O ano era 1965, e as eleições para os governos estaduais de Minas Gerais e da Guanabara estavam para ocorrer, mesmo que a ditadura militar, implantada há um ano, não permitisse a realização das eleições mais importantes, para a Presidência da República.
Um problema porém afligia os usurpadores do poder: o favoritismo de Sebastião Paes de Almeida, ex-ministro da Fazenda do governo JK e filiado ao PSD, partido que os militares alegavam ser impregnado de corruptos e, justamente por isso, um dos motivos da necessidade de se proceder a uma faxina na vida política do país.
Faltando dois meses para a realização do pleito, sobreveio novo golpe: em documento que fazia analogia entre o candidato pessedista e o assalto ao trem pagador e a seu personagem Tião Medonho, três políticos mineiros da UDN solicitam e conseguem a impugnação do nome do candidato.
Tendo seu nome lançado em cima da hora, em substituição a Paes de Almeida, Israel Pinheiro acabou elegendo-se governador de Minas Gerais.
No Rio, Negrão de Lima, do mesmo partido, acabou eleito, para desespero dos golpistas da UDN e servindo de justificativa para a proibição de eleições diretas para governos estaduais até o ano de 1982.
Tempos negros e sombrios que constituem nossa história.
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Lembro-me desse episódio, para refletir, independente das questões político-partidárias específicas da época e da reação popular, na reação do povo brasileiro, ou do eleitor, quando julga estar sendo tramada alguma injustiça.
Parece-me que o eleitor toma o lado do injustiçado e acaba apoiando-o nas urnas.
Não tenho nenhum dado concreto ou base científica para chegar a essa constatação, mas minha sensação é de que o povo brasileiro reage como quem tomasse as dores do injustiçado, ou da figura do coitadinho.
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Pois bem, tendo em vista o que afirmei acima, será mesmo que ao cassar o registro da Rede de Sustentabilidade de Marina Silva, o TSE prejudicou aquela candidata ou apenas agregou mais um ingrediente, altamente positivo à candidatura da ex-ministra e capaz de dar mais combustível a sua pretensão de ser candidata a presidência da República em 2014?
Ocupando hoje a vice-liderança da preferência popular, como indicam as pesquisas de intenção de voto, e com vários partidos interessados em oferecer-lhe a vaga a candidata, Marina não acabou sendo beneficiada pelo simples fato de ter o TSE agido estritamente dentro do que determina a legislação?
Afinal, o papel de coitadinha e de candidata prejudicada pelos interesses poderosos dos que ocupam o poder assenta-se à perfeição a Marina, que sabe cultivar tal imagem, sem sombra de dúvida.
Por um lado, há a questão de que alguns dos juízes do TSE são os mesmos que têm assento no STF, onde os embargos infringentes foram aprovados, e a opinião pública, manipulada pela mídia, já formou seu juízo de que a Corte é formada por maioria petista.
Ora, como a presidenta Dilma, petista, é candidata à reeleição, a ameaça representada por Marina afeta principalmente aos planos do partido que está no poder. Esse mesmo partido identificado com o mensalão e com os juízes que, agora, prejudicam Marina.
Até já sou capaz de imaginar Boris Casoy apresentando o jornal noturno e comentando que Tá tudo dominado!
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Não está.
Que tenha havido problemas no registro das assinaturas daqueles que se filiaram à Rede, e que tenha havido morosidade dos cartórios eleitorais, nada disso guarda relação com a decisão do Tribunal Superior Eleitoral, que se ateve estritamente ao que está contido na legislação.
Fazer aquilo que talvez fosse desejo de alguns, de flexibilizar a lei, apenas baseado no ambiente criado pela mídia que vitimizava Marina é que seria um absurdo, como deixou bastante claro a Ministra Carmem Lúcia, presidente do colegiado e Ministra do STF. Ministra, aliás, que votou contra a aceitação dos embargos infringentes que beneficiavam José Dirceu e Genoíno e João Paulo Cunha, entre outros.
Ministra que deixou muito claro não concordar com a opinião de Gilmar Mendes, outro companheiro em ambos os tribunais, e que também votou contra os infringentes e, ontem, mais uma vez, levando mais em conta seu interesse partidário que o que é a letra da lei.
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Até mesmo a perda do registro da Rede é uma mera hipótese nesse momento. Afinal, ainda hoje e até amanhã, as assinaturas necessárias, em torno de 50 mil poderão ser colhidas, especialmente se as redes sociais, que tanto ajudaram o partido a ganhar simpatia popular, promoverem uma grande campanha de filiação.
É bom lembrar, como outro dia o fez o colunista da Folha, Igor Gielow (coluna Despertador, na Folha de 2 de outubro), que foi confundir o número de assinaturas exigidas com o número de curtidas no Facebook, que ajuda a explicar porque Marina não obteve êxito no registro.
Porque não usar do imenso poder demonstrado pela candidata, ou por seu partido, para conseguir as assinaturas faltantes, numa arrancada final?
De mais a mais, se não acho que prejudique a candidatura de Marina, pelos motivos que expus, o que a não aceitação do registro da Rede pode vir a prejudicar, ou quem, são aqueles velhos políticos de sempre, e suas práticas também de sempre, da mudança de siglas, como quem muda de roupa.
A esse respeito, é bom lembrar que os políticos que têm mandato perderiam seus mandatos caso mudassem de siglas partidárias, o que não acontece se migram para partidos novos, no afã de acomodar seus interesses. Alguns desses interesses nada republicanos...
Entretanto, a possibilidade de irem para novos partidos ainda subsiste, já que recentemente 2 novas siglas foram autorizadas, mesmo que sem todo apoio e frisson que a Rede tem provocado.
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De minha parte, acho que, na verdade, quem ganha com a decisão do TSE são aqueles partidos de oposição que nunca disseram a que vieram, como o PSDB, que nunca conseguiu ser alternativa a nenhum projeto de poder político ou de mudança social desejada pela população brasileira, com seu candidato espertinho, como todos os bons meninos do Rio, com todos os seus anos de praia...
Afinal, a chegada de Marina ao páreo, por um partido nanico, sem qualquer expressão é muito boa para obrigar o eleitor a se acostumar com a possibilidade de uma disputa de segundo turno.
Mais difícil, ao final, será derrubar Marina, embora o discurso de que, no fim das contas ela é como qualquer outro político, sujeita a se filiar a qualquer partidinho, apenas para levar avante seus interesses individuais mais egoísticos, possa ser capaz de beneficiar a quem, durante todo o primeiro mandato de Dilma, nada fez a não ser ficar oportunamente em silêncio.
Ou pior, aproveitando-se das benesses de estar no poder para, só agora, no final do baile, optar por descer da embarcação e passar a criticar a direção do navio e até as músicas da orquestra de que fizeram parte tão convenientemente.
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Curiosa, em minha opinião e mudando de assunto ligeiramente, a postura do governador de Pernambuco, Eduardo Campos, que ou convenceu-se de que Lula tenta voltar ao poder em 2018 ou entrou em desespero.
Afinal, amigo de Lula, de quem foi aliado desde sempre, vinculado a Miguel Arraes e a toda tradição de cunho social que o político esquerdista representa, era de se esperar que negociasse para se tornar o nome para uma eventual sucessão de Dilma, em 2018.
Situação que, agora, parece completamente afastada do horizonte.
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