quinta-feira, 4 de setembro de 2014

Parábola do crente e do hipócrita no poder. O previsível discurso vazio de Aécio; Selic e pesquisas eleitorais

É comum, ao iniciar o dia, que uma de minhas primeiras atividades seja a leitura da Folha de São Paulo para que eu possa me manter mais bem informado sobre as notícias, comentários e análises dos fatos e eventos que foram destaque no dia anterior. 
Quase que como regra, começo a leitura pela coluna do impagável José Simão, como que em  um ritual para melhorar meu humor e poder depois, já com o fígado desopilado poder me dedicar à leitura das páginas mais densas e ... tensas do jornal, as de política, mundo, economia, etc.
Excepcionalmente hoje, e alterando meus hábitos sem qualquer arrependimento, comecei pela leitura do texto de Contardo Calligaris (caderno Ilustrada, página E10), atraído que fui pelo título sugestivo para o momento que vivenciamos no país: Hipócritas ou Crentes?
Trata-se de uma parábola em que, por hipótese, somos, cada um de nós, completamente permissivos na prática do sexo e, como tal, objeto da preocupação e alvo das medidas, na maior parte das vezes proibitivas, adotadas pelos governos.
Para completar o quadro, existem dois países A e B, com um terço da população completamente indiferente e alheio a tudo e a todos, um terço formado por crentes e outro terço por libertários hipócritas.
Aos olhos dos crentes, somos todos pecadores, para os libertários, para quem tudo é permitido (até beijar você no escuro do cinema, onde ninguém nos vê!!!) basta que haja respeito, de nossa parte, à liberdade de cada um que até ser crente e intolerante é tolerado!
Em um país, o governo é dominado pelos crentes, em outro, pelos libertários. 
Com nosso gosto sexual em primeiro plano, onde escolheríamos para morar, no país que nos condenaria ao fogo do inferno em vida ou no libertário?
Segundo Contardo, essa escolha seria desprovida de qualquer sentido. Em ambos os países, seríamos condenados por nosso gosto extravagante. No governado pelos crentes, por serem crentes e não admitirem tal prática, por princípios religiosos.
Em relação ao outro porque, libertários ou não, os governantes iriam precisar do voto do terço crente para se eleger e manter sua governabilidade. E se manter no poder. 
Ao fim e ao cabo, nossa fantasia seria proibida em ambos, com a diferença de que no país libertário os governantes seriam todos hipócritas, vendendo um discurso desapegado de sua prática.
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Vai daí, que Contardo nos coloca a questão: sendo mais honestos, os crentes talvez fossem mais simpáticos e confiáveis, embora em seu meio tivesse os xiitas, que sempre pedem penas mais pesadas para a expiação dos culpados, podendo chegar ao apedrejamento. 
E aí? Em quem depositar nossas esperanças e destinos, já que o libertário não engana a mais ninguém e, independente de seu discurso, jogam para a platéia.
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Infelizmente, essa é a situação que reflete em parte a realidade com que nos confrontamos o povo brasileiro. 
Como o autor alerta, qualquer semelhança com o Brasil não é apenas coincidência. É o triste retrato em preto e branco, descorado, de nossa decadência política.
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Muito bom. Instigante, mesmo. Vale a reflexão: quando o povo vai acordar e tomar o poder em suas mãos, de acordo com seus reais interesses, e sem se deixar enganar por visionários ou hipócritas?


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Entrevista ontem no Jornal da Globo

