quarta-feira, 3 de abril de 2013

A ansiedade com a inflação e a elevação (necessária) dos juros

Não consigo entender a ansiedade da imprensa ao tratar de notícias a respeito da inflação e, mais ainda, da preocupação com a manutenção e continuidade da política de sistema de metas.
Aliás, diga-se de passagem que, embora muito festejado como um instrumento importante no combate à inflação, o sistema de metas não faz nada mais que dar transparência a um valor que expressa uma taxa de inflação que a autoridade econômica espera que vá ser alcançada pela economia do pais, em um dado período de tempo.
Por ser uma taxa esperada, ou prevista, no fundo não passa, pois, de mera especulação, como tantas outras que ocupam o espaço das incertezas em que as decisões econômicas têm de ser adotadas.
Pois bem, feita a previsão, o sistema transforma esse número em um objetivo de cumprimento praticamente compulsório, já que revestido de caráter legal.
Na verdade,  o tal sistema apenas informa a toda a sociedade que caso aquela meta não esteja sendo cumprida, o Banco Central ou a Autorida Monetária tem o dever de agir e, aí sim, utilizar todo o arsenal de medidas e instrumentos e ferramentas que possam promover a convergência da realidade com o desejo transformado em lei.
O sistema de metas não é, assim, um instrumento. Instrumentos são as variáveis que sejam capazes de afetar o comportamento dos preços e, mais estruturalmente, da estrutura produtiva do país.
A taxa de juros é um desses instrumentos, embora não seja o único. E instrumentos existem e podem ser citados que tanto respeitam a lógica do mercado quanto que venham a refletir a presença de intervenção extra-mercado, do governo.
Além disso, ainda em relação ao que é o sistema de metas para a inflação, é importante assinalar que o estabelecimento da meta não é a determinação de um ponto no espaço de valores, mas de um intervalo, o que significa dizer que, fixado o centro da meta, aceita-se que haja uma variabilidade em torno desse valor, tanto para mais, quanto para menos. Ou, o valor da taxa de inflação pode oscilar, em um intervalo limitado, para mais ou para menos.
No nosso país, a taxa que corresponde ao centro da meta é de 4,5% para esse ano, podendo atingir até 6,5%, em seu limite superior.
E é importante que seja deixado claro que o valor não é para ser cumprido para o período de 12 meses a cada mês do ano, mas para o período de 12 meses do ano fixado. Ou seja, se a inflação de 12 meses em abril de 2013, que é a inflação acumulada de  maio de 2012 até abril, der 6,8%, isso não significa, necessariamente que o sistema foi abandonado ou que a inflação está fora de controle ou mesmo saindo de controle.
Porque se de maio a agosto do ano anterior a inflação apresentou uma aceleração e vem apresentando queda nos meses decorridos em 2013, isso é sinal que o governo já agiu e que a desinflação está em marcha.
Embora o governo deva estar atento ao comportamento dos preços, e uma taxa de 12 meses é um bom indicador para tal acompanhamento, isso não deveria promover qualquer gritaria da midia. No exemplo que criamos, o governo e a midia poderia até estar comemorando o fato de a inflação estar convergindo para o centro da meta, ou algo próximo dela.
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Só para completar a apresentação do sistema, é importante lembrar que vários outros países adotam o sistema, e que a literatura está cheia de exemplos que indicam que a adoção do regime de metas não tem ou não teve a influência esperada. Para alguns, a inflação já estava em declínio quando da adoção do regime, nada indicando que não prosseguiria em sua trajetória, caso o regime não fosse adotado.
Também se mostra que países que não adotaram o regime tiveram taxas de inflação em queda, o que não indica que a adoção do regime seja necessária ou suficiente para a obtenção de níveis de inflação civilizados.
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Então, retomando minha perplexidade inicial, não consigo entender porque tamanha ansiedade vem sendo demonstrada pela midia em relação ao fato de a inflação estar sendo projetada para ficar dentro do sistema, em 5,75%, aquém dos 6,5% do limite superior e mais baixo que o valor alcançado no ano passado.
Claro, e não sou eu que iria afirmar o contrário, inflações de 5% são ruins. Ao cabo de 4 anos, já corroeram mais de 1/5 dos rendimentos dos trabalhadores.
Mas, daí a ficar repercutindo todo o tempo que a inflação está saindo de controle é coisa bastante distinta.
Exceto pelo fato de que a midia serve de caixa de ressonância para aqueles setores que estejam mais diretamente ligados àquelas esferas que sofram influências maiores ou mais imediatas das medidas que possam vir a ser adotadas ou que venham a ser adotadas.
Afinal, como o entendimento da matéria econômica por parte dos jornalistas é bastante superficial, quando não precário, os meios de comunicação correm para ouvir as opiniões dos chamados experts, em geral, aqueles que se destacam nas áreas de atuação mais afetas à questão em debate.
Por outro lado, há nos compêndios e manuais de economia, aos quais todos os bacharéis têm acesso, a apresentação de um verdadeiro dogma, que atribui ao excesso de dinheiro, e de gastos, a causa quase que exclusiva da inflação.
Então, os experts a serem procurados para analisar e repercutir - e desinformar ou  deformar - a opinião pública são os economistas ligados ao mercado financeiro.
E aí, dá-se a oportunidade a que os maiores interessados em que algumas medidas específicas sejam adotadas, se tornem os comentaristas ou analistas que irão, "imparcialmente", julgar as políticas e até sugerir ou pressionar pela adoção de políticas para resolver o problema.
Como decisões de política econômica sempre envolvem interesses e os afeta, todos os comentários acabam por adotar um mesmo viés, uma mesma proposta ou recomendação, pela qual começam a pressionar. Ou nem precisam, já que a midia se incumbe de repercutir e cobrar no lugar deles, exercendo seu papel democrático de guardiã dos interesses da opinião pública. E, de repente, até mesmo o povão, sensibilizado e doutrinado, começa a fazer coro aos analistas "isentos".
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É por isso que vemos tanta pressão pela elevação das taxas de juros, em especial da taxa de juros básica, a Selic, por parte da imprensa e da comunidade do mercado financeiro, o único setor que se beneficia de tal medida. Ou dito melhor, o que mais se beneficia.
E a pressão é tão grande, que não percebem que estão praticando o famoso "wishful thinking" ou seja a arte de fazer com que, por seu comportamento ou pelos comportamentos que induzem, acabam fazendo o que era simples profecia acabar por se realizar.
Assim tem sido e assim é, quando vemos os comentários da ida ao Senado, ontem, do Ministro presidente do Banco Central, Alexandre Tombini. Por mais que tenha dito que o BC esteja atento. Que a inflação vai se situar nos limites da meta. Que a inflação projetada é menor que a taxa obtida no ano anterior. Que o BC tem instrumentos para lidar com um evento fortuito, caso ele venha a ocorrer. Que o BC não abandonou o regime de metas. Que o BC pode sim, vir a utilizar da política monetária e elevar juros, caso necessário, nada disso muda a interpretação da midia e de seus insufladores, os analistas do tal mercado, para quem a senha já foi dada e os juros irão se elevar na próxima reunião do Copom.
É isso.
Mesmo que não seja.



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