Mas a verdade é que o voto do Ministro Barroso foi de uma
felicidade ímpar, quando afirmou taxativamente que a permanência do Estado de Direito
impõe o dever de que o direito de onze cidadãos não venha a ser sobrepujado
pelo interesse, torcida, opinião ou desejo de milhões de outros cidadãos.
Referia-se o Ministro, à aceitação dos chamados embargos
infringentes, que permitem que o réu que obteve 4 votos favoráveis a sua
absolvição tenha o direito de ver sua causa examinada uma segunda vez, como que
se o tribunal, a título de evitar qualquer injustiça, promovesse uma segunda
oportunidade de exame da questão aos seus membros.
Cria-se assim, a oportunidade de que aquele juiz que tenha
votado sem muita convicção, possa alterar sua posição, tomando a decisão mais
adequada a sua consciência.
No caso em tela, o mensalão, a aceitação dos tais embargos
infringentes iria alcançar a 11 dos réus, sendo alguns deles os de maior
projeção política, como o ex-ministro José Dirceu, o deputado José Genoíno e
João Paulo.
Caso mantida a decisão da maioria, em um reexame da acusação
e julgamento em relação à denúncia de formação de quadrilha, vários desses
políticos teriam suas penas validadas, o que significa que teriam que se
submeter à privação de liberdade. Traduzindo em miúdos: vários deles iriam
pagar na cadeia.
Dessa forma, a alma nacional estaria começando a ser lavada,
e uma pá de cal estaria sendo lançada definitivamente sobre a famosa e
indecorosa impunidade, uma das faces de expressão de todas as nossas mazelas.
Será?
Sem querer entrar nessa discussão, e sem entrar na questão
de tais embargos terem o poder de arrastar, ao menos para os 11, e para o caso
de apenas alguns crimes específicos dentre aqueles por que foram condenados, a
verdade é que, consagrados e aceitos por nossa Justiça, seria estranho que tais
embargos não fossem acatados, apenas para saciar a nossa pressa de ver o caso
do mensalão liquidado e seus membros devida e severamente punidos.
Foi sob essa ótica que achei o voto do Ministro Barroso
importante. Porque ele me fez lembrar de um filme famoso de Hollywood,
estrelado por Henry Fonda: 12 homens e uma sentença.
Um filme que é uma aula de como uma dúvida razoável que
possa ser arguida em favor da inocência de alguém, deve ser levada em
consideração, mesmo que nossa impressão seja negativa a respeito de quem esteja
sendo beneficiado por tal postura.
Ora, no filme, realizado em dia de decisão final de
campeonato esportivo nacional, todos os jurados só desejavam deixar a sala onde
estavam reclusos, e onde o sistema de ventilação estava funcionando
precariamente ou não funcionava, para poderem voltar a suas casas, suas
famílias e à tevê, onde o jogo estaria sendo transmitido.
O resultado foi que, uma pequena dúvida levantada pelo
personagem de Fonda foi suficiente para que, noite adentro, um a um dos jurados
fosse sendo convencido de que não havia suficiente prova, senão evidências para
que o réu não fosse condenado.
Até a decisão final, o jogo
já tinha acabado há algum tempo, e já não restava mais motivos para que a
pressa não desse lugar a um julgamento mais isento.
***
Pois bem, o ministro disse
com todas as letras que tanto quanto a sociedade não vê a hora de o julgamento
chegar a seu termo. E ver as punições serem aplicadas. Mas isso não significa
que sua consciência lhe permitisse sobrepor ao direito desses 11 embargantes a
vontade da pressa e da punição que está sendo cobrada por toda a sociedade
brasileira.
Que o embargo venha a
representar um mero instrumento protelatório, isso faz parte do jogo. Mas, a
decisão diz respeito a se fazer justiça. Não vingança. E é esse tipo de
pensamento e comportamento que cria um judiciário confiável. E é exatamente
isso que a sociedade brasileira está reivindicando: instituições confiáveis.
Parabéns, pois, ao ministro.
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