quinta-feira, 3 de março de 2011

Delfim e o pragmatismo

O colega Álvaro envia-me um email encaminhando um texto publicado pela Folha na edição de ontem, na coluna mantida por Delfim Netto.
No texto, o ex-ministro da Fazenda do governo militar, considerado o czar da Economia,tece comentáriso relativos à cientificidade da Ciência Econômica, assunto já tratado neste blog, não com a mesma competência do professor.
De forma resumida, o autor constata o "fracasso da ideia que existiriam 'leis' quase naturais que determinariam a melhor forma de organização do sistema econômico e que elas poderiam ser 'descobertas' e 'exploradas'..." com a finalidade de construir tal sistema.
A conclusão do ex-ministro salienta o fracasso dessa tentativa de se transformar a economia em uma ciência capaz de adotar os mesmos métodos que a física, movida por uma 'inveja' da capacidade de esta ciência natural ser passível de emprego do chamado método científico de pesquisa.
Na realidade, o mito do método quando utilizado pelas ciências sociais, como a Economia.
O professor  sugere o retorno à velha e modesta economia política, a título de preservar a criança, jogando fora a água turva.
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Depois de admitir a carga ideológica e a interminável discussão metodológica que cerca a economia, propõe o reconhecimento de que: a) a economia, ao contrário da física, é formada por agentes que reagem, "pensa, tem limites éticos fixados em sua cultura, imita o comportamento dos outros..." . . b) que os parâmetros da economia são instáveis e modificam-se com extrema velocidade.
Em poucas palavras: os pressupostos da ciência econômica são do ponto de vista ontológico, a de organicidade em contraponto ao individualismo; além disso, a economia é dinâmica, o que leva o agente a mudar no tempo, o que se adequa mais a um agente dotado de uma racionalidade limitada ou procedimental, conforme já exposto por Lavoie em se Foundations of Post-Keynesian Economic Analysis.
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Deixando de lado o fato de que mesmo a Física modernamente tem se afastado das idéias da Física newtoniana clássica, mecânica e equilibrista, o fato é que o "comportamento dos agentes muda com a experiência, altera o espaço econômico" e torna obsoletas as teorias, mesmo as mais recentes.
E, embora o professor Delfim não deixa clara a questão,  que fique bem claro que isso nada tem a ver com qualquer teoria novo-clássica, fundada em expectativas adaptativas ou racionais. Afinal, a rota de aprendizado dos agentes não segue os critérios da ergodicidade, como lembra Paul Davidson.
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Ou seja, os agentes econômicos tomam decisões para o futuro e simplesmente não sabem. Suas decisões são sempre sob incerteza, e não expectativas cuja faixa de erro tende a ser reduzida pelo aprendizado e experiência.
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Todo o texto do ex-ministro é no sentido de mostrar que, por esse motivo mesmo, as verdades econômicas não podem ser estabelecidas como verdades imutáveis, idéia que os manuais tentam nos vender e que, lamentavelmente continuam fazendo as cabeças dos estudantes que se iniciam nessa área de pesquisa.
E, para ilustrar o autor cita como, na prática, até o FMI, bastião do pensamento ortodoxo e conservador, acaba tendo que adotar um pensamento pragmático, como o fez no caso do tratamento dispensado à flexibilização dos fluxos de capitais.
Vista e declarada em 1997 como capaz de melhorar a eficiência alocativa e promover o desenvolvimento mundial; como oportunidade de diversificação dos portfólios e ampliação dos benefícios dos investidores e como ferramenta para alavancar a produtividade da economia, a idéia de liberalização financeira é hoje vista como passível de controles "macroprudenciais".
Razão porque as medidas do governo brasileiro, em prol de estabelecer empecilhos ao enorme influxo de capitais e suas consequências sobre o câmbio são mais que toleradas, reconhecidas como apropriadas, especialmente para que o sistema financeiro mantenha sua higidez.
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Bem, de pragmatismo o Ministro arquiteto do Milagre Econômico entende bem. Razão que o levou a se afastar das medidas recomendadas por sua formação tradicional, de cunho talvez mais neo-clássico ou monetarista para, entre outras mudanças, propor em 1967 a alteração da forma de se tratar a inflação brasileira, mudando a hipótese de inflação de demanda para inflação de custos, propondo a criação de instrumentos de expansão do crédito e programas de estímulo ao desenvolvimento de setores geradores de emprego, como o financiamento habitacional, para limitar-me apenas a alguns fatos.

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