Tínhamos acabado de sair do primário e, como era comum naquele tempo, podíamos optar por fazer um ano de estudos preparatórios ou tentar direto os exames de admissão, espécie de vestibular que nos permitia entrar no curso ginasial.
Era o ano de 1966, eu ainda não tinha completado os 11 anos e, aprovado, entrei direto no primeiro ano do Colégio Santo Antônio, então um dos colégios mais respeitados de BH.
Como os meninos de nossa idade e de nossa época, eu gostava muito de futebol, e o meu gosto pela prática do esporte era, devo admitir, inversamente proporcional à minha qualidade em campo. E, também é importante lembrar que, sendo um colégio que ocupava um terreno de pequenas dimensões, o Colégio Santo Antônio não tinha um campo de futebol. Tinha uma quadra de cimento, para a prática do futebol de salão e onde eram realizadas as aulas de Educação Física.
Pois bem, como todos os colégios, também o Santo Antônio tinha um grêmio estudantil que patrocinava um campeonato interno de futebol a cada ano. E como todos os demais alunos, nós, da 1ª série ginasial ficamos ansiosos para que os quadros e murais começassem a dar informes sobre a realização do campeonato daquele ano.
E não demorou muito para que os preparativos para o campeonato tivessem início e nós, como todos os outros colegas, começássemos a discutir em sala a formação dos times para a inscrição no campeonato. Uma discussão que, vista com olhos de hoje era no mínimo curiosa, já que não tínhamos tempo suficiente para nos conhecermos. Em comum, havia apenas a vontade, enorme, de cada um de nós participarmos dos jogos. Vontade muito maior que a qualidade de nosso futebol.
E formamos o poderoso Antártica, time que contava comigo, o Tarcísio, o Serafim... e outros colegas, que a memória não me permite identificar. E a vergonha impede de identificar com os sobrenomes.
Feita a inscrição no campeonato, e publicada a tabela, fomos informados que nossa estréia seria contra o The Horses, time da 4ª série B, formado pelos alunos mais velhos do turno da tarde, e favoritíssimo a serem os campeões, junto ao The Goldfinger, time de alunos do 3º B ginasial e que enfrentaríamos, na segunda rodada, se bem me lembro.
E chegou o dia tão ansiosamente aguardado de nosso jogo. E, nesse dia, um de nossos colegas não poderia jogar.
-Não tem problema! Tamanha era nossa ansiedade que jogaríamos com um jogador a menos, entrando com três na linha.
Também não me lembro se combinamos que cada um de nós jogaria um tempo no gol, nos revezando, ou se foi o goleiro que não poderia estar em campo. Sei que o jogo foi uma marca no Colégio Santo Antônio.
Perdemos de 37 a zero.
Muito pior e mais vexatório que os 7 a 1 do time brasileiro, ontem.
Da partida, lembro-me pouco, o suficiente para lembrar que nenhum de nós tinha físico para disputar qualquer jogada com os colegas mais velhos. Que o Serafim, em momento que foi jogar no gol se atreveu a tentar interceptar um chute que lhe valeu aparecer no Colégio de mão enfaixada no dia seguinte. Que houve uma hora que, para brincar conosco, o The Horses cometeu um pênalte, que eu perdi. Simplesmente, por não ter forças para chutar a bola e conseguir fazê-la vencer o goleiro adversário.
***
Na semana seguinte, jogamos contra os Goldfinger e levamos outra sapatada, perdendo de 14 a zero.
Nossa participação era tão ridícula, que o Grêmio se reuniu e chegou à conclusão de que não havia a menor condição de dar sequência a um campeonato como aquele.
Nesse meio tempo, jogamos contra outro time, o Tupi, acho que da 1ª ou 2ª série, perdendo de 2 a zero, apenas.
E o campeonato foi suspenso e decidiu-se que daquele dia em diante haveria duas competições, uma para os novatos, nós da primeira e segunda série, outro para os mais velhos, de forma a impedir ou evitar que nós os menores puséssemos nossa integridade em risco.
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Pois bem, lembrei ontem à noite dessa história, e resolvi registrá-la apenas porque, hoje, não vejo nenhum problema em se perder uma competição ou uma partida, até de forma acachapante como aconteceu com a seleção brasileira ontem.
Problema maior é não se extrair as lições, não se tirar qualquer aprendizado, não reconhecer as falhas e não promover as mudanças necessárias para que tais derrotas não sejam em vão.
No Colégio Santo Antônio, mais que chacota, viramos o motivo de mudanças e alterações que tornaram os jogos mais justos e mais bem disputados. Terminando naquele ano, com o pessoal da 3ª série campeão.
Mas, o Colégio Santo Antônio, já naquele tempo, como ainda hoje, sempre foi lugar de lições inesquecíveis e aprendizado.
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Que nossa seleção brasileira, o comando de nosso esporte, a midia esportiva toda tenha, a partir de ontem, a humildade que não foi manifesta em nenhum momento dessa Copa, para reconhecer nossa arrogância, nossas inverdades cultivadas ao limite, nossa pretensão de sermos o país do futebol e/ou a pátria de chuteiras, para podermos dar ao futebol o valor e a dimensão que ele, como esporte, merece.
E para que o episódio de ontem, sirva para que nosso país possa melhorar, mais que a conquista do título o faria.
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