quinta-feira, 3 de abril de 2014

COPOM eleva os juros e a mídia interpreta isso de forma a mais pedestre possível

Mais uma elevação da Selic foi decretada ontem, pelo Copom, elevando a taxa básica de juros da economia para 11%, maior valor desde o início do governo Dilma.
Comemorada pelo mercado, a elevação é justificada pela resistência que vem sendo constatada a cada anúncio do comportamento do índice de preços que mede a da inflação no país.
Conforme a imprensa, a elevação e o percentual de aumento, de 0,25% já era esperado pelos analistas, que passam a especular, agora, se essa teria sido a última elevação dos juros no ano, a partir do lacônico comunicado feito pelo BC na noite dessa quarta feira.
Na manhã dessa quinta, dia 3 de abril, no programa Bom dia Brasil, Miriam Leitão justificou a atitude do Banco Central afirmando pesar sobre os ombros daquela instituição a obrigação de combater, de forma solitária no governo, a ameaça da inflação de atingir e até mesmo superar o limite máximo da meta da inflação, de 6,5%.
Isso porque enquanto as receitas apresentaram crescimento de 7 %, o crescimento dos gastos públicos foi de 15%, a maior parte em função dos gastos relativos ao conjunto de "equívocos" que constituem a política de tarifas de energia elétrica, segundo a comentarista.
Pelos dados apresentados, só com a questão das tarifas de energia e a crise das distribuidoras do setor, o governo teve de gastar cifra superior a 10 bilhões de reais, fora de qualquer previsão.
Mais interessante que o comentário de Miriam, entretanto, é a análise publicada no portal UOL, a respeito dos efeitos da elevação da Selic.
Para o redator do portal:
"Quando os juros sobem, as pessoas tendem a gastar menos e isso faz o preço das mercadorias cair, controlando a inflação, em tese. Por outro lado, juros altos seguram a economia e fazem o PIB (Produto Interno Bruto) ficar baixo." 
E continua: "Se os juros estão elevados, as empresas investem menos, porque fica caro tomar empréstimos para produção, e as pessoas também reduzem seus gastos, porque o crediário fica mais alto. Essa situação deixa a economia com menos força. O lado bom é que investimentos baseados em juros são beneficiados e rendem mais para o aplicador.
Embora o conteúdo apenas reproduza o contido nos manuais de economia, a verdade é que a hipótese de juros elevados provocarem a redução de gastos aplica-se tão somente às compras a prazo. 
Assim sendo, seria prudente que o comentário se cercasse de alguma cautela uma vez que, se a inflação está sendo impactada por elevação de preços de alimentos, por força da frustração da produção desses bens em função de problemas climáticos, pouco efeito a elevação dos juros poderá produzir, no sentido de combater a resistência da inflação. 
É verdade que quando afirma os juros maiores fazem o preço das mercadorias cair, em tese, o redator adota aquele comportamento de cautela necessário, embora não arrede pé da hipótese inicial, que vincula a inflação a um excesso de demanda. Ao contrário, até retoma o argumento, no parágrafo seguinte, ao afirmar que empresas investem menos, e pessoas reduzem os gastos, dado que o custo do dinheiro está mais elevado.
E é exatamente essa ligeireza no tratamento das questões econômicas que me atormenta e me deixa preocupado. Porque se ninguém é obrigado a conhecer em detalhes de questões econômicas, parece-me óbvio que quem irá fazer  uma matéria sobre o tema tenha que ter um maior cuidado com o que está afirmando, mesmo que tenha espaço limitado para uma análise mais profunda. 
E mesmo que seu objetivo não fosse aprofundar a discussão, acredito que, no mínimo, a matéria deveria trazer alguma referência a argumentos que pudessem trazer questionamentos ao raciocínio do senso comum. Nem que fosse citando material de referência para aqueles leitores que desejassem aprofundar o assunto.
Afinal, já há muito tempo os estudos da área de gestão financeira demonstram que a ideia de que as empresas investem menos porque fica caro tomar recursos para a produção é apenas parte da história. De um lado, há toda a questão dos estudos da estrutura e custo do capital, que pode indicar ser mais viável e mais barato trabalhar com recursos próprios, capitalizando a empresa junto ao mercado de capitais. Tudo bem que essa hipótese, nesse momento de comportamento errático da bolsa de valores, não recomenda a captação desses recursos.
Mas, é importante também se lembrar de que grande parte das empresas conta com capacidade de autofinanciamento, representada por lucros não distribuídos e à disposição do grupo gestor, exatamente por esse motivo, escapar de juros elevados de financiamento.
Por outro lado, há que se recordar que pesquisas realizadas em várias ocasiões, e vários países, demonstram que uma parcela pequena dos gastos de investimento podem ser explicadas a partir do custo do dinheiro. Outros fatores como a necessidade de investir para acompanhar a concorrência, ou para adotar tecnologias mais eficientes, aumentando a produtividade e competitividade, justificam a realização de inversões, independente do custo do financiamento. 
De mais a mais, há sempre a possibilidade de levantamento de recursos junto a órgãos oficiais de crédito, como o BNDES, a juros subsidiados.
Mas, mais interessante, é a afirmação final da frase transcrita, que afirma que há, entretanto, um lado bom: o investimento baseado em juros fica beneficiado, e o aplicador ganha mais rendimentos. Frase que revela total desconhecimento de questões básicas para a economia, como o fato de que investimentos são importantes na medida em que expandem a capacidade produtiva da economia, aumentando a possibilidade de o país atender a sua população em suas necessidades. De que apenas dessa forma, a oferta de produtos poderia se expandir, levando a indústria a produzir em quantidade suficiente para atender a demanda, impedindo que a escassez de produtos pudesse provocar a elevação dos preços, mencionada na própria matéria.
De resto, traz o ranço do mercado financeiro, dos rentistas que, na opinião de Keynes constituem autênticos parasitas da sociedade. Afinal, quanto mais elevados forem os juros, mais dinheiro será desviado da atividade produtiva, geradora de produtos, riqueza e empregos - mas também riscos e dores de cabeça, para a atividade especulativa típica dos mercados financeiros, o que não me parece seja o que o país precisa nesse momento. 
Principalmente se o excesso de demanda - motivado por compras a prazo, for apontado como causa da elevação de preços.
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O que nos leva a ficar pensando se a citada desinformação ou a ligeireza de análises não estaria a serviço de outros propósitos,  destinado a difundir exatamente um conjunto de ideias que atendem a certos interesses que apresentar a realidade e cultivar a capacidade interpretativa e analítica do leitor.

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