontro entre
um jovem turista e um velho sábio, muito reverenciado no local em que vivia.
Ao final de uma tarde
inteira de conversas sobre assuntos variados, ao se despedir, e sem conter sua perplexidade, o jovem comentou
a simplicidade da habitação, dotada
apenas de uma cama, uma mesa e duas cadeiras. Ao que o sábio retrucou: e onde
estão seus móveis e bens?
Eu não trouxe nada disse
o jovem, estou aqui só de passagem.
Eu também, respondeu o
ancião.
Nunca é demais destacar,
ao contrário é um dever acadêmico, conceder a textos e evangelhos bíblicos a primazia
sobre tal ensinamento.
Mas, se é verdade que
aqui chegamos e daqui partiremos sem poder carregar quaisquer bens materiais,
qual a razão de cada vez mais pessoas iguais a cada um de nós, se mostrarem tão preocupadas em acumular
riquezas e fazer dessa atividade seu objetivo de vida? Custe o que custar.
E como explicar o
desenvolvimento de todo um campo de conhecimento, objeto dos
estudos da Ciência Econômica, cuja preocupação fundamental está, cada vez mais, focada no processo de
acumulação de bens, de riquezas, de capital?
Excetuada alguma
preocupação com a manutenção de um padrão minimamente estável e digno para o
sustento de sua descendência, razão suficientemente questionável para quem tem
a sabedoria de deixar plantadas as sementes do saber, da educação, da
solidariedade e do respeito, como entender a adoção de tal comportamento por
parcela dos integrantes de nossa sociedade?
Afinal, que utilização
podem ter os bens materiais, além daquela de nos permitir ter uma vida
tranquila, equilibrada, até confortável, se quando estivermos desfrutando
desses prazeres e levantarmos o olhar à nossa volta, encontrarmos os olhares
famintos e desesperados de nossos irmãos.
Diz a letra de uma música
de Paulinho da Viola, quase um hino, “ que a vida não é só isso que se vê, é um
pouco mais. Que os olhos não conseguem perceber, e as mãos não ousam tocar, os
pés recusam pisar”.
Em que instante perdemos
de vista, a Economia, o sentido pleno da vida em todas as suas dimensões,
substituída por uma visão canhestra do homem econômico. Cuja passagem pela
terra teria como objetivo a maximização de seu prazer individual, egoístico,
sempre uma quimera inalcançável.
Ora, se o objetivo do
homem fosse a maximização de seu prazer material, então esse objetivo só poderia
ser alcançado no momento derradeiro da vida, sob pena de, se atingido antes, não
haver mais razão de se continuar vivendo.
Desgraçadamente é esse
conteúdo que continua frequentando os programas das disciplinas, cada vez mais
dominadas pela preocupação com as técnicas de quantificação, de elaboração de
projeções estatísticas e cálculos frios, numa inversão inadmissível, que prioriza
as ferramentas auxiliares, em detrimento do
conhecimento essencial.
Consequência dessa
inversão, amplia-se o fosso entre os que têm e que tudo podem, proprietários
dos bens de produção e aqueles que nada têm, exceto, caso sobrevivam, sua própria
capacidade de sobreviver e trabalhar.
Situação que cria a
oportunidade para o surgimento de conflitos sociais que não poderiam prosperar,
especialmente em um país que gosta de
fantasiar-se e apresentar-se como sendo a terra da democracia racial, da
miscigenação, da alegria e irreverência, da paz, samba e alegria.
Festas para quem, cara
pálida?
É verdade e já até as
pichações dos muros trazem a mensagem: todo brasileiro tem sangue índio e
negro. Os pobres, nas veias. Os ricos nas mãos.
As mãos que subjugam os pobres e os exploram como seres inferiores.
A vida não é só isso que se vê. E se há uma
preocupação crescente com a ampliação dos bens de capital, as máquinas e
equipamentos, é apenas porque são esses bens que tornam possível produzir maior quantidade de produtos
para que toda a sociedade possa, deles, usufruir.
