Ao longo
da história, nazistas negaram aos judeus o direito à vida. Ainda hoje, alguns
povos se julgam superiores a muçulmanos, que se julgam superiores a cristãos,
que se julgam superiores aos adeptos das religiões afro.
Em nossa
sociedade, alguns de nós se acham superiores aos homossexuais e, casos recentes
demonstram como alguns se sentem superiores a outros com base na cor da pele,
indiferente ao fato de o outro ser um atleta como Tinga ou Arouca ou um juiz de
futebol. Ou em sã consciência, alguém duvida que Glenn Ford, o homem que passou
30 anos esperando a execução da sentença que o condenou à morte, mesmo sendo
inocente, não teve a seu desfavor a cor da pele?
Por isso,
não deveria ser surpreendente verificar que ainda há aqueles que se sentem
superiores apenas por sua posição social ou tipo de trabalho ou meio de
transporte, como nos mostra a reação e críticas nas redes sociais à atriz
Lucélia Santos, fotografada andando de ônibus.
Tão
surreal a situação, que essa sensação de superioridade por força de condições
sociais e do trabalho exercido tornou-se base de uma tese, provando como um ser
humano, pelo tipo de seu trabalho pode tornar-se invisível.
Nesta
sociedade que segrega os menos favorecidos, a fome ameaça 1,2 bilhão de
pessoas. Embora tenhamos a atenção mais atraída por aqueles que, bafejados pelo
prêmio da loteria biológica, lutem contra a obesidade. Em suas famílias, podem se
dar ao luxo de optarem por comer menos, para não engordarem.
Como diz
Frei Betto clonam-se corpos, não a justiça. E a preocupação com a estética dos
corpos não permite espaço para que valores, subjetividades, utopias e
espiritualidades sejam discutidos.
A forma
como a economia lida com os corpos, revela a política de uma sociedade. Onde os
objetos de luxo preocupam mais que o modo como trabalhadores são tratados ou
destratados, onde o valor do dinheiro se
sobrepõe ao das vidas humanas e as guerras tornam-se motor de prosperidade, é
preciso de nos perguntarmos que sociedade estamos ajudando a construir.
Reclamamos
da insegurança e violência, sem percebermos que reproduzimos o ambiente em que
o homem permanece sendo o lobo do homem, como mostram os casos recentes em que
a população, entende e aceita o direito de fazer justiça com as próprias mãos.
Brigamos
por reduzir a maioridade penal, entretanto, a maioria da população mundial
nasce para morrer antes do tempo e isso não nos preocupa.
Vivemos
uma sociedade caracterizada pela privatização da moral o que a torna paradoxal:
juridicamente repressivas mas economicamente liberais. Como indivíduos, não
podemos fugir do padrão ético predominante nas relações sociais reguladas.
Entretanto, temos a nossa disposição, no mercado e sujeito à lei da oferta e
procura, uma série infindável de imoralidades. Que quanto mais forem condenadas,
mais ampliam seu valor de mercado.
O que
permite, enfim, que se realize o objetivo real do mundo que estamos
construindo: a acumulação de riquezas em mãos de uma minoria que se destaca cada
vez mais como especial. Quem sabe, superior?
Não nos
apercebemos de que a imoralidade e violência cumprem a função de desviar nossa
atenção do pecado social, que explora a maioria da população e nos reduz a um
monte de nulidades.
Essa
privatização da moral serve para camuflar o fato de que a moral que praticamos
individualmente e nos torna virtuosos, aplaca nossa consciência. Afinal,
assumimos comportamentos que nos tornam bons, justos, honestos.
E
contraditoriamente, com a consciência limpa, aceitamos a ideia de que
preocupações sociais escapem à nossa responsabilidade pessoal, transferindo tal
responsabilidade para os que participam diretamente do poder.
E
passamos a cobrar o governo, a quem culpamos por toda a nossa passividade e inércia
ou fuga.
O que me
lembra de uma piada da internet, sobre a expressão que fazia sucesso nos início
dos anos 60, quando a tv brasileira exibia o seriado do herói Lone Ranger, aqui
batizado de Zorro, sempre acompanhado de seu fiel e servil índio Tonto: um dia
Zorro e Tonto encontram-se encurralados por índios sioux de um lado; comanches,
apaches e moicanos pelos outros lados. Quando acaba a munição, Zorro se
lamenta: "Nós estamos perdidos, Tonto". Tonto faz sua melhor pose de
índio, capricha no sotaque e responde: "Nós, quem, cara-pálida?".
Expressão
que capaz de expressar rápida e eficazmente, como uma pessoa tenta se esquivar
da tentativa de um amigo, de envolvê-la em um problema particular.
De quebra, transmite a ironia de um comportamento que se de um lado
aprova quem deseja desfrutar sozinho dos sucessos, por outro lado admite que,
na hora do aperto, os problemas devam ser compartilhados.
É, a
história fala de todos nós.
Mas,
estou certo de que vocês, formandos hoje, que contam com a solidez de
princípios e valores que seus pais e familiares lhes transmitiram, o que me leva a agradecer-lhes e cumprimentá-los,
felicitando a cada um deles, saberão evitar as armadilhas a que nos referimos.
Jovens, inteligentes,
esforçados como ficou demonstrado em todo esse tempo dispendido para chegarem a
esse momento; formados por professores e profissionais aptos a lhes fornecerem
as ferramentas para que usem o conhecimento e experiência acumulados menos em
proveito próprio mas em prol de toda a sociedade, sei que saberão lutar pela
construção de uma sociedade mais justa e mais digna.
Ao vê-los iniciarem suas
brilhantes jornadas, trago a certeza de que não me decepcionarão: vocês irão
fazer a diferença. Em todo lugar. E sempre.
Obrigado.
Um comentário:
Caro Professor Paulo, discurso maravilhoso! Atual e verdadeiro! Parabéns ! Orgulho em ser sua aluna! Paula Faria 1b comércio exterior noite UNA 2014
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