terça-feira, 25 de fevereiro de 2014

De volta a questão da maioridade penal

Há muito tempo atrás, postei aqui minha opinião sobre a questão da maioridade penal, que volta agora ao debate, graças a projeto apresentado e derrotado no Congresso de autoria do senador Aloysio Nunes.
Através da grande imprensa, ficamos sabendo que o projeto de redução da maioridade penal, que contava inclusive com o apoio do governador paulista foi derrotado, o que toda a midia está considerando uma perda de oportunidade. Um atraso.
Por trás da notícia, sempre, o argumento da impunidade, razão do crescente número de adolescentes praticando crimes bárbaros em nosso país.
É verdade. Os números não mentem, mesmo que sirvam tão somente como o que são: registros. Nada a ver, por esse motivo, passar a fazer projeções estatísticas para uma possível escalada de crimes de adolescentes no futuro.
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Como da outra vez que me manifestei quanto ao tema, continuo acreditando que a discussão está mal colocada. Não se trata de reduzir a maioridade penal e pronto. Com tudo ficando resolvido como num passe de mágica.
Porque se hoje se aprova a redução desejada, para a idade de 16 anos, com fortes argumentos a seu favor, admito, inclusive o de que com essa idade o adolescente já tem condições de escolher até o presidente da República, nada indica que em pouco tempo, as mesmas vozes que agora propõem essa idade, e pelos mesmos motivos, não venham a ter de propor nova redução para 14, quem sabe 12 ou até 10 anos no futuro.
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Em minha opinião, a verdade é que, recrutados pelo crime, especialmente nas favelas e nas bocas de tráfico, os adolescentes ganham status, ganham  poder, visibilidade, coisas que lhes são negadas a cada momento, nas ruas e asfalto dos grandes centros  urbanos.
Não poderia ser apenas pela antecipação da idade de puni-los com a privação da liberdade que eles passariam a ter outro comportamento social. Isso é muito pouco e de privação de liberdade a vida deles já é repleta. Liberdade para se divertir, para irem ao shopping encontrar os amigos - os rolezinhos e a reação histérica da sociedade já indica isso - liberdade para andarem pelo centro da cidade, desocupadamente, apenas sentindo-se cidadãos normais. Toda essa liberdade já lhes é negada por todos nós, que lhes negamos o maior direito de todos, de serem tratados como seres humanos ou ainda o direito de serem tratados como inocentes até prova em contrário.
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Mas, antes que me acusem de ser desses que passam a mão na cabeça dos marginais, incentivando a impunidade, é importante deixar claro que minha opinião apenas expressa o fato de não acreditar que a redução da maioridade, por si só venha a resolver uma questão que não pode ser vista apenas por seu lado legalista, policialesco, mas que deve envolver uma discussão muito mais ampla, envolvendo psicólogos, pedagogos, assistentes sociais, médicos, antropólogos, sociólogos, etc. uma ampla gama de pessoas de profissões diversificadas, para que possa surgir uma discussão mais ampla e mais propícia a que o problema possa ser tratado com a dimensão e consideração que merece.
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Acho pobre uma discussão centrada apenas na proposição de se reduzir a maioridade penal. Até porque acho que essa é uma situação típica para que pudéssemos analisar e aprender com situações semelhantes vivenciadas e tratadas por outros países.
A Inglaterra, por exemplo, há alguns anos condenou como se adultos fossem, dois menores, que ainda não tinham completado os 10 anos, se não me falha a memória, acusados de terem sequestrado e abusado de uma garotinha de idade ainda inferior à deles.
Se não me engano, ambos passaram por uma série de entrevistas com profissionais especializados, que concluíram que ambos sabiam o que estavam fazendo, tinham plena consciência de seus atos e consequências, o que lhes valeu a condenação à prisão perpétua, creio.
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Ora, é verdade que a situação de dois meninos de classe média britânica é bastante diferente das condições de vida ou não-vida, de miséria e degradação de grande parte de nossas crianças. Mas, acho que essa é a situação mais adequada quando há algum tipo de delito envolvendo menores: analisar o grau de entendimento da ação que resolveram praticar e o grau de discernimento por eles experimentado em relação às consequências dos atos por eles cometidos.
Aí sim, punir com o rigor da lei e do direito por eles desrespeitado. Sem que a sociedade fique preocupada em olhar apenas a idade cronológica de cada autor de um crime, para poder começar a punir, até para evitar que dentro em breve, estejamos discutindo, sem qualquer mudança nos números e estatísticas, ou no pânico já instalado em nossas cidades, se deveríamos reduzir ainda mais a maioridade penal, quem sabe para 4 ou 5 anos.

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