Mas não nos iludamos, nem
sejamos maniqueístas, que tal visão não corresponde à realidade de nosso mundo:
não há, a priori, nem homens apenas maus
ou apenas bons, por definição.
Vejamos uma ilustração: o
empregado que trabalha de 6 horas da manhã até as 6 da tarde, de sol a sol, para
pescar dez peixes que constituem o sustento diário de sua família, claramente
será beneficiado por trabalhar como assalariado para um empregador que, além de
lhe prometer um salário de vinte peixes, ainda lhe conceda duas horas de
intervalo para o almoço.
Ocorre que, com patrão
tão generoso, se antes todo o fruto seu
trabalho era dele, agora, se vier a utilizar instrumentos mais
sofisticados de pesca, como as redes, ele irá receber os vinte peixes
contratados, de um total que pode alcançar a mais de uma centena. Uma
quantidade a quel ele não terá qualquer direito, ainda que decorrente de seu
trabalho.
Ou seja: Independente do
caráter e generosidade das pessoas envolvidas, há aí uma injustiça, fruto exclusivo
de uma dos personagens ser proprietário de bens acumulados, às vezes por direito
de herança, sem nada ter feito para merecê-los, enquanto o outro apenas tem de
seu sua disposição e trabalho.
É essa situação que justifica,
muitas vezes, a gana pela acumulação: a capacidade de, mesmo sem o desejar, uma
classe de pessoas poder explorar seus iguais.
É contra esse pecado
original que temos que lutar, todos aqueles que são contra as injustiças
sociais e a favor de uma sociedade mais fraterna e digna: a criação de um
espaço de igualdade, que os olhos não conseguem perceber diferenças e as mãos
não ousam explorar.
Luta cada vez mais
inglória em função do mesmo avanço tecnológico, origem das redes sociais que
iniciaram nossa fala. Porque esse avanço tecnológico, queiramos ou não, traz
consigo uma completa subversão de tudo que constituí nossa vida, nossa atividade
produtiva, nossa forma de gerar riquezas, trabalho, emprego e renda.
Está aí o uber, para
desbaratar o sistema de transporte coletivo de passageiros por taxi. O Airbnb,
para destroçar as estruturas de recepção de hóspedes; os sites como o Decolar, o
Trivago, para destruir o mercado tradicional de hotelaria e viagens; o OLX,
para destruir os mercados de utensílios de segunda mão e até imobiliários.
Não poderia me furtar de
fazer referência ao ensino à distância que, independente de nossa vontade pessoal,
cada vez mais se impõe e está fadado a tornar obsoletos profissionais como esse
que vocês resolveram homenagear. Talvez em uma das últimas ocasiões propícias a
esse tipo de homenagem aos antigos professores de carne e osso.
É verdade. E independente
de qualquer posicionamento, favorável ou não, é para atuarem na realidade desse
mundo novo que vocês estão saindo hoje da escola. Que vocês tenham aprendido
mais que conteúdos, a serem pessoas bem-intencionadas, honestas, atentas, antenadas,
curiosas, interessadas, versáteis e lutadoras incansáveis. E sempre, como bons
brasileiros, portadores da esperança.
A seus pais e familiares,
sustentáculos e participantes dessa épica vitória de todos, e a todos vocês,
parabéns. Felicidades. E o desejo de que possam sempre manter a mente quieta, a
espinha ereta e o coração tranquilo.
Obrigado.
***
Este foi o discurso de formatura da turma de Ciências Econômicas do 1° semestre de 2016, do Centro Universitário UNA.
Que eles tenham êxito e o restante de nós algums momentos de reflexão, sempre necessáriia.
Ao longo dessa semana, tratamos mais das Olimpíadas, seus resultados, e a festa de encerramento, mais uma vez, um evento que serve para mostrar ao mundo de nossa capacidade de fazermos as coisas de forma a grardar a todos.
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