Bem fez, em minha opinião, a presidenta Dilma de não comparecer ao Jornal da Globo, evitando de se expor ao linchamento que foi a entrevista concedida ao Bonner e à Patrícia Poeta, e seu cada vez mais fraco Jornal Nacional.
Embora William Waack e sua companheira de bancada tenham mostrado, ao menos ontem, com Aécio, mais elegância e educação que Bonner e sua sanha de querer agredir, mais que questionar.
Quanto ao comportamento do Bonner, gastando inutilmente o nosso tempo,  apenas mudando a forma de elaborar a mesma questão para tentar arrancar da presidenta, inúmeras vezes, sua opinião sobre o episódio e as penas do mensalão, que ela já tinha deixado claro na primeira tentativa de que não iria responder, já comentei anteriormente.
Sua agressividade, que ele acredita que tentou imprimir em todas as entrevistas com todos os candidatos, não foi autêntica, já que, com outros ele tolerou as esquivas, e teve mais civilidade. 
Talvez também Waack, com a Dilma não fosse tão tolerante quanto foi ontem, com Aécio. Mesmo sendo dever dizer que ele ainda tentou, algumas vezes, extrair do candidato alguma declaração mais concreta e não o conjunto de obviedades vazias que o candidato apresentava.
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De Aécio, apenas a constatação de que o candidato está cada vez mais previsível. Não apenas no sentido da previsibilidade que o peessedebista parece crer que representa e que basta para acertar a todos os pontos, por exemplo da política econômica que ele tanto critica como estar semelhante a uma terra arrasada.
Questionado sobre que ministérios irá eliminar, tergiversou. Vai deixar aí um número razoável de, talvez, 23. 
Sua justificativa é que esse é um número razoável, e que outras funções que devem ser desempenhadas não precisam de ter o status de ministério. No fundo, no fundo, apenas citou a incorporação da Pesca em um superministério da Agricultura ou Agronegócio.
Curiosamente, assim como Collor propôs e executou, de triste memória, se propõe a recriar a superpasta da Infraestrutura, para ser o único centro, locus ou o antro da corrupção.
Ao menos, centralizaria a propina e negociatas... ou não?
Em relação a essa questão de ministérios, já tivemos a oportunidade de comentar aqui que dos 39 ministros de Dilma, 16 apenas têm o título, embora a função sempre tenha existido e sido executada, com outros status. Estrutura mesmo e gastos elevados, portanto, em princípio, apenas as 23 pastas que Aécio já afirmou que irá manter. 
Quanto a como vai combater a inflação sem mexer em juros, saiu pela tangente. Para ele, basta vencer e a previsibilidade se encarrega do resto.
Como vai fazer para retomar a trilha perdida pelo PT, na política econômica? O governo dele irá fazer o país crescer. E o país crescerá porque o governo dele não será intervencionista. Não irá promover quebra de contratos. A indústria vai voltar a ter importância, deixando de representar hoje, o que já representava nos tempos de JK, 13% do PIB.
Esse crescimento irá, por óbvio, dar mais segurança aos trabalhadores, e gerar mais empregos, ao contrário do governo Dilma que, em julho, gerou a menor taxa de desemprego da HISTÓRIA (?) do Brasil!!??????
Claro, isso não será da noite para o dia. Vai levar um tempo. Vai levar o tempo para a previsibilidade, seja lá o que isso signifique na cabeça do candidato, surtir efeitos...
Como não saiu desse discurso previsível, mesmo que quando cobrado pela Christiane Pelajo, apenas sabemos que ele acha um absurdo que o governo queira discutir taxa de retorno de empreendimentos privados. 
Ao menos fica claro que em seu governo, irá tolerar qualquer lucratividade obtida nos negócios que o Estado deve ao menos agir como provedor, o que sinaliza que irá tolerar a fixação de preços de produtos de utilidade pública, com a inclusão de qualquer mark-up.
Ah! sim. Irá voltar a dar força às agências reguladoras, que irão ajudar a debelar a inflação... 
Por ser previsível, irá também corrigir os preços represados dos produtos administrados pelo governo, como energia, combustíveis, mas isso, sem açodamento. Ao longo do tempo para que o realismo tarifário que propõe não ponha mais lenha na fogueira da inflação e os preços voltem a expressar a realidade dos mercados.
Completamente previsível. E vazio. Completamente vazio.

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Selic e Juros no BC refém

Sob a expectativa de que seu refém, o BC não tentaria fugir a suas determinações, o mercado apostou e... milagre!!! a aposta estava correta, em que a Selic não seria alterada, mantendo-se nos 11%.
Isso, independente de a economia estar apresentando sinais de recessão. 
É que a inflação continua resistente à queda e para que a meta não estoure no ano, os juros devem continuar no patamar em que se encontram.
Ok.
Apenas observar que nenhum comentarista lembrou que a inflação vem cedendo, nos últimos meses, apresentando valores declinantes mês a mês. E que a recessão também é circunstancial, já que os indicadores antecedentes já indicam alguma recuperação até mesmo da indústria. 
E já que o mercado, conforme a pesquisa Focus espera PIB de 0,5 positivo, o crescimento será pífio, sim. Mas não caracteriza nunca, nem pode caracterizar redução do nível de atividade econômica.
E ainda tem gente que diz que o BC não tem autonomia.


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Pesquisas

As pesquisas IBOPE e Datafolha indicam ligeira recuperação de Dilma, que ainda vence no primeiro turno e perde para Marina no segundo turno e a queda ladeira abaixo de Aécio. 
O que, aos olhos do candidato tucano deve ser também previsível, com seu discurso empolado e oco.
Já Marina mantém-se, transversalmente, iludindo aos vários públicos para os quais se apresenta, rainha da demagogia que é. 
Quanto a sua candidatura, e a coluna-parábola de Contardo Calligaris, apenas lembrar que existe sim, e não foi descrito pelo autor, a figura do crente hipócrita. 
Que reúne o pior dos mundos. Mas, acreditem, existe, e tem nome. 
Atualmente atende por Marina Silva.

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